Crise política sem fim

Unidade das lutas para derrubar Temer e as reformas! Frente de Esquerda Socialista para derrotar a direita e superar o petismo!

Vivemos um momento de impasse após o recuo das fortes lutas, que se deram entre março e junho, contra os ataques de Temer. A crise política continua, mas o governo ilegítimo se mantém devido à ausência de alternativa política e à falta de um golpe de misericórdia vindo das lutas.

Apesar de frágil, atolado em acusações de corrupção e sem nenhum apoio popular, o governo Temer continua a lançar mão de ataques contra o povo trabalhador. É urgente reconstruir uma unidade nas lutas para barrar novos ataques, mas também é preciso apostar na construção de uma alternativa política que supere os erros do petismo, que abriram o caminho para o marasmo atual.

O cenário está marcado por grande incerteza e volatilidade. Precisamos estar preparados para diferentes cenários e a possibilidade de mudanças bruscas na situação.

São inúmeros os elementos que mostram a profundidade da crise política e institucional. Primeiramente, o golpe parlamentar contra a Dilma e sua substituição pelo governo extremamente impopular de Temer. Além disso, temos os constantes escândalos de corrupção, que levaram uma parte do judiciário a tentar uma “faxina”, com métodos autoritários e viés político, através da Operação Lava Jato, que atingiu vários partidos centrais do poder, principalmente PT e PMDB, mas também diretores de grandes empresas. Nessa crise política vimos vários fatos inéditos, como o primeiro senador preso durante mandato, o primeiro presidente acusado criminalmente, além de conflitos entre os poderes judiciário e o congresso, agora com a decisão de afastamento de Aécio Neves do mandato.

A classe dominante é incapaz de oferecer uma saída dessa crise. O debate sobre reforma política resultou em uma mini reforma que não vai muito além de dificultar o caminho para novas alternativas de esquerda, com a cláusula de barreira. Nenhuma das medidas atacam as raízes da podridão do sistema político. Para isso, seria necessária uma verdadeira revolução democrática de participação popular. A proibição de financiamento empresarial das eleições não é suficiente para sufocar o sistema corrupto. Existem ainda muitos caminhos para se repassar dinheiro público para empresas através de licitações, Parcerias público-privadas (PPPs), privatizações, concessões, etc., que retroalimentam a máquina política. O fundo eleitoral proposto não vai servir para garantir um maior acesso democrático a alternativas genuínas como PSOL, e sim para sustentar os grandes aparatos que não precisam buscar nenhum real respaldo popular e podem manter uma relação clientelista com sua base.

Um fator que ameniza a situação para a classe dominante é que a esquerda também sofre uma crise de representação, com falta de uma alternativa que consiga ocupar o espaço existente e desempenhar o papel que o PT fazia antigamente, unificando e dando uma linha para a luta.

Reacionários e militares, contra a primavera dos oprimidos

O projeto de conciliação de classes do PT deixou um legado tóxico. Esse projeto incluiu alianças com forças reacionárias, onde temas ligados ao combate à opressão, como aborto, kit anti-homofobia, etc. foram tratados como moeda de troca. Reacionários como Marco Feliciano, Eduardo Cunha e outros, ganharam espaço e nunca pararam de produzir propostas para atacar ainda mais os direitos de mulheres, LGBTs, negros e negras, povos indígenas, etc. Por isso, apesar de um avanço na opinião pública em temas como aceitação a relações LGBTs e combate à violência machista, o avanço real de direitos foram poucos e na maioria do tempo o movimento tendeu a agir na defensiva.

Os crimes da ditadura também nunca foram condenados, e representantes militares e reacionários como Bolsonaro, ainda podem abertamente defender a ditadura sem que nada aconteça. A mídia, totalmente dominada pela direita e interesses de grandes empresas e igrejas, também foi deixada intocada, sem nenhuma tentativa de democratização da comunicação.

A falta de alternativa de esquerda que consiga estimular um salto na consciência das massas faz com que esse cenário abra espaço para alternativas como Bolsonaro, que pode se tornar um para-raios para quem está insatisfeito com os partidos do poder, incluindo o PT.

A classe dominante nesse momento não irá apostar em uma figura como Bolsonaro, que incendiaria o país se ganhasse as eleições. Mas, da mesma forma como nos EUA, com a eleição do Trump, não podemos descartar que um “acidente” desse tipo aconteça, expressando a profunda crise política e falta de alternativas pela esquerda.

Além disso, a ala reacionária é perigosa mesmo não tomando o poder. Ela age, ou tenta agir, como tropa de choque de governos de direita, como no caso do MBL, e pode se tornar mais perigosas com a polarização social, incluindo a utilização de ataques físicos. Vimos isso em junho de 2013 e nas tentativas de ataques sobre as escolas ocupadas pelos estudantes. Também foi assim em vários países da Europa, onde a extrema-direita cresceu.

Por outro lado, os temas relacionados à opressão tem sido muitas vezes o estopim para mobilizações importantes. Foi o caso da primavera feminista contra Cunha, mas também esse ano, com as manifestações de 8 de março sendo o primeiro passo na onda de lutas que culminou com a greve geral dia 28 de abril.

Porém, o recuo geral das lutas também afetou as mobilizações contra as opressões. A resposta contra a liberação através de liminar judicial da “cura gay”, foi rápida e forte, especialmente o ato em São Paulo com cerca de 4 mil participantes, mas o movimento retrocedeu rapidamente. Devemos estar atentos porque pode ser que provocações como essas desencadeiem novamente uma nova onda de mobilizações.

Ataques continuam

A política de ataques de Temer conta com uma grande maioria entre os partidos do congresso. Mesmo assim, há contradições. Temer pode não ter ambições para se eleger a algum cargo em 2018 e por isso não tem problema em ser impopular, mas esse não é o caso dos deputados e senadores. O governo também tem sido forçado a recuar em certas medidas, como no caso da retirada do decreto que criava a reserva do Renca para exploração de mineradoras na Amazônia. Por outro lado, fica cada vez mais evidente a possibilidade de Meirelles se lançar nas próximas eleições e ele precisa se mostrar competente. Por isso, não é possível deixar o governo paralisar a aprovação das “reformas”.

Aprovada a contrarreforma trabalhista, o segundo grande foco seria a reforma da previdência. Porém, já está bem claro que será quase impossível passar uma grande contrarreforma, que requer maioria qualificada no congresso, nesse contexto de grandes ataques e tão perto da eleição. Isso não significa que não vão tentar votar uma meia reforma, como ataques sérios, que pode começar a ser votada ainda em outubro.

Além disso o governo já lançou um grande pacote de privatizações. São 57 projetos que incluem privatização da Eletrobras, Casa da Moeda, aeroportos, portos, etc.. A venda da Eletrobras deixaria 95% da geração de energia no país em mãos privadas (hoje são 60%). Meirelles admitiu que estuda também a possibilidade de privatizar também os Correios.

Os efeitos da política de cortes tem sido muito grave. Muitas universidades, federais e estaduais, passam por grandes dificuldades, com instituições importantes como a UERJ sendo ameaçadas de fechar. Programas como Minha Casa Minha Vida estão com perspectiva de perder todo o financiamento. Na cultura, a grande maioria das verbas foi cortada.

Em nível estadual e municipal, a situação é muitas vezes pior ainda. A crise muito profunda no Rio de Janeiro, em combinação com governos de direita, têm trazido profundos ataques aos serviços públicos e aos servidores.

A guerra aberta de facções criminosas na Rocinha, incluindo polícia e exército, e a prisão do presidente da COB por suspeita de compra de votos na eleição do Rio de Janeira como sede dos Jogos, são só os mais exemplo da crescente barbárie.

Retomada econômica para quem?

Depois de uma longa e profunda crise, a economia dá sinais de uma lenta e fraca recuperação. A expectativa é que o crescimento do PIB fique abaixo de 1% esse ano e que o PIB per capita termine o ano abaixo do nível de 2010.

A economia ainda é marcada por falta de investimentos, que continuaram caindo em 0,7% no segundo trimestre. Desde o início de 2014, os investimentos acumulam uma queda de 28,9%. A indústria de transformação teve uma queda de 17,7% e o setor de construção caiu 21%.

Há muita ociosidade nas fábricas, o que também limita os investimentos. Com muitas máquinas paradas, é possível aumentar a produção sem grandes investimentos.

Segundo a Folha de S. Paulo, investidores dos EUA acham que a reforma trabalhista não é suficiente para animá-los a investir no país. “Então quer dizer que ainda não vamos poder reduzir salários? Isso é a coisa mais anticapitalista que existe”, diz um deles à Folha.

As finanças públicas continuam com enormes déficits, já que o governo Temer se recusa a taxar as grandes empresas e fortunas. Recentemente o governo anunciou o aumento da previsão do déficit fiscal em 20 bilhões, subindo para 159 bilhões esse ano. Isso significa que a dívida, e gasto com juros, continuará a crescer, enquanto o governo continuará a cortar em saúde, educação, moradia, etc..

O desemprego continua altíssimo, em cerca de 13 milhões. Segundo o IBGE, 7 em cada 10 novos empregos são no setor informal.

Por outro lado, vemos como a bolsa de valores já bateu o recorde de 2008, enriquecendo mais os já ricos.

Sem um avanço significativo nas lutas e a construção de uma alternativa política pra valer, o risco é grande de que se repita no Brasil o fenômeno comum dos últimos tempos no mundo, em que a retomada do crescimento vai apenas para os bolsos dos mais ricos. Tudo isso aponta para que, nos próximos anos, a tensão social tenda a se agravar.

Por que houve um recuo das lutas em junho?

Não concordamos com aqueles que tentam culpar “o povo” pelo fracasso da greve geral de junho. O apoio às mobilizações e às greves gerais, mesmo por parte daqueles que não saíram às ruas, foi de uma grande maioria.

Porém, as grandes centrais, que foram forçadas pela pressão da base a organizar a greve de 28 de abril, jogaram um papel de desmontar a greve geral de 30 de junho.

Centrais de direita como Força Sindical e UGT não queriam derrubar o governo Temer e por isso não queriam jogar peso na luta, somente pressionar para obter algumas concessões.

Também as centrais como CUT e CTB, que são de oposição ao governo Temer, não jogaram o devido peso. O centro da estratégia dos ex-governistas é apostar na saída institucional, o “Lula 2018”. No último período isso tem ficado mais claro ainda. Enquanto o governo Temer continua a anunciar ataques, os movimentos ligado ao PT jogaram todo o seu peso em construir a figura de Lula, sem mobilizar para a luta, como na caravana no Nordeste. Isso enquanto a CTB, ligado ao PCdoB, participou de uma iniciativa junto com a FIESP, Força Sindical, UGT, NCST e CSB para elaborar um manifesto pela “retomada do crescimento”, que inclui redução de impostos para as empresas e apoio às Parcerias Público-Privadas, que foi apresentada ao governo Temer no dia 12 de setembro!

Porém, a continuidade dos ataques, os efeitos nefastos da política de austeridade, como atrasos de salário do funcionalismo, falta de verbas na saúde e nas universidades federais e outros, junto com a crescente barbárie da crise social, com casos de violência contra mulheres, negros e negras, LGBTs, indígenas, sem terra, etc., força inúmeros setores a lutarem, porém de forma fragmentada.

Não há falta de lutas importantes e exemplos positivos, como a grande ocupação urbana do MTST, “Povo Sem Medo”, em São Bernardo do Campo, que em poucos dias cresceu para mais de 7 mil famílias.

As iniciativas conjuntas no segundo semestre, com as mobilizações do dia 14-15/9 e 03/10, até agora têm sido mais fracas. O principal dia de lutas nesse semestre provavelmente será o 10 de novembro, o dia antes da reforma trabalhista entrar em vigor, decidida em uma plenária nacional reunida em São Paulo dia 29/9 de metalúrgicos de todas as centrais, com representantes de outros setores.

Novos ataques, como uma ameaça de votação da reforma da previdência, podem ajudar a impulsionar um novo ascenso das lutas, mas não é garantido. Para superar essa situação, é necessário unificar as lutas, construir uma agenda unificada, que possa trazer a confiança de uma luta pra valer.

2018 muito incerto

Se essa retomada de lutas não vingar no curto prazo, que é uma possibilidade real, é natural que uma camada crescente aposte suas esperanças em uma saída através das eleições. Precisamos dar uma resposta a esse anseio, sem deixar de enfatizar que essa alternativa política tem que ser construída com base nas lutas hoje.

A construção dessa alternativa política e eleitoral não deve se confundir com a necessidade de construção de uma frente única mais ampla possível dos trabalhadores para derrotar os ataques dos governos e dos patrões.

O que os movimentos ligados ao PT estão fazendo é diferente. Estão secundarizando a luta, priorizando a construção de uma alternativa institucional que não será substancialmente diferente do que foi construído durante os governos Lula e Dilma, baseando sua “governabilidade” em acordos com partidos da ordem e grandes empresários, não na mobilização popular. A fala de Lula que não vai revogar as contrarreformas de Temer, o encontro com Renan e elogios a Sarney durante a caravana no Nordeste, etc., mostrou que nada mudou, nada se aprendeu, da trajetória que abriu o caminho para a crise atual.

O cenário político para 2018 ainda é bem incerto. Ainda não está descartada a possibilidade de Lula ser impedido pela Justiça de se candidatar. Mas mesmo se for condenado em segunda instância, há também a possibilidade de STF fazer uma nova avaliação política, como no caso do julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE, e liberar a sua participação, temendo que o impedimento de Lula iria aumentar a instabilidade política.

Nas pesquisas, Lula se mantém na frente, com Bolsonaro em segundo lugar. Esses dois também são os com o maior índice de rejeição, Lula com 42% e Bolsonaro com 33%. O cenário pode ainda mudar bastante até as eleições. A situação pode favorecer o crescimento de um candidato tecnocrata de direita, como Meirelles, ou alguém do judiciário.

Falsas alternativas “novas”

Em São Paulo, Doria conseguiu se eleger no primeiro turno com o perfil de “gestor”, mas é muito incerto se ele consegue decolar, já que sua rejeição em São Paulo está aumentando. Marina continua entre os mais cotados e continua tentando cultivar um perfil de alguém que está fora da elite política atual. Mas sua candidatura passada, amparada por donos da Natura e Itaú e seu apoio a Aécio Neves no segundo turno, mostra que ela não é uma alternativa para o povo trabalhador.

Um cenário sem o Lula aumenta ainda mais a incerteza. No PT o tema oficialmente é tabu, mas se discute a possibilidade de Haddad ou Jaques Wagner. No PCdoB se discute Ciro Gomes do PDT como um plano B.

Muitos vão querer apostar em uma candidatura de Lula para barrar a ameaça do retorno dos tucanos ou mesmo a vitória do Bolsonaro. Porém, a aposta eterna de um “mal menor”, não é sequer uma garantia contra essas ameaças, como mostrou o exemplo dos EUA, onde a aposta do “mal menor” Hillary Clinton levou ao “mal maior” de Trump.

Os exemplos internacionais de crescimento de alternativas como Bernie Sanders nos EUA, Jeremy Corbyn na Grã Bretanha, Podemos na Espanha etc. mostram a possibilidade de construção de novas forças de esquerda, quando essas forças adotam um perfil radical de esquerda.

Temos visto surgir novos espaços importantes nos últimos anos. A Frente Povo Sem Medo é um espaço amplo de luta que inclui, além do MTST e movimentos influenciados por correntes do PSOL, incluindo a LSR. A CUT , UNE e CTB e outros movimentos ligados ao PT e PCdoB também participam, mas sem jogar peso, visando mais controlar os passos dados pela Frente. Isso porque, a Frente tem sido um espaço importante para a construção das lutas do último ano, mas também para chegar a uma nova camada que está começando a tirar lições da derrocada do PT.

Essa unidade na luta não pode se dar ao preço de deixar de fazer o necessário debate das lições dos erros do PT, para evitar que sejam repetidos.

Por outro lado, não concordamos com aqueles que descartam a Frente Povo Sem Medo, a iniciativa de debates programáticos “Vamos” ou mesmo o MTST, como associados ao lulismo/petismo. Os exemplos internacionais mostram que uma nova esquerda só consegue crescer se consegue aproximar camadas da classe trabalhadora que muitas vezes ainda tem ilusões em antigas alternativas. É preciso saber dialogar com esas bases sem deixar de apresentar uma clara alternativa.

Alternativa política

É fundamental que o PSOL comece a construir uma figura pública que possa intervir no debate sobre 2018. O nome mais discutido até agora é o de Chico Alencar. Defendemos que o PSOL defina um nome no seu congresso nacional, mas esse debate não pode ser descolado do debate programático.

Existe também a possibilidade da candidatura de Guilherme Boulos, que representaria um grande passo. Precisamos de um candidato e uma campanha que consigam abrir novo espaço para a esquerda consequente, incluindo a capacidade de influenciar uma base que foi petista. Novamente, isso deve se dar adotando um programa anticapitalista e socialista audaz, e sem medo de fazer um balanço duro da política de alianças com a direita do PT.

Uma candidatura ligada à luta que consiga unificar a coerência política e de luta com um programa anticapitalista pode captar a imaginação de uma grande parcela da população, especialmente da juventude, minando o espaço do voto de protesto em figuras como Bolsonaro.

Qualquer que seja a candidatura definida, ela deve estar ligada à construção de uma Frente de Esquerda Socialista, que una a atuação importante do PSOL no parlamento com os movimentos sociais combativos e partido de esquerda, que unifique PSOL, PCB e PSTU, MTST, CSP-Conlutas, Intersindical e outros.