A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994

O ato do Poll Tax: 31 de março de 1990

Com apenas poucas semanas do ano novo, o Militant publicou uma manchete de primeira página: “Esmagar o poll tax” com o chamado para a Federação Britânica Anti-Poll Tax realizar “um ato de massas em 31 de março” (1) 35 milhões de pessoas receberiam seus recibos do poll tax na Inglaterra e Geles em 1 de abril. A campanha deu um grande encorajamento para a revista Tory Economist declarar: “Imagine um país onde mais de uma em dez pessoas da população adulta se recuse a pagar a taxa. Bem vindo à Escócia 1990.” Na realidade este órgão dos grandes negócios subestimou grosseiramente o verdadeiro nível de não-pagamento na Escócia que era de um a cada três apenas em Glasgow. O Economist continuou: “O drama de hoje em Glasgow pode se repetir amanhã em Liverpool. Quanto tempo antes dos Conservadores começarem a ansiar nostalgicamente pelas taxas antes ridicularizadas?” (2)

Ameaçada por uma revolta de massas a “unidade” conservadora começou a rachar à medida que a revolta parecia iminente. Enquanto o Ministro do poll tax Chris Patten declarava que os recibos em média não seriam mais do que £278 por pessoa, em várias áreas eles eram de £400 ou mais, e em Borough of Haringey, Londres, a média era de £579! Relembrando a Escócia Tommy Sheridan declarou:

Na Escócia o tamanho da rebelião excedeu todas as nossas expectativas. A região de Strathclyde enviou apenas 250 mil mandados de justiça contra pessoas que não pagaram, 107 mil apenas em Glasgow. Como pode um punhado de oficiais de justiça – oficiais de justiça escoceses – lidar com este número de casos?

Ele continuou:

Escrevemos ao TUC sugerindo que chamem uma manifestação anti-poll tax em 1 de abril – mas eles recusaram. Então estamos apelando aos sindicalistas de cada fábrica e local de trabalho para se unir à manifestação. (3)

Revolta de Shires

Em Tory Berkshire também, na cidade de Maidenhead, numa gelada noite de sábado em janeiro, 2 mil pessoas atenderam a uma reunião sobre o poll tax. O MP Conservador local foi denunciado como o “Ceausescu de Maidenhead”. O representante Trabalhista local não se diferenciava dele à medida que chamava o povo na reunião a pagar o poll tax e foi vaiado energeticamente. A maioria da reunião estava a favor da campanha massiva de não-pagamento e o secretário da Federação Anti-Poll Tax foi aclamado quando chamou por uma campanha nas linhas da Escócia. Esses eram apenas dois dos abalos sísmicos do terremoto poll tax que iria abalar o governo desde suas fundações e derrubaria Thatcher antes que o ano terminasse. Até mesmo o Daily Telegraph, lealmente pró-Thatcher, foi obrigado a escrever em fevereiro: “Dizer que os preparativos para o poll tax estão num estado simbólico é desonesto para matadouros e para os honestos açougueiros que trabalham lá.” (4) Debbie Clark e John Ewers escreveram no Militant em 2 de março:

Uma enorme multidão de mil pessoas se reuniu fora sob os holofotes. Uma operação de segurança e policiamentos massivos custando £10,000 permitiu entrar apenas os que tinham bilhetes. Parecia uma cena da Revolução Romena – exceto que esta ocorria em Gloucestershire of Stroud. E o que acionou este protesto de massas? A câmara de Stroud estava reunida para criar seu poll tax, eventualmente acordado em £380 para cada adulto. 500 bilhetes para o “evento mais quente da cidade” foram comprados rapidamente. Até mesmo bilhetes porcamente falsificados estavam à venda.

A reunião foi realizada no centro de lazer da cidade porque a câmara municipal comportava apenas 60 pessoas. Steve Nally, secretário da Federação Anti-Poll Tax de toda Grã-Bretanha, saudou a multidão: “Esta pressão já é a maior da Grã-Bretanha. O que está acontecendo em Stroud é uma indicação da atmosfera ao nível das camadas mais baixas”. (5) Um grande urra se levantou. Dentro da câmara outro hurra irrompeu quando a câmara votou por 40 a 8 uma campanha para que o poll tax fosse abolido o mas rápido possível e organizar um lobby no Parlamento. A líder da câmara, uma independente, declarou que ela queria levar “toda a cidade comigo” para pressionar o Parlamento.

Essa reunião e a pressão de massas sobre a câmara cresceu do trabalho da federação anti-poll tax na cidade. Além disso, a raiva e ódio ao poll tax era evidente em Windsor, e outros bastiões Conservadores na área. Isso foi seguido por uma massiva manifestação de 15.500 em Plymouth. Ela foi iniciada por uma dona de casa, Hilda Biles, que disse ao Militant: “Eu nunca fiz nada parecido antes, mas alguém tinha que fazê-lo.” (6)

Demonstrações e reuniões de milhares estavam começando a se espalhar pela Inglaterra e Gales à medida que as câmaras se reuniam para estabelecer a sua tarifa poll tax. As maiores foram no Sul, com ex-eleitores Conservadores declarando que foram “traídos”. No distrito Conservador de West Oxfordshire vereadores renunciaram em protesto aos aumentos de impostos e aluguéis de seu próprio partido. A câmara de Carlisle council se recusou a fixar o seu poll tax.

Walton – primeiros movimentos

Enquanto isso, em Walton, Liverpool, um drama estava acontecendo e teria importantes consequências para o movimento trabalhista em Liverpool e levaria a um evento decisivo na história do Militant. O carrasco Trabalhista de direita, Peter Kilfoyle, ‘desorganisador’ em tempo integral do partido e ceifador, foi escolhido como candidato parlamentar por Liverpool Walton na próxima eleição geral. O MP da área, Eric Heffer, estava seriamente doente e portanto anunciou sua aposentadoria.

A principal oponente de Kilfoyle era Lesley Mahmoud, que recebeu um apoio majoritário, 92 delegados dos 140 presentes na conferência de seleção. Mas Kilfoyle recebeu 19.9% dos votos sindicais, contra os 17.4% de Mahmoud. Muitas das seções que votaram por Kilfoyle nunca se reuniram e tiveram os papéis de votação preenchidos por secretários das seções e pelos profissionais. Além disso, as seções GMB 48 e T&G 6/523, ambas que escolheram Lesley Mahmoud, descobriram nas reuniões de listagem dos delegados escolhidos, que eles estavam sendo excluídos da votação. A seção da Ford do Sindicato dos Transportes tinha 4% dos votos no colégio eleitoral. Mas numa reunião onde a esquerda tinha uma clara maioria de delegados foi lhes dito que o comitê da seção já tinha postado as cédulas eleitorais, com os votos indo para o diretor sindical de direita Mike Carr, e com o 2º lugar indo para Kilfoyle.

Eric Heffer, de sua cama do hospital, exigiu uma exclusão do Comitê Executivo Nacional para impedir Kilfoyle de se manter. Ele pontuou que como antigo diretor regional na mesma região, Kilfoyle tinha uma vantagem desleal, com acesso aos registros dos membros do partido e organizações filiadas. Ele também tinha muitas denuncias sobre o modo como os apoiadores de Kilfoyle eram escolhidos. Desesperado para ter a vaga, Kilfoyle procurava cair nas graças da esquerda, tentando se vestir com as cores do Militant. Em seu discurso eleitoral declarou:

Este distrito eleitoral proclamou (mais de 35 anos atrás) a necessidade de tomar os setores chave da economia e chamar pela nacionalização, naquela época, dos 500 maiores monopólios. Em minha juventude sempre me impressionei pelo material produzido por Walton e circulado pelo partido. (7)

Sua seleção ultrajou a maioria dos ativistas dentro do Partido Trabalhista e sindicatos de Merseyside, nem todos deles da esquerda. Portanto o terreno estava pronto para uma dura batalha entre a direita e a esquerda em Walton no futuro próximo.

A rebelião do poll tax estoura

Mais imediatamente, o mês de março testemunhou uma dramática escalação na luta contra o poll tax. Em um mês, a Stroud se uniram Maidenhead, Bath, Taunton, Oxfordshire e Brighton, áreas do Sul, que, durante décadas, nunca foram tocadas por demonstrações ou protestos. Uma após a outra a população destas cidades se levantaram para denunciar o poll tax. Ao lado deles havia milhares que sitiavam conselhos em Londres: em Hackney, 2 mil se reuniram fora da prefeitura. Centenas pressionaram a câmara de Southwark. 2 mil se reuniram fora da prefeitura de Lambeth, centenas fora das de Waltham Forest e Haringey. Praticamente todas as áreas do Sul foram afetadas de um modo ou de outro pelos protestos e manifestações do poll tax em fevereiro e março.

Em algumas áreas, a situação ficou feia quando manifestantes foram excluidos das prefeituras. Em alguns lugares, a policia se virou contra eles. Em Southampton a polícia começou atacando 400 manifestantes fora da prefeitura, e prendeu rapazes e moças pelo cabelo e braços. Vinte sete pessoas foram presas em Southampton.

Em Lambeth, o Newsnight da BBC mostrou pessoas sendo presas. Uma pessoa foi presa por dois policiais à paisana, um dos quais tinha uma cópia do Militant em seu bolso de trás. “Qual era o seu papel no lobby? Ele estava carregando o Militant para que os manifestantes não suspeitassem dele em seu meio?” (8) Eram perguntas feitas pelos comentaristas de TV e manifestantes.

Face a estas convulsões, a única resposta dos Conservadores e seus jornais era repetir o velho e gasto mito de “agitadores externos”. Uma feroz saraivada de calúnias e mentiras mais uma vez choveu sobre nós nas primeiras duas semanas de março. Cada ministro Conservador e cada pasquim atacou o Militant como o “inimigo interno”. O Times de Murdoch e o Sun chegaram ao extremo. O Sun nos comparou a hooligans do futebol: “A tendência Militant é a própria guarda vermelha interna Trabalhista.” (9)

Para sua eterna vergonha, Neil Kinnock repetiu algumas das afirmações dos Conservadores. Tony Benn concluiu: “O Partido Trabalhista está com mais medo da campanha anti-poll tax do que do próprio poll tax.” (10) A imprensa Conservadora conjurou o ridículo espetáculo de um grupo itinerante de manifestantes profissionais se movendo por toda Grã-Bretanha: em uma noite eles estavam presentes em Bristol, Norwich, Maidenhead, Weston-Super-Mare, Exeter, Gillingham e Birmingham, para atiçar os protestos do poll tax. Em Bath, a reunião da câmara que estabeleceu o poll tax foi atrasada por 3 horas de raivosos protestos. De acordo com os dignitários Conservadores, incluindo o MP loca e o ministro do poll tax Chris Patten, eram todos “hordas pagas de fora, tirados aos montes de covis do Militant como Stroud!” (11)

Como explicar então, que em Bridgewater, 450 se reuniram e concordaram em criar uma união anti-poll tax. O mesmo em Glastonbury, onde 350 se reuniram, com 200 pessoas de Gatcombe Park (residência da família real). De fato a imprensa capitalista estava preparada para caluniar e atirar lama em qualquer organização ou individuo que estava preparado para organizar a resistência às medidas Conservadoras.

Ataques à Arthur Scargill

Ao mesmo tempo em que éramos mais uma vez ridicularizados, a imprensa marrom também voltou seu fogo à Arthur Scargill. Ele foi atacado pelo Sun, Mirror e o resto da Fleet Street. Após a derrota dos mineiros eles ainda queriam jogar no lixo a idéia de luta e estavam determinados a esfregar o nariz dos mineiros nele. Insinuaram que Scargill e outros líderes do NUM usavam o dinheiro do sindicato para eles mesmo quando os mineiros passavam fome durante a greve. O autoproclamado “socialista” multimilionário Maxwell, falou em uma entrevista sobre o papel do Mirror em derrotar a greve do NUM Este foi “acusado de receber dinheiro da Rússia”. Mas os mineiros russos deram de bom grado alguns de seus dias de pagamento para mostrar solidariedade. O aspecto mais nauseante deste ataque era que antigos esquerdistas entraram na onda, atacando Scargill como um meio de atacar a idéia de luta de classes militante.

Assim, o presidente escocês do NUM George Bolton (membro do Partido Comunista) disse que se opôs que o sindicato pagasse qualquer ação legal, afirmando que as transações financeiras em questão não fariam nada com o sindicato. Perguntamos: “Como pode medidas para proteger os bens do sindicato dos seqüestros não preocupar o sindicato?” (12)

A imprensa falha em deter a revolta do poll tax

Em março e depois, o choro sobre a “violência da esquerda” se tornou um tema constante e excessivo. Isso foi visto antes nas lutas de Liverpool e dos mineiros. A mesma tática foi empregada nas disputas de Wapping e Warrington. A classe dominante tem enormes meios em suas mãos para moldar a “opinião pública”. Uma campanha de calúnias pode ter um efeito em desorientar temporariamente os trabalhadores. Contudo, quando grandes questões sociais estão em jogo, seu efeito e no melhor dos casos periféricos e muito temporário, algumas vezes tão inofensivo quanto uma gota de água numa chapa quente.

Os baluartes Conservadores no Sul estavam se insurgindo contra seu “próprio” governo. E não apenas no Sul. O Morecambe Conservative Club ameaçou se desfiliar do Partido Conservador em protesto contra o poll tax.

Um quarto dos backbenchers [membros do parlamento sem pasta} indicaram que queriam que “ela” renunciasse antes da próxima eleição geral. Um dos seus mais próximos confidentes, Ian Gow, que iniciou a ascensão de Thatcher à liderança do partido, a alertou: “Há uma clara necessidade de fazer algo.” O MP Conservador Tony Marlow disse a um atônito Comitê Conservador 1922:

Há um risco de que vejamos uma guerra declarada ao povo e, com os níveis de preço das comunidades sendo agora fixados, temos o risco de ser confrontados por uma campanha de desobediência civil massiva e incontestável.(13)

Baker ataca o Militant

O presidente do Partido Conservador, Kenneth Baker, tentando cobrir as rachaduras, se voltou contra o Militant por alegadamente “orquestrar a violência”, usando táticas de “bate-paus” e manipular a Federação Anti-Poll Tax de toda Grã-Bretanha. O Times fez coro com ele, numa tentativa de desviar a atenção da enorme onda de protestos que se espalhava de um ponto do país a outro. Uma desesperada e devidamente agradecida Thatcher parabenizou o Times no Parlamento por seu “excelente artigo que culpava a ‘esquerda militant’ por organizar ‘violência’ e ‘manifestações intimidadoras’.” (14)

Em 9 de março, foi publicada uma mentira descarada: “Sra. Hilda Biles de Plymouth estava com raiva sobre uma entrevista no jornal Militant desta semana, que ela disse que nunca deu. ‘Parece que usaram sem permissão uma entrevista de um dos jornais locais de Plymouth’.” (15) A sra. Biles na verdade deu uma entrevista ao Militant e confirmou isso subsequentemente. Com sua concordância, ela foi gravada e tínhamos a posse do tape. O Times não nos telefonou para checar as sérias alegações de que tínhamos fabricado uma entrevista, nem publicou a correção que exigimos. Em 10 de março, as calúnias continuaram com alegações selvagens de

Agitadores trotsquistas… associados estreitamente com a Federação Anti-Poll Tax de toda Grã-Bretanha… já plantaram vírus de computador para contaminar o software de dois municípios escoceses. (16)

Contudo, a ineficiência desta “propaganda negra” foi realçado no jornal irmão do Times, o Sunday Times, com o colunista Robert Harris comentando:

Duvido que o eleitor comum, assistindo a violência na televisão, diga: ‘Veja estes horríveis comunistas, Mabel. Precisamos votar na sra. Thatcher como a única pessoa que pode nos livrar destes desordeiros.’ O eleitor provavelmente dirá: ‘Veja a nova confusão sangrenta que aquela mulher está nos jogando.’ (17)

Fãs contra o poll tax

Mesmo nas partidas de futebol, fãs de lados opostos cantavam juntos: “Nós não estamos pagando o poll tax.” O crédito por esta iniciativa deve ir para John Viner da união anti-poll tax de Acton, que escreveu:

Estava indo para o jogo Arsenal v Forest e ‘de improviso’ decidi levar algumas centenas de panfletos do ato nacional para distribuir. Quando o Arsenal apareceu no campo eu arremessei todos para o ar e os vi chovendo sobre os fãs em torno de mim. Eu comecei a cantar ‘Nós não estamos pagando o poll tax!’ e várias centenas se uniram a mim. Tente isso no seu próximo jogo! (18)

Este exemplo foi seguido em Portsmouth, Spurs, Southampton, Newcastle e Watford. A campanha de vilanização não teve efeito na preparação para a manifestação de 31 de março. Mas a imprensa excedeu a si mesma com “táticas intimidatórias e truculentas” ao perseguir representantes da Federação, como Steve Nally, que foi perseguido pelos chacais da Fleet Street. Sua família, vizinhos, amigos e conhecidos passados foram todos abordados para dar informação sobre sua vida pessoal, onde sua mão costumava trabalhar, onde seu pai trabalhava, etc. Os vizinhos se juntaram em torno de Steve Nally e fizeram ouvidos surdos às abordagens da imprensa. Alguns artigos eram completas fabricações, como Steve Nally recorda:

O pior era o Independent no domingo. Tiraram uma fotografia com a legenda: “Steve Nally, apoiador do Militant que disse que não é política do grupo incitar a violência, no protesto de Hackney que virou um tumulto.”Era uma absoluta mentira. Naquela mesma manhã eu dei a um repórter do Independent meu itinerário da semana. Deixei muito claro que não estava indo para Hackney mas falar num lobby em Hillingdon aquela tarde e indo para a Sky TV. Eu nunca fui para Hackney. (19)

Kinnock usa seu peso político

Contudo, não eram apenas os Conservadores e seus mercenários que mostravam os dentes. A direção Trabalhista não resistiu a se unir a eles. Kinnock condenou os advogados do não-pagamento em massa do poll tax como “revolucionários de brinquedo”, uma frase inspirada pelo Sun.

Em contraste, Tony Benn se pôs atrás da campanha contra o poll tax: “Se pessoas suficiente permanecerem firmes contra o poll tax podemos compelir o governo a se retirar.” (20) Ele exigiu que o próximo governo Trabalhista concedesse uma anistia a todos que se recusaram a pagar.

Isso foi ruidosamente condenado por Kinnock e John Cunningham como aceitar a “quebra da lei”. A implicação estava muito clara – Kinnock, a direção Trabalhista e as câmaras Trabalhistas seriam incitados não para apoiar o não-pagamento em massa mas para perseguir os não-pagadores através das cortes. Mesmo alguns ostensivamente da esquerda, como Diane Abbott e Brian Sedgemore, dois MPs Trabalhistas de Hackney, estavam menos que resolutos. Enquanto declaravam o quão necessária era uma campanha unida, ao mesmo tempo não estavam preparados para apoiar os milhares que não poderia pagar o poll tax em si. A audiência numa reunião em Hackney interrompeu os dois MPs para perguntar porque não estavam apoiando a campanha. Um apartante berrou para Brian Sedgemore: “Nós elegemos você e podemos não elegê-lo, a menos que fique com nós que não estamos pagando.” Várias mãos foram chamadas e cada uma na sala votou que não pagariam com a exceção dos dois MPs na plataforma. (21)

À medida que a maré de oposição crescia, houve muitos, incluindo a maioria dos MPs Trabalhistas, que começaram se distanciar de nosso programa de não pagamento em massa.

Oscilações no Westminster

Um destes era Harry Barnes, MP Trabalhista por Derbyshire Nordeste, que pelo menos tentou argumentar contra o não pagamento. Numa carta aos MPs Trabalhistas, que chamava para que a massa do Partido Trabalhista e o TUC organizassem demonstrações contra o poll tax em Londres no 1º de maio, ele também atacou a política de não pagamento:

A raiva contra a taxa tem começado a decolar. Mas muito desorganizadamente e sem direção e está presa da semiliderança de grupos como o Militant… Eles ocuparam o vácuo e assumiram, quase sempre com o pior tipo de manipulação, a direção política da campanha… Se o Trabalhismo se movesse para posição mais vigorosa sobre o poll tax poderia ajudar a varrer a noção debilitante de que o único modo efetivo de se opor ao poll tax e através do não-pagamento em massa. (22)

Escrevi a Harry Barnes e o convidei para elaborar suas visões em nossas páginas. Ele respondeu, explicando suas diferenças:

Visto que o não-pagamento não é o programa oficial do movimento trabalhista e após uma série de derrotas sindicais e políticas da classe trabalhadora durante os anos Thatcher, não posso ver uma suposta campanha de não-pagamento massiva realizando os sonhos do Militant… O Não-pagamento pode, contudo, ser uma parte legítima da campanha, alertando aos que a escolhem das medidas draconianas que podem ser usadas contra eles, mais os limites da reserva financeira que está disponível para eles, Os que seguem este caminho merecem qualquer apoio moral e político que possamos dar a eles. Isso será feito por um bom número de pessoas, incluindo eu mesmo, mas não posso encorajar pessoas a se colocar em perigo pessoal. (23)

Ele foi respondido na mesma edição por Kath Dunn e Rachel McRoy, secretária e presidente respectivos da União Anti-Poll Tax de Clay Cross em seu distrito. Eles escreveram que Harry tinha

criticado a falta de luta dos líderes Trabalhistas mas infelizmente não tinha uma estratégia verdadeira. Harry está sugerindo que a campanha deve incluir não-pagadores e aqueles que pagam e se refere à Federação Anti-Poll Tax de toda Grã-Bretanha como uma campanha estreita. Isto é o oposto da verdade. A campanha de não-pagamento em massa tem levado mais pessoas à ação do que qualquer outra luta contra o governo Conservador. Por exemplo em Clay Cross, parte do próprio distrito de Harry, nossa união anti-poll tax tem levado centenas de pessoas para a atividade. (24)

Nesta questão, os MPs Trabalhistas de direita e alguns da esquerda, encontraram um terreno comum. O SWP, por exemplo, se moveu de uma posição morna e apoio passivo para a campanha anti-poll tax para a oposição à estratégia de “não-pagamento”. Pouco antes da manifestação de 31 de março, eles declararam no Socialist Worker:

O governo calcula que uma passiva campanha de não-pagamento pode ser reduzida eventualmente num nível que possa ser dirigida… Os ativistas precisam reconhecer que a maioria dos trabalhadores provavelmente sente que não tem escolha senão pagar. Muitos temem as consequências dos processos judiciais e de irem à falência. Alguns temerão a perda de seus empregos se forem multados. (25)

Alguns comentaristas capitalistas, como o escritor do Guardian Victor Keegan, estavam à esquerda do SWP nesta questão:

Julgando pela experiência da Escócia e pesquisas de opinião na Inglaterra e Gales, o número dos que se recusam a pagar será de milhões. Desde que o cumprimento em tal escala é impossível, isso não apenas irá levar a lei a uma vergonha, mas irá gerar uma fresca reação contra a taxa entre aqueles que atualmente a estão pagando. (26)

O Socialist Worker estava reforçando os argumentos da direita Trabalhista. Eles depreciaram a campanha de não-pagamento na Escócia, minimizando seu significado, e subestimaram os números dos que não estavam pagando. Eles afirmaram que : “Um molde similar é provável na Inglaterra e Gales.” Na conferência da União Escocesa de 4 de março, onde todas as regiões da campanha anti-poll tax estavam juntas, o SWP se opôs ao não-pagamento em massa e argumentou que sem o apoio da direção sindical a campanha não teria sucesso!

Os ataques ao movimento e ao Militant eram apenas picadas de alfinetes à medida que a construção do ato de 31 de março tomava corpo. Nas semanas antes deste evento houve muita especulação nas fileiras da Federação e também em nosso escritório nacional à medida que aumentava a expectativa da demonstração de Londres.

As estimativas variavam de 20 mil a 50mil pessoas. Ninguém, mesmo aqueles que estavam prevendo uma grande virada, anteciparam totalmente a escala e tamanho da manifestação que ocorreria em 31 de março.

Exército anti-poll tax

A primeira página do Militant para a manifestação declarava: “Una-se ao exército anti-poll tax” e “Não pague, mande os Conservadores embora”. (27) No mesmo número, vendido amplamente na manifestação, detalhes foram dados de como os oficiais de justiça estavam sendo derrotados na Escócia. Uma reportagem apareceu mostrando como a União Nacional de Jornalistas (NUJ) votou esmagadoramente uma resolução a favor do não-pagamento em massa do poll tax.

Na pré-eleição em Mid-Staffordshire ocorrida pouco antes da manifestação, uma maioria Conservadora de 14.654 em 1987, se tornou uma maioria Trabalhista de 9.449. Uma frase era ouvida várias vezes durante a campanha: “Ela está indo longe demais!” Esse era em particular o sentimento sobre o poll tax. Uma emissora de TV perguntou a eleitores que desertaram dos Conservadores, numa pesquisa especial, porque fizeram isso. Todos menos um disseram que foi o poll tax o responsável. Pesquisas de opinião descobriram que o povo estava mais interessado no poll tax do que na pré-eleição em si. Duas enormes reuniões da federação anti-poll tax ocorreram em Mid-Staffordshire em tardes consecutivas, atendidas por 350 pessoas em Lichfield, e por 450 em Rugeley.

Essas foram facilmente as maiores da campanha eleitoral. Muitos mais teriam atendido se não fossem a campanha de terror Conservador e os cavalos de polícia reunidos fora das reuniões dando a entender que qualquer um que atendesse estava se encaminhando para um motim.Mais de 20jornais e 4 estações de TV atenderam à reunião anti-poll tax de Lichfield. O Partido Trabalhista escreveu a todos os seus membros exigindo que ficassem longe. Porém, a pesquisa de opinião realizada pelo Independent no domingo, que pôs o Trabalhismo 28 pontos à frente, foi realizada nas duas manhãs após estas reuniões anti-poll tax. Elas obviamente tiveram um profundo efeito. Porém, a resposta da burocracia Trabalhista àqueles que as organizaram e que claramente estimulou o apoio ao Trabalhismo, foi de mais ataques e mais repressão.

Em Liverpool, o policial Trabalhista regional, Peter Kilfoyle, e o organizador nacional, Joyce Gould, atenderam à reunião do grupo Trabalhista para terem certeza de que eles não votariam do “modo errado” sobre a questão do poll tax. 27 direitistas votaram por um poll tax de £448, com 21 vereadores da Esquerda Ampla se opondo.

O movimento anti-poll tax eleitoralmente, de fato redundou em benefícios ao Trabalhismo. Até mesmo Conservadores como John Biffen reconheceram isso: “O poll tax tem sido um pára-raios para o descontentamento e isto explica muito do colapso de Mid-Staffordshire.” (33). Este descontentamento foi preparado em sua maior parte, e organizado pela federação anti-poll tax, com os membros e apoiadores do Militant jogando um papel decisivo.

O ato

Sua recompensa foi a magnífica visão de 200 mil manifestantes em Londres e 50 mil em Glasgow em 31 de março.A marcha de Londres, disse Tony Benn, foi a maior manifestação desde os Cartistas, 150 anos atrás. Onda após onda de manifestantes surgiam de ônibus, carros e trens da Kennington Park, o ponto de saída. Muitas pessoas foram forçadas a sair dos ônibus e caminhar a última milha, pois os motoristas tentavam escapar do tráfego. A grande maioria dos que a atenderam jamais tinha estado numa manifestação antes. Os velhos, os jovens, ex-Conservadores desiludidos, até mesmo um velho soldado aposentado e condecorado de Bournemouth, se juntaram nesta espetacular manifestação do poder da classe trabalhadora.

No parque, oradores invocaram as tradições do passado para reivindicar o que estava sendo proposto hoje. Phil Maxwell, então líder do grupo Trabalhista de Tower Hamlets, disse que eles não iriam perseguir os não-pagadores se uma Câmara Trabalhista fosse eleita em maio. Ele lembrou à multidão dos vereadores de Poplar nos anos 20:

Eles não disseram ‘Gostaríamos de dar este dinheiro aos pobres mas estaríamos quebrando a lei e Ramsay MacDonald se voltaria e nos chamaria revolucionários de brinquedo’… Nossa luta é maior que qualquer lei Conservadora. Nos baseamos nas lutas dos mineiros, motoristas de ambulância e todos os outros que resistiram às leis Conservadoras. Eu tenho aqui minha nota poll tax da câmara. (28)

Ele então a rasgou, para grande aclamação e a espalhou pela multidão. Margi Clarke, estrela de Letter to Brezhnev, nos disse que o poll tax era uma privatização maligna do voto.

Tenho dinheiro suficiente para pagar o poll tax mas estou aqui em nome de todos que não podem. É brilhante que o Militant tenha organizado isso. Eu apoiei muitas causas como o Greenpeace. Mas esta campanha precisa de uma força decisiva, que é o Militant. (29)

Quarenta manifestantes anti-poll tax de Kent refez a rota da revolta camponesa, iniciando em Faversham e marchando 75 milhas através de Sittingbourne, Maidstone e Gillingham. Eles participaram da marcha assim como manifestantes que marcharam todo o caminho de Tory Maidenhead a Trafalgar Square. Um trem lotado chegou de Cornwall. Vendedores do Militant fizeram uma venda estrondosa naquele dia, com 8 mil jornais vendidos em Londres e além,e 1.500em Glasgow.Tal era a antecipação dos organizadores da manifestação que eles pediram ao Departamento Ambiental permissão para o comício final ser desviado da Trafalgar Square para o Hyde Park. Também, às vésperas da manifestação, a Federação fez um chamado para uma manifestação pacífica. E a maior parte dos marchantes aderiu a este aviso. Ian Aitken, do Guardian, não um amigo da esquerda, descreveu a marcha como “uma das mais pacíficas demonstrações já realizadas na capital da nação”. Representou um triunfo para o movimento anti-poll tax, acima de tudo para a Federação Anti-Poll Tax de toda Grã-Bretanha.

Em Glasgow, 50 mil marcharam em cenas que lembravam os dias de Red Clydeside. Houve uma participação de todos os setores da classe trabalhadora e parece que de todas as áreas da Escócia. Tommy Sheridan declarou à multidão, antes de pegar um avião para se dirigir à manifestação de Trafalgar Square:

Mais de um milhão não pagaram. Não tem havido leilões dos seus bens. Mais de 10 milhões na Inglaterra e Gales estão se unindo a nós agora. Estamos no caminho da vitória! (30)

1 Militant 976 19.1.90
2 Citado no Militant 976 19.1.90
3 Militant 976 19.1.90
4 Citado no Militant 981 23.2.90
5 Militant 982 2.3.90
6 Militant 983 9.3.90
7 Militant 982 2.3.90
8 Militant 984 16.3.90
9 Citado no Militant 984 16.3.90
10 Tony Benn “The End Of An Era – Diaries 1980-1990 Pp585-6
11 Militant 983 9.3.90
12 ibid
13 Militant 983 9.3.90
14 Militant 984 16.3.90
15 The Times 9.3.90
16 The Times 10.3.90
17 Sunday Times 11.3.90
18 Militant 984 16.3.90
19 ibid
20 Militant 984 16.3.90
21 ibid
22 Militant 985 23.3.90
23 Militant 988 13.4.90
24 ibid
25 Socialist Worker 24.3.90
26 Victor Keegan no The Guardian, Citado no Militant 986 30.3.90
27 Militant 986 30.3.90
28 Militant 987 6.4.90
29 ibid
30 ibid