Romênia: Greve na Dacia-Renault por um salário igual ao da França

Este poderia ser “o fim do mito dos trabalhadores romenos baratos”, como estampava o jornal romeno Adevarul sobre a atual greve dos trabalhadores da Dacia-Renault na Romênia.

Após o chamado do sindicato, entraram em greve, desde o dia 24 de março às 7:00 horas, cerca de 80% dos 13.000 trabalhadores de fábrica em Pitesti (ao sul da Romênia) por tempo indeterminado.

Os trabalhadores cujo salário mensal em média chega a 285 euros reivindicam um reajuste de 60% no salário. “Nós trabalhamos como se trabalha na França, mas recebemos apenas migalhas” e é hora “de lutar por um salário como o que é recebido na França”, disse o sindicato. A empresa Dacia foi comprada pela Renault, em 1999, por um valor muito baixo e desde então ela produz com sucesso o modelo Logan.

Na verdade, os salários romenos estariam, incluindo o reajuste demandado, muito longe do que ganham seus colegas franceses (os trabalhadores da Renault na França recebem cerca de 2.200 euros brutos por mês), mas simbolicamente esta reivindicação tem um grande significado, já que é uma tentativa de superar a divisão dos trabalhadores. Por isso, um dos slogans da manifestação de quinta feira (27 de março) com 9.000 participantes em Mioveni, foi “Unidade”.

O patronato reagiu como se esperava, qualificou as reivindicações salariais como inaceitáveis e queriam proibir a greve por meio da via judicial. O requerimento do sindicato, teve a decisão do julgamento prorrogada para até 2 de abril.

Em uma carta aberta, que foi publicada no jornal Evenimentul Zilei, o diretor da Dacia, Fraçois Fourmont, ameaçava com uma mudança imediata: “Estes pedidos podem ameaçar o futuro da fábrica, levando em conta que, para o ano de 2010, as fábricas da Renault, abertas no Marrocos, Índia e Rússia, estarão em condições de produzir o Logan”.

Algumas destas ameaças são bem conhecidas pelos companheiros da Europa Ocidental. Nos últimos meses, algumas multinacionais ocidentais mudaram parte de sua produção para a Romênia, ou pelo menos ameaçaram fazer isso. Assim fez a construtora norte-americana de carros Ford com a fábrica da Daewo em Craiova. Também se sabe que a Nokia quer mudar sua produção de Bochum (Alemanha) para Jucu e a Daimler fala em abrir uma nova fábrica em Cluj Napoca.

Romênia, paraíso dos empresários?

Antes de qualquer coisa, as multinacionais ocidentais têm defendido a mudança por causa dos baixos custos da produção e acusam os trabalhadores da Alemanha ou da França de serem muito caros e exigentes. A Romênia recebeu a promessa de abrir uma fábrica, mas de modo algum isto sairá de graça. Para a planejada fábrica da Nokia, o Estado romeno e o distrito de Cluj desembolsaram 33 milhões de euros. A condução de gás, eletricidade e água foram construídas para as zonas afastadas, onde fica a empresa, e inclusive a construção de uma via férrea desde o povoado até a fábrica. A condições de trabalho também são ruins. Atualmente os trabalhadores romenos da Romsteel Cord (uma filial da Michelin), se opuseram às horas extras que não são pagas, à não concessão de férias e ao período de experiência de 18 meses. Os trabalhadores romenos da Nokia receberão um salário entre 7 e 8 vezes menor que seus colegas na Alemanha.

Contudo, o crescente custo de vida na Romênia, junto com os baixos salários, já afetou as pessoas e aqueles que podem já estão abandonando a Romênia. Quatro milhões de romenos trabalham no exterior, o que significa 20% da população, mesmo não sendo fácil conseguir um visto de trabalho. Os especialistas em economia advertem que já existe um déficit de mão de obra na Romênia. Os patrões já começaram a importar trabalhadores de países ainda mais pobres como a Moldávia e a China para trabalhar em fábricas romenas. Em fevereiro de 2007 cerca de 400 trabalhadores chineses do ramo têxtil em Bacau, no noroeste da Romênia, entraram em greve. Esta semana o governo da Moldávia publicou um relatório que afirmou que cerca de 75 mil crianças da Moldávia crescem como “órfãos virtuais”, porque seus pais estão trabalhando no exterior.

A Greve não é um balé!

A indignação e a auto-estima dos companheiros crescem. Por um lado, a Dacia-Renault obteve em 2007 resultados recorde, com um aumento de 17,4% em comparação ao ano anterior, e agora os trabalhadores querem receber a sua parte. “Nós não somos nenhuma colônia francesa”, disse um grevista enfurecido à agência de notícias romena Rompress. Os trabalhadores romenos produzem na fábrica da Renault um automóvel a cada 52 segundos, porém o lucro retirado da Romênia vai parar nos bolsos dos patrões franceses.

Por outro lado, muitos já não sabem como alimentar suas famílias. Após o aumento do custo de vida dos últimos anos, alguns alimentos essenciais como o leite ou a carne são mais caros que na França ou Alemanha. Por exemplo, o aumento do preço do óleo em 2007 chegou a 44,1% e o pão é 13,27% mais caro. Além disso, a taxa de desemprego (até então baixa, devido aos compatriotas que trabalham no exterior) aumentou. O jornal Cotidianul expressou da seguinte maneira o temor dos empresários: “Os anos dourados de privilégios para as multinacionais acabaram, uma vez que a ausência de força de trabalho começou uma nova ‘ditadura do proletariado’”.

O fato é que quatro dias de greve criaram uma enorme pressão sobre os patrões. O sindicato anunciou que a greve cortou a produção de 1.300 carros por dia. A mídia fala de uma perda de mais de 10 milhões de euros por dia de greve. Os dirigentes da empresa, já subiram a sua oferta de 12% para 16,7%. Os trabalhadores rejeitaram a proposta. Nas manifestações eles gritavam ”máfia”, “ladrões” e “nós estamos aqui para ficar”. 

Ariel Ungureanu, acessor da Barnett McCall Recruitment, referindo-se aos planos de investimento da Ford, afirmou:”O grupo americano que no momento planeja seus futuros investimentos na Romênia, sem dúvidas, pensará agora que seus empregados pedirão igualmente nos próximos anos aumentos de 70%.

Sua predição pode não estar tão errada se os companheiros da Dacia tiverem sucesso. Isto fará com que trabalhadores de outras fábricas sigam o seu exemplo. Já na manifestação do quarto dia de greve estiveram presentes companheiros de Avione Craiova, da Posta Romana e da recentemente aberta fábrica da Ford de Craiova. No total, 1.500 trabalhadores de outras fábricas foram até Mioveni para expressar sua solidariedade. Estiveram presentes representantes dos sindicatos franceses e os trabalhadores franceses da Renault aprovaram uma moção de solidariedade.

O presidente do comitê de fábrica, Nicolae Pavalescu, declarou à agência de notícias Rompres, que ele esperava uma radicalização do conflito nos próximos dias: “Uma greve não é um balé, os trabalhadores podem usar uma linguagem clara. Talvez não ocorra no primeiro dia, mas é possível que seja assim nos próximos dias. O povo sabe que só pode vencer por meio da greve e se preparando para mais dias de protesto”.

A greve dos trabalhadores da Dacia e suas demandas por melhores salários, tal como as greves que estão ocorrendo na França, podem ser um primeiro passo para parar a queda dos salários provocada pela imigração das empresas para a Romênia. Especialmente em uma empresa internacional como a Renault, a solidariedade para além das fronteiras e pautas conjuntas, são fundamentais.

Trabalhadores de toda a Europa devem aprender com o exemplo dos trabalhadores da Dacia. Se a empresa tentar superar o déficit de produção aumentando a jornada de trabalho em outras fábricas da Renault, os trabalhadores devem se negar. Se as multinacionais tentam jogar os trabalhadores de diferentes países uns contra os outros, com as ameaças realocação, cortes de postos de trabalho ou “salários de fome”, há apenas uma resposta efetiva: a estatização da empresa sob o controle democrático dos trabalhadores.