A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994

Liverpool: Segundo Round

Com o fim da greve dos mineiros Thatcher estava livre para isolar e derrotar a Câmara Trabalhista de Liverpool. Michael Parkinson em seu livro Liverpool on the Brink declara:

Em meados dos anos 80, os Conservadores viram Liverpool como a base de poder da Tendência Militant e queriam derrotá-la. O cenário estava armado para o confronto político… o governo reconheceu que perdeu a batalha de propaganda em 1984 e falhou em convencer o eleitorado com seus argumentos. O governo decidiu agora abandonar o terreno dos argumentos e atacar a câmara Trabalhista no futuro diretamente, retratando o conflito não como uma disputa técnica sobre dinheiro, mas como um complô do Militant contra o governo. (1)

O governo estava preparando sua próxima rodada de medidas contra os vereadores locais.

Muitos vereadores foram obrigados pela força das circunstâncias a considerar tomar a ‘via de Liverpool’ e o desafio ilegal ao governo. A posição comum de vários vereadores levou a uma frente unida no final de 1984 entre Liverpool e outras autoridades, cujos fundos federais tinham sido cortados. Um debate se abriu entre os líderes das câmaras com os orçamentos limitados sobre qual tática para fixação do imposto anual, a ser fixada em março de 1985, poderia melhor mobilizar a indubitável oposição que existia às políticas do governo.

O método de Liverpool de estabelecer um imposto predial que deixasse o déficit no orçamento, apresentando uma clara demanda ao governo para dar mais recursos à câmara para cobrir a diferença, mostrou na prática ser um excelente meio de mobilização da massa da classe trabalhadora para a luta, enquanto estivessem claro os seus objetivos.

A ‘tendência de esquerda’ de Ken Livingstone da Grande Câmara de Londres, David Blunkett em Sheffield e Margaret Hodge, líder da Câmara de Islington, contrapuseram a ela sua própria tática de ‘nenhum imposto’: a idéia seria de que a Câmara se recusaria a fixar a taxa de propriedade local, conhecida então como imposto predial. Isso eventualmente levaria à posição de que cada Câmara seria diferente, fazendo com que fosse virtualmente impossível precisar a data quando todas as câmaras enfrentariam a bancarrota. Além disso, a política de ‘nenhum imposto’ era negativa, deixando a iniciativa nas mãos do governo.

Havia outra profunda diferença entre a abordagem de Liverpool e outras câmaras de ‘esquerda’. Liverpool se opunha completamente à idéia do governo contrabalançar a concessão de cortes por aumentos massivos dos impostos prediais. Os advogados da política de ‘nenhum imposto’ não. Apesar dos alertas do Militant, Liverpool foi adiante com a política de ‘nenhum imposto’ no interesse da frente comum contra o governo. 25 vereadores decidiram ter uma posição comum contra o governo.

Na corrida para o dia do orçamento, planos foram feitos para a mobilização dos trabalhadores de Liverpool para coincidir com a paralisação nacional dos trabalhadores municipais em 7 de março. Uma vez mais, uma demonstração de massas de 50 mil marchou ao Town Hall, “uma das maiores em 100 anos”, declarou Tony Mulhearn. Na reunião do Inner London Education Authority (ILEA) alguns membros Trabalhistas se uniram com os Conservadores e o SDP para abrir caminho para um imposto legal depois de 8 horas de debate.

Então o GLC, encabeçado por Ken Livingstone, liderou a retirada de outras câmaras. Apesar de suas palavras e gestos heróicos ele levou a maioria dos vereadores Trabalhistas de Londres a uma posição de “permanecer dentro da lei” ao estabelecer um imposto e orçamento que significaria cortes. Isso representou um ponto de inflexão na luta das autoridades Trabalhistas contra o governo.

A oposição do GLC era meramente verbal e uma repetição da retração de 1982 quando os Lordes governaram contra a política de transportes baratos ‘Fares Fair’. O Militant sujeitou a liderança do GLC a uma severa crítica:

Ken Livingstone, numa reportagem para a Executiva do Partido Trabalhista da Grande Londres, atacou a “postura de alguns líderes municipais” que adotavam uma política que permitia a eles “mergulhar no assunto da ilegalidade” na reunião de orçamento de 7 de março mas “deixava o GLC e ILEA por sua conta” por causa dos requerimentos legais para as autoridades de ordem superior (como o GLC e ILEA) a fixar um imposto em 10 de março. (2)

Mas ele ignorava totalmente o fato de que 3 dias antes do GLC finalmente fixar um imposto, uma câmara, Hackney, foi para a ‘ilegalidade’ por se recusar a ficar um imposto em desafio à ordem do tribunal para fazê-lo. Além disso, o manifesto do GLC para a eleição de 1981 declarou:

“Oposição de massas para as políticas Conservadoras levará o GLC Trabalhista a se tornar o foco de uma campanha nacional, envolvendo outras câmaras Trabalhistas, contra os cortes.”

Essa parte do manifesto foi escrita pelos apoiadores do Militant mas apoiada pelo movimento Trabalhista de Londres como um todo.

MPs Militant sob ataque

Terry Fields estava ganhando o bem merecido ódio dos Conservadores e da classe dominante. Pelo mesmo motivo, sua posição e a da Dave Nellist também os fizeram subir na consideração da classe trabalhadora. Eles usaram o Parlamento de um modo como o Trabalhismo sempre deveria ter procurado fazer, como uma plataforma para organizar e mobilizar o povo trabalhador à luta. Tomando alerta da crescente popularidade destes dois MPs, e particularmente de sua decisão de viver com não mais do que o salário médio de um trabalhador qualificado, a liderança trabalhista direitista tentou impedi-los de dar dinheiro para o partido de seus salários parlamentares. Sua posição junto com a do MP patrocinador do NUM Dennis Skinner, que deu todo o seu salário para os mineiros durante toda a greve, lhes angariou enorme popularidade.

Este incidente mostrou o medo da ala direita da demanda de um MP trabalhador com salário de trabalhador. Seus ataques a Dave Nellist e Terry Fields foram feitos contra o pano de fundo de uma séria crise financeira do Partido Trabalhista. Mas em todo o lugar a campanha da imprensa, TV e rádio, apoiada pela direita dentro do partido, tentava quebrar o movimento de esquerda no Partido Trabalhista, tipificada pela batalha que agora se desenrolava em torno de Liverpool. O NEC também conduziu uma investigação em Coventry Sudeste em 1984, centrada em torno da vitória de Dave Nellist! Nós alertamos o movimento trabalhista sobre a ofensiva em vista:

Uma série de ataques aos apoiadores do Militant sugere que os líderes direitistas do Partido Trabalhista e de alguns sindicatos podem começar uma guerra dentro do partido… numa franca admissão de suas intenções, um delegado da conferência de 1984 do NUPE chamou por “um expurgo que faria Stalin parecer um ativista social”. (3)

Em julho a executiva de Welsh do Partido Trabalhista expulsou Tony Wedlake, um representante do LPYS, e Chris Peace, que tinha liderado a votação nas eleições para o Comitê Executivo no Partido Trabalhista de Welsh.

Liverpool – abordagens para o prazo final

Apesar disto, Liverpool, onde o Militant ainda tinha sua base de força, estava em curso de colisão com o governo. Até o dia em que a câmara supostamente estabeleceria um imposto ‘legal’, o governo estava confiante de que Liverpool iria na esteira da onda de capitulação das outras câmaras. Em 13 de maio, Patrick Jenkin repetiu sua recusa anterior de conversar com a câmara. John Hamilton, líder do grupo Trabalhista, declarou raivosamente: “Se ele voltar a Liverpool para tentar explicar suas políticas, então suas idéias serão massacradas.” (4) Pelo fim de maio quatro câmaras estavam resistindo a política ‘nenhum imposto’: Southwark, Camden, Liverpool e Lambeth. Em 22 de maio o Auditor Distrital ameaçou os vereadores de Liverpool com pesadas multas e banimento de seus escritórios a menos que estabelecessem o imposto em nove dias.

Quando o tempo decisivo se aproximava, tanto o governo quanto o Liverpool Echo esperavam a capitulação da câmara. É claro que houve uma séria discussão entre os apoiadores do Militant em nível local e nacional e dentro do movimento trabalhista sobre qual curso de ação deveria ser seguido. Ao fim destes debates, com o colapso da frente de ‘nenhum imposto’, se concluiu que o único possivel era o enfrentamento com o governo. Às 11 horas de 11 de junho, a câmara municipal mais uma vez apelou para as discussões com Jenkin. Ele recusou, esperando ver o Trabalhismo comer sujeira e saboreando a expectativa de que desta vez ele poderia “dançar na sepultura de Derek Hatton.” Num editorial o Militant apelou a Liverpool para permanecer firme e em sua histórica reunião de 13 de junho o Diretório do Partido Trabalhista unanimemente concordou em fixar uma imposto de 9% – não maior do que a taxa real de inflação e sem nenhum corte.

Aproximadamente todos os vereadores Trabalhistas estavam lá, e não houve uma voz dissonante na reunião quando esta política foi defendida. Além disso, nenhuma hesitação de último minuto foi manifestada no dia seguinte quando Thomas MacMahon, o Auditor Distrital, enviou uma carta dizendo: “Um crime tem sido cometido” e partiu para agir contra eles (os vereadores) por perdas contraídas entre 1 de abril e junho. Portanto quaisquer desertores potenciais foram dissuadidos de tomar tal curso pelo fato de que mesmo se eles traíssem o Trabalhismo, eles poderiam ser sobretaxados.

Raramente o movimento trabalhista de Liverpool esteve tão unido. Com a taxa de 9% e com a recusa do governo de dar mais subsídios, estava claro de que a cidade poderia ficar sem dinheiro num certo estágio. O Trabalhismo não estava expondo a cidade a uma bancarrota deliberada, mas pretendia usar o tempo avaliado para mobilizar a população e apelar nacionalmente aos trabalhadores de autoridades locais para exercer pressão sobre o governo. Inicialmente atônitos pela decisão da cidade de permanecer lutando, quando compreenderam o que estava acontecendo, o governo e a imprensa lançaram uma furiosa ofensiva contra o movimento trabalhista de Liverpool. O ar estava denso com denúncias de Liverpool e ameaças expedidas pelos comissários do governo. O Auditor Distrital, com poderes semiditatoriais, também decidiu sobretaxar os 49 vereadores Trabalhistas com £106,000 por “má conduta deliberada”. Isso apenas serviu para galvanizar o apoio à câmara Trabalhista.

O apoio de massas para a câmara estava ligado ao fato de que o povo da cidade podia ver os efeitos do que a luta da câmara Trabalhista significava. Algumas vezes mesmo o Echo pode enviar uma carta, de fontes improváveis, recordando os progresso que tinham sido feitas:

Como visitante de Portsmouth para sua cidade, tive a maior impressão do programa habitacional da sua câmara. Em Portsmouth, com uma câmara Conservadora, nenhuma casa está para ser construída nos próximos 5 anos, ainda que Hampshire tenha 250 mil pessoas precisando de acomodações no mesmo período. É realmente um problema se o Militant está por trás da câmara municipal se eles são as únicas pessoas no país a se levantar contra a louca política de transformar as maiores cidades da Grã-Bretanha em cortiços? Eu apoiaria homens de marte se ele construísse 2 mil casas em nossa cidade. (5)

Progresso Escocês

O jornal e seus apoiadores encontraram forte apoio na Escócia, especialmente em Glasgow e Edimburgo. De fato, proeminentes apoiadores escoceses do Militant estiveram perto de ganhar posições como candidatos parlamentares Trabalhistas. No distrito de Provan, Ronnie Stevenson, leal ao Militant por mais de 20 anos, se candidatou contra Hugh Brown, MP em 1982, mas foi derrotado por 31 votos a 24. Em 1985 Jim Cameron, um dos mais hábeis representantes da visão do Militant e sindicalista proeminente, se candidatou para o assento vago após a retirada de Brown. Ele foi derrotado por apenas um voto por Jimmy Wray na conferência de seleção. Outros apoiadores do Militant estiveram perto de serem escolhidos em vários distritos em Londres, Gateshead Leste, Swansea, Southampton e Greenwich.

As notícias de demissão

Alguns dos antigos esquerdistas estavam para jogar um triste papel no drama de Liverpool que chegaria ao auge em setembro e no Congresso do Partido Trabalhista logo depois. Uma das questões que eram aproveitadas pelos inimigos da câmara de Liverpool e do Militant eram as chamadas ‘noticias de demissão’. Face aos recursos se esgotando, o Grupo Trabalhista fez planos de contingência depois de experts legais e financeiros avisarem que sob o Ato de Proteção ao Emprego de 1978, uma vez o dinheiro tendo acabado, eles seriam forçados a terminar os contratos de todos os servidores municipais. A incapacidade de fazê-lo deixaria os vereadores pessoalmente responsáveis por £23 milhões de ‘seguro desemprego’ ao qual 30 mil trabalhadores de autoridades locais teriam direito. Sob a lei do governo local, uma câmara não poderia demitir trabalhadores, mas encerrar seus contratos, cujo efeito é o desemprego.

Além disso, o Tesouro da Cidade avisou que a falência em agir ‘legalmente’ editando as notícias de demissão resultaria que a Junta de Empréstimos para Trabalhos Públicos se recusaria a levantar empréstimos para pagar os gastos diários. Isso por sua vez significaria que a câmara estaria com falta de dinheiro dentro de poucas semanas. Portanto os trabalhadores não receberiam seus salários depois deste período. O aparelho ‘legal’ das notícias de demissão permitiria pelo menos que os salários fossem pagos até o fim de 1985. Isso permitiria construir uma campanha para forçar o governo a pagar a quantia roubada da cidade. A classe dominante deliberadamente moldou a lei do governo local na tentativa de emaranhar as câmaras em tais sutilezas legais. Se a câmara de Liverpool fosse constituída inteiramente pelos apoiadores do Militant, o que não era, este curso de ação não teria sido adotado já que os marxistas teriam ido até o fim.

Mas os vereadores sentiram-se desapontados, especialmente pela recusa dos líderes sindicais dos trabalhadores de colarinho branco de apoiá-los integralmente. O Grupo Trabalhista decidiu usar a ‘tática’ de publicar o aviso de 90 dias para assegurar aos 30 mil trabalhadores para assegurar uma pausa para respiro na tentativa de construir a campanha. Era absurdo sugerir, como a imprensa fez, e para sua vergonha os líderes sindicais nacionais, que os 30 mil trabalhadores estavam para ser demitidos. Todo o objetivo deste exercício era defender os empregos. Contudo, o anúncio das notícias de demissão se tornou o maior erro tático.

O grande estrategista militar Clausewitz uma vez disse: “Combate militar precisa do tipo de matemática de Euclides ou Newton.” Mais simplesmente, álgebra política é necessária. Para qualquer um liderando uma grande luta política, é necessário visualizar, não apenas como os trabalhadores ativos verão o problema, mas como seus inimigos poderão explorar suas declarações, estratégia e táticas.

Quando esta tática era explicada para aqueles trabalhadores que podiam ser alcançados havia apoio e entendimento. Este era o caso entre a grande maioria dos trabalhadores manuais. Para a grande maioria da população de Liverpool e num plano nacional e mesmo para a maioria dos 30 mil trabalhadores locais, eles recebiam a informação de fragmentos de notícias da TV e imprensa. Logo as ‘notícias de demissões’ levantaram um enorme clamor público, criado pela imprensa nacional. A questão das ‘notícias de demissão’ dividiu os líderes da força de trabalho municipal

Muitos trabalhadores de colarinho branco estavam genuinamente preocupados de que se o seus contratos fossem encerrados, e a ameaça de sobretaxa levasse a Coalizão Liberal/ Conservadora ao poder, muitos poderiam não ser re-contratados. A tática das ‘notícias de demissão’ foi tomada sem o conhecimento prévio e apoio nem do Militant local ou da direção nacional. Em Merseyside, a maioria dos apoiadores do Militant se opunha a esta tática. Embora o Militant exercesse uma poderosa influência na luta de Liverpool isso não significava aceitação automática aos nossos pontos de vista. Logo que ouvimos, via rádio e TV, que essa ‘tática’ estava sendo recorrida, expressamos nossa oposição. Contudo, esta não tomou a forma de ‘denúncia pública’ mas em procurar explicar porque os vereadores pensavam que foram obrigados a tomar esta ação. Depois de uma série de debates o Comitê Unido de Delegados Sindicais, em 7 de setembro rejeitou o ‘plano de demissões’. Estava agora claro que a câmara poderia ficar sem dinheiro não em dezembro mas em questão de semanas. I

O record real de Liverpool

A característica mais vergonhosa das ‘notícias de demissão’ foram os mais completos métodos desleais e traiçoeiros da direita Trabalhista e dos líderes sindicais, dirigidos por Kinnock no Congresso do Partido Trabalhista poucas semanas depois. Permanece um fato histórico incontestável que a câmara socialista de Liverpool não realizou uma simples demissão. Ao invés disso, criou mais de 2 mil empregos, construiu 4 mil casas populares com jardins, centros esportivos e até mesmo um parque.

O mesmo não se pode dizer daqueles que denunciaram o Militant e a câmara de Liverpool sobre a tática das ‘notícias de demissão’. Em Sheffield, por exemplo, aqueles como David Blunkett que subsequentemente ridicularizaram o Militant implantaram um programa de economias que eliminou muitos milhares de empregos municipais. A mesma história foi repetida em todo o lugar.

Logo que a opção pelas ‘notícias de demissão’ foram derrotadas o Comitê Conjunto de Delegados Sindicais propôs uma greve total para forçar o governo a ajudar a câmara. Nós comentamos:

O confronto que se aproxima entre Liverpool e o governo é inteiramente devido à política Conservadora… O que faz Liverpool especial, fora o fato de que é uma cidade com habitações excepcionalmente pobres e desemprego alto, é o fato de que tem uma câmara determinada a enfrentar a política dos Conservadores. (6)

Pontuando o frenesi sublinhado na imprensa capitalista, nós alertamos:

Não se pode nem mesmo excluir que os Conservadores sejam estúpidos o suficiente para usar tropas para administrar alguns serviços municipais, embora isso apenas endureça a força de trabalho e fortaleça a solidariedade em todo o lugar. (7)

O Daily Mail até mesmo pintou um horrível quadro em que custódia municipal e ‘escolas aprovadas’ sendo evacuadas “para a Isle of Man”. Kenneth Baker, o Secretário do Meio Ambiente que substituiu o azarado Jenkin, negou que o governo estivesse considerando o possivel uso de tropas na eventualidade de colapso dos serviços municipais, mas admitiu:

O governo tem planos de contingência geral para a manutenção dos serviços essenciais por todo o país. Até a câmara botar as coisas em ordem. (8)

Todos saindo?

A decisão de ir a uma ação grevista total iniciou um período de debates políticos sem precedentes e generalizado que se espalhou por toda a força de trabalho municipal nos 4 cantos do país. Os pioneiros do trotsquismo na cidade nos anos 30 melancolicamente olhavam rumo ao dia em que uma reunião de massas sob sua influência teria lugar no estádio de boxe de Liverpool. Agora este cenário começava a se delinear. Um setor após o outro dos trabalhadores rumavam ao estádio para discutir e debater os méritos e deméritos de uma greve total. Os donos dos cafés e pubs locais esgotaram toda a sua comida e cerveja enquanto os trabalhadores chegavam às centenas no estádio.

Infelizmente, os professores votaram por não sair em greve. Isto causou enorme rancor entre outros trabalhadores e foi um estímulo considerável ao governo e aos oponentes da câmara. A liderança dos professores neste período era tipificada por Jim Ferguson, membro do Partido Comunista. Os membros do GMBATU, contudo, numa série de reuniões de massa, votaram por 4345 a 2934 em favor de uma ação grevista total. Os delegados sindicais do UCATT votaram por 54 a 4 em favor da ação grevista que patrocinou reuniões de massas. O TGWU também votou por uma maioria massiva a favor. O mesmo com a maioria dos trabalhadores manuais. 58% dos membros do GMBATU votaram pela ação grevista. Os membros do UCATT votaram por três a um e o TGWU também votou em maioria para sair em greve. Dos sindicatos manuais apenas o EETPU votou contra. Portanto, a decisão de se os trabalhadores municipais empreenderiam uma luta total dependia da decisão dos líderes do NUPE e do NALGO. O ‘ultrademocrata’ Jane Kennedy do NUPE recusou até mesmo sancionar o voto sobre a questão entre os 2.700 membros do NUPE. Seu comportamento não refletia os membros mal pagos do NUPE cujos empregos estavam em jogo nesta luta.

Nas consequências da greve de 25 de setembro estes trabalhadores, muitos deles mulheres muito mal pagas, quase cercaram Jane Kennedy numa reunião setorial sem precedentes do NUPE. Centenas se mobilizaram, bloqueando a rua Dale e forçando a liderança do NUPE a abandonar a reunião. Foram os líderes do NALGO Graham Burgess e Peter Creswell que jogaram um papel crucial em relação a chamar uma greve em 25 de setembro. Eles eram a favor da ação grevista o tempo todo mas não fizeram absolutamente nada a seu favor. Pelo contrário, eles expressaram sentimentos negativos sobre a efetividade de uma ação grevista. Na reunião de massas do estádio, os líderes do NALGO anteriormente expuseram a moção pela ação grevista, mas foram pesadamente derrotados por 3.891 a 1.455.

7,200 tomam uma posição

O Militant comentou:

Os 7.200 trabalhadores que votaram por uma greve indefinida tomaram uma decisão consciente de fazer enormes sacrifícios na tentativa de defender seu padrão de vida.(9)

contudo, em vista da divisão da força de trabalho os vereadores, pesadamente influenciados pelos argumentos do Militant, tomaram uma decisão fatídica em 24 de setembro. A questão estava posta: poderiam os trabalhadores manuais, apesar de serem uma minoria, tomar unilateralmente a ação grevista? Eles votaram solidamente da ação grevista e seriam capazes de ‘amarrar’ a cidade se saíssem. Apenas os zeladores poderiam fechar todas as escolas de Liverpool. O único setor do GMBATU que votou contra a greve foi o Departamento de Educação, liderado pelo presidente Peter Lennard que não era apoiador do Militant. Ao contrário, ele depois se tornou nosso oponente, por uma mistura de razões pessoais e políticas. Entre os setores da força de trabalho onde os apoiadores do Militant eram fortes ou tinham uma influência decisiva, o caso foi exposto firmemente e a maioria dos trabalhadores, numa votação secreta, se pronunciaram a favor da ação grevista.

A votação total de todos os trabalhadores foi de 7.284 pela greve e 8.152 contra. Nesta situação ir adiante com uma greve total resultaria numa divisão entre os sindicatos, com a possibilidade de conflitos nas linhas de piquete, o que seria explorado pela imprensa e por todos os oponentes da câmara. Portanto, enquanto saudavam os trabalhadores que votaram a favor da ação grevista, especialmente os manuais, os delegados sindicais recomendaram que uma greve total fosse suspensa. A concordância com esta decisão foi conseguida com dificuldade. Muitos trabalhadores municipais, como os membros da segurança e os da limpeza, que tinham mais a perder se a câmara fosse derrotada, se congregaram na Prefeitura para esperar a decisão dos delegados. Também parecia que a mídia mundial se reuniu no Anexo Municipal naquela tarde. A imprensa, num momento, teve que ser protegida da raiva destes trabalhadores, e apenas a intervenção dos apoiadores do Militant entre os delegados impediu um violento assalto às equipes da imprensa. Frustrados no chamado de uma ação grevista total os delegados dos trabalhadores manuais então decidiram recomendar um dia de greve no dia seguinte, 25 de setembro. Nós comentamos:

Dezenas de milhares de trabalhadores demonstraram seu desafio ao governo Conservador em Liverpool na quarta-feira. Centenas de faixas dos sindicatos, LPYS e Partido Trabalhista de todas as partes de Merseyside e do país foram vistas ao lado da massa dos manifestantes. Não havia um vestígio de resignação ou derrota. (10)

Os líderes sindicais e do Trabalhismo estavam determinados a esmagar Liverpool e o perigoso exemple que mostrou a ‘militância paga’. Em Liverpool, na tarde de 24 de setembro, Anthony Bevins, correspondente político do The Times, confidenciou a um apoiador do Militant que Kinnock estava planejando uma “bomba” contra nós. Kinnock estava confiante que desta vez poderia efetivamente eliminar a influência do marxismo na cidade.

Quinze meses depois, depois que Kinnock tentou todas as medidas para minar o apoio ao Militant o mesmo Bevins, tendo mudado sua lealdade jornalística, iria escrever: “Ele [Kinnock] não quebrou os trotsquistas e jamais o fará”. (11)

Congresso do Partido Trabalhista

A questão do Militant dominou não apenas o congresso do Partido Trabalhista, mas os congressos dos partidos Liberal, Conservador e SDP. David Alton, líder da bancada Liberal exigiu que Neil Kinnock “expulse os líderes Militant da câmara.” Quatro ministros do gabinete, no Congresso do Partido Conservador, liderados por Tebbit e Thatcher, denunciaram Militant e a Câmara de Liverpool. Eles também exigiram que Neil Kinnock implementasse a expulsão do Militant do Partido Trabalhista. Além disso, a própria Thatcher foi à Câmara dos Comuns para zombar da liderança Trabalhista e exigir que ela tomasse ação contra os marxistas. Thatcher, em nome dos capitalistas, era a verdadeira instigadora da caça-as-bruxas contra o Militant.

Uma pesquisa de opinião realizada pelo Sunday Times em 29 de setembro mostrou que os eleitores de Liverpool votariam no Trabalhismo por uma esmagadora maioria. 55% disseram que votariam no Trabalhismo, 34% na Aliança SDP/Liberal, e 11% para os Conservadores. Isso representou um aumento de incríveis 9% na parte Trabalhista dos votos desde as eleições de 1984.

Fala grotesca de Kinnock

Mas tudo isso era de importância secundária para Kinnock enquanto se preparava para enviar um sinal para a classe dominante. Não será concedida pela história qualquer importância a nenhuma sílaba da tirada de Kinnock, salvo por seu venenoso ataque aos heróicos vereadores de Liverpool que ultrapassou até mesmo os Conservadores em sua violência. Nenhuma palavra de apoio foi pronunciada pelas lutas da câmara Liverpool em defesa dos trabalhadores da cidade e nem uma palavra de crítica foi feita mesmo sobre aquelas câmaras Trabalhista tais como Rhondda, Newcastle ou Wakefield, que provocaram greves pela privatização, fechamento de creches e outros cortes. Sua declaração infame sobre o alegado “caos grotesco das câmaras Trabalhistas alugando táxis saindo em torno da cidade passando notícias de demissão para sua própria força de trabalho”, produziu um pandemônio no Hall do congresso.

Eric Heffer, membro do Comitê Executivo Nacional, e MP por Liverpool Walton, assaltou furiosamente a plataforma. Vaias acolheram a declaração de Kinnock. Enquanto os vereadores de Liverpool estiveram no poder, de 1983 a 1987, nenhum trabalhador foi demitido. O mesmo não pode ser dito de Neil Kinnock. No outono de 1987, ele causou 40 demissões verdadeiras entre a equipe da sede do Partido Trabalhista de Walworth Road.

O ataque de Kinnock provocou indignação generalizada por toda a Liverpool. A estação telefônica municipal foi atravancada com chamadas de protesto. Isso foi interpretado pela maioria dos moradores de Liverpool como outro ataque à cidade. Todo o Grupo Trabalhista se uniu em sua condenação ao ataque de Kinnock. Mesmo direitistas como Roy Gladden e Joe Devaney, futuro candidato parlamentar por Mossley Hill, estavam agora com os apoiadores do Militant em repudiar a fala de Kinnock. Os MPs Trabalhistas de Liverpool foram unânimes em sua condenação. Bob Parry, MP de Riverside, denunciou Kinnock como o “maior traidor de classe desde Ramsey MacDonald”. (12)

A imprensa capitalista acolheu a fala de Kinnock com hosanas. A imprensa exigia ação não apenas contra os vereadores de Liverpool e o Militant mas também contra Bernie Grant: “Dê um chute em Bernie Grant”, declarou o Daily Express. (13)

No congresso do Partido Conservador na semana seguinte Tebbit declarou:

Nada pode realmente mudar até que extremistas como o Militant estejam fora do partido [Trabalhista]. O Partido Trabalhista não está senda capaz de esconder o sr. Scargill, sr. Hatton e Bernie Grant sob o manto da moderação. Não podemos deixar o sr Kinnock descansar até ele remover aquelas pessoas das posições de poder dentro do seu partido. (14)

No inicio de 1985 o Trabalhismo permanecia em 38% nas pesquisas de opinião. Dois anos depois, depois do assalto ao Militant, que esteve atado com o alijamento das políticas de esquerda e o ataque à re-eleição dos MPs, a popularidade do Trabalhismo permanecia no mesmo nível. Subsequentemente ele caiu para 31% na eleição geral de junho de 1987. O efeito imediato da fala de Kinnock foi que garantiu que o Militant teve sua maior e mais vitoriosa reunião já feita em um congresso do Partido Trabalhista:

Em torno de 700 delegados e visitantes fizeram a reunião dos leitores do Militant a maior e mais vibrante de todas. A reunião foi terça à noite, logo após o ataque de Kinnock à câmara de Liverpool, e isso deu um espírito adicional à reunião. As contribuições à discussão, e a magnífica coleta de mais de £2,100 para o fundo de luta do Militant – a maior de todas – foi à melhor resposta às calúnias de Kinnock.(15)

A reunião foi transmitida ao vivo no jornal do Canal 4 às 7 da noite.

Kinnock ataca os mineiros

Kinnock continuou seu ataque a Liverpool com uma fala suja, trouxe lágrimas aos olhos dos mineiros e suas esposas presentes no congresso, quando recusou a apoiar indenizações das multas impostas ao sindicato mineiro em um futuro governo Trabalhista. Ele também se opôs à futura dissipação da sobretaxa dos vereadores em Liverpool e Lambeth. Disse que nenhum outro governo agiu desta maneira. Mas em 1975 o governo Trabalhista passou o Ato de Financiamento Habitacional (Condição Especial) para indenizar os vereadores multados e desqualificados por se recusar a obedecer ao Ato de Financiamento Habitacional do governo Heath forçando-os a aumentar os aluguéis municipais. Por causa da rebelião da direita Trabalhista nos Comuns, essa legislação não protegeu os vereadores de Clay Cross que tomaram a liderança na luta de aluguéis naquele ano.

Apesar da intervenção de Kinnock, a conferência passou uma moção exigindo que um governo Trabalhista recompensasse os mineiros e re-contratar os mineiros. Também patrocinou uma resolução do NEC que prometia uma indenização para os vereadores. Mas a ala direita e a imprensa capitalista presentes estavam avidamente procurando derrotar a moção apoiando a luta de Liverpool.

O debate no congresso foi um dos mais duros na recente história do movimento trabalhista. Vários oradores de direita se enfileiraram para reprovar a câmara e os apoiadores do Militant. Os únicos apoiadores de Liverpool permitidos a falar no debate foram Derek Hatton e Tony Mulhearn. A ala direita não pôde impedir isso desde que eles estavam desenvolvendo e apoiando a moção.

Kinnock não estava recompensado por este assalto à Liverpool. Pelo contrário, mais sangue era exigido dele. Tebbit, num debate na Câmara dos Comuns em 12 de dezembro disse:

Nós Conservadores desejamos boa sorte ao líder da oposição – é sempre bom quando ele dá um pulo para escutar o debate – em seu eminente expurgo dos apoiadores da Tendência Militant… em Liverpool e em outras cidades.

Um furioso Kinnock retorquiu: “Esqueça isto.”

Mas Tebbit não se fez de rogado: “Podemos esquecer o expurgo tão logo? Haverá um expurgo em Birmingham e Manchester?”

E quando a liderança Trabalhista (energeticamente e verbalmente) protestou contra as táticas de Tebbit, ele ligou Kinnock com os ‘desesperados’ de Liverpool: “Temos visto as táticas e atitudes da Tendência Militant esta noite.” (16)

Comício Militant em Albert Hall

Se o ataque à Liverpool e ao Militant queria intimidá-los, teve o efeito oposto. Pela primeira vez o Militant organizou seu Comício Nacional em Albert Hall. A reportagem do evento Militant declarou: “5 mil pessoas se entusiasmando pelo socialismo em Albert Hall. £26.587 levantados na coleta do fundo de luta. O comício Militant do último domingo quebrou todos os recordes.” Ao meu lado e de Ted Grant falou Harry De Boer, veterano da luta dos trabalhadores dos EUA, um dos pioneiros dos piquetes volantes na greve geral de Minneapolis de 1934 quando foi baleado na perna. Ele também encontrou Leon Trotsky no México em 1940 e foi preso por sua oposição à II Guerra Mundial. Na idade dos 80 Harry De Boer não perdeu nada de seu comprometimento socialista e revolucionário, dizendo no comício:

Trotsky me disse, o movimento sindical sozinho não pode resolver os problemas dos trabalhadores. Você precisa ter um Partido Trabalhista controlada por um movimento sindical democrático. Muitas pessoas são eleitas para a direção e então esquecem que as colocou lá e porque. Nossos slogans em 1934 era 1934 “cada membro um organizador” e “fazer de Minneapolis uma cidade sindical”. Os slogans do movimento trabalhista internacional deve ser “Organizar os trabalhadores mundialmente” e “trabalhadores de todos os países, uni-vos”.

Ao se lado falou Terry Fields:

As cartas estão postas. O povo de Liverpool está lutando como nunca antes sob a bandeira da Câmara Municipal de Liverpool. Eles estão resistindo às mentiras, sujeira e distorção da imprensa.

Jack Collins, o secretário geral em Kent do NUM, declarou: “Devemos projetar o que o socialismo significa… se estamos protegendo os interesses da classe trabalhadora.” (17)

Este comício, que “quebrou todos os recordes”, foi a melhor resposta à venenosa campanha da imprensa e da ala direita do Trabalhismo e do movimento sindical.

1 Michael Parkinson, “Liverpool On The Brink”, P124

2 Militant 741 22.3.85

3 Militant 752 7.6.85

4 Taaffe And Mulhearn, Op. Cit., P227

5 Liverpool Echo, Quoted In Taaffe And Mulhearn, Op. Cit., P237

6 Militant 766 20.9.85

7 ibid

8 Daily Mail 16.9.85

9 Militant 767b 27.9.85 A Second Edition Of The Paper Was Published After The One-Day Strike.

10 ibid

11 The Independent 7.1.87

12 Taaffe And Mulhearn, Op. Cit., P300

13 Quoted ibid

14 ibid

15 Militant 768 4.10.85

16 The Guardian 13.12.85

17 Militant 773 8.11.85