Escola de Verão do CIT: a crise do capitalismo e o avanço das lutas no mundo

Entre os dias 8 a 13 de julho, aconteceu na Bélgica a Escola de Verão Europeia do Comitê Por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT). Estiveram presentes militantes de 32 países, dentre eles Reino Unido, Irlanda, França, Bélgica, Espanha, Portugal, Grécia, Itália, Alemanha, Áustria, Suécia, Rússia, Cazaquistão, Israel/Palestina, Sri Lanka, Tunísia, Hong Kong, Taiwan, Malásia, Austrália, Nova Zelândia, Nigéria, Estados Unidos, Canadá e outros. Nós da seção brasileira do CIT também estivemos lá.

Dos países do G7 (EUA, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Japão), apenas três estão produzindo mais do que eles fizeram antes de 2007. O déficit público referente ao PIB aumentou de -2,1% (1999-2008) a -8,1% (2009). Ao mesmo tempo, estima-se que as empresas americanas e europeias tem quase 5 trilhões guardados no banco, pois não tem onde investir de forma que tenha lucro. Compreende-se que esta é uma crise profunda e não só mais uma crise cíclica do capital.

Ao que tudo indica, não há uma potência mundial que possa resolver esse problema econômico. Itália e Espanha tem uma dívida de 2,8 trilhões de euro. Esse valor é seis vezes maior que a reserva existente no Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), política criada para “salvar” as economias em problemas. Está certo de que o euro irá entrar em colapso, a questão é quando e como.

O desemprego é massivo no mundo inteiro. Estima-se 200 milhões de desempregados. No Reino Unido tiveram cortes em massa no setor público, três anos de congelamento salarial e 85% dos cortes ainda estão por vir! O primeiro ministro de Portugal está aconselhando seriamente os jovens a emigrar para Moçambique ou Angola se querem empregos, alegando que “Portugal não é um país para jovens”.

A economia Chinesa está mostrando sinais de desaceleração. Diante desses e outros dados, comprova-se que essa crise é muito mais do que uma crise cíclica ou uma crise econômica do capital.

A crise política da burguesia

Um elemento importante trazido em debate na Escola é que essa é uma crise econômica e política – e uma crise das instituições burguesas como um todo. Ou seja, não se trata apenas do sistema político, mas também da Igreja Católica, dos sindicatos patronais e outras instituições que revelam cada vez mais os esquemas de corrupção e as divisões internas.

O escândalo de corrupção que envolve Bo Xilai, do Partido Comunista da China, provocou desconfiança na população, sendo este o momento de maior divisão aberta na burocracia desde 1989. Na França, ainda que o país não tenha recebido os pacotes de austeridade, as disparidades entre as classes, social e econômicas, tem provocado uma crise política grande, e a direita vem perdendo cadeiras na Assembleia Nacional. 

Na Itália, metade da população não participou das últimas eleições locais. Esse índice de abstenção é um problema generalizado na Europa, com o aumento de descrença no sistema político como um todo.

Uma nova radicalização

As lutas que ressurgem em diversos lugares, muitas de caráter espontaneísta, revelam a indignação das pessoas e a vontade de transformação. A palavra “socialismo” e “revolução” voltou a ser pronunciada com força nas vozes da juventude, de mulheres, LGBTT, trabalhadoras e trabalhadores. No entanto, ainda é algo muito inicial, e a tomada de consciência ainda caminha muito mais lenta do que o ritmo que os capitalistas tentam sobreviver, atirando pacotes de austeridade para todos os lados.

Como consequência da ausência de um programa anticapitalista e um projeto socialista revolucionário, em alguns lugares observa-se um campo aberto para nacionalistas, de esquerda ou de direita. A preocupação pelo crescimento de partidos fascistas, que claramente se posicionam contra imigrantes, mulheres, homossexuais, é uma realidade concreta para muitos países. A juventude tem desenvolvido um papel importante na luta contra isso, em organizações como “Juventude contra o Fascismo”.

A experiência da formação de novos partidos de esquerda (Syriza na Grécia, Die Linke na Alemanha, e outros), de configuração semelhante ao do PSOL no Brasil, de uma forma geral, tem crescido e até em alguns lugares já possui parlamentares. Nós do CIT defendemos que após falência dos antigos partidos como o PT, faz-se necessário novos partidos que consigam apresentar um programa concreto que expresse a luta dos trabalhadores, organizados de forma radicalmente democrática.

Construindo uma organização internacional

Participar da Escola foi uma oportunidade de ver concretamente a importância do internacionalismo. Nunca o capitalismo esteve tão integrado no mundo todo como no último período, o que aponta para nós um espaço mais aberto para também construir uma luta unificada dos trabalhadores internacionalmente.

Diante disso, existem iniciativas de fóruns e partidos que se articulam e mantém relação com grupos de esquerda de outros países. Além disso, muitas pessoas passaram a assumir as redes sociais da internet como um canal importante para divulgar lutas não apenas locais, mas que estão ocorrendo no mundo, possibilitando mostrar o fortalecimento de lutas e ter acesso a uma série de acontecimentos que a mídia burguesa nos esconde.

No entanto, a experiência das escolas de verão (além da Europeia, temos a Latino Americana e outras escolas), os congressos mundiais e outros fóruns do CIT mostram como uma maior organicidade nos possibilita potencializar a nossa intervenção, local, nacional e mundialmente. A oportunidade de produzir acúmulos coletivamente, mas também de debater e contribuir na intervenção de outras companheiras e companheiros de diversos países já nos possibilita anos a mais de experiência se comparado a pessoas que individualmente se indignam. Nós temos a importante tarefa de traduzir esse acúmulo nos espaços que intervimos.

Assim, retornam 400 militantes para seus respectivos países, levando o acúmulo e o ânimo para transformar essa sociedade, neste período tão decisivo e dinâmico em que vivemos, com a clareza de que o socialismo será mundial, ou não o será.

Desafios para a esquerda grega

A Grécia foi um dos grandes debates, tanto por companheiros de lá como de outros países, que tiveram a oportunidade de contribuir com diferentes pontos de vista sobre a nossa intervenção e análise da situação.

No campo político, o Syriza chegou a 28% dos votos, quando previamente era de 4%, revelando um grande terremoto político que vive a Grécia. O Syriza é um partido com potencial de se destacar como uma alternativa, de chamar a unidade da esquerda e de denunciar os pacotes de corte, como veio fazendo no último período. Porém, desde os primeiros ganhos eleitorais em maio, retrocederam, aumentando então as dúvidas sobre qual seria sua proposta concreta.

Crescimento dos fascistas: um perigo

Essa preocupação se dá nos marcos de um crescimento, por outro lado, da Aurora Dourada, que ganhou cerca de 7% nas duas eleições gerais esse ano. Se a esquerda não conseguir dar respostas a altura do que a realidade demanda, abrirá cada vez mais espaço para o partido neonazista e outros grupos de direita.

Outro debate é que a saída da Zona do Euro já está colocada para a Grécia, já que a dívida é impagável e o país será expulso por não cumprir as exigências da União Europeia, seja dentro de um ano ou até menos que isso. Assim, o “como” será essa saída é a grande questão, refletida entre os trabalhadores mas a própria burguesia que ainda não sabe o que fazer.

Momentos decisivos

O momento é decisivo, onde realmente existe a possibilidade de um partido de esquerda assumir o poder na Grécia, e seria um grande retrocesso ter um governo reconhecido como radical capitulando com as medidas de austeridade, ou mesmo que não tenha uma política clara do que fazer a partir daí.

Nós do CIT desempenhamos um papel importante com trabalhadores da saúde, do transporte, com a juventude, imigrantes e outros setores, buscando realizar uma atuação em conjunto com o Syriza, mas apontando a necessidade de lutarmos por mais: defendemos que essa saída da Zona do Euro deve acontecer com a classe trabalhadora assumindo o controle.

Faz-se necessário nacionalizar os bancos, principais indústrias, criar monopólio estatal do comércio exterior, e garantir as poupanças, comida e moradia da classe trabalhadora.

 

As mulheres e a crise mundial

Durante toda a Escola, foram diversas as intervenções que traziam o debate das lutas contra as mais diversas formas de opressão: o racismo, machismo, a homofobia, a xenofobia, dentre outros. Tivemos uma comissão específica que tratava da luta das mulheres, com uma explanação muito rica de Sarah Wrack, da Inglaterra, trazendo dados que comprovam como as mulheres estão sendo extremamente atacadas nesse contexto da crise, e que isso coloca a urgência de estarmos na linha de frente combatendo o capitalismo.

É visível que as mulheres, sobretudo as mais jovens, estão se identificando cada vez mais com o feminismo, ou demonstrando revolta em relação ao machismo. Companheiras de vários países trouxeram a experiência da construção da Marcha das Vadias, entre outras iniciativas que vem surgindo no último período, como lutas a favor do aborto, contra violência doméstica etc. Como marxistas, temos essa clareza de que as condições objetivas é que determinam a consciência, e que por isso esse sentimento de indignação cresceu agora com grande força porque as mulheres estão sendo extremamente atacadas nesse contexto de crise – e não por sermos “alvos” do governo, mas porque já partimos de uma posição desigual na sociedade, que se acentua nesse período.

Só o começo dos cortes

Na Grã-Bretanha, um artigo mostrou que do corte de 15 bilhões de euro implementados até agora, 11 bilhões atingiram as mulheres – principalmente diante dos cortes nos benefícios previdenciários e creches, mas também por conta do corte nos trabalhadores do setor público – nos últimos três meses de 2011 duas vezes mais mulheres que homens perderam seus empregos.

Nos EUA, em 82% dos programas de abrigo contra violência doméstica observa-se aumento da demanda, no entanto 77% tiveram corte de financiamento. Diante desses e outros dados, torna-se urgente que um programa para a classe trabalhadora reflita esse específico impacto que a crise tem nas mulheres.

É evidente que existem outros motivos para as mulheres se mobilizarem, mas Sarah apontou exemplos de como muitos desses protestos, ainda que não estejam claros a relação com a crise, tem sido respostas a esses ataques.

A discussão de mulheres foi uma das que mais mobilizou os participantes, onde nos primeiros minutos em que se abriu para a fala, militantes de todos os países ali presentes já haviam manifestado interesse em falar.

Isso mostra o quanto é um tema que tem sensibilizado e preocupado o CIT como um todo, e a valiosa contribuição das companheiras mulheres nos diversos temas que envolveram a Escola mostraram o saldo positivos das diversas seções ao atentarem em fortalecer a intervenção no debate das opressões. 

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