Por trás dos conflitos na USP, há um projeto de exclusão social

Nos últimos anos, desde o início da gestão de Rodas, a USP vem passando por intensas reformas que a deixam cada vez mais fechada para os trabalhadores e isolada da população que a sustenta. As medidas tomadas pela reitoria durante as férias de final de ano demonstram qual é o projeto que está sendo implantado.

Apesar da enorme importância da Universidade de São Paulo para o conjunto da sociedade, muito da relação entre a universidade e a comunidade externa está se perdendo, com um projeto político que se coloca cada vez mais intensamente através da Reitoria, controlada hoje por João Grandino Rodas.

O serviço de transporte do campus está deixando de ser público, gratuito e acessível a todos, como era até o final de 2011. Pessoas da comunidade externa utilizavam os circulares da USP para se locomover pela Cidade Universitária, funcionários terceirizados os usavam para ir e voltar do trabalho, e mães tomavam a condução para levar seus filhos à creche. Mas todas essas pessoas terão agora que pagar – e caro – pelo acesso ao transporte, que deveria ser um direito.

O Reitor, terceirizando o serviço de circulares, o entregou a uma empresa privada, que somente não cobrará de quem apresentar uma carteirinha da USP. Ou seja, além de permitir que alguém lucre com aquilo que deveria ser um direito de todos, restringe a circulação de pessoas da comunidade pela Cidade Universitária, dificultando que as pessoas de baixa renda tenham acesso aos serviços e espaços.

Outra restrição aconteceu nos restaurantes universitários. Durante as férias foi instalado um sistema de catracas que restringe uso dos restaurantes à comunidade acadêmica.

Por que fechar a USP?

Esses dois passos que foram dados dentro de um projeto de isolar a USP se somaram a antigas políticas de restrição da circulação. Um exemplo é a catraca no Centro de Práticas Esportivas, que poderia ser uma referência de espaço de lazer para a comunidade, mas somente alunos e funcionários podem ter acesso. Outro é a política de manter dois dos três portões fechados durante a noite e grande parte dos finais de semana.

Há alguns meses, uma estação do Metrô que deveria ser construída dentro da USP foi rejeitada pelo Reitor, porque se perderia o controle da circulação. Finalmente, também foram proibidas as festas no ambiente universitário, que são uma das poucas atividades de convivência social e de troca que ainda restam no campus. A festa da Calourada Unificada, por exemplo, que aconteceu na quarta-feira da primeira semana de aula e que contou com vários artistas importantes, como B Negão e Tulipa Ruiz, teve seus equipamentos impedidos de entrar na Cidade Universitária durante horas.

 O atual Reitor não assumiu o cargo por acaso nesse momento. Ele foi escolhido pelo então Governador do Estado José Serra porque era a melhor pessoa para implantar na Universidade um projeto de elitização, e ao mesmo tempo sufocar qualquer opinião contrária.

A privatização dos circulares; a abertura de um curso de graduação pago, oferecido por uma instituição privada na Faculdade de Economia e Administração; a concessão de espaços nas aulas de alguns cursos, como Nutrição, para empresas falarem de seus produtos; e os acordos com grandes corporações para o desenvolvimento de pesquisa são apenas alguns aspectos que mostram que interesses a Universidade está atendendo. Está voltada para uma minoria rica que quer formar profissionais e desenvolver tecnologia unicamente para aumentar seus lucros. Enquanto isso, os interesses da maioria da população ficam em segundo plano, e iniciativas para atendê-los são menosprezadas ou reprimidas.

A USP está atualmente liderando uma operação de reurbanização da Favela São Remo, que fica nos arredores da Universidade. Reurbanização nada mais é que a promoção de uma limpeza social, ou seja, retirar a população pobre do local para que seja utilizado para garantir outros interesses que não o de moradia.

Mas ninguém faz nada?

Há movimentos contra esse projeto de privatização e elitização da USP. O próprio Movimento Estudantil, que é constantemente atacado pela grande mídia e associado ao consumo alienado de drogas, na verdade defende a ampliação do acesso à Universidade e a sua democratização. É atacado pela grande mídia, pelo Governo e pela Reitoria porque se coloca contra esse projeto que dá vantagens aos setores dominantes na sociedade.

Mas os ataques já deixaram de ser apenas ideológicos, e passaram a se constituir de repressão física desde que a Polícia firmou acordo com a Reitoria para patrulhar o campus. O direito de manifestação e o direito dos estudantes de ter espaços nos quais podem debater e se organizar, ambos conquistados historicamente com muita luta, estão sendo cada vez mais tolhidos.

Mais de 80 estudantes já foram presos

Mais de oitenta estudantes já foram presos em movimentos que reivindicavam democracia na Universidade, a retirada da PM e o direito à moradia para estudantes de baixa renda. Seis estudantes foram eliminados – ou seja, além de serem expulsos nunca mais poderão ter nenhuma relação formal com a Universidade – por fazerem parte de movimentos que questionam o atual projeto da Reitoria. Todos os trabalhadores liberados do Sindicato dos Trabalhadores da USP estão sendo ameaçados de demissão.

Além disso, a Polícia vem constantemente invadindo espaços dos estudantes, agredindo e ameaçando-os nesses espaços. Um acontecimento que ficou publicamente notório foi quando um policial agrediu e apontou sua arma para um estudante negro dentro do espaço do Diretório Central dos Estudantes.

Quem vive o dia a dia da Universidade compreende que casos de violência e abuso não são isolados, mas sim parte importante da estratégia da Reitoria para a implantação de seu projeto. A polícia não está lá prevenindo a criminalidade e cuidando da comunidade. Está cuidando de um projeto de uma minoria que exclui a maioria. A polícia está presente garantindo uma ordem e reprimindo quem questiona essa ordem, que é de exclusão e privatização da Universidade. 

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