Divisão no Congresso e não formação de central unitária representa uma derrota para os trabalhadores
A montanha pariu um rato! Um Congresso com 3180 delegados e mais de 4 mil presentes representando o que há de mais combativo no movimento sindical e popular, construído a partir de centenas de Assembléias de base em todo o país, incansáveis debates e negociações durante meses, e que poderia ter resultado na formação de uma forte organização de luta unitária, acabou resultando numa grande derrota. Uma derrota para todos os setores envolvidos, sem exceção. Uma derrota para o conjunto da nossa classe.
A divisão no Congresso da Classe Trabalhadora e a confusão política e organizativa que se seguiu só interessam aos pelegos, patrões e ao governo. Estes sim estão mais unidos que nunca para nos impor o congelamento de salários do funcionalismo, o veto ao fim do fator previdenciário, os cortes de 10 bilhões de reais já anunciados pelo governo, além da perseguição e repressão sobre quem luta.
A divisão no Congresso e a não formação de uma Central unificada vem completar tragicamente o desastre representado pela divisão da esquerda socialista nas eleições presidenciais desse ano.
Qualquer trabalhador avançado minimamente sensato hoje se pergunta – como a esquerda e as direções sindicais e populares podem ser tão irresponsáveis politicamente? Será que não compreendem a importância da unidade nesse momento tão difícil para quem defende a independência de classe frente a um governo que quer nos isolar, enfraquecer e aniquilar?
Um Congresso vitorioso, resultando na formação de uma nova Central sindical e popular unitária, daria um novo ânimo para milhares de ativistas que hoje se enfrentam com os patrões e o governo. Uma nova Central unitária seria uma ferramenta valiosíssima para enfrentar o pacote de maldades que o futuro governo, seja ele encabeçado por Dilma ou Serra, terá que impor sobre os trabalhadores diante das contradições do capitalismo internacional em sua mais importante crise das últimas décadas.
Sem essa ferramenta de luta unitária estamos mais fracos, confusos, divididos e desorganizados – presas fáceis para os chacais neoliberais. Foi a crise capitalista e os ataques sobre os trabalhadores, como as demissões massivas na GM e Embraer, etc, que empurraram os dirigentes sindicais da Conlutas e Intersindical, além de outros setores, a retomar a idéia de unificação para melhor resistir. A falsa idéia de que a crise já passou é hoje dominante na sociedade. Mas, não passa de ilusão. Em 2008/2009 não estávamos suficientemente preparados para enfrentar os ataques. Continuaremos despreparados e divididos quando eles voltarem com força?
É doloroso hoje constatar que havia condições para concluirmos o Congresso de forma positiva, apesar dos limites na discussão política e as diferenças existentes. Um pouco mais de tolerância diante das divergências e senso de responsabilidade sobre o que estava em jogo, teria resultado num desfecho favorável a todos. O sentimento de indignação que resulta da divisão é natural e legítimo, mas só poderá servir para algo se pudermos fazer um balanço sério e tirar todas as lições dos erros cometidos.
O Congresso da Classe Trabalhadora aconteceu a partir de um grande esforço de mobilização na base e negociações políticas entre os diferentes setores. É inegável que muitas das principais diferenças que, no início dos debates, pareciam intransponíveis, deixaram de ser obstáculos reais.
No primeiro seminário realizado para debater as possibilidades de unidade, tanto a Intersindical quanto a corrente Unidos/CST/FOS (integrante da Conlutas), além de outros setores, defendiam a formação de uma central exclusivamente sindical e rejeitavam a participação do movimento popular. Quando chegamos ao Congresso de Santos já havia um amplo consenso em torno da defesa do caráter sindical e popular da nova organização a ser criada. Esse acordo talvez tenha sido um dos mais importantes, pois tem a ver com a natureza mesma da organização a ser criada, além de ter uma implicação direta em nossa intervenção na luta de classes. Unificando organicamente sindicatos e movimentos populares, estaríamos enfrentando o desafio de organizar os setores mais oprimidos, precarizados e excluídos da classe trabalhadora.
A participação do movimento estudantil e dos movimentos contra as opressões na nova Central se manteve como ponto divergente. Na votação, uma ampla maioria aprovou a participação desses setores dentro de um limite máximo de 5% nas instâncias da nova Central. Apesar de mantidas as divergências, durante o Congresso não passou pela cabeça de ninguém romper o processo de unificação por causa disso. Qualquer um que queira colocar hoje essa questão como uma das justificativas para romper o Congresso não pode ser encarado seriamente. É preciso um sentido de proporção sobre o que está em jogo.
Outro exemplo concreto de acordo político construído refere-se ao tema da estrutura da direção da nova Central. Conseguiu-se construir um grande consenso, se não total pelo menos amplamente majoritário, no sentido de que a direção executiva da nova Central seria eleita nesse Congresso e não pela Coordenação Nacional aberta composta por representação das entidades. Houve também acordo em remeter para o próximo Congresso uma deliberação definitiva sobre o tema.
Um dos temas mais polêmicos durante todo o último período foi aquele referente à unidade da esquerda nas eleições desse ano. O PSTU, junto com alguns setores minoritários, de forma equivocada em nossa opinião, recusava-se a aprovar um chamado do Congresso em favor de uma Frente de Esquerda nas eleições. O fato de que o PSTU conseguiu obter maioria para sua posição (com a abstenção injustificável da Unidos/CST/FOS e até de um setor da Intersindical, sem falar na proposta confusa apresentada pelo MTL) foi um elemento negativo do Congresso. Porém, também não passou pela cabeça de ninguém dividir o Congresso por isso.
A gota d’água, porém, se deu com a votação do nome da nova Central. De forma intransigente e totalmente desproporcional, o PSTU junto com o MTL (que acabou jogando um papel muito negativo nesse sentido) insistiu até o fim no nome “Conlutas-Intersindical – Central Sindical e Popular”. Fez questão de colocar em votação essa proposta de nome mesmo diante da recusa da Intersindical em aceitar a utilização de seu nome na denominação da nova organização a ser criada. A intransigência na defesa desse nome serviu para acirrar a idéia de que estava em curso um processo de anexação dos demais setores ao projeto da maioria da Conlutas encabeçada pelo PSTU.
Uma inflexão mínima por parte do setor majoritário da Conlutas encabeçado pelo PSTU no sentido de aceitar uma proposta de acordo que invertia o nome da Central, passando a chamá-la de Central Sindical e Popular, seguida dos logotipos da Conlutas e Intersindical (uma proposta que hoje eles admitem que poderiam aceitar), teria diminuído as tensões e o clima de indignação presente em boa parte do Plenário. Essa mínima concessão poderia ter salvado o Congresso e evitado o desfecho trágico.
Ao não fazer essa concessão, o setor majoritário jogou no lixo todo o histórico da Conlutas em defesa da unidade com a Intersindical e da formação da nova Central. Ao invés de ser o motor da unificação, como foi no período anterior, o PSTU colocou a Conlutas na posição de entrave ao processo.
Faltou ao PSTU a grandeza política de entender que uma vitória imediata numa votação no Congresso não justificava os enormes danos que a ruptura provocou no processo de reorganização sindical e popular. A vitória do PSTU acabou sendo uma vitória de Pirro.
É preciso reconhecer isso como condição para tentar reverter a situação. A atitude de considerar que, apesar de tudo, uma nova Central foi formada e a vida deve seguir como se nada tivesse acontecido, não é aceitável. A Secretaria provisória formada ao final do Congresso, sem os setores que saíram do Plenário, só terá sentido se for encarada como uma Comissão cujo principal objetivo é o de trabalhar pela recomposição das relações e a construção de um caminho unitário.
Ao mesmo tempo, não podemos concordar com a postura das correntes da Intersindical, da Unidos e outros setores de abandonar o Congresso. Intempestiva ou conscientemente planejada, a atitude acabou jogando esses mesmos setores e o conjunto do processo de reorganização num grau de caos e confusão política e organizativa que não serve a ninguém. A luta contra a postura hegemonista do PSTU poderia e deveria ser travada nos marcos de uma mesma organização.
Tão importante quanto saber ser maioria, qualidade que o PSTU demonstrou não ter, é saber ser minoria. Não podemos concordar com uma postura recorrente de romper quando se é minoria.
Não houve dúvidas ou questionamentos quanto aos resultados das votações. Queiramos ou não, havia uma maioria estabelecida no Congresso e isso inclusive não era surpresa para ninguém. Toda pressão e esforço para buscar convencer o setor majoritário do Congresso poderia ser justificado até o limite da manutenção do processo de unificação. A atitude de romper o Congresso não serviu a rigorosamente ninguém, nem mesmo aos setores que romperam.
O infeliz resultado é que temos hoje uma situação mais confusa e um grau de polarização e tensionamento das relações superior ao que existia no período anterior. Alguns começam a tirar conclusões de que de fato não havia e não haverá base real para uma central unificada. É preciso cuidado para que não se caia num grau de conflito que inviabilize a retomada do processo de unidade que a classe trabalhadora necessita independente dos interesses de cada uma das correntes.
A cristalização de uma situação onde, de um lado, a Intersindical, Unidos e outros que romperam formem uma organização própria e, de outro lado, os setores majoritários da Conlutas, MTL, MTST e outros formem outra Central, não serve a ninguém. É preciso recompor as condições para a unidade.
É verdade que o sectarismo se alimenta do refluxo no movimento de massas. Somente um grande ascenso de luta de massas poderá construir uma base sólida o suficiente para um processo qualitativo de reorganização do movimento sindical e popular. Mas, mesmo em situações de refluxo e defensiva por parte do movimento operário e popular é preciso dar respostas mínimas e preparar-se para uma mudança na situação.
A unificação da Conlutas, Intersindical e outros setores, no Congresso da Classe Trabalhadora teria representado um importante passo. A derrota do Congresso abre um período de maior dificuldade e muita incerteza. Mas, é preciso aprender as lições do ocorrido e buscar retomar o processo de reorganização sindical e popular.
A corrente LSR participou do II Congresso da Conlutas e do Congresso da Classe Trabalhadora, como parte do Bloco de Resistência Socialista e sempre trabalhou, desde muito antes, na perspectiva da construção da unidade.
Não rompemos com o Congresso, mas também não entendemos que a nova Central que queríamos formar foi efetivamente construída. A atitude do PSTU e MTL de considerar que a Central foi formada e que a prioridade é defendê-la dos ataques de outros setores está errada. Da mesma forma, não concordamos com uma saída de cristalizar a divisão formando-se uma nova organização unindo os setores que romperam com o Congresso a partir da Intersindical, Unidos, etc.
Não consideramos que a Central pela qual lutamos foi formada e a Secretaria provisória organizada ao final do Congresso deve assumir um papel claro no sentido de buscar recompor as relações e reconstruir condições para a unidade.
Nos marcos atuais e dentro dos limites de acordo já construídos antes do Congresso, nenhuma concessão é grande demais que não possa ser feita se o objetivo for recompor a unidade. Isso vale para medidas que ofereçam garantias democráticas às minorias. Vale muito mais para temas menores como a definição do nome. Trabalharemos para que se construam as bases de retomada das relações entre todos os setores que participaram do Congresso e até mesmo novos setores.
Aprendamos a lição. Não há mais lugar no movimento operário para a disputa estéril pelo controle de aparelhos, o sectarismo e a obsessão pela autoconstrução em detrimento dos interesses globais da classe. No final das contas perdem as correntes e perde o movimento global dos trabalhadores.