Os Yanomamis na mira do ouro de sangue 

O Território Indégina (TI) Yanomami se encontra em um cenário de guerra. As consequências de uma política genocida do desgoverno de Bolsonaro foi devastadora, colocando os Yanomamis em uma situação de extrema violência, pobreza e calamidade, levando à morte de mulheres, idosos e crianças. O bolsonarismo desmontou toda e qualquer política de proteção ao território, ambiental e saúde desses povos, abrindo espaço e promovendo o garimpo ilegal na região, criando essa barbaridade no TI Yanomami. Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, “570 crianças Yanomamis morreram contaminadas por mercúrio e fome.” Mas Bolsonaro é só um sintoma de um sistema que depende da divisão e violência para se manter.  

O tamanho da barbaridade que está ocorrendo contra esse povo foi revelado nas primeiras semanas do novo governo do Lula, após circular uma foto nas redes sociais de uma mulher Yanomami que morreu por desnutrição e malária. Mais e mais fotos e relatos foram sendo divulgados mostrando que até que a situação era pior do que todo o país acreditava que era. Isso levou a ministra dos povos indígenas Sônia Guajajara e o Lula até o local e um estado de emergência foi decretado pelo governo federal. A ministra dos povos indígenas diz “a situação do povo Yanomami não é nova… a cada 72 horas, uma criança ou idoso Yanomami morre por desnutrição, diarreia e malária.”

A crise sanitária e humanitária que o povo Yanomami vive hoje foi intensificada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro que se mostrou ser inimigo dos povos indígenas e isso ficou bem claro para todos durante seus quatros anos de governo. O líder indígena Junior Hekurari, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami, afirmou “que o governo de Bolsonaro passou quatro anos ignorando os pedidos de ajuda das comunidades indígenas da região.” Ele também falou que “foram enviados mais de 60 pedidos de auxílio ao governo Bolsonaro e todos foram ignorados.”

Bolsonaro incentivou os garimpeiros

Bolsonaro em suas falas preconceituosas e racistas contra os indígenas incentivou garimpeiros a invadir os territórios demarcados e, em tese, protegidos. Os Yanomamis foram uns dos mais afetados, mas, além deles, os Kayapós e Munduruku também estão sofrendo com esse problema, além de outros povos.  O ex-presidente tentou atacar os povos indígenas negando a eles a demarcação dos seus territórios, o direito à saúde e, com o seus aliados no congresso, tentou introduzir projetos de lei que permitissem o garimpo em área indígena mesmo que os seus esforços não fossem aprovados no parlamento.

Eles promoveram ataques que estimularam a destruição na Amazônia levando a desmatamento, incêndios e contaminação dos rios. Durante o período do governo Bolsonaro, junto com os empresários e suas empresas, não se mediu esforços para garantir o extermínio dos povos Yanomamis para assim poder colocar a mão sobre as terras e explorá-la.

Como já foi colocado, as invasões na terra indígena não é algo novo. A luta dos Yanomami vem de muitos anos e acontece desde de antes de suas terras serem demarcadas em 1992. Na década de 1940, esses povos tiveram contato com invasores quando o governo brasileiro queria delimitar a fronteira com a Venezuela. Nos anos 70, a ditadura militar decidiu construir uma estrada cortando duas comunidades indígenas e isso impactou diretamente os Yanomamis e levou ao desaparecimento de  duas aldeias. Até hoje essas comunidades sentem os efeitos.

As corridas do ouro existem há décadas

As corridas do ouro que leva a esse genocídio acontece há décadas. Segundo a Survival Brasil: “Durante a década de 1980, os Yanomami sofreram imensamente quando cerca de 40.000 garimpeiros brasileiros invadiram suas terras. Os garimpeiros atiravam neles, destruíram muitas aldeias, e os expuseram às doenças para as quais não tinham imunidade. Em apenas sete anos, vinte por cento dos Yanomami morreram.” Além disso “Em 1993, um grupo de garimpeiros entrou na aldeia de Haximu e assassinou 16 Yanomami, incluindo um bebê.”

Mesmo com suas terras demarcadas, os povos Yanomamis se encontram de novo na situação de invasão pela quarta corrida do ouro. Isso mostra que dentro desse sistema os povos indígenas sempre serão alvos de violência e suas terras serão sempre alvos do capitalismo. 

A lógica brutal desse sistema é uma de constante expansão onde alguns lucram em cima do ouro de sangue do povo Yanomami. 

Grandes negócios

Empresários com apoio de políticos e autoridades locais tem se enriquecido tanto diretamente ou indiretamente do garimpo ilegal. Investigações feitas por portais jornalísticos como Repórter Brasil e Amazônia Real, como também pelas associações indígenas como o Hutukara Associação Yanomami e apoiadores, têm revelado a extensão de uma grande cadeia de negócios que vai muito além dos garimpeiros que invadiram as TIs diretamente. A logística envolvida em produzir uma infraestrutura para apoiar o garimpo ilegal envolve balsas, combustível, alimentação e equipametnos como escavadeiras e outras máquinas pesadas que só conseguem chegar a locais tão remotos com grande investimento. 

No ano passado, investigações estimaram que pouco menos de 40 pistas clandestinas estavam operando na TI Yanomami com pilotos e operadores de aeronaves chegando a faturar R$ 200 mil por semana, segundo a Polícia Federal. Esses voos levam garimpeiros e também empresários que fazem a viagem para visitar seus investimentos ou para comprar o ouro de sangue direto dos garimpeiros. Eles operam com impunidade e sem interferência das forças armadas e agências de fiscalização que em tese eram para estar monitorando os céus da região. Os operadores são conhecidos pelos governantes que até tem contratos já estabelecidos. 

Lojas de ouro em Boa Vista são fachadas para operações de empresas com suas sedes no sudeste que compra e “limpa” o ouro via o processo de “legalizar” e que tem sua base na Lei 12.844/2013, sancionada no governo Dilma, que baseia a venda do ouro a partir da boa fé do vendedor! Um punhado de empresas, as chamadas Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) têm autorização do Banco Central para aquisição de ouro. Essas empresas têm lucros gigantes como no caso da F.D’Gold que em 2020 declarou ter lucro líquido de R$ 32,8 milhões. Eles vendem ouro para empresas nacionais e internacionais, principalmente joalherias como a H Stern, que tem lojas em Nova York, Moscou e Londres e onde um anel deouro da marca chega a custar R$ 29 mil. 

Além disso, refinadoras como Marsam e a italiana Chimet compram ouro de DTVMs como a F.D’Gold e aí fornecem esses e outros metais para serem usados em produtos eletrônicos, inclusive das maiores empresas do mundo como Apple, Microsoft, Google e Amazon (em 2021, o lucro combinado dessas impressas chegou a US$ 74 bilhões). Em 2020, a Chimet lucrou mais de 3 bilhões de euros (cerca de R$ 18 bilhões).

Nos últimos anos, o mercado de ouro internacional tem chegado a altas históricas. Com o sistema capitalista em crise, o recuo da globalização e um cenário geopolítico mais incerto com a nova guerra fria, especuladores e também governos têm comprado mais ouro como um investimento “mais seguro”. Segundo o Oregon Group, uma quantidade histórica de 673 toneladas de ouro foi comprada por bancos centrais no segundo semestre do ano passado. É estimado que o valor do metal só aumentará neste ano, com a demanda aumentando, enquanto as fontes se tornam mais escassas e difíceis de acessar, estimulando uma corrida imperialista para garantir novas fontes de recursos.

O mercado capitalista na raiz do problema

São esses fatores que continuarão a levar empresas e governantes a estimularem a extração, tanto legal como ilegal, que produz tanta devastação e barbaridade. As medidas imediatas do governo Lula de combater a desnutrição, os casos de malária e de expulsar o garimpo de terras indígenas são corretas no curto prazo, mas não vai acabar com o garimpo ilegal. Mesmo as medidas levantadas por alguns setores de um aumento da fiscalização e regulamentação do mercado de ouro, também só servem para “organizar” um sistema baseado na extração e devastação. Enquanto o mercado de ouro e outros metais existirem, a devastação do meio ambiente, a violência contra povos originários e a exploração de comunidades continuará. 

Precisamos punir e expropriar todos os responsáveis por financiar e estimular esse mercado de sangue. Como colocou Davi Kopenawa Yanomami, “Esse ouro é sujo, é ouro cheio de sangue do meu povo Yanomami.” Precisamos unir as lutas para acabar com essa barbaridade, colocando essas grandes empresas sob o controle democratico dos trabalhadores e acabando com esse sistema capitalista.