Quem mandou matar Marielle Franco e Anderson Gomes?
No dia 14 de março de 2018, a vereadora Marielle Franco foi vítima de uma execução política. “Quem mandou matar Marielle e Anderson?” é a pergunta que fazemos à justiça desde então. Marielle, que completaria neste ano 43 anos, foi encurralada e executada por uma política violenta que vê nas mulheres negras organizadas uma ameaça.
Quatro anos depois, não temos respostas, provas foram destruídas, promotoras se afastaram do caso e chegamos ao quinto delegado após quatro serem afastados. Apesar de termos construído mobilizações massivas exigindo justiça, não só por Marielle e Anderson, mas também por George Floyd, João Pedro, Moïse, Durval, a execução dos nossos corpos não cessou.
Recentemente, a Anistia Internacional publicou uma matéria sobre o assassinato de defensoras (es) dos direitos humanos e de jornalistas nas Américas. A Anistia informou que pelo menos 20 defensoras (es) e jornalistas foram mortas na região só em janeiro deste ano. Destas 20, 18 lutavam por terra, proteção dos territórios e do meio ambiente.
Nas câmaras legislativas, não é diferente, mesmo na condição de deputada e após a morte de sua amiga Marielle Franco, Taliria Petrone é ameaçada de morte, barrada na entrada da Câmara, e também chamada de “barraqueira” e “favelada”. Em São Paulo, dentro da câmara municipal, a vereadora Erika Hilton do PSOL foi ameaçada de morte, dentro do seu próprio local de trabalho.
No congresso nacional, nós, mulheres negras, representamos apenas 2% da composição total. Isso é reflexo da formação social classista, racista, machista de nosso país e instituições. Apenas em 2018, tivemos a primeira deputada indigena. Formada em direito e militante desde 1997, Joênia Wapichana é uma das 77 mulheres eleitas em 2018. No judiciário, também somos minoria, desde a criação do STF em 1981, só houve três ministros negros e entre 88 ministros e ministras, há apenas uma de nós.
Exigimos mudanças
Qual o perfil das direções partidárias? Que apoio as mulheres negras candidatas recebem para além do estipulado, tardiamente, na lei? Quem marcha ao lado das lideranças negras? Outras mulheres? Quem se posiciona junto conosco contra o racismo? Quem vai até o fim com Mirtes ou com a mãe de Moïse na luta por justiça? Quantos partilham das responsabilidades políticas no interior das organizações, mas também dentro de casa?
A educadora e cineasta periférica do Totó – Recife, Yane Mendes, escreveu um artigo para o site “Blogueiras Negras”: “Eu não quero que as minhas amigas, pretas fodas, virem sementes. Quero elas vivas, para colher os frutos das lutas diárias delas.”
Para que sigamos vivas e colhendo os frutos de nossas lutas, para que o que aconteceu com Marielle não se repita, a participação de pessoas negras, indígenas, trans, travestis, trabalhadoras organizadas deve ser entendida não como símbolo, mas como a força social capaz de movimentar as estruturas do nosso país, as estruturas das nossas organizações, movimentos sociais e partidos políticos de esquerda.
Estes, devem não só construir programas que expressem as nossas necessidades, mas também definindo mecanismos de prevenção á violência política de gênero e raça, além de cumprir a proporcionalidade do fundo eleitoral, do fundo partidário e do tempo de TV durante as eleições. Os partidos políticos de esquerda, movimentos sociais e organizações devem nos proteger, apoiar, fortalecer, apresentar oportunidades, reconhecer em nós parte da direção que nos conduzirá a mudanças efetivas! Devem somar esforços na construção do 8 de março de luta das mulheres em que lutamos por direitos e pela derrubada de Bolsonaro.
Precisamos construir estratégias de prevenção à violência política contra nós. Incentivar a construção de redes de solidariedade com e entre mulheres na política. Fomentar a criação de um fundo de combate à violência política no Brasil, com apoio emergencial a candidaturas e mandatos ameaçados. Precisamos articular órgãos do sistema de justiça e dos direitos humanos com programas e serviços de proteção que incluam escuta e assessoria de vítimas, análises de risco e adoção de medidas e protocolos de segurança.