8 de março: mulheres na luta pelo socialismo
Milhões de mulheres trabalhadoras participaram de várias greves em França, Espanha, Grécia e Portugal, e também de grandes lutas contra ataques ao setor público que percorrem a Europa. Jovens mulheres tomam a linha de frente de uma nova geração de lutadores do movimento estudantil contra cortes de verba e aumento das mensalidades na Inglaterra, Itália, e outros países. E, é claro, dezenas de milhares de mulheres que participaram dos grandes movimentos no Egito e Tunísia, por democracia e direitos sociais, além do fim dos regimes ditatoriais.
É provável que aconteça uma intensificação dessas lutas nos próximos meses, principalmente nos países em que as medidas de austeridade, como os cortes nos gastos sociais e aumentos de imposto, estão mais intensificadas. Não nos resta escolha, se não lutar. Nos últimos quarenta anos a vida das mulheres nos países capitalistas desenvolvidos sofreu grandes transformações. Desigualdade, discriminação e opressão não foram resolvidos, mas mudanças importantes aconteceram que deram fundamento para a ideia de que existia um contínuo progresso e que a liberdade estava ao alcance das mulheres.
A situação em países neocoloniais da Ásia, África, América Latina e Oriente Médio tem obviamente sido muito diferente. Mas, mesmo com a globalização e as consequentes mudanças socioeconômicas – em particular o aumento de mulheres jovens fora de suas casas e no mercado de trabalho – significou um sentimento de grande esperança de que as coisas poderiam melhorar para as mulheres de todos os lugares, mesmo que gradualmente.
Agora, com a crise econômica mundial e suas consequências, muitos dos ganhos alcançados ao longo de muitos anos, rapidamente retrocederam. Isso desencadeará uma piora na vida de mulheres dos países desenvolvidos e um pesadelo para as mulheres dos países neocoloniais.
Essa crise está revelando o que o CIT sempre afirmou: a incompatibilidade do capitalismo e a conquista de fato dos direitos para as mulheres, em todas as partes do mundo. Exploração e opressão são o coração do sistema capitalista, em que o lucro e a concorrência imperam. Somente travando a luta contra o sistema e pela alternativa socialista nós poderemos avançar.
Por que nos organizar e lutar
Mulheres e trabalho
Nas últimas décadas o aumento expressivo da mulher no mundo do trabalho revela-se como fenômeno mundial. Em alguns países o número de mulheres que trabalham é maior que o número de homens. Embora os salários das mulheres seja, em média, abaixo do salário dos homens, esse processo levou a um maior grau de independência econômica para as mulheres e a uma transformação na perspectiva das mulheres e da sociedade em geral.
Nessa fase inicial, a crise econômica teve efeitos diversos com relação aos empregos femininos. Em lugares em que as demissões atingiram sobretudo a manufatura e construção, como nos EUA, os homens trabalhadores foram mais afetados. Em lugares em que os setores de prestação de serviço estiveram na linha de fogo, como no caso da Inglaterra, as mulheres foram as que sofreram mais com o desemprego. Agora que um banho de sangue de desempregos está sendo criado nos setores públicos em muitos países, serão as mulheres quem sofrerão, majoritariamente. Segundo pesquisas realizadas na Inglaterra, onde há uma expectativa de que 500 mil trabalhadores do setor público serão demitidos nos próximos anos, 75% dos cortes será vivenciado por mulheres. Isso porque são elas a maioria dos trabalhadores nesta esfera – professoras, enfermeiras e funcionárias nos municípios, em que os empregos estão ameaçados. Ao mesmo tempo mulheres serão desproporcionalmente afetadas com o corte dos benefícios e serviços.
Independência Econômica
O aumento do desemprego e o corte de benefícios significarão um crescimento da pobreza para a classe trabalhadora e algumas mulheres de classe média, especialmente as mães solteiras. Em lugares que as mulheres desempregadas conseguem um trabalho alternativo significa provavelmente aceitar salários baixos, informalidade e precariedade com direitos reduzidos ou nada de saúde, férias, pensão, auxílio maternidade, entre outros. Salários e condições de trabalho estão sendo atacados severamente nos setores público e privado.
Isso aumentará a dependência financeira de mulheres sobre homens e pode haver um efeito negativo nas relações pessoais. No período anterior, trabalho remunerado, benefícios estatais e acesso a moradia pública proporcionaram para algumas mulheres um grau de independência econômica que significou a possibilidade de sair de relações infelizes ou abusivas, diferente da situação de gerações passadas. Desde o começo da crise econômica diminuiu o número de divórcios em alguns países (e até três quartos dos divórcios são normalmente iniciados por mulheres). Isso é um sinal de que sair de uma relação está ficando mais difícil e que algumas mulheres, assim como no passado, estão sendo forçadas, devido a restrições econômicas, a permanecer com seus parceiros mesmo contra a vontade.
Educação
O maior acesso a educação superior foi um dos fatores que mais alimentou a mudança de vida e de perspectiva das mulheres. Agora, pela primeira vez nos países capitalistas desenvolvidos, a próxima geração de jovens mulheres enfrentam um futuro mais sombrio que o de suas mães. A mercantilização do ensino superior, cortes draconianos de verbas destinadas à educação e aumento das mensalidades dificultarão muito que mulheres jovens tenham acesso a educação de qualidade na esperança de melhorar suas perspectivas para uma vida decente. Até quando conseguem um diploma universitário, a situação difícil no mercado de trabalho as leva aos empregos temporários, com baixos salários e uma vida de insegurança e exploração.
Serviços públicos (Serviços essenciais)
Apesar dos grandes avanços na vida de algumas mulheres, elas continuam sendo as principais responsáveis pelo cuidado dos filhos e de outros membros da família. Com os ataques neoliberais nas creches, abrigos de idosos e outros serviços sociais, são as mulheres quem normalmente tem que segurar a onda. Isso significará mais um elemento que forçará as mulheres a largarem seus empregos. Ficará ainda mais difícil para mulheres desempregadas voltar para o mercado de trabalho e aumentará o peso da dupla jornada para aquelas que já trabalham, tendo que cuidar da casa e da família. Cortes e privatizações levarão a uma queda na qualidade de serviços e precarização dos salários e das condições das trabalhadoras que precisam dele.
Uma a cada cinco mulheres são violentadas pelos seus parceiros ou ex-parceiros em algum momento de suas vidas. Em países capitalistas avançados, uma em cada sete é estuprada. Em algumas partes do mundo, a brutal e massiva violência contra as mulheres tornou-se uma arma de guerra letal. O crescente tráfico internacional de mulheres por sexo é alimentado por pobreza e será exacerbado na crise econômica atual.
A violência contra a mulher tem na raiz a ideia comum (ainda prevalente em muitas sociedades) de que as mulheres são propriedades dos homens. É reforçada pela desigualdade econômica que ainda permanece na relação entre homens e mulheres e também na idéia de propriedade privada, desigualdades de riqueza e poder que o próprio capitalismo é baseado. Frequentemente a violência é usada pelo capitalismo para defender seus interesses (como os trabalhadores da indústria têxtil da Ásia e estudantes da Europa têm experimentado de primeira mão). Pobreza e desemprego não causam violência doméstica. Acontece em todos os grupos e classes sociais. Mas esse fator pode ser um gatilho para a violência em casa e a crise econômica só tornará isso mais provável.
Em muitos países as atitudes em relação a violência contra a mulher melhoraram radicalmente nas últimas três décadas. Leis progressivas como por exemplo a Lei Maria da Penha no Brasil, foram aprovadas e existe um conhecimento geral de que a violência contra a mulher é um crime sério que deve ser combatido.
Mas um grande corte nos serviços públicos prejudica muito o progresso que foi feito. Falta de creches, casas abrigos para mulheres vítimas de violência e outros serviços dificultarão que mulheres escapem da violência sofrida em casa (onde normalmente acontece o abuso), enquanto aumento na tarifa de transportes e cortes em iluminação pública etc. significarão menos segurança para as mulheres fora de casa. O empenho da justiça para apoiar e apurar os inúmeros casos de mulheres que foram estupradas ou violentadas também estão sob ameaça além de ser precário e negligente.
Na última década dezenove países tornaram menos restrito ou legalizaram totalmente o aborto, mas milhões de mulheres ainda morrem em países onde o aborto é ilegal ou extremamente restrito. Em todo o mundo cerca de 20 milhões de abortos ilegais são realizados todo o ano resultando na morte de 70 mil mulheres e mutilação de milhares.
Em alguns países ataques ideológicos ao aborto continuam e precisam ser combatidos. Mas em muitos outros são os cortes na saúde e privatização de tantos outros serviços que ameaçam esse direito. Os cortes significam também menor acesso ao tratamento de infertilidade, além de reduções ou fechamento de clínicas que oferecem conselhos sobre métodos contraceptivos e saúde sexual, afetando principalmente mulheres jovens, pobres e negras.
Milhões de mulheres no mundo inteiro sofrem terríveis restrições à sua sexualidade, incluindo práticas bárbaras como mutilação genital. Em muitos países capitalistas avançados medidas sobre sexualidade e relações pessoais avançaram, sem dúvida. Mulheres estão sentindo-se mais livres de muitas restrições morais, sociais e religiosas presentes no passado. Mas sob o capitalismo a liberação sexual começa a ser distorcida em prol da busca pelo lucro e manutenção das desigualdades existentes. O sistema capitalista torna tudo mercadoria, inclusive o corpo da mulher – seja para venda direta, na indústria do sexo, ou indiretamente usando como comercial para vender produtos.
Isso promove imagens particulares da mulher, que são limitadas, estereotipadas e frequentemente prejudiciais. Essa objetificação das mulheres reforça atitudes conservadoras, incluindo a violência, e como consequência prejudica as mulheres na luta mais ampla por direitos econômicos e sociais.
O aumento de protestos e greves que mulheres estão envolvidas no último período mostram que destruir essas conquistas não será possível sem uma resistência. As mobilizações dos trabalhadores da indústria têxtil na Ásia e o Oriente Médio vem mostrando que mesmo as mulheres mais exploradas estão preparadas para responder via luta.
Um retrocesso no direitos das mulheres não será um processo simples. As mudanças significativas em medidas sociais que tem ocorrido principalmente em países desenvolvidos, não poderão ser facilmente revertidos. Mulheres (e muitos homens) não aceitarão que o lugar das mulheres volte a ser a casa e não o mercado de trabalho. Mulheres lutarão firmemente para defender os progressos econômicos e sociais que aconteceram.
Haverá inevitavelmente tentativas de ressuscitar velhos preconceitos como forma de minar as lutas, para impor uma divisão entre homens e mulheres, especialmente nos locais de trabalho. Qualquer tentativa de dividir e enfraquecer trabalhadores deve ser fortemente combatido porque uma luta vitoriosa para defender e aumentar direitos das mulheres é possível apenas em conjunto com uma luta anticapitalista envolvendo a classe trabalhadora unida.
Baseado na competição e na busca do lucro, o capitalismo gera a exploração, pobreza, opressão, violência, guerra e degradação ambiental. É um sistema podre que limita e destrói a vida de trabalhadores e jovens com mulheres duplamente oprimidas e restringidas por conta do gênero. As mulheres, portanto, tem um interesse em particular por uma alternativa ao sistema capitalista.
Uma alternativa socialista é baseada no interesse social e não na propriedade privada de produção, no controle democrático de produtores e consumidores e não da elite burguesa. Onde o lucro não determina o que deve ser produzido, e onde desigualdade e relações hierárquicas de poder e riqueza são trocados por cooperação, igualdade e respeito mútuo nacionalmente e internacionalmente.
A vida poderia ser muito diferente para todos mas especialmente para as mulheres. Uma economia democraticamente planejada liberaria recursos para garantir uma renda decente e uma independência econômica para todos. Prestação de serviços públicos de qualidade como creche, atenção à saúde, educação, habitação, transporte etc. dariam à mulher uma escolha real sobre todos os aspectos de sua vida. Uma sociedade baseada na igualdade e cooperação lançaria as bases para uma vez por todas um fim a todas as formas de sexismo e violência contra a mulher; e então as mulheres finalmente seriam libertadas de verdade.