PSOL em uma encruzilhada

Fortalecer as lutas e uma alternativa socialista para derrotar Bolsonaro e o neoliberalismo

Cada dia vemos novas razões para a urgência de derrotar Bolsonaro: as mortes causadas pelas chuvas, o aumento dos preços e a fome, a sabotagem da vacinação das crianças contra a Covid, novos assassinatos racistas, privatizações, cortes sociais e liberação de agrotóxicos e garimpo. 

A pesar de inúmeras crises e protestos, o governo Bolsonaro sobreviveu até agora e o debate está cada vez mais centrado nas eleições. Porém, a derrota de Bolsonaro e do neoliberalismo não se resume ao que acontece nas urnas.

Não tem como vencer essa guerra sem fortalecer as lutas e atacar as causas que levaram ao surgimento do monstro Bolsonaro. Se não, corremos o risco de que a extrema direita não só sobreviverá, mas tenha possibilidade de voltar fortalecida no próximo período.

Nessa situação o PSOL tem um papel fundamental para apontar uma alternativa socialista que possa derrotar Bolsonaro nas ruas, nas urnas e após as eleições. 

À primeira vista, a tarefa parece simples: vote em Lula e tudo volta ao normal.

Porém, Bolsonaro não surgiu do nada. Foi a “normalidade” anterior que gerou esse monstro e Lula vem demonstrando que ele não aprendeu nada com os erros que nos trouxeram até aqui.

Lula aposta nas ilusões de que é possível sair da crise e melhorar a vida do povo sem uma ruptura não apenas com o capitalismo, mas até mesmo com as políticas neoliberais em geral.

A política de alianças com o centro e a direita, que impediu mudanças estruturais e abriu espaço para o golpismo, permanece, agora coroado com o acordo de colocar Geraldo Alckmin como vice. 

Alckmin foi por mais de uma década a principal figura pública da burguesia e do projeto neoliberal no Brasil, como governador de São Paulo e candidato a presidente, além de apoiar o golpe contra Dilma.

Não existe frente de esquerda com Lula

Por isso é um grande equívoco criar a ilusão de que existe a possibilidade de uma frente de esquerda com Lula, como faz a maioria da direção do PSOL.

Não faz sentido repetir hoje as táticas legítimas utilizadas pela esquerda socialista até 2002, quando se faziam chamados para que Lula não fizesse alianças com a burguesia e que adotasse um programa socialista. O PT governou o país por 13 anos sem qualquer ruptura com o sistema político e econômico. Mesmo durante o golpe de 2016 e a prisão de Lula em 2018, ele manteve a defesa das instituições podres desse sistema.

Também não se trata de uma tática pontual para mostrar os limites da candidatura de Lula. Isso só teria credibilidade se o PSOL junto a isso estivesse construindo sua própria pré-candidatura, para mostrar que há um plano alternativo.

O plano A e B da maioria é uma aliança com Lula e os sinais que são emitidos pela direção do PSOL são que isso não muda com Alckmin, argumentando algum avanço em pontos programáticos. 

Lula pode defender o fim do teto de gastos, mas combinado com sinalização de “responsabilidade fiscal”. Ele já levantou a possibilidade de rever partes da reforma trabalhista. Lula não deve revogar a reforma da previdência, mas talvez ajuste algo. Porém, essas medidas não serão suficientes para reverter a profunda crise social que vivemos.

A resolução da executiva do PSOL de 11 de fevereiro fala em abrir negociações sobre a composição de chapa, mas também o papel do PSOL na coordenação de campanha de Lula, mostrando que o programa e Alckmin não serão impeditivos.

A resolução minimiza também as críticas ao próprio PT, colocando como a situação piorou “desde a retomada da agenda neoliberal”. Obviamente, os governos Temer e Bolsonaro aprofundaram e agravaram os ataques neoliberais, mas é errado dar a impressão de que durante os governos do PT não havia uma agenda neoliberal.

Os governos do PT combinaram medidas sociais com a manutenção de toda a agenda neoliberal dos governos de FHC, acrescentando medidas como a reforma da previdência, a lei dos PPPs, etc., além do duro ajuste fiscal e uma versão do teto de gastos no último governo Dilma.

Mesmo após o golpe, o PT segurou as lutas e subordinou-as a estratégia eleitoral, como depois da greve geral de abril de 2017, onde havia a possibilidade de derrubar o ilegítimo governo Temer. Porém, a linha do PT era de centrar o fogo na reeleição de Lula em 2018, algo que o “juiz ladrão” Sergio Moro conseguiu sabotar. Novamente, em 2021 não se jogou um peso total nas mobilizações pelo Fora Bolsonaro, já que a linha era de sangrar Bolsonaro, mas não o derrubar.

O PSOL tem jogado um papel importante para mostrar um outro caminho, primeiro como oposição de esquerda aos governos do PT e depois aos governos de Temer e Bolsonaro, combatendo a direita e impulsionando as lutas. 

O partido conseguiu se fortalecer nas últimas eleições, com programa e candidaturas próprias, mesmo se o espaço por vezes era limitado. Esse foi o caso da candidatura de Guilherme Boulos em 2018, que teve somente 0,6%, mas que contribuiu para o crescimento das bancadas e os avanços nas eleições de 2020. Porém, a linha de adesão à candidatura de Lula está colocando em risco essa trajetória.

Candidatura própria contribui para a derrota de Bolsonaro

Não há dúvida que a derrota de Bolsonaro é o tema central para essas eleições. O PSOL deve deixar explícito que votaremos em Lula no segundo turno para derrotar Bolsonaro, como fizemos em 2018. Estamos dispostos até a retirar a candidatura e chamar o voto no Lula no primeiro turno se existir algum risco de termos apenas a direita no segundo turno.

Mas é fundamental que a esquerda socialista tenha uma expressão política nesse processo, defendendo políticas anticapitalistas e socialistas.

Uma candidatura da esquerda socialista no primeiro turno não atrapalha, e sim ajuda a combater Bolsonaro. O papel de uma candidatura socialista nesse cenário seria o de apresentar o programa necessário para derrotar a direita, o bolsonarismo e a agenda neoliberal, que sabemos que Lula não irá apresentar. Seu foco seria o enfrentamento a Bolsonaro e não a polarização com Lula. 

Desmonte do perfil próprio

A ameaça de um desmonte do perfil independente do PSOL vai além do apoio a Lula no primeiro turno. Há um risco que essa política se repita em estados importantes, como por exemplo apoiando a candidatura de Marcelo Freixo, que tem ido cada vez mais ao centro desde sua saída do PSOL, a governador de Rio de Janeiro.

A pré-candidatura de Guilherme Boulos em São Paulo está mantida, mas sob forte pressão do PT, que quer garantir a eleição de Fernando Haddad. Porém, o peso dado à argumentação da necessidade de unificar a “esquerda” para derrotar o tucanato, minimizando o balanço político do PT, enfraquece a defesa da pré-candidatura na medida em que Haddad está a frente nas pesquisas.

O cenário eleitoral de polarização entre Lula e Bolsonaro pode diminuir o espaço do PSOL nas eleições proporcionais. O partido também perdeu figuras importantes no Rio de Janeiro, que era uma base eleitoral forte. Mas o pior erro que o PSOL pode cometer nesse cenário é diluir a sua diferenciação com o PT ao invés de mostrar que tem um projeto alternativo. 

O risco de não superar a cláusula de barreira abriu para a proposta de fazer uma federação partidária com a Rede, rebaixando ainda mais o perfil do partido. A Rede não é um projeto de esquerda ou classista. Pelo contrário, Marina Silva chamou voto no Aécio Neves e junto com Heloísa Helena defende voto no Ciro Gomes. Uma federação vai muito além de uma coligação eleitoral. Ela vale por quatro anos e em todos nos níveis: nacional, estadual e municipal, com programa conjunto. 

A luta não acaba com as eleições

A lógica da política majoritária do PSOL abre também para a possibilidade de uma participação em um futuro governo Lula, o que seria um grave erro. O partido deve manter uma postura independente e construir as bases para uma oposição de esquerda. 

É provável que, ao adotar posturas conciliatórias e moderadas sem fazer transformações estruturais no sistema econômico e político, um governo de Lula empurre a esquerda a uma nova desmoralização. Se não houver uma alternativa de esquerda ao lulismo, isso pode acabar abrindo espaço para uma recuperação da direita ou extrema-direita.

É por isso que a luta contra a extrema direita no Brasil não pode limitar-se ao processo eleitoral. Ela é uma luta social e política que se dá nas ruas, nos bairros, nos locais de trabalho e estudo e seguirá seja quem for que ganhe as eleições.

As próximas semanas e meses serão decisivas para o futuro do PSOL como eixo do processo de reorganização da esquerda. Lutaremos para que a conferência eleitoral de abril rejeite a linha de adesismo ao PT e Lula e lance uma candidatura própria, em aliança com partidos e organizações da esquerda socialista e movimentos sociais combativos e que levante um programa anticapitalista e socialista de ruptura com o neoliberalismo e o sistema que criou Bolsonaro, o capitalismo.

  • Fora Bolsonaro, Mourão e a agenda neoliberal e autoritária!
  • Unir as lutas contra Bolsonaro e por direitos, empregos, salário, terra, liberdades democráticas e pela vida!
  • Investimentos públicos massivos para sair da crise, em especial para saúde, vacina, educação, emprego, moradia e transporte. 
  • Controle de preços de alimentos, energia e combustível e auxílio emergencial de um salário mínimo.
  • Por 1% do PIB para combater a violência contra a mulher e população LGBTQIA+. Contra o genocídio do povo negro: contra a guerra às drogas, pela desmilitarização e controle social das polícias.
  • Desmatamento zero, não à exploração em terras indígenas e quilombolas e populações tradicionais. Reforma agrária já! Estatização das mineradoras e Petrobrás 100% estatal. Investir em energias alternativas e transporte de massas público e gratuito não baseado em combustíveis fósseis.
  • Romper com a política neoliberal! Revogar as reformas da previdência e trabalhista. Reestatizar as empresas privatizadas. Revogar o teto de gastos, Lei de Responsabilidade fiscal e Desvinculação das Receitas da União.
  • Taxar os super-ricos e grandes fortunas! Cancelamento e auditoria da dívida pública Fim das exonerações fiscais para grandes empresas.
  • Romper o poder econômico sobre a sociedade: estatização dos bancos e sistema financeiro e das grandes empresas que controlam a economia, sob controle e gestão de representantes de trabalhadores. 
  • Por uma candidatura a presidente do PSOL em aliança com partidos e organizações da esquerda socialista e movimentos sociais combativos e que levante um programa anticapitalista e socialista!
  • Por uma saída anticapitalista e socialista da classe trabalhadora para a crise!

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