Para onde vai o conflito ucraniano?
O presidente Putin anunciou agora que a Rússia reconhecerá a independência das duas regiões disputadas na Ucrânia – Donetsk e Luhansk. Ele instruiu as tropas russas a agirem como “forças de manutenção da paz”. Isto marca outra etapa extremamente perigosa no que poderia acabar como a pior guerra vista na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
Há mais de três meses, os belicistas estão provocando a histeria. As potências ocidentais anunciaram que a ocupação russa da Ucrânia começaria – 3 horas da manhã, hora local, em 16 de fevereiro. Conforme o prazo se aproximava, os gritos dos belicistas aumentavam, instalando um certo grau de pânico na Ucrânia. O governo anunciou a mobilização de tropas e reservistas. As companhias aéreas pararam de voar, enquanto as passagens das ainda ativas subiram para cinco vezes seu preço – a guerra, afinal, é sempre lucrativa para alguns! Quarenta países anunciaram que estavam evacuando famílias de diplomatas de Kiev – alguns para a cidade ucraniana ocidental de Lviv. Vinte vôos fretados foram organizados para permitir a fuga de personalidades, oligarcas e suas famílias, enquanto a ajuda militar e equipamentos inundavam a Ucrânia.
Enquanto isso, a população foi convidada a “não entrar em pânico”!
Com o fim do prazo, um jornal russo comentou cinicamente “a guerra foi adiada”. Muitos ucranianos sem dúvida suspiravam de alívio quando acordaram na quarta-feira. A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova, descreveu como “vergonhoso” as alegações estadunidenses de um ataque pendente. Ela pediu à mídia que a informasse sobre as datas futuras de um ataque russo à Ucrânia para que ela pudesse planejar suas férias. O Kremlin falou, em 16 de fevereiro, sobre ter derrotado “a histeria que se instalou em todo o mundo, o que não é mais do que uma campanha de informação absolutamente sem precedentes para provocar e impulsionar tensões na Europa”.
As tensões ainda continuam a aumentar. A Casa Branca alegou que a invasão da Ucrânia era iminente. Boris Johnson declarou que o Kremlin ocupará todo o país, e a Ministra das Relações Exteriores do Reino Unido, Liz Truss, fala da Rússia ocupando a Europa Oriental.
O Kremlin contradisse estas alegações, negando que eles têm planos de invadir. O Ministério da Defesa russo distribuiu vídeos mostrando tropas e equipamentos retornando ao quartel. Mas, em vez de retornar as tropas russas que estavam em Belarus “para exercícios conjuntos”, foi anunciado que elas ficariam de vez. As bravatas beligerantes russas continuaram com novos jogos de guerra realizados durante o fim de semana para testar mísseis balísticos hipersônicos.
A luta se intensifica na Ucrânia Oriental
O fim de semana viu novos sinais preocupantes. A manhã de sexta-feira começou com trocas de fogo de artilharia ao longo da fronteira entre o território controlado por Kiev e as disputadas repúblicas da Ucrânia Oriental – Donetsk e Luhansk (DNR/LNR). Como os residentes locais apontam, isto não era particularmente novo, pois a guerra perdura faz 8 anos, com mais de 14 mil perdendo suas vidas, mas este foi um aumento dramático. Os observadores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) relatam que os ataques ocorreram em mais de 30 locais. Mais tarde, o jipe pertencente ao chefe de polícia de Donetsk foi explodido fora de seu escritório, embora um residente local tenha comentado que nunca havia visto oficiais de tão alta patente dirigindo um carro tão barato.
Na segunda-feira, uma reunião do Conselho de Segurança da Rússia, claramente encenada para a televisão, foi realizada. Uma após outra, figuras de alto nível pediram o reconhecimento das duas repúblicas disputadas DNR/LNR. Quando o Procurador Geral falou fora de linha dizendo que apoiava o chamado para que a DNR/LNR se unisse à Federação Russa, ele foi corrigido por Putin, que disse que isso não está sendo discutido: estamos apenas discutindo o reconhecimento da independência das duas repúblicas.
Mais tarde à noite, Putin apareceu na televisão para “dirigir-se à nação”. Em uma incursão de meia hora na história que remonta ao século IX, ele explicou como a Ucrânia era parte da Rússia. Em uma parte significativa de seu discurso ele atacou Lenin e os bolcheviques, que, disse ele, “criaram a Ucrânia moderna, usando métodos muito brutais em relação à própria Rússia pela separação, arrancando parte de seu território histórico”. Stalin, porém, nas palavras de Putin “na véspera e após a ‘Grande Guerra Patriótica’ [2ª Guerra Mundial] a uniu de volta à URSS…”. Ele passou a apoiar a abordagem stalinista da questão nacional após a revolução, quando Stalin tentou criar a Federação Socialista Russa com a Ucrânia subserviente como parte da Rússia, em oposição à formação de Lenin da URSS com a Ucrânia como um parceiro igualitário.
Ele passou a descrever a onda de corrupção que havia dominado a Ucrânia, a falta de democracia e, como ele chamou, o golpe de estado de inspiração ocidental que havia tomado o poder em 2014. Ele reclamou que aqueles que estavam no poder organizavam assédio, verdadeiro terror contra aqueles que se opunham a essas “ações inconstitucionais”. Políticos, jornalistas, ativistas sociais são escarnecidos e humilhados publicamente. As cidades ucranianas são atingidas por uma onda de pogroms e violência, uma série de assassinatos abertos e impunes. Muitos dos que assistiam a este discurso se perguntavam se ele estava falando da própria Rússia!
Ele terminou anunciando que a Rússia agora reconheceria oficialmente a independência e a soberania da DNR e do LNR. As tropas russas foram ordenadas para as duas repúblicas como “forças de manutenção da paz”. Em poucas horas foi noticiado que tanques russos já estão em Donetsk.
Este é um movimento extremamente perigoso. Um “diplomata sênior dos EUA” sugeriu ontem que “as tropas russas que se deslocassem para a região de Donbas não seriam novas”. Mas isto é notavelmente ingênuo. Já está claro que haverá conflito sobre onde estarão as fronteiras das “repúblicas independentes”.
Nem o DNR nem o LNR ocupam a totalidade das antigas regiões de Donetsk e Luhansk, partes significativas da região, no caso de Donetsk, mais de 40% dos 4 milhões de habitantes e dois terços da área permanecem sob o controle de Kiev. Leonid Kalashnikov, figura sênior da Duma russa e membro do partido comunista, apelou para que as tropas assumissem a totalidade das duas regiões. Se o papel dos “mantenedores da paz” é enfrentar as tropas ucranianas na atual linha de frente para assumir a totalidade dessas regiões, há um perigo muito real de uma escalada dramática e fora de controle da guerra.
Ainda há esperança para a diplomacia?
Após a Conferência de Segurança de Munique do fim de semana, as negociações diplomáticas podem continuar, mas é quase certo que agora é tarde demais para fazer alguma diferença. A primeira reação de Macron e Scholz ao anúncio de Putin foi expressar desapontamento, mas esperando que as negociações pudessem continuar.
Durante a Conferência de Munique, Zelensky expressou uma verdadeira insatisfação com a inação ocidental. Desde o início, os EUA tentaram apresentar uma frente unida com a União Europeia contra a Rússia. Tiveram que superar a resistência alemã à ameaça de sanções contra o gasoduto Nord Stream 2. Falando na conferência, o Secretário de Estado dos EUA Antony Blinken elogiou o Ministro das Relações Exteriores alemão e membro do Partido Verde, Annalena Baerbock, por agir de forma coordenada e complementar, enquanto o chanceler Scholz prometeu que a Alemanha precisava de “aviões que voem, navios que possam partir para o mar, soldados que estejam perfeitamente equipados para suas tarefas perigosas – estas são coisas que um país do nosso tamanho, que carrega uma responsabilidade muito especial dentro da Europa, deve ser capaz de arcar. Devemos isto também aos nossos aliados na OTAN”. Mas por trás dos discursos sangrentos de pessoas como Johnson, os apelos de Zelensky para iniciar “sanções preventivas” contra a Rússia não foram ouvidos.
A atenção então passou para o presidente francês Emmanuel Macron. Durante a Conferência de Munique, ele anunciou que tinha tido “garantias pessoais” do presidente Putin. Não pela primeira vez, é claro, um líder mundial voltou de uma conferência em Munique reivindicando tais garantias, como fez o ex premier britânico Neville Chamberlain em 1938, após se encontrar com Hitler. O Secretário de Defesa britânico falou do “cheiro de Munique”, implicando que o resultado tinha sido uma repetição do “apaziguamento” anterior à Segunda Guerra Mundial. Pelo menos Macron não acenou com um pedaço de papel. No entanto, a próxima etapa pretendida era um retorno ao “formato Normandia” – negociações entre a França, Alemanha, Ucrânia e Rússia sobre a implementação de Minsk 2 e o status de DNR/LNR. Se existe agora a mínima possibilidade de um acordo diplomático, será neste sentido.
Não será de longe fácil chegar a um acordo. A Rússia usará a ocupação efetiva das duas repúblicas para colocar uma enorme pressão sobre Kiev, mesmo que ela não invada mais o país. Zelensky, entretanto, estará sob uma tremenda pressão para não ceder. Mas a própria existência da DNR/LNR impedirá a Ucrânia de ingressar na OTAN ou na União Europeia, já que países que não podem garantir suas próprias fronteiras não são aceitos.
O sofrimento na Ucrânia Oriental
Aqueles que vivem em DNR/LNR estão atualmente sofrendo as consequências da crise. No fim de semana, os líderes pró-russos e senhores da guerra anunciaram a mobilização para suas forças de defesa e a evacuação de mulheres, crianças e idosos para a Rússia. Dezenas de milhares fugiram durante a noite, mas foram largados para dormir em ônibus antiquados em temperaturas abaixo de zero. Muitos sentem que foram levados ao pânico para sair desnecessariamente – uma mãe relatou como ela havia sido persuadida a sair com seus filhos, sem sequer ter tempo de contar ao marido.
Enquanto isso, os políticos russos estão cinicamente insensíveis. Enquanto a TV russa cobre a chegada de crianças e avós refugiados em lágrimas vindas da Ucrânia Oriental, os parlamentares sugerem que eles deveriam ser alojados nos apartamentos daqueles que morreram de Covid. Outros propõem que os funcionários estatais percam seu 13º salário (um bônus de fim de ano para compensar os salários baixos) para pagar por isso. Os pacientes que se recuperam de doenças graves estão sendo expulsos dos hospitais e albergues estudantis que estão sendo instalados para acomodar refugiados.
Muitos relatórios de DNR/LNR sugerem que há um grande ceticismo em relação às autoridades. As pessoas falando anonimamente à imprensa dizem que os ataques estão sendo exagerados, reclamam que não podem falar abertamente por telefone, sabendo que estão sendo ouvidos. Como comentou alguém: “Os ricos, os empresários, os banqueiros e os bandidos – todos eles fugiram em 2014”. Outros falam da guerra sendo provocada pelos políticos.
Interesses de ucranianos comuns sendo sacrificados
É provável que a Ucrânia sofra as consequências por meses, se não por anos. Empresas estrangeiras têm fugido e houve uma fuga de capital de US$ 15 bilhões como resultado do aumento do temor de guerra, uma soma muito além dos pouco mais de US$ 2 bilhões de ajuda financeira prometidos pelos EUA e pela União Europeia na semana passada.
Isto foi refletido pelo discurso de Volodymyr Zelensky durante a Conferência de Segurança de Munique neste fim de semana. Ele falou da Ucrânia como o “escudo da Europa”, mas reclamou que desde 2014 tanto a OTAN quanto a União Europeia se recusam a aceitá-la como membro. Ele advertiu que o “formato Budapeste” (o acordo de 1994 sob o qual a Ucrânia renunciou às armas nucleares em troca de garantias de segurança) havia deixado o país sem armas e sem segurança. Nesse caso, ele disse: “Ficaremos livres de nossas obrigações”. Ele prosseguiu: “Se todos os dias nos dizem que amanhã haverá uma guerra, o que acontecerá no país, exceto o pânico? O que será de nossa economia? Você nos diz: realizar reformas, melhorar sua gestão, combater a corrupção – e então nós o ajudaremos. Mas em nossas fronteiras, há 150 mil soldados. Talvez vocês devam fazer algo a respeito disso antes de exigir que façamos algo”?
Uma nova guerra fria
A situação atual faz parte da polarização e realinhamento em desenvolvimento do mundo entre os interesses imperialistas dos EUA e da China. A OTAN vem intensificando sua presença na Europa Oriental, agora com bases na Polônia, Romênia e nos três países bálticos, que fazem fronteira com a ex-União Soviética. 12 mil soldados da OTAN dão suporte a um quarto de milhão de efetivos locais nesses países. Desde 2016, o Ministério da Defesa dos EUA enviou ajuda militar no valor de US$ 1,65 bilhão para a Ucrânia, enquanto o Reino Unido enviou US$ 1,7 bilhão desde 2020. Outras potências da OTAN, como Canadá, França e Turquia, assim como os países bálticos, também ajudaram, embora em uma escala muito menor. Durante as tensões atuais, a OTAN tem enviado rapidamente mais tropas e equipamentos para a Ucrânia e seus vizinhos. Esta é uma consequência real das políticas de linha dura do governo Biden, que nomeia a China como “o principal concorrente” e a Rússia como “o mais perigoso”.
Os esforços de Biden para persuadir a Alemanha e a França a apresentar uma frente unida está se defrontando com seus interesses. Não menos importante, se houver uma guerra generalizada, haverá uma crise econômica e uma onda maciça de refugiados. A Alemanha depende da Rússia para seu fornecimento de energia, particularmente gás, sanções contra as quais levarão à escassez de energia e a um aumento maciço dos preços para os consumidores da União Europeia. Esta é parte da razão pela qual os EUA têm pressionado a União Europeia a diversificar seus fornecedores de energia, de modo que ela não dependa tanto da Rússia. A Alemanha tem sido pressionada a retirar seu apoio ao Nord Stream 2, que está aguardando a certificação final para iniciar as operações.
Neste contexto, os EUA inesperadamente retiraram seu apoio ao gasoduto Mediterrâneo Oriental, que teria permitido o trânsito direto de energia de Israel e do Oriente Médio para a Europa. Parece que isto foi feito para apaziguar a Turquia, pois Erdogan expressou seu apoio aberto à Ucrânia nesta crise, e oferece uma rota de porta traseira para transferir armas para Kiev. Já foi construída uma fábrica para construir drones turcos em Kiev.
Depois de semanas de alertas não confirmadas, a Casa Branca dobrou a aposta, prevendo ataques orquestradas pelos russos como um pretexto para invadir. A estratégia militar do Kremlin inclui o desencadeamento da “guerra híbrida” – o uso combinado de guerra eletrônica, tropas negáveis (mercenários), interferência política e provocações. Não é o único a usar esses métodos. Os EUA, britânicos, franceses e outras forças imperialistas há muito praticam tais métodos. Seu uso, no entanto, no submundo oculto, torna difícil analisar quem realmente fez o que, quando e onde. A perigosa mistura do belicismo ocidental com a guerra cibernética russa criou uma situação que logo será impossível de controlar.
O imperialismo russo
As políticas do Kremlin também endureceram durante a última década. Quando agora se queixa da expansão da OTAN na Europa Oriental, esquece que durante a primeira década do mandato de Putin, “cooperou” com a OTAN, permitindo até mesmo a utilização de uma base aérea na Rússia como ponto de escala para o Afeganistão. Quando Putin foi eleito pela primeira vez, até mesmo falou da possibilidade de a Rússia aderir à OTAN! Mas desde então a direção tem sido no sentido oposto. Tendo fortalecido sua posição global na Síria e na África Central, aumentou sua influência em Belarus e no Cazaquistão. O mais preocupante para o imperialismo estadunidense é que a cooperação sino-russa está aumentando. Durante os jogos de inverno de Pequim, Xi e Putin assinaram um novo acordo para a Rússia aumentar o fornecimento de energia à China em troca de oposição conjunta a novas “revoluções coloridas”.
Indicativas da atmosfera em que o Kremlin agora toma suas decisões são as fotos das longas discussões da mesa de Putin, primeiro com Macron, e depois com o Ministro das Relações Exteriores Sergey Lavrov e o Ministro da Defesa Sergey Shoigu no final de uma mesa ainda mais longa! Desde o início da pandemia, Putin tem estado isolado da sociedade e os conselhos que ele recebe são cada vez mais desequilibrados. Lavrov, durante sua reunião, foi o responsável pelas discussões com Macron e outros. Seu comentário foi que embora não tenha havido progresso nas principais exigências da Rússia, incluindo a retirada da OTAN para as fronteiras de 1997, houve desenvolvimentos interessantes em outras áreas. Lavrov disse que ainda havia espaço para a diplomacia, mas se Putin quisesse, ele deveria avançar com o reconhecimento da DNR/LNR.
Uma decisão formal de reconhecer as duas repúblicas foi tomada na Duma, por iniciativa do reacionário partido comunista. Enquanto muitos deputados do partido governista votaram a favor da resolução, a posição do Kremlin foi de tomar nota da decisão, sugerir que os deputados da Duma estão refletindo a opinião pública, e deixar a decisão sobre quando assinar a proposta a Putin. O Ministério das Relações Exteriores também expressou sua oposição ao reconhecimento imediato das repúblicas.
Apesar de ser autoritário, o regime ainda tem que levar em conta se os russos aceitarão uma guerra contra a Ucrânia. 2022 não é 2014, quando a tomada da Criméia pela Rússia resultou em uma onda patriótica maciça. Sem ânimo para uma guerra contra a Ucrânia, a maioria dos russos está lutando com padrões de vida mais baixos, inflação crescente e, durante a pandemia, mais de um milhão de “mortes em excesso”. A desconfiança em tudo o que o governo diz está crescendo. Há relatos de oposição a uma invasão total mesmo de dentro das fileiras do exército e dos serviços de inteligência.
Putin pode estar contente de ter o apoio de Pequim, mas se uma guerra prolongada drenar recursos econômicos, ele pode muito bem ter que pedir a Xi que lhe pague a fiança.
A posição dos socialistas sobre a Ucrânia
Esta situação demonstra o que dissemos há 30 anos, que quando a União Soviética entrou em colapso: nem as economias, nem os direitos nacionais e democráticos dos habitantes da região seriam protegidos com a restauração do capitalismo.
Os socialistas não deveriam tomar partido entre as diferentes potências imperialistas. Não é nossa tarefa julgar as afirmações dos russos de que foi o exército ucraniano que iniciou o bombardeio de artilharia, ou de Kiev (ecoado pela Casa Branca) que as forças das repúblicas disputadas foram responsáveis, e que estas foram operações orquestradas de inspiração russa para justificar uma invasão. Também é possível que os ataques não tenham sido sancionados pelo Kremlin, mas organizados pelos líderes reacionários das duas repúblicas para pressionar a Rússia a intervir.
Mas o que é importante é o direito da Ucrânia de ser um país independente. A ASI se pronuncia incondicionalmente por esse direito. Todas as tropas imperialistas, sejam da Rússia ou da OTAN, devem ser retiradas imediatamente da Ucrânia e da Europa Oriental. Para diminuir a tensão, as tropas russas atualmente ao longo da fronteira devem voltar para os quartéis.
Desde o colapso da União Soviética, quando a Ucrânia se tornou independente, sua elite governante e os oligarcas que os apoiam envolveram o país no conflito entre as potências econômicas do mundo. Os recursos naturais do país, os bancos e as grandes empresas deveriam ser tirados das mãos dos oligarcas e das multinacionais e transformados em propriedade pública, sob controle democrático de trabalhadores.
Ao mesmo tempo, a Ucrânia deve respeitar os direitos de suas próprias minorias e regiões. Deve-se lembrar que foram as tentativas do governo após os protestos de 2013 de restringir os direitos em língua russa e o medo de uma parte da população em relação ao crescimento da influência de extrema-direita que criou o descontentamento original que o regime russo então explorou. Os direitos linguísticos devem ser respeitados. Se uma minoria ou região deseja autonomia, ou mesmo a secessão, deve ter o direito de fazê-lo. Mas qualquer decisão deve ser tomada sem qualquer presença militar, e em votos democráticos, controlados pela população local.
Não podemos ter confiança em nenhuma das potências imperialistas. O Ocidente tem demonstrado repetidamente – no Iraque, na Síria, na Sérvia, na Líbia e em outros lugares – que não é um guardião da democracia ou da soberania. Ele está defendendo os interesses da classe capitalista que representa. A Rússia também não é certamente um defensor do povo ‘eslavo’ que pretende apoiar – suas próprias ações contra o próprio povo russo demonstram isso. O Estado russo age para apoiar os interesses da oligarquia russa, assim como o Ocidente defende suas elites. Suas “tropas de manutenção da paz não estão na Ucrânia para “manter a paz”, mas para defender os interesses econômicos e políticos da elite governante russa.
Os socialistas precisam defender um movimento antiguerra e anti-imperialista de massas. Esta pode não ser a tarefa mais fácil, pois muitos que se teriam oposto a ataques imperialistas a países como o Iraque estão agora divididos. Alguns apoiam a Rússia e a China em oposição ao imperialismo estadunidense, outros se opõem à agressão russa, dando total apoio à Ucrânia e a seus apoiadores imperialistas.
Como socialistas, porém, não podemos apoiar uma ou outra das potências imperialistas enquanto elas brigam sobre o destino da Ucrânia. Seu destino como país independente e livre de intervenção externa não pode ser confiado à elite dominante, nem do capital ocidental nem da Rússia. Somente uma luta unida da classe trabalhadora contra os belicistas em cada país pode criar uma situação na qual a Ucrânia possa ser genuinamente independente.
A classe trabalhadora ucraniana deve desempenhar um papel importante neste contexto. Se ela fosse organizada para defender casas e empregos de ataques militares, se ela garantisse que a luta não fosse desviada para as linhas nacionalistas ou pró-capitalistas, travando uma luta unida de todos os trabalhadores na Ucrânia, independentemente de nacionalidade ou idioma, ela poderia fazer um poderoso apelo de solidariedade aos trabalhadores na Rússia, Europa e EUA. Unidos de tal forma, a classe trabalhadora e a juventude podem trazer um fim ao pesadelo da guerra, garantir o direito à autodeterminação e abrir o caminho para uma nova sociedade democrática e socialista.