Protestos em 70 cidades dos EUA: “justiça por George Floyd”

Uma semana após o brutal assassinato de George Floyd, de 46 anos, por agentes da polícia de Minneapolis, protestos explodiram em todo o Estados Unidos. Em mais de 70 cidades do país, milhares de pessoas saíram às ruas em protesto contra a violência policial e exigindo o #JusticeforGeorgeFloyd. Havia mais pessoas nas ruas do que nos protestos logo após a eleição de Donald Trump em 2016 e estão acontecendo mais à medida que escrevemos. 

Em cidades como Los Angeles e Chicago, os manifestantes fecharam as ruas levantando cartazes com “No Justice, No Peace” e “Black Lives matter” (”Sem Justiça, Sem Paz” e ”Vidas Negras Importam”). Em Boston, foram realizados assembleias e, em Detroit, Nova Iorque e várias outras cidades, as pessoas marcharam exigindo justiça. Manifestantes em Washington D.C. chegaram mesmo a cercar a Casa Branca e foram impedidos de chegar mais perto por policiais e agentes do serviço secreto. 

Em todo o país, os protestos assumiram um aspecto multirracial, com imigrantes, latinas/os, muçulmanas/os e brancas/os se juntando em solidariedade e protesto. “Este é um movimento multigeracional, multirracial e multisexual da classe trabalhadora!” escreveu a Socialist Alternative Chicago (ASI-EUA) em rede social. 

Só depois desta imensa pressão nas ruas, Derek Chauvin, o policial de Minneapolis que foi filmado ajoelhado no pescoço de George Floyd durante quase nove minutos, foi acusado de homicídio em terceiro grau e homicídio culposo. 

Por todo o lado, os manifestantes foram recebidos com apoio pelas comunidades locais e da classe trabalhadora, à medida que a raiva do público por esta questão aumenta. Mas policiais e os grupos de extrema-direita aumentaram a violência em resposta aos protestos. “Acabamos de ter um grande afluxo de polícias de choque, policiais a cavalo e a patrulha estatal chegando”, informou Adam, membro da Alternativa Socialista em Columbus, Ohio. 

Em Nova Iorque, foram detidos pelo menos 100 pessoas. No Arizona, a polícia declarou os protestos como uma “assembleia ilegal” e disparou gás lacrimogêneo e spray de pimenta contra centenas de pessoas. Esta escalada levou a confrontos entre os manifestantes e a polícia, com viaturas sendo atacadas quando a raiva contra a repressão transbordou. 

No Colorado, a polícia disparou gás lacrimogêneo contra os manifestantes que se reuniram na capital do estado. Um manifestante foi intencionalmente atropelado por um motorista de SUV, que ainda atirou em uma multidão de manifestantes. 

Em Louisville, Kentucky, centenas de manifestantes reuniram-se no centro da cidade, exigindo justiça para Breonna Taylor, uma enfermeira de 26 anos que foi morta a tiro pela polícia dentro do seu próprio apartamento em março. Pelo menos sete pessoas foram feridas por tiros enquanto manifestantes cercaram um veículo da polícia. Não se sabe quem disparou os tiros, embora o presidente da câmara de Louisville tenha dito que nenhum agente da polícia disparou as suas armas.

Pelo menos três pessoas morreram durante os protestos até agora. Em Detroit, uma pessoa morreu depois de alguém em um carro ter aberto fogo sobre os manifestantes. Dois agentes federais levaram tiros em Oakland, tendo um deles morrido devido aos ferimentos. Em Minneapolis, cidade de George Floyd e onde os protestos começaram, um homem negro foi baleado e morto durante uma noite de protestos. Na cidade, a situação é tensa, uma vez que a guarda nacional foi totalmente mobilizada pelo governador do Minnesota para reprimir tudo o que considerem violência. 

Os estados de emergência e o toque de recolher estão sendo declarados em vários municípios e há uma forte presença policial em quase todos os protestos. Isto contrasta com a resposta dada aos grupos de direita e conservadores que exigiram o fim das medidas de quarentena nas semanas anteriores, em que a polícia permaneceu em silêncio à medida que grupos fortemente armados andavam pelas capitais dos estados. 

No entanto, mesmo com esta repressão, o movimento apenas cresceu e se espalhou. A raiva palpável sentida pelo público resultou na queima de edifícios e no saque de algumas grandes lojas. Em uma imagem que tem dominado as redes sociais, um prédio de apartamentos de luxo em construção em Minneapolis iluminou a noite quando foi incendiado e tornou-se um símbolo dessa raiva. Por um tempo, manifestantes expulsaram a polícia de uma delegacia e parte dela foi incendiada. 

Donald Trump ameaçou usar de violência contra os manifestantes. Numa série de tweets inflamados afirmou que “quando começam os saques, começam os tiros” (frase usado em 1967 pelo então chefe da polícia de Miami, Walter Headley, que ficou conhecido por implementar uma cultura de violência policial contra negros/as) e que os/as manifestantes ao redor da Casa Branca podem ser atacados/as por “cães cruéis e armas sinistras”. Desde então, ele tem tentado amenizar as declarações, mas as suas tentativas de mostrar simpatia pela família de George Floyd foram vistas como os gestos ocos que são. Trump tem um histórico de defesa de policiais assassinos e de grupos violentos de extrema-direita e agora está falando em mandar o exército para combater o que ele chama de “grupos de extrema esquerda”.

Em absoluto contraste com as ações da polícia e da classe dominantes, os sindicatos e sindicalistas aderiram aos movimentos de apoio aos manifestantes e exigindo justiça. Numa clara manifestação de solidariedade, os/as motoristas de ônibus de Minneapolis e de Nova Iorque recusaram-se a transportar os/as manifestantes detidos para as prisões e a transportar os agentes da polícia de e para os protestos. Assinaram também uma petição, juntamente com centenas de sindicalistas dos correios, enfermeiras/os, professoras/es e hoteleiras/os, para citar alguns que apelam à #JusticeForGeorgeFloyd e se comprometem a não ajudar o policiamento dos protestos com o seu trabalho. 

“Estamos dispostos a fazer o que pudermos para garantir que o nosso trabalho não seja utilizado para ajudar o Departamento de Polícia de Minneapolis a encerrar os apelos à justiça”, lê-se na petição escrita por Adam Birch, membro do Socialist Alternative, um motorista de ônibus de Minneapolis que também criou o grupo de membros do sindicato para o Facebook #JusticeForGeorgeFloyd, que até agora tem quase 3 mil membros.

A raiva sentida pelas pessoas nas ruas não é apenas por causa deste último assassinato policial. São décadas de opressão por uma polícia e sistema racistas que desproporcionalmente encarceram e matam a população negra no país. Além disso, pessoas estão cansadas de todo o sistema capitalista que se baseia no racismo e na opressão para funcionar. 

Em todo o mundo, a classe trabalhadora está cansada de ser explorada e de ser obrigada a pagar, muitas vezes com as suas vidas, pelas crises e a barbaridade do capitalismo. Austeridade, neoliberalismo e acumulação de recursos pelas elites super-ricas significa que, mesmo no país mais rico do mundo, os/as pobres e a classe trabalhadora, que em grande parte são negros/as, lutam cada dia para sobreviver. Embora não apoiamos saques, é uma reação compreensível depois de décadas de pilhagem das comunidades e dos direitos dos trabalhadores pelas grandes empresas. Como diz esta declaração da Alternativa Socialista de Cincinnati: “Os slogans e exigências que estão sendo levantados atingem todos os aspectos da sociedade: gentrificação, educação, empregos, prisões. A polícia é protetora deste sistema, a ponta de lança do Estado capitalista”.

Tudo isto que está acontecendo tem com o pano de fundo da crise do Covid-19. Os Estados Unidos têm um dos piores resultados em lidar com a crise. Tem um dos números mais elevados de pessoas infectadas e o maior número de mortes relacionadas com o Covid-19 no mundo. A mortalidade pelo Covid-19 na população negra é assustadoramente alta, devido as condições precárias de vida e alto índice de doenças que agravam o quadro. 

O desemprego está num nível recorde e prevê-se que atinja 15% no próximo mês, uma vez que o sistema capitalista se mostra totalmente incapaz de lidar com a pandemia e a crise econômica que está tomando proporções não vistas por gerações. Novamente a população negra é a mais afetada.

A crise vem acentuando problemas que existem há décadas e este último assassinato policial tem sido a centelha da explosão social que estamos a assistir. Mais explosões como esta podem potencialmente acontecer em outros países, mas sem um programa e uma direção claros, correm o risco de perder o ímpeto e de se esvaziarem. Como diz Kshama Sawant, vereadora da cidade de Seattle e militante da Socialist Alternative,  “o assassinato de Floyd é uma previsão arrepiante da resposta do Estado durante uma crise econômica cada vez mais profunda, que já resultou no desemprego de quase 40 milhões de pessoas. A nossa luta está apenas no início.”A classe trabalhadora e as comunidades oprimidas nos EUA, bem como no mundo inteiro, têm de se unir para lutar contra este sistema brutal e apontar o caminho para sair desta crise, construindo uma alternativa socialista.

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