Paralisação de trabalhadores da saúde
Há quase 2 meses sem receber, profissionais residentes da saúde de todo o país decidiram paralisar! O motivo é o não pagamento das bolsas-salário destes trabalhadores, que estão na linha de frente durante a pandemia!
Estamos há quase 2 meses sem salário e nos endividando. Entramos na residência em 2/3 e, desde então, nos comprometemos com dedicação exclusiva ao programa. Como cumprimos 60h semanais, não temos como ter outra fonte de renda. Nossa primeira bolsa deveria ter caído até o 5º dia útil de abril, o que já era ruim, porque passamos o primeiro mês sem qualquer renda acumulando contas, já que muitos residentes mudam de cidade quando são aprovados. Esse é meu caso.
Sou de São Paulo e, quando passei na residência em Santos, tive que me mudar, alugar apartamento e me comprometer com contas. Com o isolamento social, parte da renda dos meus pais diminuiu, o que apertou bastante nossas contas. Já é dia 24/04 e sigo sem receber minha bolsa.
O Ministério da Saúde, responsável pelas bolsas-salário, argumenta que só não receberam os residentes que estão com os dados bancários errados. O que é impensável, pois todos os residentes confirmaram seus dados diretamente ao ministério logo no início do mês de março e são mais de 700 residentes sem receber. Ou seja, o ministério além de não pagar, se desresponsabiliza e culpa os próprios trabalhadores!
Tenho colegas que não têm como ir trabalhar sem a bolsa, quanto mais pagar contas com juros! Estamos nos endividando pela irresponsabilidade e desorganização do Ministério e do governo. E certamente nossas bolsas, se caírem, não virão com os juros dos dias atrasados.
Além da gente ter que se preocupar com a qualidade duvidosa dos EPI’s (equipamentos de proteção individual) disponíveis nas unidades de saúde, estarmos longe das nossas famílias, com medo de contaminar outras pessoas, preocupados com a saúde física e mental de nossos colegas, acumulamos ainda a preocupação do endividamento. Mesmo sem bolsa, estamos trabalhando todos os dias nos serviços de saúde e atendendo à população durante a pandemia. Esse é o nível do descaso do governo federal com profissionais que, nesse momento, estão na linha de frente do combate ao coronavírus!
A cereja do bolo é o desconto de contribuição ao INSS. Os poucos residentes que receberam antes do dia 5/4, tiveram o desconto de 11% de contribuição ao INSS (como deveria ser mesmo). Conforme a organização e mobilização do Fórum Nacional de Residentes em Saúde, durante o mês de abril a bolsa de alguns residentes foi caindo em dias aleatórios e outros (como eu) seguem sem receber. Os que foram recebendo durante o mês, já foram descontados em 14% da contribuição (percentual modificado a partir da reforma da previdência). Ou seja, além do atraso da bolsa, o desconto foi maior!
O desinvestimento na saúde pública não é de hoje. Assim como os residentes precisam do básico para trabalhar, todos os trabalhadores da saúde sofrem com o desmonte do SUS e com a lógica privatista na saúde pública. As extensas jornadas de trabalho, baixa qualidade dos EPI’s e a maioria das equipes incompletas já sobrecarrega diariamente os trabalhadores da saúde. Cenário que também desabastece a produção científica no país, que deveria mais do que nunca, em meio a uma pandemia, ser incentivada e investida. Enquanto isso, o governo Bolsonaro corta mais orçamento das universidades federais.
Hoje estamos em paralisação nacional dos profissionais residentes da saúde! Com uma programação de assembleias regionais, divulgação da nossa reivindicação e uma live às 20h para exposição da pauta. Enquanto o Ministério da Saúde e o governo federal dizem que estão incentivando os trabalhadores com bonificação de 667 reais, a verdade é que não estão pagando nem os nossos salários.
Salário e proteção adequada é o que precisamos para exercer nosso trabalho, tão reforçado como essencial nesse período.Amor à profissão ainda não é aceito para pagar boleto.