Venezuela: construir uma alternativa independente e socialista da classe trabalhadora
Entrevista ocorrida em agosto de 2008 durante a Escola de Quadros Européia do CIO realizada por Luciano Barboza com a Sanndy Martinez, do Coletivo Socialismo Revolucionário (CIO na Venezuela).
Crise econômica atinge Venezuela
– Apesar dos altos preços do petróleo no ano de 2008, a crise econômica atingiu a Venezuela. O crescimento de 8,8% no primeiro semestre de 2008 caiu para 4,8% no segundo semestre.
– As medidas que Chávez fez para frear essa desaceleração econômica, foram feitas no marco de um acordo com a burguesia, baixando os impostos sobre os bancos e ampliando a linha de crédito para a burguesia venezuelana. O fortalecimento da pequena e grande burguesia que seguem se beneficiando dos créditos do governo, não mudara o rumo da crise na Venezuela, pois esses empresários não investem no país, investem na verdade fora do país e por isso recebem muitos lucros.
– Os aumentos de salários feitos pelo governo Chávez não são suficientes para compensar a inflação, que chega há 27%. A cesta básica por exemplo aumentou 43% no último período, o que causou uma queda no poder aquisitivo dos trabalhadores em cerca de 20%. Na verdade a alta crise econômica na Venezuela esta sendo tapada pelos altos preços do petróleo.
PSUV
– O PSUV foi formado de forma burocrática por uma pequena direção política distante das massas, mas com apoio de Chávez chegou a 5 milhões de filiados (mas não militantes ativos). A derrota de Chávez no referendo de 2007 se sucedeu de eleições internas no partido, e nessas eleições participaram 1 milhão e 400 mil venezuelanos, 33% dos filiados de início do partido. Isso demonstra que as massas não concordaram com a imposição de dirigentes no partido.
– O PSUV teve uma política sectária de não apoiar os candidatos de outros partidos da base do governo Chávez, só aceitava receber apoio aos seus candidatos. Isso é claro, irritou os pequenos partidos regionais que apóiam o governo Chávez, pois muitas vezes a direção do PSUV impunha seus candidatos que não teriam aceitação eleitoral em muitas regiões e por isso os candidatos seriam derrotados nas eleições.
– Existe uma crise política no partido, porque a direção do PSUV vai para um lado e Chávez vai para o outro, porque Chávez defendeu unidade com outros partidos e aceitava seus candidatos como cabeça de chapa nas regiões onde eram fortes. A posição do PSUV nas eleições demonstra que Chávez não controla o PSUV. O prognóstico é que esta postura sectária do PSUV levara Chávez a perder 10 governos de Estado nestas eleições.
– O PSUV parece um partido totalitário por não aceitar as diferenças entre os partidos políticos. Os militantes de base do PSUV que queriam sair como candidatos nas eleições, não conseguiram por causa da direção burocrática que domina o partido, esta direção indicou somente os dirigentes do partido para sair como candidatos.
– Os militantes do CIO venezuelano que se organizam no Coletivo Socialismo Revolucionário estão filiados ao PSUV, e suas constantes críticas a direção burocrática do partido os tornaram alvo de perseguições políticas e até de ameaças de morte feitas pelas lideranças do PSUV.
– A justificativa política feita pela direção do PSUV para as perseguições feitas aos militantes do CIO, é que como fazemos críticas constantes aos métodos antidemocráticos do partido, os militantes do coletivo socialismo revolucionário são na verdade membros da CIA. Essa postura e analise absurda da direção burocratizada do PSUV nada mais é do que o velho método stalinista de fugir do debate político com calunias difamatórias.
Movimento Estudantil
– Para analisar o Movimento Estudantil atual na Venezuela, temos que voltar a sua trajetória mais antiga. A maior parte dos lideres do movimento estudantil da década de 1960 faziam também parte do movimento dos trabalhadores. A ditadura militar da Venezuela da década de 1960 matou suas principais lideranças. Sendo assim, a Federação de estudantes passa a ser controlada pela direita estudantil e os mais pobres progressivamente não conseguem mais entrar nas universidades nas décadas posteriores, pois os exames de admissão tornam-se progressivamente um grande empecilho. Atualmente o presidente Chávez tem feito políticas de inclusão dos pobres nas universidades públicas, mais o quadro geral ainda não se alterou.
– As marchas estudantis que ocorreram nos últimos anos contra o Governo Chávez, com a presença de milhares de jovens, não foram mobilizações por melhorias nas universidades públicas, foram marchas com eixo político claro (contra o governo Chavez), promovidas pela direita estudantil que ainda hoje controla a Federação Estudantil e cumpre um papel reacionário.
– Hoje não há um peso da esquerda dentro das universidades para fazer lutas reivindicatórias e enfrentar a direita estudantil, não existem organizações de jovens de esquerda com um número de membros expressivo.
– Com esse cenário, a atual geração de jovens estudantes na Venezuela é extremamente despolitizada. O nível de discussões políticas da maioria dos jovens é muito baixo, porque os jovens não são estimulados a fazer debates políticos nas escolas e isso gera uma baixa participação estudantil.
Mobilização dos trabalhadores
– Acontece no último período uma maior participação nas lutas por parte do movimento dos trabalhadores. Chávez chama a unidade dos trabalhadores só para conseguir mais votos, ele fez pequenas concessões por causa das eleições de governadores que ocorreu em novembro.
– Há uma forte burocratização nos sindicatos na Venezuela, muitos dirigentes negociaram com o governo Chávez cargos de indicação na administração pública. Esses dirigentes burocratas são mais duros com os trabalhadores nas negociações de greve do que o próprio governo Chávez.
– Essa situação faz com que surja novos e melhores militantes contra a burocratização dos sindicatos. É necessário um processo de democratização por baixo nos sindicatos. As alterações na Venezuela devem vir de baixo para cima, e não através de decretos do governo Chávez.
– O Coletivo Socialismo Revolucionário da Venezuela (CWI) defende a união de classe sem intervenções políticas de Chávez no movimento dos trabalhadores, além da independência dos sindicatos perante o governo, para que a população organizada avance na luta pelo socialismo.