Fim da CPMF: Não ao novo pacote de ataques do governo Lula!
No último mês vimos em rede nacional e em todos os jornais de grande circulação a votação no congresso que pôs fim à CPMF (Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira). A CPMF foi criada em 1997 com o intuito de provisoriedade para atender as necessidades imediatas da saúde pública, sendo renovada novamente em 2003.
O fim deste imposto impôs uma derrota ao governo e trouxe como conseqüência uma série de medidas de restrição e cortes no setor público. No entanto é importante irmos para além da mera aparência e compreender o que de fato está por trás desta questão.
Com o fim do imposto o governo se sentiu legitimado a atacar ainda mais os setor público, contudo desta vez, amparado pela necessidade de manter o país funcionando diante do ataque “irresponsável da direita oportunista” que votara contra a CPMF. Como conseqüência, de modo a manter o que se arrecadava com o referido imposto, o governo aumentará impostos assim como cortará os concursos públicos, as novas admissões, dentre outros serviços destinados à população.
Frente a este quadro é necessário esclarecermos a posição dos socialistas diante deste tipo de arrecadação e desmascarar esta falácia de que sem a CPMF é necessário atacar ainda mais o setor público fazendo com que novamente os (as) trabalhadores (as) paguem o “pato” pelos limites do sistema capitalista.
Para compensar o fim da CPMF o governo lançou um pacote via o ministro da Fazenda Guido Mantega e o do Planejamento, Paulo Bernardo, durante uma entrevista coletiva já no dia 2 de janeiro.
O pacote compensaria os R$ 30 bilhões dos R$ 40 bilhões que o imposto do cheque arrecadaria em 2008. A maior parte virá do corte de gastos e arrocho no setor público, R$ 20 bilhões. R$ 10 bilhões virão do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) que taxam os empréstimos, R$ 8 bilhões, e os outros R$ 2 bilhões viriam da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) taxado sobre o lucro dos bancos. Os R$ 10 bilhões restantes o governo espera conseguir com o crescimento da economia (previsto para 2008), que levaria automaticamente ao aumento da arrecadação de impostos.
Os trabalhadores é que vão pagar
Ainda não foi apresentado de onde sairão os cortes de R$ 20 bilhões, o que é certo é que quem vai sofrer são os trabalhadores e pobres. Uma medida já anunciada foi o cancelamento dos concursos públicos que seriam realizados este ano. Servidores que se aposentarão em 2008 não serão substituídos, levando a um aumento do déficit de funcionários no serviço público.
O governo também quer suspender o reajuste para os servidores negociados em 2007. Paulo Bernardo disse que ”Não podemos fazer redução de salário, mas não queremos promover aumentos neste momento”. Essa medida afeta cerca de 1,3 milhão de servidores civis e 609 mil militares esperam reajuste para este ano. Somente ajustes que já foram aprovados pelo congresso estão garantidos.
O aumento do IOF vai ser mais pesado para os trabalhadores que pegam empréstimos para financiar suas compras, garantir necessidades básicas como alimentação, dentre outras. A IOF aumentaria de 1,5% ao ano para 3%. Calcula-se também que o aumento do imposto sobre os lucros dos bancos, a CSLL, vai ser repassado para os clientes em forma de aumento de tarifas.
Não podemos aceitar essa lógica!
Parece quase uma “lei natural” no sistema capitalista: os trabalhadores acabam sempre pagando pelo ônus da crise. Esta lógica faz parte da política neoliberal e na verdade não tem nada de “natural”. O empresário Synésio Batista, presidente da Abrinq (associação de fabricante de brinquedos) disse para a Folha de S. Paulo: ”Não nos iludamos, os bancos não vão pagar pelo aumento da CSLL”. Outros comentaristas colocam na mídia que “por causa da concorrência” é inevitável que os bancos tenham que repassar o aumento dos impostos para os seus “clientes”. Na verdade isso mostra como esse sistema não tem nada para oferecer aos trabalhadores e que o fim da CPMF não resolve a grande tributação imposta aos trabalhadores, a lógica permanece.
Os defensores do capitalismo e do neoliberalismo costumam usar como argumento a maravilha da “livre concorrência”. Agora os mesmos dizem que os bancos brasileiros, que nos últimos anos tiveram lucros recordes e chegaram a ser os mais lucrativos do mundo, não podem pagar 15% dos seus lucros em impostos, uma taxa relativamente baixa quando comparada com o resto do mundo, deixando escapar que isso poderia quebrar os bancos nacionais diante da concorrência mundial.
Os bancos faturaram R$ 40,8 bilhões só com a cobrança de tarifas entre janeiro e setembro deste ano, segundo levantamento do Banco Central, um crescimento de R$ 6 bilhões em relação aos primeiros nove meses de 2006. A cobrança de tarifas ajudou a impulsionar o lucro do sistema financeiro, que, segundo o BC, neste ano estava acumulado em R$ 31,6 bilhões até setembro, 33% a mais do que 2006. Isso mostra que os bancos poderiam pagar muito mais de impostos, mas sabem que tem o apoio do governo para manter uma baixa tributação. Acreditam na dita “lei natural”, construída e articulada entre o governo e grande capital, que o aumento de gastos podem e devem ser repassados aos consumidores.
Governo mente quando culpa o fim da CPMF
O governo Lula chora lágrimas de crocodilo quando diz que agora a saúde e educação vão ter que sofrer, por causa do fim da CPMF. Está bem claro que a prioridade do governo é a de repassar o máximo possível do dinheiro público aos tubarões que lucram com a dívida pública. E de lá não sai um centavo para compensar a CPMF. Em dezembro, Lula pessoalmente ordenou que “não se tocasse no superávit”, cuja meta para 2008 é de 3,8% do PIB.
O superávit primário (o que o governo “economiza” para pagar a dívida pública) bateu a meta do ano de 2007 em onze meses. Durante janeiro-novembro, o superávit foi de R$ 113 bilhões, 17 bilhões a mais que a meta de R$ 96 bilhões para o ano e equivalente a quase a metade da CPMF.
Para 2008, estão previstos R$ 248 bilhões para o pagamento dos juros e amortizações da dívida federal, enquanto serão destinados apenas R$ 48 bilhões para a saúde, R$ 26 bilhões para a educação e R$ 5 bilhões para a Reforma Agrária.
A Auditoria Cidadã da Dívida usa dados do Orçamento Geral da União para mostrar como a CPMF não foi usada para aumentar dos gastos da saúde, mais sim para o pagamento da dívida pública. Este dado é de extrema importância para comprovar o quão falacioso é o discurso do governo a respeito das conseqüências do fim da CPMF para a saúde e demais setores públicos.
Isso evidencia como na verdade o fim da CPMF serve muito bem ao governo para justificar os seus cortes e a falta de compromisso com o conjunto dos trabalhadores, pois o grande problema com o fim da CPMF é garantir o pagamento da divida pública para manter o interesse do capital financeiro, com o intuito de forjar uma certa estabilidade econômica brasileira.
Segundo dados do Orçamento Geral da União, disponíveis na própria página da Câmara, em 1995, antes da criação da CPMF, o Governo Federal gastava R$ 14,9 bilhões com o Ministério da Saúde, o que representava 2,12% do PIB. Passados 11 anos, apesar da criação da CPMF, este gasto caiu para apenas 1,72% do PIB, representando R$ 39,9 bilhões. Nesse período, os gastos com juros da dívida passaram de R$ 26 bilhões (16% do orçamento) para R$ 257 bilhões (42% do orçamento)!
“Oposição” da direita – farinha do mesmo saco
A disputa entre o governo e a “oposição” de direita é uma disputa para se posicionar nas eleições, uma disputa interna pelo poder sem diferenças de fundo, estratégicas. Na verdade o governo Lula deu continuidade à política neoliberal do PSDB. O PSDB criou a CPMF, no período o PT era contra, agora o PSDB acha o mesmo muito injusto. Mas os dois lados estavam totalmente em acordo em prorrogar a DRU (a Desvinculação das Receitas da União), que permite o governo desviar 20% das receitas destinadas para a saúde, previdência ou educação para o superávit. Se a votação da CPMF levou meses para ser realizada, a votação da DRU foi encaminhada em algumas horas. Isso sem dúvida mostra o quanto eles compartilham dos mesmos interesses. Governo e “oposição de direita” estão preocupados em manter o padrão de acumulação de capital vigente, ou seja, manter as políticas que atacam e retiram os direitos dos trabalhadores.
A oposição conseqüente – a resposta dos socialistas
Para nós militantes do Socialismo Revolucionário, seção brasileira do CIO, é tarefa dos militantes e ativistas conseqüentes se colocarem contrários a qualquer tipo de imposto regressivo, ou seja, que acaba por taxar todos indistintamente, sabendo que o grande ônus sempre recai no bolso do trabalhador.
Defendemos a taxação das grandes fortunas, dos bancos e a construção de uma luta rumo à estatização do mesmo. Não podemos nos deixar confundir com a oposição de direita ao governo Lula que, dias depois, votam conjuntamente pela prorrogação da DRU, que concordam com o aumento dos outros impostos (IOF e CSLL) e que como vimos recairão sobre os bolsos vazios dos trabalhadores.
Além disso, temos que denunciar o quanto o Governo está se utilizando desta situação para legitimar mais cortes e ofensivas contra nós trabalhadores de modo a criar uma atmosfera de defesa de cobrança de um imposto que era para ser provisório e tendia a ser eterno.
Temos clareza que a única solução para a saúde, educação, para mais postos de trabalho se encontra na destruição desta lógica de manutenção dos grandes lucros em detrimentos da vida da maioria da população. A nossa luta conjunta e unitária deve ser construída no sentido de exigirmos que o dinheiro utilizado para pagamento das dividas públicas (conquistada em favor da manutenção do lucro dos grandes capitais) seja revertido para garantir a vida digna de mais de 150 milhões de brasileiros, trabalhadores e trabalhadoras responsáveis pela produção real desta riqueza.
Governo não desiste de ataques
Mesmo com a derrota do governo sobre a CPMF o governo não vai desistir de novos ataques. Lula chegou a dizer que desistiu de propor novas emendas à constituição (PECs) até o fim do mandato, por causa da derrota. Mas isso pode ser visto como uma chantagem à oposição, que também quer continuar as contra-reformas neoliberais, para não fazer tanta confusão.
Por isso não podemos pensar, por exemplo, que nos livramos do risco de uma nova reforma da previdência. O ministro da previdência Luiz Marinho declarou que mesmo com o fracasso do Fórum Nacional da Previdência Social de chegar a uma proposta de “reforma”, o governo virá com uma reforma. Entre as propostas encontra-se a de aumentar a idade mínima de aposentadoria em mais de 5 anos (60 para homens e 55 para mulheres). É possível que a reforma da previdência tome o mesmo rumo que a reforma trabalhista e seja dividida em várias medidas menores durante um tempo prolongado para diluir a oposição.
Vimos também como o governo mantém os planos de fazer a transposição do rio São Francisco, que beneficia o agronegócio. Ao mesmo tempo em que os últimos dados mostram que o governo Lula durante o ano de 2007 só desapropriou 204,5 mil hectares de terra, suficiente para assentar somente 6 mil famílias. Este é o pior resultado durante o governo Lula e mostra que não existe reforma agrária.
Não aceitamos esses ataques!
É fundamental continuar a construção da unidade nas lutas que começou no ano passado, que passou pelo Encontro unificado contra as reformas neoliberais de 25 de março, o dia nacional de luta de 23 de maio e a marcha a Brasília de 24 de outubro. Um marco importante esse ano vai ser a construção do congresso da Conlutas, nos dias 3-6 de julho em Betim (MG). Também vai ser importante a construção de candidaturas nas eleições que são claramente em oposição aos governos municipais, estudais e federal. Temos que manter a linha da Frente de Esquerda das eleições de 2006 (PSOL, PSTU e PCB), ampliando para setores combativos dos movimentos sociais. Nos movimentos a questão de uma greve geral, para unir as lutas, paralisando o país e mostrando a força dos movimentos, tem que começar a ser discutida. Esta será a maneira mais eficiente de superar a dispersão e o isolamento das lutas.
• Não ao pacote do governo Lula que joga o peso da compensação da CPMF nas costas dos trabalhadores! Taxe os lucros dos bancos e grandes empresas não os trabalhadores!
• Não ao pagamento da dívida pública aos tubarões do setor financeiro. Por um aumento drástico nos gastos sociais.