Guadalupe: Movimento de greve geral termina em vitória
Por mais de seis semanas, a ilha de Guadalupe, no “Caribe francês”, esteve no centro de uma poderosa greve geral que se espalhou para a vizinha ilha de Martinica e, desde 5 de março, para a ilha do leste africano de Reunião. Em 4 de março, foi assinado um acordo entre o LKP (‘Comitê contra a Exploração’ – representante da massa do povo de Guadalupe) e os patrões da ilha.
O acordo representa uma impressionante vitória para os trabalhadores de Guadalupe. Ele inclui um aumento salarial de €200 por mês aos trabalhadores mais mal pagos, assim como concessões no preço do pão e nas viagens aéreas. Ainda continuam as negociações sobre outras demandas do movimento, como a diminuição dos preços dos produtos mais básicos. A militância da greve e o sucesso brilham como um exemplo de como combater os efeitos da crise capitalista para todos os trabalhadores internacionalmente.
Guadalupe possui cerca de 440.000 habitantes, ao contrário da imagem que é retratada na mídia, de um minúsculo e insignificante pedaço de terra. Historicamente, os eventos em Guadalupe, um “departamento ultramarino” francês, estiveram estreitamento ligados com a situação na França continental.
Em 1794, a escravidão na ilha foi abolida, após a Revolução Francesa, apenas para ser reinstalada, por meio de uma sangrenta repressão, com a ascensão ao poder de Napoleão Bonaparte, in 1802. Assim, as lutas das pessoas comuns na história de Guadalupe sempre influenciaram, ou sempre foram influenciadas, pelas de seus camaradas franceses. O fato de muitos guadalupenhos trabalharem na França reforça esse elo. Contudo, as origens do capitalismo de Guadalupe na história da escravidão e da opressão colonial lhe dão um caráter mais arrogante, o que explica seu fracasso em agir, por três semanas, em resposta ao movimento.
A mídia faz todo o possível para nos mostrar que o movimento deve terminar, pois a população não o suporta mais, e que o LKP é uma organização antidemocrática. A classe dominante está usando todas as suas ferramentas para se defender dos trabalhadores, cuja solidariedade mostrou sua força. Se o LKP liderar uma nova mobilização, este pode se mostrar imparável devido à sua estratégia e apoio de massas entre a população, o que lhe dá sua incrível força.
Um exemplo da estratégia militante empregada pelo LKP foi mostrado pelos trabalhadores do Carrefour (um supermercado de propriedade do homem mais rico em Guadalupe, Hayot, cuja fortuna pessoal é de €350 milhões). Eles entraram em greve para forçar Hayot a assinar o acordo do LKP: uma estratégia que será aplicada empresa após empresa.
O próprio Sarkozy apelou aos patrões para aceitarem as propostas do LKP, no interesse do estado francês, apesar de não ser do interesse dos patrões locais. A sede dos patrões por lucros a curto prazo pode levá-los a cometer um terrível erro. Se não deixarem o LKP ter o que quer, não cumprindo o acordo, eles podem chegar a lamentar.
O acordo, que foi assinado na última quarta a tarde, é muito detalhado. Ele é composto de 165 parágrafos, que cobrem uma ampla variedade de questões, desde o preço das baguetes às condições de contratação dos professores. Elie Domota, o líder do LKP, perguntou a uma manifestação de massas em frente do local de negociações, se ele deveria assinar o acordo, depois de lê-lo em voz alta. A população mostrou sua aprovação. Domota respondeu: “Camaradas, podemos nos orgulhar do que conseguimos, mas esse é apenas o primeiro passo!”. Ele anunciou que a greve geral acabara, mas não a mobilização. Ele disse que “a mobilização é o único modo de ganhar” e que eles continuariam a lutar para conseguir novas vitórias. Mas a questão é, qual é ó último passo?
A MEDEF (a organização patronal) não é mais a organização mais poderosa em Guadalupe. O LKP reuniu toda a classe trabalhadora sob uma bandeira. Se os patrões são tão arrogantes para pensar que ainda são capazes de impor sua vontade, estão errados.
“Estivemos no movimento por 40 dias. O LKP não se dissolverá, temos 40 anos de trabalho para fazer.” – Elie Domota (líder do LKP).
Os socialistas não podem discordar. Não há necessidade de dissolver essa organização por ter a greve geral terminado. Ela organizou a classe trabalhadora, uniu-a e deu-lhe uma direção política. Ela é necessária enquanto a classe dominante estiver organizada contra nós. A mensagem dada pelo estado francês aos patrões guadalupenhos foi muito clara. Para compensar a greve geral sofrida pelos “pobres” patrões, o governo francês revogou as multas que eles teriam que pagar pelos impostos atrasados, provocados pela greve.
Os patrões simbolicamente tentaram reabrir um supermercado, com centenas de policiais, mas não puderam, por causa da reação das massas. Isso mostra que eles não podem mais fazer o que quiserem.
Patrick Karam, delegado interministerial para a chamada ‘igualdade de oportunidades nos departamentos ultramarinos’, disse durante as negociações: “Todo mundo tem a oportunidade de ser vitorioso”. Ao contrário de seus desejos, as massas ganharam! O verdadeiro problema, a razão por não ter havido nenhum acordo até agora, é que os patrões não têm sido capazes de aceitar sua derrota. Mesmo agora, eles continuam arrogantes e dizem que vão anunciar demissões em larga escala, depois do acordo. Se fizerem isso, terão outra greve geral!
Os patrões não entendem realmente o que esta acontecendo, como mostra sua proposta na quarta, 4 de março. Eles propuseram que o acordo durasse apenas 36 meses (o período que o governo concordou em pagar pela maior parte de seu custo) e que beneficiasse apenas poucas pessoas. Isso mostra que eles farão de tudo para tomar o que a greve lhes tirou. O sistema capitalista nunca permitirá que a classe trabalhadora mantenha o que conquistou por muito tempo.
Martinica e Reunião
Na bela ilha de Martinica, onde vivem aproximadamente 400.000 pessoas, também foi alcançado um acordo entre os patrões e os grevistas. Trabalhadores que recebem menos de 1,4 vezes o salário mínimo receberão entre 130 a 200 euros por meses, como aumento. Isso é uma vitória, mas não como foi exigido. Os patrões pagarão apenas 30 a 100 euros disso. O resto virá do estado. Portanto, são os contribuintes que pagarão seus próprios salários. Algumas centrais sindicais, como a CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) e FO (Força Operária) não assinaram, já que querem consultar suas bases e ver o que será acordado na questão dos preços. Assim, a greve continua. Na ilha de Reunião, na quarta 4 de março, um coletivo de 40 organizações diferentes chamou uma greve de massas para 5 de março.
Alternativa Socialista
A magnífica vitória da greve geral de Guadalupe apresenta um dilema para o capitalismo francês e o governo Sarkozy. Num momento em que se pede aos trabalhadores e jovens franceses para aceitarem os selvagens ataques a seus empregos, serviços e condições de vida, e esses pretendem resistir (como visto pela greve nacional massiva de 29 de janeiro), um movimento militante de massas no Caribe francês forçou enormes concessões do governo. Sarkozy agora está ameaçado com o assustador cenário dos trabalhadores da França continental fazendo o mesmo! Na preparação para o próximo dia nacional de greve em 19 de março, os eventos em Guadalupe seguramente darão renovada energia aos trabalhadores.
Durante a greve, Olivier Bescancenot, do NPA (Novo Partido Anticapitalista) francês, visitou Guadalupe para expressar solidariedade com o movimento, corretamente chamando os trabalhadores franceses a imitarem seu movimento militante, em defesa dos empregos e serviços contra a ofensiva dos patrões franceses e do governo Sarkozy. Contudo, para combater efetivamente os ataques do capitalismo, é preciso mais do que isso. Embora as greves gerais tenham mostrado, de um modo claro e poderoso, o imenso poder da classe trabalhadora de conseguir enormes ganhos, enquanto o sistema capitalista prevalecer, quaisquer ganhos serão atacados continuamente. Para se conseguir ganhos duradouros e se livrar das tentativas dos patrões de fazer os trabalhadores e os pobres pagarem pela crise, é preciso lutar por uma alternativa ao capitalismo, quer dizer, a dominação das vidas da maioria pela sede de lucro dos grandes negócios. Para fazer isso, os trabalhadores de Guadalupe e do Caribe francês precisam de uma voz política independente, um partido de massas que possa representá-los em suas lutas e apresentar uma alternativa socialista ao capitalismo em crise. Na França, a Gauche Revolutionnaire luta para que o NPA se torne tal partido.
A única maneira de garantir as necessidades básicas do povo em Guadalupe, Martinica e internacionalmente, é mudar o sistema sob o qual a sociedade é dirigida. O socialismo, um sistema onde a economia e a sociedade são controladas democraticamente pelos trabalhadores, é a única alternativa capaz de satisfazer essas necessidades. Se os patrões não cumprirem o acordo que assinaram e continuarem com sua arrogância, tentando fazer a maioria pagar pela crise de seu sistema, devemos construir um movimento internacional pelo socialismo. Em Guadalupe e no Caribe francês, isso significa mobilização de massas para quebrar o poder do capitalismo local e internacional e construir uma federação socialista da região.