Fora Bolsonaro, Mourão e a agenda neoliberal!

Em defesa do salário, emprego, saúde pública e direitos democráticos!

Estamos entrando na mais grave crise brasileira e mundial em muitos anos. Uma crise em vários sentidos, humanitária, de saúde pública, econômica, social, política. A terrível pandemia do novo coronavírus e o início de uma nova e profunda recessão atingem todo o planeta.  A angústia diante da incerteza e o repúdio ao que está aí atingem multidões por toda parte. 

Esse cenário influenciará a consciência de milhões e provocará verdadeiros terremotos políticos e sociais. É preciso que a classe trabalhadora organizada, os movimentos dos oprimidos e a esquerda socialista intervenham com firmeza e construam uma saída própria para esse pesadelo.

No Brasil, esse cenário se expressa na mais importante crise do governo Bolsonaro desde a posse. O país está entrando num novo ciclo recessivo profundo depois de três anos de crescimento baixo (2017-19) antecedidos por dois anos e meio de queda contínua do PIB (parte de 2014, 2015 e 2016). 

Os efeitos sociais dessa nova recessão em meio às terríveis consequências da pandemia do Covid-19 serão devastadores. Milhões de brasileiros perderão seus empregos e fontes de renda. Outros são obrigados a seguir trabalhando expostos a todos os riscos apenas para garantir os lucros de seus patrões.

Os mais afetados serão os mais pobres, em particular a população negra que representa quase 80% daqueles que dependem exclusivamente do SUS e estão mais vulneráveis nas periferias, sem acesso a água, moradia digna, saneamento básico e condições mínimas de higiene e saúde.

Também as mulheres sofrerão mais com os impactos físicos e emocionais da crise. As mulheres são maioria entre os trabalhadores informais que perderão sua fonte de renda. Com as quarentenas e isolamento sociais, sofrerão também com a tendência de aumento da violência doméstica e a sobrecarga no trabalho de cuidado de crianças, idosos e o trabalho doméstico.

Em um contexto de cortes e sucateamento do SUS e dos serviços públicos, muitos milhares poderão perder suas próprias vidas ou ter sequelas graves à sua saúde.   

Diante desse pesadelo, a reação do governo Bolsonaro é criminosa. O presidente da república menosprezou o problema (“gripezinha”, “fantasia”, “superdimensionado” etc.). Ainda estimulou de forma explícita o não cumprimento das orientações de prevenção do contágio ao ir às pequenas e reacionárias manifestações do dia 15 de março. 

É criminosa a demora em tomar iniciativas enquanto no mundo inteiro já se observava a gravidade da situação. Ele continua sistematicamente fazendo declarações em oposição a medidas de prevenção mais sérias e eficazes.Isso já custou muitas vidas e custará ainda mais nas próximas semanas e meses. São vidas que ele simplesmente despreza. Mais uma vez, Bolsonaro é culpado pelo sofrimento e morte de inocentes e tem que pagar por isso.

Também é criminosa a resposta do ministro Paulo Guedes diante da devastação econômica e social que começa a se concretizar na medida em que o vírus se alastra. Mesmo em meio a essa emergência absoluta, o governo mantém o teto de gastos e a essência das contrarreformas (previdenciária, trabalhista etc.), medidas que sucateiam o SUS e o serviço público em geral e retiram direitos de milhões. 

Tentando aparentar alguma preocupação social, Guedes apenas anuncia a antecipação do pagamento de direitos já adquiridos, como no caso do 13º dos aposentados, o abono salarial do PIS-Pasep e um pequeno reforço no bolsa-família. O governo diz que vai incorporar um milhão de pessoas no bolsa-família, mas esquece de dizer que no ano passado excluiu do programa o mesmo número de beneficiários. Ou seja, nada de realmente novo está sendo feito.

Soma-se a isso o fato de que, desde os cortes no bolsa-família no ano passado, a distribuição dos novos benefícios prejudicou fortemente o Nordeste. A região recebeu somente 3% das novas concessões durante esse período. O Nordeste abriga quase 40% das famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza no país, e a região inteira recebeu duas vezes menos benefícios que Santa Catarina, por exemplo. O que já era uma política de fome e morte ganha agora contornos ainda mais cruéis com a pandemia.

O governo federal anunciou também uma ajuda de 200 reais para uma parcela minoritária de trabalhadores informais e autônomos. Esse valor representa apenas 38,5% do valor de uma cesta básica em São Paulo e 53,9% em Aracaju, por exemplo, segundo o DIEESE. É muito pouco, atinge poucos, vem muito tarde e nem se compara ao que está sendo destinado às grandes empresas e aos especuladores. 

Para piorar, usando o pretexto da pandemia, Guedes anunciou a proposta de mudanças na legislação trabalhista para permitir a redução dos salários junto com a redução na jornada de trabalho. Isso mesmo, o governo Bolsonaro quer reduzir salários em meio ao caos e desespero social de um lado, enquanto, de outro, destina uma fortuna para empresas ameaçadas pela recessão! 

Enquanto o poder executivo faz isso, Rodrigo Maia e outros representantes da burguesia na Câmara dos Deputados estudam cortar imediatamente entre 10 e 20% os salários dos servidores públicos.

Essas medidas não são apenas insuficientes, elas vão na direção errada. Querem mais uma vez que os trabalhadores paguem pela crise, dessa vez com suas vidas.

Enquanto Guedes se preocupa com as grandes empresas e os investidores, o povo trabalhador está jogado no desespero, na doença e na morte. É preciso dar um basta nessa situação imediatamente em nome da vida e milhões!

O cenário atual coloca a necessidade urgente de derrubada desse governo em nome da saúde pública e da vida de milhares e milhões. É urgente, é necessário, é inadiável e está tornando-se possível!

Já chega!

Nos últimos dias, a incapacidade, irresponsabilidade e o caráter nefasto de Bolsonaro ficaram ainda mais evidentes para milhões de brasileiros, inclusive um setor importante de seus próprios eleitores que estão sentido no bolso, na alma e no coração os efeitos da crise econômica e de saúde pública.

É verdade que as sandices do presidente em relação ao coronavírus estimulam e alimentam o fanatismo irracional da parcela ultrarreacionária e fanática de seguidores de extrema-direita. Mas, essa é uma parcela minoritária e hoje cada vez menos capaz de arrastar outros setores mais amplos atrás de si. 

Os setores populares que tiveram ilusões em Bolsonaro em 2018 foram afastando-se do governo durante todo o ano de 2019. E agora vemos uma parcela significativa das classes médias, que até o ano passado estavam ainda do lado do governo, começando a deslocar-se significativamente.

No interior da classe dominante, a grande burguesia, já identificamos as divisões internas em relação ao governo. Parte dos grandes capitalistas no Brasil veem Bolsonaro como uma ameaça aos seus interesses por duas razões. De um lado, temem que sua postura autoritária, tresloucada e irresponsável afete seus interesses econômicos dificultando a aprovação de contrarreformas, prejudicando relações comerciais com outros países (como a China, por exemplo), agravando o cenário econômico e a recessão. No caso dos meios de comunicação, há o temor de que a escalada autoritária atinja sua liberdade de ação.

Ao mesmo tempo, de outro lado, uma parte da burguesia teme que os ataques e provocações de Bolsonaro provoquem uma resposta popular mais forte e radical como aconteceu em vários países latino-americanos em 2019. Já preferiam em 2018 e continuam preferindo hoje uma alternativa burguesa neoliberal politicamente mais ponderada e mais orgânica de sua classe. Várias figuras políticas disputam essa posição diante dos olhos da burguesia (Maia, Doria, Huck etc.).

Essas divisões interburguesas precisam ser exploradas e utilizadas pelos trabalhadores e a esquerda socialista, principalmente diante das ameaças autoritárias. Mas, esse setor da burguesia não é capaz de ir até as últimas consequências contra Bolsonaro. 

Em editorial (26/02), a Folha de S. Paulo, por exemplo, deixou claro que defende apenas impor limites a Bolsonaro e não necessariamente derrubá-lo. Querem que “o temor de um processo de impeachment possa deter a perigosa aventura”. 

Mas, não é apenas um processo formal de impeachment no Congresso que vai deter Bolsonaro e sim a mobilização popular, a luta concreta. Isso, porém, a Folha não quer, pois na luta contra o autoritarismo de Bolsonaro também suas medidas econômicas neoliberais podem ser derrotadas.  

O governo ainda é funcional para a classe dominante se conseguir aplicar as contrarreformas neoliberais. Se deixar de sê-lo, a situação se complica. Mas, nesse caso, a alternativa a Bolsonaro que setores da classe dominante querem passaria pelo vice-presidente Mourão (um general do exército que tem tentado se credenciar como alternativa ponderada e racional e alinhado com os interesses da burguesia) ou uma alternativa eleitoral da direita neoliberal tradicional brasileira. 

É preciso repudiar essas saídas pela direita diante da crise. É preciso construir as condições para que a luta para derrubar Bolsonaro, uma possibilidade concreta no período que se abre de gravíssima crise no país, construa uma saída pela esquerda, radicalmente democrática e que adote um programa anticapitalista e socialista, a única forma de fazermos frente à gravidade da situação atual.

Risco autoritário

O caráter excepcional do momento que entramos com a pandemia e a recessão profunda também apresenta riscos seríssimos de uma escalada autoritária do governo. É verdade que Bolsonaro se enfraquece, mas quanto mais isso acontece mais a resposta do governo é “dobrar a aposta”, radicalizar o discurso e apontar para uma saída autoritária.

A pandemia abre uma oportunidade única para o aprofundamento de uma postura autoritária nos marcos de um estado exceção supostamente justificado pelo cenário caótico. Bolsonaro, membros de seu governo e aliados vem sistematicamente tentando normalizar a ideia de um estado de exceção ao mencionar o AI-5 e apontar o Congresso ou o STF como obstáculos à sua “cruzada” messiânica, como ficou evidente nas pequenas manifestações de 15 de março.

O próprio presidente chegou a dizer que as eleições de 2018 foram fraudadas e que ele teria vencido já no primeiro turno. O objetivo evidente é criar as condições para que, diante de um movimento pela sua destituição no curto prazo ou mesmo a possibilidade de derrota eleitoral em 2022, sua reação seja autoritária e golpista.

A resposta a essa ameaça e risco não pode ser o recuo e a capitulação. Isso só abrirá mais espaço para iniciativas autoritárias e golpistas. A resposta deve ser contundente vinculando a defesa das liberdades democráticas com a defesa dos direitos sociais, trabalhistas e de saúde pública.

Não existe a menor possibilidade de que, estando na iminência de ser derrotado, Bolsonaro não apele para uma reação de contornos autoritários, antidemocráticos, altamente repressivos e de viés fascistizante. É preciso que o movimento dos trabalhadores se prepare para esse nível de enfrentamento. 

Mesmo aqueles que preferem apenas esperar as eleições de 2022 para tentar vencer Bolsonaro (como a direção do PT e Lula) devem entender que não há como vencê-lo eleitoralmente sem que uma poderosa mobilização popular impeça as fraudes e manipulações que já vimos em 2018 (dessa vez muito piores), a repressão e o golpismo.

O pico dessa crise, portanto, se dará muito antes de 2022 e é preciso preparar-se desde já. Isso significa levantar em alto e bom som a bandeira do Fora Bolsonaro, mas sempre junto da denúncia de seu vice e demais alternativas burguesas e suas políticas neoliberais criminosas.

Resistência e repúdio popular contra Bolsonaro

A jornada de lutas contra o governo planejada para esse mês de março foi diretamente afetada pela crise do coronavírus. O forte 8 de março de luta das mulheres poderia ter impulsionado grandes mobilizações nos dias 14/03 (dois anos do assassinato de Marielle e Anderson) e principalmente no dia nacional de lutas em 18/03. Isso não foi possível em função das medidas restritivas às aglomerações como prevenção ao coronavírus. 

Ainda assim, observamos uma nítida e poderosa manifestação de repúdio ao governo crescendo em muitos níveis. Os panelaços e manifestações expressivas envolvendo muitos milhares nas janelas e varandas por todo o Brasil são um sinal evidente desse ambiente. Os que se mantém bolsonaristas estão intimidados e cresce o espaço para um repúdio ao governo. 

Além das manifestações massivas nas janelas e varandas, no dia 18 de março também tivemos paralisações de setores do funcionalismo público.

A evolução dramática da pandemia no Brasil impedirá ações de rua massivas e mesmo outras mobilizações mais contundentes. Ao mesmo tempo ela tem provocado uma resposta dos trabalhadores diante da própria pandemia. Os metalúrgicos do ABC anunciaram através do seu sindicato que se as empresas não pararem até o dia 30 de março, os próprios trabalhadores as pararão. Os metalúrgicos da Chery em São José dos Campos impediram com greve as demissões planejadas pela empresa.

Trabalhadores metroviários e dos transportes em geral estão debatendo as medidas preventivas nos seus casos e a irresponsabilidade das empresas diante dos riscos de contaminação. Ações de pressão são necessárias para defender vidas e ao mesmo tempo servir à população. 

Trabalhadores dos call centers, bancários, construção civil, todos começam a questionar a lógica do lucro acima do direito à vida e tomam iniciativas exigindo seus direitos. 

A solidariedade na sociedade diante do avanço dramático da pandemia também cresce e se manifesta. Isso vai desde os aplausos nas janelas aos trabalhadores da saúde, as arrecadações para trabalhadores sem-teto que perderam suas fontes de renda até as ações cotidianas de apoio mútuo de vizinhos, colegas de trabalho etc. 

É preciso exigir com força dos governos os direitos básicos nesse contexto de crise ao mesmo tempo em que se forjam essas relações de solidariedade na luta e no apoio mútuo. 

A falta de confiança (justificada) nas autoridades pode e deverá provocar reações de pânico e descontrole. A incerteza diante do futuro é enorme. É fundamental que os movimentos sociais organizados e a esquerda socialista ofereçam um caminho organizado, ainda que radical e contundente, de manifestação e pressão. 

Não é hora de suspender as lutas, é hora de buscar os meios possíveis para manter a luta mesmo em meio a situações de necessária quarentena e medidas de isolamento social. A comunicação joga um papel central. Os trabalhadores precisam de informações verdadeiras e orientação em meio ao caos. Mas, também formação política, preparação das lutas futuras e ações hoje mesmo dentro do que for possível.

Ao contrário do que acontece em alguns países, no Brasil o avanço terrível da pandemia não deve criar um ambiente de unidade nacional envolvendo o povo, as classes dominantes e as autoridades. Aqui deve se aprofundar a raiva contra o governo e sua inépcia e irresponsabilidade. 

Durante a crise e principalmente depois de seu ponto mais agudo é provável que tenhamos mobilizações mais contundentes e uma situação de intensa efervescência política. É preciso que nos preparemos para isso. 

Uma alternativa de esquerda, anticapitalista, socialista e democrática

Nesse cenário dramático e terrível para milhões de pessoas no Brasil e no mundo, a esquerda socialista tem uma responsabilidade histórica e precisa estar à altura dela. Não pode perder-se em disputas fratricidas internas, totalmente descoladas da realidade do povo trabalhador e dos oprimidos em geral.

É preciso oferecer uma alternativa política e programática à falência do sistema. Partindo de demandas concretas e um diálogo vivo com a classe trabalhadora é preciso estimular as conclusões anticapitalistas e socialistas. É preciso fazer isso sem estimular ilusões em uma saída meramente institucional para a crise, uma saída por dentro do regime político decadente hoje ainda em vigor. É preciso oferecer algo novo, radicalmente democrático e à serviço das maiorias. 

Estamos entrando em uma das piores crises que o capitalismo já enfrentou e o momento exige que todos os esforços sejam direcionados à organização da classe trabalhadora e a construção da uma unidade política de combate na esquerda que seja suficiente para atrair amplos setores de massas e derrubar Bolsonaro, Mourão e suas políticas neoliberais.

Nesse momento é fundamental que defendamos um plano de emergência para enfrentar a pandemia do coronavírus e a crise econômica e social que reflita os interesses da classe trabalhadora e todos os setores oprimidos da sociedade.

Entendemos que a base de um programa de ação nessa conjuntura deve basear-se nos seguintes pontos:

  • Fora Bolsonaro, Mourão e a agenda neoliberal! Em defesa do salário, emprego, saúde pública e direitos democráticos!
  • Manter a luta coletiva! Construir formas alternativas de mobilização e solidariedade entre os trabalhadores e todo o povo oprimido – solidariedade e paz entre nós e combate a esse governo criminoso.
  • Em defesa das liberdades democráticas! Não ao autoritarismo e estado de exceção sob a justificativa de combate ao coronavírus. A pandemia se combate com participação popular e dos trabalhadores!
  • Tomar todas as medidas necessárias para colocar a saúde pública, os direitos sociais e a vida acima dos lucros!
  • Combater a disseminação do vírus com garantia de condições para o máximo possível de isolamento social e quarentena envolvendo todos e todas que não estão em serviços essenciais. Pagamento integral de salários aos trabalhadores licenciados.
  • Garantia de uma renda mínima de um salário-mínimo mensal para os trabalhadores (as) autônomos e informais. Suspensão da cobrança de contas de água, luz, gás e IPTU e anistia das dívidas desses trabalhadores! Nenhuma remoção ou despejo durante esse período. Garantia e fornecimento de cesta-básicas para todas as famílias que necessitem.
  • Garantia do fornecimento de equipamentos de proteção individual para os trabalhadores de serviços essenciais e participação de representantes dos trabalhadores no planejamento e organização do trabalho nesses setores.
  • Proibição de demissão durante o período de quarentena e isolamento social. Intervenção do Estado sobre as empresas que o fizerem ou ameaçarem promover demissões.
  • Garantia de acesso a água, saneamento e condições de higiene em todas as regiões. Combater o déficit habitacional e as péssimas condições de moradia utilizando imóveis e terrenos ociosos para fins de moradia social.
  • Paralisação imediata da tramitação e retirada dos projetos de contrarreformas que atacam os trabalhadores e revogação das contrarreformas já feitas (como a trabalhista e previdenciária).
  • Investimentos pesados na saúde pública. Garantia de leitos, insumos e pessoal nos equipamentos públicos direcionando orçamento para o SUS e aprovando a convocação de novos servidores aprovados em concursos. Além disso, garantir o controle público de 100% dos leitos privados.
  • Fim do teto de gastos! Taxar as grades fortunas e suspender o pagamento dos serviços da dívida pública para os grandes especuladores como forma de financiar o esforço de emergência em defesa da vida.

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