O massacre da previdência
O Governo Jair Bolsonaro apresentou no dia 20 de fevereiro, a PEC 6/19, que trata da Reforma da Previdência, a qual traz em seu corpo uma série ataques aos trabalhadores, tais como idade mínima para aposentadoria, aumento da alíquota da contribuição do trabalhador, tempo mínimo de contribuição para o trabalhador rural, redução drástica do valor das pensões por morte e das aposentadorias por incapacidade permanente e instituição do regime de capitalização, propostas que agudizarão as condições de vida e de aposentação dos trabalhadores.
O argumento principal que sustenta a reforma é a de que o sistema é deficitário – entra menos em impostos e contribuição do que é gasto com benefícios – e está à beira do colapso, o que supostamente deixaria grande parte da população sem aposentadoria. Na verdade, o sistema previdenciário tem sido superavitário, como mostra os relatórios da ANFIP (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal): uma boa parte dos impostos que deveriam financiar o sistema previdenciário é desviado através da DRU (Desvinculação de Receitas da União) para o pagamento da dívida pública (que em si é fraudulenta e ilegal, como mostrou o CPI da dívida e os relatórios da Auditoria Cidadã da Dívida).
Previdência sob ataque ao redor do mundo
Nas últimas décadas, do centro à periferia do capital, da França ao México, passando por Alemanha, Grécia e Argentina, e também o Brasil como já mencionamos, a previdência vêm sendo atacada.
Em geral o sistema previdenciário em muitos países surgiram a partir das caixas de ajuda mútua que os próprios trabalhadores organizaram para se manter em caso de doença, desemprego e para aposentar. Essas foram incorporadas ao Estado como um direito generalizado dos trabalhadores a partir de muita luta, mas também em uma situação em que o sistema era relativamente barato: a população era jovem, e os muitos trabalhadores na ativa pagavam os poucos aposentados. Agora a população no mundo inteiro está envelhecendo e o sistema fica mais caro. Mas isso não significa que não é possível bancar um sistema que garante direitos a todos. O problema é que os governos não querem taxar as fortunas cada vez maiores e os lucros das empresas cada vez mais gigantes.
Por isso, querem substituir o sistema de pacto geracional (onde que está na ativa hoje banca a previdência de quem se aposentou) como uma sistema de capitalização, onde cada pessoa tem sua “poupança” individual e recebe somente o que ela mesma pagou em forma de taxas (mais eventual contribuição do patrão). Trabalhadores que passam muito tempo fora do mercado formal, ficam afastados por doença, mulheres cuidando de filhos ou parentes, acabam “poupando menos” e sai perdendo. Isso elimina também qualquer redistribuição de renda entre os que ganham salários altos para os mais pobres.
Querem especular e lucrar com nossa aposentadoria
Além disso, há um outro interesse por trás dessa reforma: colocar o máximo possível dessa poupança individual nas mão de bancos privados, que podem lucram com as taxas e especular com o dinheiro do trabalhador. Eventuais prejuízos pela oscilações do mercado desses fundos ficam nas costas do próprio trabalhador, como vemos com as quebras de fundos que já ocorreram, como General Motors dos Estados Unidos e aqui no Brasil dos trabalhadores dos Correios.
Nesse sentido, a atual proposta além de prever a instituição de um sistema alternativo com base na capitalização, já apresenta em sua concepção, e também na propaganda que circula, o discurso de “separação entre assistência e previdência”, desconsiderando o entendimento de Seguridade Social da Constituição, que é o de um conjunto integrado de ações destinadas a assegurar direitos relativos à saúde, à previdência social e à assistência social, que tem seu orçamento baseado nessa integração. Somente distorcendo a concepção de Seguridade Social que se pode construir o discurso do déficit da Previdência e distorcer os cálculos. Dessa forma, além da desconsideração das DRUs, o governo desconsidera propositalmente do cálculo Receitas próprias do FAT, Parcela do PIS/Pasep destinada ao BNDES, que juntas somam uma ordem de R$ 159 bilhões (dados da ANFIP para 2017), e considera como despesas as aposentadorias de militares que contribuem para um regime próprio e não fazem parte do orçamento da Seguridade Social.
O Ministro Paulo Guedes ainda durante a campanha eleitoral já apresentava a proposta e o interesse de aplicar aqui um modelo de capitalização. Não é à toa, que o Ministro que leva esta proposta como carro chefe do governo é um grande representante do capital financeiro, fundador do atual banco BTG.
À classe trabalhadora resta ainda uma outra nefasta condição da reforma, a de que, ao entrar no mercado financeiro, o dinheiro poupado investido pelos fundos em ações, para ser valorizado dependerá da exploração contínua de outros trabalhadores em outros lugares.
Outro ponto central que segue essa tendência mundial de ataque à previdência pública é o da instituição de uma idade mínima para aposentadoria, de 62 anos para mulheres e 65 para os homens somada à ampliação do tempo mínimo de contribuição. Sob o argumento de que o aumento da expectativa de vida das pessoas têm sido um risco às contas da previdência, o governo desconsidera as desigualdades regionais de um país como Brasil, e das condições cada vez mais precárias dos empregos, que se acentuaram após a aprovação da última reforma trabalhista, e do aumento do desemprego que atingem principalmente os mais jovens.
Aumentará a desigualdade
Somada a idade mínima, outro ponto que atingirá a população mais pobre e irá aumentar as desigualdades é a da instituição de um tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria rural e aumentando a idade mínima para as mulheres, igualando à dos homens. Essa proposta contraria todos os fundamentos da aposentadoria rural e desconsiderada às especificidades do modo de vida do campo e das suas condições de trabalho.
A idade mínima de aposentadoria das mulheres é igualada à dos homens em várias outras categorias, ignorando o peso da dupla ou tripla jornada das mulheres.
Nesse sentido, é possível notar uma grande contradição entre o discurso e a propaganda governamental e as propostas em si. Dizer que o sistema se tornará “Sistema justo e igualitário (rico se aposentar na idade do pobre)” é negar que os que realmente tem privilégio não irão perder nada, apenas fazer sua conta privada para garantir suas vultuosas aposentadorias. Enquanto os mais pobres, que são quem dependem necessariamente da seguridade social terão cada vez mais barreiras para recepção de benefícios cada vez menores.
Paulos Guedes e Bolsonaro repetem o mesmo argumento, que há uma contradição entre “direitos e empregos” ou “direitos e aposentadorias”. Isso só é testemunha de que o sistema que eles defende não é capaz de garantir uma vida digna para a maioria que trabalha, ao mesmo tempo que os ricos ficam cada vez mais ricos e não se mexem nos verdadeiros privilégios dos políticos, do judiciário e servidores do mais alto escalão.
Enquanto o governo propõe a redução em 40% dos benefícios das pensões por morte e das aposentadorias por incapacidade permanente, para além dos pontos centrais que já citamos, nada é discutido sobre combater os reais privilégios, como por exemplo a dívida de mais de R$450 bilhões que empresas como Bradesco, JBS, Vale e Pão de Açúcar têm com a previdência (Conforme CPI), nem sobre a renúncia tributária de mais de R$ 150 bilhões em contribuições sociais (só para o ano 2018, segundo projeção da ANFIP), e tampouco a taxação das grandes fortunas e o impostos sobre lucros e dividendos das empresas.
Por uma previdência que atenda nossas necessidades
É preciso defender hoje a previdência, defendendo nossos direitos, mas compreender que há limites nos marcos do capitalismo e que só uma sociedade socialista pode garantir aposentadoria digna à toda a população. É necessário lutar por uma Seguridade Social que atenda nossas necessidades e não as do mercado. É tarefa necessária e urgente fazermos esse debate sobre previdência com toda a população de forma clara, desvelando os mitos e mentiras do capital e expondo os reais reflexos dessa reforma e os limites da previdência nesse sistema.