A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994

Conclusão

De uma força muito pequena no inicio, o Militant ascendeu,se tornou um significativo fator na política da Grã-Bretanha e do movimento trabalhista. Quais são as garantias, contudo, de que este sucesso possa ser repetido e ampliado na paisagem econômica, social e política em mutação, do final dos anos 90 e início do século 21? Certamente, comentaristas burgueses já tiraram a conclusão que o marxismo é historicamente obsoleto. O colapso do stalinismo e o giro à direita da direção Trabalhista e sindical tem, eles sustentam, realizado o sonho de Thatcher de “acabar com o socialismo” de uma vez por todas. Mas a idéia do socialismo saiu das experiências de vida dos trabalhadores. As contradições insolúveis do capitalismo, sua incapacidade de fornecer até mesmo as exigências mínimas de emprego, abrigo e alimentos em escala mundial, leva a classe trabalhadora a procurar um sistema alternativo. A menos que os defensores do sistema capitalista possam agora mostrar que o capitalismo do final do século 20 tenha superado estas contradições, que Karl Marx brilhantemente analisou, então sua antítese, o socialismo – socialismo científico, marxismo – permanecerá relevante como nunca. Permanecerá, apesar do fato de que a compreensão da realidade dos trabalhadores é muito defasada em relação à situação objetiva.

O pensamento humano é em geral muito conservador. A classe trabalhadora procura a linha de menor resistência, irá evitar enfrentar a dura realidade quando uma via ‘fácil’, de menor confronto, menos brutal, parece possível. Mas a situação objetiva irá forçar por si mesma, como força hoje em dia, a conscientização de todas as classes da sociedade, acima de tudo a classe trabalhadora. É claro, uma direção defeituosa pode jogar o papel de uma enorme freio dos trabalhadores. Mas líderes de partidos, ou secretários gerais de sindicatos, não são um fator histórico independente. Muito mais importante é a situação que irá arrebentar com uma poderosa força num certo estágio e moldar a consciência da classe trabalhadora. Mais ainda do que quando o Militant foi fundado, o capitalismo está demonstrando sua total incapacidade de fornecer as necessidades básicas da espécie humana.

Um terço da força de trabalho mundial, mais de 800 milhões de pessoas,estão desempregadas ou subempregadas. 34 milhões ainda estão desempregadas nos países industriais avançados enquanto há um enorme acúmulo de débitos, especialmente débito governamental. Isso é a conseqüência da libertinagem dos anos 80 que significa que os capitalistas terão que retomar as rédeas dos gastos públicos ou a arriscar outra espiral inflacionária similar aos anos 70 e 80. O que por sua vez pressupõe uma ofensiva geral contra o bem estar social e os empregados no setor público. Isso em si é uma garantia de massivos levantes sociais no Japão, Grã-Bretanha e EUA. Isso aparte as convulsões que estão ocorrendo e irão aumentar no mundo colonial e semi-colonial. Na Grã-Bretanha há um grau sem precedentes de privação e pobreza, inimagináveis na época que o Militant lançou seu jornal. Isso tem se espalhado como uma crescente mancha de tinta num mata-borrão das tradicionais áreas “depressivas” da Grã-Bretanha para os bastiões Conservadores. Quase 30% da população não tem mais rendimentos de um emprego. Aqueles que o fazem são atormentados com incertezas e pioras nas condições. Em 1975 cerca de 55% da força de trabalho estava em “empregos seguros de tempo integral”. Isso caiu para 35% em 1994 com o trabalho em tempo parcial e contratos temporários se tornando agora a norma junto com a crescente exploração do trabalho que é sinônimo das “práticas americanas”. A média do trabalhador americano, comparado a 20 anos atrás, é trabalhar agora um mês a mais a cada ano.Este é o futuro que está sendo planejado para os trabalhadores britânicos pelos patrões e seus representantes políticos.

Mesmo agora os trabalhadores britânicos trabalham 1 hora a mais por semana, comparado a meados dos anos 80. Nas bases de um sistema econômico e político são, novas tecnologias podem abrir a perspectiva de diminuição da semana de trabalho. O oposto ocorre. Mais e mais trabalhadores estão se tornando robôs industrias, já que os patrões tentam espremer deles mais trabalho, e portanto mais lucros. Exaustão, falta de sono, desaparição do “fim de semana”, cada vez mais fazem parte da vida britânica. 44% dos trabalhadores britânicos chegam agora em casa todo dia “totalmente exaustos”. O “luxo” até mesmo do trabalho suado é negado a uma proporção cada vez maior da força de trabalho. Em 1995, 15% das famílias da Grã-Bretanha não tinham uma única pessoa trabalhando. Mais de 1 milhão de jovens na idade de 25 anos estão desempregados, e um quarto de milhão entre as idades de 16 e 25 anos nunca trabalharam. Com certeza a descrição de Karl Marx do capitalismo como um “exército de reserva de desempregados”, ridicularizada por gerações de economistas capitalistas, é uma realidade inquestionável. É, além disso, uma arma efetiva da burguesia contra os que têm “sorte” suficiente de ter um emprego. A precarização está puxando as condições, tal como nas docas, de volta às do inicio deste século ou mesmo do século 19. Mas condições similares trarão assim por diante resultados similares. Explosões industriais de não-qualificados, como no final do século 19, irão se desenvolver no próximo período, só que num plano superior. A detonação de levantes sociais é também inevitável dado o brutal tratamento dos pobres pelo governo Conservador, o que provavelmente não será diminuído sob um governo Trabalhista.

Tais são as condições na Grã-Bretanha hoje que um incidente pode iniciar uma revolta do tipo de Los Angeles. Os ‘motins’ de Bradford são um sintoma disso; 38% da população asiática em Manningham, onde os motins ocorreram, estão desempregados. Um levante na indústria está inevitavelmente sendo preparado pelo empobrecimento de milhões de trabalhadores. O hipócrita Subsídio para os que Procuram de Empregos [Job Seekers Allowance] que o governo Conservador está propondo introduzir em 1996 é uma reminiscência dos dias negros do capitalismo britânico, quando os patrões procuravam brutalmente abaixar os salários. Sob um governo Trabalhista em particular, uma revolta dos mal-pagos é inevitável, e o Militant Labour irá jogar um papel em tal movimento. A Insegurança é agora não é mais apenas uma característica da vida dos trabalhadores pois afeta cada vez mais afeta a classe média, outrora o pilar do Partido Conservador e do Thatcherismo. Nos anos 80 a desregulamentação, embora “lamentável” para operários industriais, era apesar de tudo tolerado ao lado da explosão do “mercado de habitação”. Mas agora, quando isso começa a afetar altas camadas dos servidores civis, arquitetos, engenheiros, etc, berros de ultraje tem crescido dos subúrbios arborizados. Isso é reforçado pela destruição do mercado de habitação com 300 mil casas retomadas desde 1990; o mais alto número de desalojamentos desde os despejos de Highland do século 17! Tais condições são apenas a manifestação externa do declínio catastrófico do capitalismo britânico.

Quarenta anos atrás a classe dominante britânica ainda governava um quarto da humanidade Mas a perda do império, junto com seu rápido declínio econômico deixou o capitalismo britânico agora num papel menor num estágio mundial e europeu. Uma pesquisa recente mostrou que a Grã-Bretanha caiu para o 18º lugar na liga das economias capitalistas mais competitivas. Esta “queda inglória” por sua vez levou à fratura no Partido Conservador, que até recentemente era o mais velho e estável partido capitalista na Europa. No passado a classe dominante britânica, em especial seus representantes políticos, os Conservadores, em grande medida escondiam quaisquer divisões existentes em suas fileiras. Eles inventaram a marca especial da hipocrisia britânica, a fraseologia parlamentar, (“o membro honorável” etc) que permitia um debate dentro de seu círculo “charmoso” enquanto ao mesmo tempo procuravam distrair a atenção de um “3º partido” que é a classe trabalhadora. Contudo, com o inicio de seu declínio isto começou a evaporar. Os Tory Wets, a suposta ala liberal dos Conservadores, e a direita Thatcherista trocaram insultos de modo semi-público pelos anos 80. Estes eram contudo meros ressentimentos de família comparados às convulsões públicas dos atuais partido e governo Conservador. Major descreveu os Thatcheristas no gabinete – Portillo, Lilley, Howard e Redwood – como “bastardos” e sua heroína, Thatcher, como “a avó de todos os bastardos”. Eles revidaram desconsiderando Major como um “fraco” – “um bom rapaz mas um perdedor”. A falha de San Andreas que divide o Partido Conservador – que ainda existe apesar da vitória de Major sobre Redwood na disputa pela liderança Conservadora – ameaça no final romper amplamente num abismo profundo.

Há agora uma especulação aberta se os Conservadores podem seguir o caminho dos Democratas Cristãos na Itália, que virtualmente desapareceram ou dos Liberal-Democratas no Japão, dividido por facções e forçados a uma coalizão. A maioria dos MPs Conservadores não são mais “os Grandes Nobres” do passado, capazes de depender de rendas de um propriedades rurais ou riquezas herdadas. O baixo clero dos Conservadores esperam poder evitar a completa aniquilação do seu partido. Mas a direção de direita do Partido Trabalhista de Tony Blair está fazendo o jogo dos Conservadores.

Cada pronunciamento político dos membros do gabinete fantasma Trabalhista os deixa cada vez mais indistinguíveis dos Conservadores. Jack Straw, como qualquer outro provinciano direitista Conservador, recentemente expressou o desejo de ver as ruas limpas de mendigos, sem teto, limpadores de pára-brisas e “camelôs”, todos eles que são produto do capitalismo britânico em colapso. Pintando o Trabalhismo na mesma cor dos Conservadores, Blair ameaça desmobilizar setores de potenciais eleitores Trabalhistas. Já uma enorme camada de jovens estão desencantados, acreditando que “todos os políticos são iguais”, e não votarão na eleição geral. O que provavelmente salvará Blair e a direita Trabalhista é o amargo sentimento anti-Conservador. Isso provavelmente levará, embora não seja certo, à vitória do Trabalhismo na eleição geral. Mas que tipo de governo Trabalhista terão os Trabalhadores, dada a posição cada vez mais de direita de Blair?

A crise estrutural do capitalismo britânico permanece e parece piorar. O que está acontecendo na Suécia é um alerta para o movimento trabalhista britânico e a classe trabalhadora. O maior voto Trabalhista registrado numa eleição geral, em setembro de 1994, levou os Social-Democratas ao poder. Contudo, eles despedaçaram as esperanças do movimento trabalhista sueco com a adoção de um selvagem programa de austeridade. Enredado pela crise do capitalismo um governo de Blair pode ser obrigado a agir de modo similar. A única saída deste impasse seria numa direção socialista, que a liderança de Blair especificamente descarta. A inação de um governo Blair, além dos ataques às condições de vida dos trabalhadores, inevitável nas bases do capitalismo, pode preparar o terreno para uma feroz reação Conservadora que pode fazer Major e Heseltine parecerem liberais em comparação.

Os recentes eventos de 1995 em Ontario, Canadá,são um alerta aos trabalhadores britânicos. Depois de serem varridos nas eleições nacionais, com sua representação reduzida a dois assentos, os Conservadores Canadenses estão de volta ao poder na província de Ontário. Eles conseguiram isso porque o anterior governo do Partido Nacional Democrático (NDP) em Ontário foi incapaz de resolver os problemas dos trabalhadores. Isso levou a ala direita a se recolher, o que trouxe ao poder o líder Conservador Harris, com sua alegada “revolução do senso comum”. Ele prometeu introduzir o workfare [obrigação de aceitar qualquer tipo de trabalho, sob o risco de ter cortado os seus benefícios], destruir o estado de bem-estar social, e infligir mais ataques aos sindicatos junto com a redução dos direitos das minorias. Nas palavras de William Keegan, correspondente econômico do The Observer, “A loucura dos anos 80 estão vivas e bem vivas em Ontário.” (1)

Apenas o poderoso movimento trabalhista britânico adotando políticas socialistas, como consistentemente argumentado pelo Militant, pode evitar futuros pesadelos como esse para a classe trabalhadora. Como temos visto acima a burguesificação das “organizações tradicionais” dos trabalhadores pode se refletir na Grã-Bretanha com um sério racha do Trabalhismo sob um governo direitista de Blair.

O perfil para tal divisão é refletida até no jornal Tribune, que tem jogado o papel de apologista de ‘esquerda’ para a direção Trabalhista de direita. Suas colunas estão cheias de denúncias de Blair e seus acólitos. Hugh Macpherson, seu correspondente político, agora implicitamente admite o que o Militant Labour tem argumentado há algum tempo: a base operária do Partido Trabalhista está sendo sistematicamente desmantelada pela direção de Blair. Ele escreve:

Agora não há nenhuma dúvida que o novo partido que está sendo construído dentro do Partido Trabalhista não tem nenhuma conexão com o velho, salvo ao fornecer a estrutura que pode ser usada para criar o novo partido. Tony Blair disse isto quando tratou com Rupert Murdoch e seus editores em sua ilha paradisíaca. Ele disse com um extraordinário sofismo, que até as próximas eleições, o Trabalhismo poderia ser literalmente um novo partido, logo que aqueles que se uniram depois que ele se tornou líder superarem em número os membros anteriores. (2)

Macpherson, se referindo à criação de um novo partido de direita dentro do Trabalhismo, também escreve: “Mas onde estão os Militants expulsos por serem justamente aquilo – um partido dentro do partido”. (3)

Mas o que o autor não diz é quanto tempo os “2 partidos” – um abertamente burguês, agrupado em torno de Blair – podem coexistir dentro da estrutura do Partido Trabalhista. A crescente separação que é evidente agora provavelmente resultará num divórcio se um governo encabeçado por Blair chegar ao poder.

Apoiamos a criação de um novo partido socialista de massas. O sucesso do Militant no passado cresceu de uma correta compreensão da situação objetiva do capitalismo britânico e da classe trabalhadora. Mas apenas isso não é suficiente para garantir o sucesso. Também fomos capazes de identificar as questões chave em cada estágio, para então formular um claro programa e através de uma corajosa organização para levar a luta até uma conclusão. Talento e iniciativa combinada a uma cuidadosa avaliação da situação levou a espetaculares resultados na batalha de Liverpool, a luta do poll tax e a luta contra os fascistas nos anos 90. Uma igual, senão maior, tática hábil será exigida pelos marxistas no próximo período. O terreno político é agora muito mais complicado, exigindo flexibilidade abordagem junto com intransigência e implacabilidade em defesa do programa e perspectivas marxistas. O Militant Labour irá energeticamente perseguir a tarefa de construir sua própria organização.

Mas nas palavras de Marx, os socialistas “não têm nenhum interesse separado ou oposto aos do proletariado”. (4)

Ao mesmo tempo em que constrói uma poderosa força marxista o Militant Labour fará tudo em seu poder para ajudar os trabalhadores que ainda não concordam totalmente ou ainda não estão preparados a se unir a nossas fileiras, a construir uma força dos trabalhadores a mais ampla possível para resistir aos patrões na indústria mas também para politicamente aumentar o poder e a posição da classe trabalhadora. Portanto, ao construir o Militant Labour estaremos preparados para se unir com outras forças socialistas para criar as bases de um genuíno partido socialista de massas na Grã-Bretanha. Uma coisa é clara, o terreno está sendo preparado para colossais agitações sociais e políticas na Grã-Bretanha e através do capitalismo mundial antes desta década terminar. O Militant Labour demonstrou no passado sua habilidade de ligar seu programa como movimentos de massa da classe trabalhadora. Contudo, os dramas nos quais participou não serão nada frente aos poderosos eventos que se aproximam. O marxismo uma vez mais irá ressurgir com tal força que irá deixar atônitos os burgueses céticos e os socialistas de “coração fraco”. Enriquecidas pela experiência dos últimos 30 anos, nos tumultuosos eventos que são historicamente iminentes as idéias do Militant Labour serão abraçadas por dezenas de milhares, então por centenas de milhares e milhões. Esta é a pré-condição indispensável para o movimento trabalhista começar a remodelar o mundo, a substituir o obsoleto e decrépito capitalismo – que ameaça levar a humanidade para um abismo histórico – com uma sociedade de solidariedade humana, uma sociedade socialista.

1 The Observer 18.6.95

2 Tribune 21.7.95

3 Tribune 28.7./4.8.95

4 Marx e Engels, The Communist Manifesto, Foreign Languages Press 1975, P49