A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994

O Poll Tax derrotado

Outro tipo de “guerra” estava ocorrendo na Grã-Bretanha, dentro do movimento trabalhista. Em 13 de agosto, poucos dias após o funeral de Pat Wall, dois vereadores Trabalhistas de direita entraram em seu escritório distrital. Eles insistiam para que os dois assistentes de Pat Wall reunissem seus pertences pessoais e partissem. Esse era apenas um exemplo da infâmia da abordagem mesquinha da direita Trabalhista que estava se desenvolvendo numa escala nacional. Em Basildon, três apoiadores do Militant, John McKay, Eleanor Donne e Dave Murray foram intimados pelo Comitê Constitucional Nacional Trabalhista. Entre as acusações lançadas contra eles era que eles estavam num comício em apoio aos motoristas de ambulância em 30 de janeiro de 1990.

Mesmo em Dover e Folkestone, os trabalhadores demitidos da P&O Sue Haynes e Andre Bradford, que se uniram ao Trabalhismo durante a greve de 1988-89, estavam entre os 7 membros do partido sob “investigação” ao lado de Eric e Robbie Segal, membros do Partido Trabalhista por 15 anos. Eles eram acusados de serem “Militants full-time”. Uma das queixas contra eles veio de um ex-vereador Conservador que se uniu ao Trabalhismo no ano anterior. Ao mesmo tempo, o Socialist Organiser , foi banido pela direção. Militant defendeu o direito do Socialist Organiser de apresentar suas idéias e vender seu jornal no Partido Trabalhista, apesar das muitas diferenças de opinião com eles e seus apoiadores.

Liverpool

Em Liverpool, o direitista Grupo Trabalhista estava implementando aumentos nos aluguéis de £4 por semana com mais e mais diretórios do Partido Trabalhista indo para a oposição, até mesmo daqueles que não apoiavam a esquerda no passado. A câmara agiu de um modo sem precedentes ao servir uma injunção aos grevistas de Nalgo.

Esta injunção falhou em impedir um meio dia de greve apoiado pelos 6 mil membros do Nalgo. Os grevistas se reuniram na prefeitura e aplaudiram os 29 vereadores da Esquerda Ampla suspensos do Grupo Trabalhista por se opor ao poll tax e ao aumento de aluguéis.

A marcha do povo

Em contraste à imitação servil dos Conservadores, a Marcha do Povo contra o Poll Tax estava para descer sobre Londres em 20 de outubro. Os manifestantes levaram a mensagem do não-pagamento para cada parte do país. O efeito incrível desta marcha foi registrado num panfleto, Diário da Marcha do Povo por Sally Brown. O ponto alto da marcha, de acordo com a maioria dos participantes, foram os eventos em Northampton em torno de Cyril Mundin, um pensionista de 75 anos que foi levado ao tribunal e ameaçado com a prisão pelo não-pagamento. Os marchantes ocuparam o escritório do tesouro municipal e barricaram a área de recepção. A polícia do lado de fora cercou o prédio com cães, mas telefonaram para os ocupantes para negociar. Estes explicaram:

Exigimos ver um oficial municipal para encerrar o caso de Cyril Mundin. A polícia disse que a câmara estava horrorizada – eles não estavam acostumados a ter seus escritórios ocupados. Bem, é melhor eles se acostumarem.

Eventualmente, vários manifestantes foram presos. Cyril Mundin ainda se recusou a pagar o poll tax. Ele na verdade marchou com a marcha do povo fora de Northampton e “desejava ser jovem o suficiente para ir conosco até Londres mas ele desceria com a manifestação em 20 de outubro.” (1) Cyril eventualmente foi tirado da linha de fogo quando o ‘Capitão Dinheiro‘ do News of the World pagou o seu poll tax!

Ato em Londres saúda os manifestantes

Houve uma tremenda saudação aos manifestantes em 20 de outubro de 1990, com dezenas de milhares de Londres e milhares de outros de lugares tão longe quanto Glasgow e Liverpool. 35.000 no total saudaram os manifestantes em Londres. Um representante sindical de Beta, o sindicato de entretenimentos, declarou:

Eu nunca estive tão orgulhoso de minha filiação sindical como quando vi nossa bandeira levantada na demonstração de 31 de março. Vi que não estava sozinho, que outros membros do Beta comprometidos a acabar com o poll tax e lutar pelo socialismo. Sinto-me apoiado no não pagamento, sabendo que meu sindicato está atrás de mim. Isso é o que um sindicato deve ser. (2)

Tony Benn declarou no comício que um filme do Canal 4 sobre demonstração d’A Batalha da Trafalgar Square que foi recentemente transmitida “mostrou que houve um ataque da policia sobre os manifestantes para tentar intimidar as pessoas para parar a campanha.”

Prisão de Brixton

A manifestação, que foi enormemente vitoriosa em elevar o nível de resistência ao poll tax, todavia terminou com enfrentamentos quando uma manifestação separada organizada pela “Campanha dos Réus da Trafalgar Square” decidiu marchar fora do parque e parou na Prisão de Brixton. Antes disso, o grupo anarquista ‘Guerra de Classes’ se comportou de um modo totalmente alienado de todas as tradições do movimento da classe trabalhadora. Eles ocuparam posições na frente do comício e no fim da marcha e começaram a organizar virtualmente a interromper cada orador. Eles tentaram fazer Tony Benn se calar e uma dupla deles seguiu o MP Terry Fields à medida que ele deixava a tribuna, lançando-lhe insultos. Eles miravam os líderes eleitos da federação anti-poll tax e até mesmo aqueles partidários que marcharam todo o caminho da marcha do povo. Atiraram latas de cerveja no secretário da Federação Steve Nally e imundos insultos racistas jogados contra um grevista negro sul-africano do BTR que falou no comício. No ato houve até mesmo cantorias de “Melhor morto do que vermelho,” dirigidas especialmente aos organizadores da marcha. Nós declaramos:

Pequenos grupos como Guerra de Classes e aqueles que são atraídos por ele são uma porta aberta para provocadores entrarem. Se as forças do estado querem um grupo para usar a fim de incitar problemas não precisam olhar muito longe. (3)

Concedemos que eram alguns jovens totalmente alienados da sociedade que podem ser ganhos para um programa combativo socialista e da visão de classe que o Militant se baseia. Mas ao mesmo tempo, pontuamos que

Ninguém tem o direito de abusar da democracia da classe trabalhadora. Todas as manifestações precisam ser bem preparadas e disciplinadas. Ações deliberadas de provocação precisam ser controladas e tentativas de interromper reuniões impedidas. (4)

Um evento interessante ocorreu no comício quando

um escocês perdeu a calma com os perturbadores e puxou uma comprida cabeleira negra de um baderneiro. O cabelo caiu, expondo uma careca bem lisa, seu dono muito chocado para fazer algo. Quem era ele? Com quem ele estava trabalhando? E o que, fora seu cabelo curto, ele estava tentando esconder? (5)

A marcha à Prisão de Brixton foi pacífica e largamente composta por jovens “gritando referências deselegantes à Thatcher”. Mas quando alcançou a prisão, a polícia não deixou os manifestantes atravessarem a rua para ficarem de frente aos portões da prisão. À medida que a manifestação chegava, o Militant descreveu a situação:

Nós ficamos aglomerados na frente. Houve alguns incidentes menores – um policial tentou arrancar uma bandeira e fazer algum abuso. Umas poucas latas de cerveja vazias foram jogadas. Então alguém lançou um cone de tráfego, que acertou um carro. A situação rapidamente se tornou violenta quando um esquadrão de polícia se lançou na multidão para prender pessoas. Isso provocou uma saraivada de paus e garrafas nas linhas policiais. A polícia atacou de novo. As pessoas na frente eram indiscriminadamente pegas pela polícia, até mesmo os que não atiraram nada… Um homem estava gritando “calma!” para os manifestantes e a polícia – e levou uma cacetada na cabeça. (6)

Um ativista da Federação comentando as ações da Campanha dos Réus de Trafalgar Square (TSDC), escreveu: “Nas semanas de preparação para os atos repetidamente escutamos rumores de policiais falando de uma ‘reedição’ do 31 de março.”

Alguns chefes de polícia disseram mesmo a alguns organizadores que esta era a atitude de alguns policiais. E sem dúvida alguns deles viram a marcha para a Prisão de Brixton como uma oportunidade de tirar uma revanche. Numa reunião com os organizadores da TSDC e da Federação o chefe da polícia encarregado alertou que ele não permitiria aos manifestantes se reunirem em grande número fora da prisão. O escritor continuou:

Os manifestantes presos depois do ato de 31 de março precisam de uma campanha ativa de defesa, então a Federação sempre irá cooperar com o TSDC. Mas o TSDC ignorou os sentimentos da Federação de que a marcha de seus partidários pode complicar o assunto, exaurir nossos recursos e privando a Federação de finanças.

Numa reunião, pouco antes da manifestação, um organizador da Federação alertou a TSDC: “Se eu fosse você eu estaria tendo uma noite sem dormir a respeito de Brixton. Você está numa posição muito vulnerável. Espero que vocês já tenham organizado todos os seus efetivos.” (7)

A única resposta foi um sorriso e um balançar de ombros. Não havia nenhuma organização no piquete e não havia nenhuma linha clara de comunicação do que poderia acontecer no evento de estalar um tumulto. As ações da TSDC eram apenas um exemplo dos métodos divisionistas empregados por grupos com pouco apoio real na base.

Operação Cheetah

Ao mesmo tempo, a imprensa burguesa lançou outra campanha suja conta o Militant. O Sunday Times alegou que estávamos recebendo fundos de acordos secretos de terra em Liverpool. Eles vasculharam as vielas e becos de Liverpool, procurando em vão por algum sinal de evidência de ligação do Militant com corrupção. Eles tiveram a oportunidade de lançar outra campanha vil de mentiras pela “Operação Cheetah” envolvendo um exército de 280 oficiais de polícia e ao custo de milhões de libras. Ela foi dirigida contra Derek Hatton que depois de anos de perseguição se viu completamente inocente de todas as acusações contra ele.

Thatcher Fora!

Estes eventos ocorreram às vésperas de desenvolvimentos dramáticos dentro do Partido Conservador. Após a humilhação da pré-eleição de Eastbourne e depois de chegar ao terceiro lugar em Bradford Norte, MPs Conservadores estavam horrorizados de que até mesmo assentos seguros pudessem ser perdidas se Thatcher permanecesse como líder. “A dama de ferro precisa ir” se tornou um tema dos bastidores. Os tiros cruciais na campanha Conservadora anti-Thatcher foram dados por Geoffrey Howe em novembro na Câmara dos Comuns que levou Michael Heseltine a desafiar Thatcher para a liderança Conservadora. Nossa manchete em 23 de novembro dizia: “Fora! – Eleição geral agora” A primeira parte desta demanda foi satisfeita em horas; Thatcher falhou em obter uma maioria decisiva nas eleições para a liderança do partido. Ela renunciou na quinta de manhã e o Militant mudou sua primeira página para refletir isso. A atmosfera era de êxtase entre o povo trabalhador. Um apoiador andando pela estação de trem da Ponte de Londres disse que quando o anúncio chegou aos autofalantes “eles estavam dançando nas escadas rolantes! Houve um aplauso espontâneo, mulheres gritando, e quase houve uma festa na plataforma.” (8)

Estudantes de Glasgow caminharam na hora do jantar para fazer uma festa em frente à sede local do Partido Conservador. Comentaristas da imprensa especularam que foi a Europa e outras questões que derrubaram Thatcher. Mas ela e seu séqüito sabiam: Foi o poll tax no essencial que a levou a cair. Em seu relato dos seus anos no poder, ela escreveu:

Cranley Onslow deu então sua avaliação. Ele… não acreditava que a Europa era a principal [questão]: não seria crucial numa eleição geral. A maioria do povo estava preocupada com a taxa comunitária e ele esperava que algo substancial pudesse ser feito sobre isso. Intervi para dizer que eu não poderia tirar coelhos do chapéu em cinco dias. John MacGregor apoiou-me: Eu não poderia agora prometer com credibilidade uma revisão radical da taxa comunitária, não importa quão conveniente isso parecesse. (9)

Os 18 milhões de não-pagadores do poll tax é que foram decisivos em sua queda. Face a um massacre eleitoral se ela permanecesse, os MPs Conservadores a descartaram depois de 11 anos no poder.

A Campanha pelos Direitos da Juventude organizaram uma festa de champagne fora da sede Conservadora no dia seguinte da renúncia de Thatcher. E nesta semana, a Federação Anti-Poll de Toda Grã-Bretanha realizou sua 3ª conferência anual com 2 mil pessoas presentes. Esta conferência lidou com a questão crucial de como derrotar os oficiais de justiça se eles fossem usados na Inglaterra e Gales como os oficiais de justiça na Escócia. Naturalmente havia um regozijo com o fim de Thatcher e do Thatcherismo, mas também havia a determinação de continuar a luta até o poll tax estar morto e enterrado.

Bryan Wright encarcerado

Esta abordagem vigilante foi justificada quando na sexta, 7 de dezembro o primeiro não-pagador foi preso. Essa foi a primeira pessoa em 600 anos, desde a Idade Média, a ser presa por não pagar uma taxa por cabeça. Na prisão, Bryan Wright, de Grantham, o prisioneiro do poll tax, recebeu um tratamento real pelos presidiários: “Ele é um herói para os rapazes na prisão, mesmo para os guardas. Os prisioneiros diziam: “Bom para você, Bryan, você foi ótimo. Agüente firme.” (10)

Depois de vigorosos protestos ele foi solto depois de 14 dias. A implacável oposição de massas ao poll tax and e a determinação de ir à luta até o fim contrastava duramente com o sentimento da direção Trabalhista. Kinnock foi tido com tendo “ficado deprimido” porque sua melhor aposta para ganhar a próxima eleição geral, Thatcher, foi removida do poder!

Numa carta aberta publicada no Militant com a manchete “Forçar os Conservadores para fora”, o Corpo Editorial se dirigiu à Kinnock:

Você tem que mover um voto de não confiança no governo e chamar por uma eleição geral, como o Militant tem feito nas últimas semanas. Se você é sério com esta demanda, contudo, não é suficiente apenas levanta-la no Parlamento… Se você precisa de um conselho de como organizar uma manifestação de massas, fale com a Federação Anti-Poll Tax de Toda Grã-Bretanha. Na primavera, eles organizaram a maior marcha desde os Cartistas.

Continuamos:

Você está tão obcecado em se opor ao não-pagamento do poll tax que você mal a menciona toda. Você ainda está planejando expulsar os vereadores de Liverpool que votaram contra a implementação desta odiada taxa. Ao invés disso, você deveria proclamar que ela seria abolida logo que o Trabalhismo fosse eleito e prometer uma anistia dos tribunais e oficiais de justiça para todos que não pagaram. (11)

Na verdade, não esperávamos uma resposta de Neil Kinnock. E no debate de ‘não confiança’ na Câmara dos Comuns, ele foi muito patético. Ele na verdade pagou um tributo a Thatcher, realmente muito apreciado pelas 900.000 pessoas que esperavam por operações ou os milhões nas ruas que acreditavam que Thatcher e o sistema que ela representava eram os responsáveis.

1 Militant 1013 19.10.90

2 Militant 1014 26.10.90

3 ibid

4 ibid

5 ibid

6 ibid

7 ibid

8 Militant 1018 23.11.90

9 Thatcher, Op. Cit., Pp848-9

10 Militant 1021 14.12.90

11 Militant 1018 23.11.90