A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994
H-Blocks e Solidariedade
Em 1980-82 outras questões vitais preocupariam o Militant. Na Irlanda do Norte em 1981 o longo conflito nos H-Blocks [prisões cujos edifícios tinham a forma da letra H], protestos sujos e greves de fome, estavam chegando ao auge. Muito espaço foi devotado pelo Militant a esta questão, com nossos correligionários norte-irlandeses detalhando as horríveis condições nas prisões.
Os protestos de H-Block foram provocados pela retirada, pelo governo Thatcher, do ‘status especial’ dos prisioneiros. Nós dissemos:
‘H-Block’, como todos os aspectos da repressão, é na verdade uma questão de classe. Mas se o movimento trabalhista não tomar a questão para si, ela será defendida pelos fanáticos que irão torná-la uma questão sectária. Oposição à repressão, que é um dever fundamental dos socialistas, não é apoio aos Provisórios. Se opor às horríveis condições nos ‘H-Blocks’ e Armagh não é um modo de apoiar os falsos métodos de luta que organizações como os Provisórios tem tomado tanto na Irlanda quanto na Grã-Bretanha. (1)
Nós pontuamos que:
O movimento trabalhista precisa lutar pela destruição de todo o aparato repressivo. É preciso também levantar a questão de todos os que foram condenados por tribunais sem júri. (2)
Isso significava que o Militant era a favor da libertação de fanáticos sectários? Apesar das pequenas forças do Militant Irish Monthly, nenhuma outra organização tentou, como eles, trabalhar uma política em oposição à repressão que atingia também o apoio ao movimento sindical e trabalhista organizado.
Durante as ‘Perturbações’ atrocidades inumeráveis de ambos os lados foram cometidas pelos fanáticos sectários que são inimigos da unidade de classe. Tais são os ‘Shankill butchers’, assassinos degoladores de católicos inocentes, ou aqueles que desumanamente mataram dez trabalhadores protestantes em Bessbrook, South Armagh, em 1976. (3)
A proposta portanto era feita para “um inquérito conduzido pelo movimento trabalhista dos casos de todos os condenados de delitos surgidos nas Perturbações. Nas bases de tal inquérito, o próprio movimento pode decidir quem pode ser designado como um prisioneiro político, fazendo uma campanha por sua libertação.” Tony Saunois, no NEC, ganhou o apoio do Trabalhismo para uma campanha em base a estes princípios.
Thatcher, contudo, permaneceu inflexível em face das reuniões de protestos dos prisioneiros. Isso resultou em maio de 1981 na morte de Bobby Sands, seguida por outras greves de fome. Isso por sua vez levou a uma intensificação das divisões sectárias.
Infelizmente, estas apareceram justamente numa época quando o movimento trabalhista e a classe trabalhadora da Irlanda do Norte, através de greves, ocupações, demonstrações anti-Conservadores e outras atividades dos sindicatos, começaram a unir trabalhadores católicos e protestantes em ação. Vários conselhos sindicais estavam se preparando para desafiar os Conservadores e os Fanáticos numa base de independência da classe trabalhadora.
Militant nunca se furtou em descrever as condições como elas realmente eram. Uma vivida reportagem seguiu uma visita à um protestador anônimo em Long Kesh feita um apoiador bem-conhecido do Militant, Bill Webster, que vivia em Derry. Ela mostrou as horríveis condições desta época. Como resultado do tipo de intervenção dos apoiadores do Militant Irish Monthly, se abriu um diálogo entre nós e os prisioneiros nas cadeias. Apenas através deste tipo de trabalho obstinado, consistente e heróico o terreno poderia ser preparado para ganhar a classe trabalhadora irlandesa para as idéias socialistas.
Solidariedade
Outro desenvolvimento chave na arena internacional era o drama que se desenvolvia na Polônia. Enormes greves convulsionaram este país alo longo de 1980. Isso obrigou o regime stalinista de Gierek a fazer algumas concessões ‘democráticas’.
Os protestos dos trabalhadores pipocaram sob a bandeira do recém-criado ‘Solidariedade’ (Solidarnosc). O movimento era tal que Gierek foi obrigado a ceder poder para o líder militar Jarulzelski. Isso foi uma expressão do apodrecimento completo do Partido ‘Comunista’ Polonês. Militant pontuou em abril de 1981 que
apesar das ameaças de intervenção russa, apesar da ‘trégua’ de 90 dias nas greves entre o governo de Jarulzelski e os sindicatos independentes, nas barbas da oposição de seus próprios líderes, enormes explosões de raiva, inclusive greves gerais locais, continuam a estourar de um ponto da Polônia a outro. (4)
O movimento em março de 81 representou a maior greve geral ocorrida no período do pós-guerra na Polônia e o Leste Europeu. O Solidariedade apareceu como uma forte organização de 3 milhões de membros, que formalmente pertencia ao PC polonês. O regime stalinista estava por um fio. Nas condições da Polônia de então seria possivel seguir até uma revolução política, para estabelecer uma democracia operária. Contudo, o‘urso russo’, a burocracia russa, estava ameaçando uma intervenção militar a menos que colocasse uma rédea ao movimento. A total desmoralização da burocracia foi mostrada pelos comentários de um burocrata silesiano (sudoeste da Polônia): “Nós perdemos a confiança no Comitê Central e nossas crianças perderam a confiança em nós.”(5) Ao mesmo tempo nós dissemos
Por que os líderes do Solidariedade… recusaram-se a colocar a questão de uma revolução política pacífica para criar uma democracia operária. Eles inevitavelmente irão buscar uma acomodação com a ala ‘liberal’ da burocracia. Mas as demandas básicas por reforma levantarão a necessidade de terminar com o regime totalitário corrupto. (6)
O movimento de 1980-81 na Polônia claramente ia na direção de uma revolução política.
Um manto religioso?
É verdade que foi encoberto pela religião. A Igreja Católica era a instituição que tinha, na procura de uma alternativa, jogado um papel durante séculos como um tipo de guardião do nacionalismo polaco. É também verdade que havia algumas tendências pró-capitalistas dentro do Solidariedade. Mas a esmagadora maioria dos membros e simpatizantes do Solidariedade neste estágio não procuravam a salvação num retorno do capitalismo.
O capitalismo se tornou uma alternativa somente depois que o movimento foi esmagado pelos militares. Junto com as aparentes vantagens do capitalismo durante o boom dos anos 80 isso foi decisivo na mudança de perspectivas para os trabalhadores poloneses. Na última conferência do Solidariedade em outubro de 1981, um operário do estaleiro Lenin em Gdansk disse: “Algum tempo atrás tudo estava em nossas mãos, toda a Polônia estava assistindo.” (7)
A questão crucial pontuada por esta histórica conferência era o papel da liderança do Solidariedade. O correspondente do Militant que compareceu nela reportou que
os trabalhadores sentem o poder escapando deles. Instintivamente eles estão esticando a mão, para uma alternativa aos compromissos de Walesa. Estão procurando o caminho para um genuíno poder dos trabalhadores. (8)
Infelizmente, o tempo não permitiu a emergência de uma corrente marxista genuína e em dezembro de 1981 a contra-revolução atacou. Jaruzelski prendeu os lideres do Solidariedade, ‘suspendeu’ o sindicato e declarou as greves ilegais “por tempo indeterminado”. Ele tentou retirar todos os ganhos e direitos democráticos conquistados nos 17 meses anteriores. A intervenção militar russa arriscava provocar uma insurreição nacional do povo polonês. Pela escolha de se mobilizar atrás de uma figura militar polonesa a contra-revolução escolheu o curso mais seguro. Walesa inicialmente reportou que lhe foi permitido sair livremente enquanto o regime o incitava a entrar em negociações com Jaruzelski.
Enquanto havia uma resistência latente considerável ao estabelecimento do governo militar, ao mesmo tempo o movimento dos trabalhadores, por causa das deficiências dos líderes do Solidariedade, chegou a um beco sem saída. Uma certa fadiga e exaustão levaram a uma derrota temporária. Um novo movimento, que se levantaria uma década depois, tomaria uma forma inteiramente diferente do de 1980-81. A contra-revolução militar stalinista teve um efeito de retrocesso na visão dos trabalhadores poloneses. Não apenas a burocracia mas a simples idéia de economia planificada recebeu um grande golpe nos eventos de dezembro de 1981. A partir disso, as tendências pró-capitalistas iriam predominar, mesmo na consciência e no movimento dos trabalhadores. Isso iria ser reforçado no ‘boom’ dos anos 80, especialmente a partir de 1984-85. Essa foi a razão porque Thatcher recebeu uma recepção tão entusiasmada em Gdansk em novembro de 1988, pelos mesmos trabalhadores que se moveram para abraçar as idéias e o programa de uma democracia operária nos eventos de 1980-81. O esmagamento deste movimento e a completa falência do regime stalinista de Jaruzelski em desenvolver a sociedade levou ao colapso do apoio às idéias do socialismo e da economia planificada. A paixão pelo ‘mercado’ se tornaria a norma.
1 Militant 504 23.5.80
2 ibid
3 ibid
4 Militant 546 3.4.81
5 The Times 20.6.81
6 Militant 561 17.7.81
7 Militant 575 30.10.81
8 ibid