A saída é pela esquerda!

A crise política se aprofunda no país. Há um descontentamento generalizado com a inflação, aumento de tarifas, corrupção, demissões, cortes na educação, na saúde e nos programas sociais. Esse ano vai ser marcado pelo aprofundamento da crise econômica, que pode se tornar ainda mais profunda com a crise hídrica e energética, quando o fim das chuvas de verão no Sudeste retomar a queda dos reservatórios.

A resposta de Dilma tem sido austeridade e ajustes direcionados principalmente aos trabalhadores, seguindo a cartilha neoliberal. Ao mesmo tempo, Dilma sofre uma revolta da sua base aliada, liderada pelo PMDB, que quer ampliar seu poder.

É nesse cenário que ocorreram as manifestações de 15 de março, como uma revolta da classe média que menos se beneficiou da política lulista. Sem uma alternativa clara de esquerda, setores de direita, incluindo setores reacionários, deram o tom nas manifestações.

Mas a saída também não está em defender o governo Dilma e sim em derrotar os ajustes neoliberais, junto com os ataques dos governos estaduais e municipais dos tucanos e outros partidos.

Para isso ser possível, é necessário unificar as categorias e movimentos que lutam por aumento de salários, contra demissões e contra os cortes e assim construir uma saída pela esquerda, uma alternativa que aponte para uma ruptura com o sistema político e econômico podre do país, por uma alternativa socialista.

Novos dados são apresentados quase diariamente e confirmam o aprofundamento da crise. O PIB subiu somente 0,1% no ano passado. O Banco Central lançou uma projeção no dia 26/03 que o PIB esse ano deve cair 0,5%, a maior queda desde 1992 e que a inflação no ano deve fechar em 7,9%, bem acima do teto da meta de 6,5%.

A indústria continua indo mal. Nos 12 meses acumulados até fevereiro, a produção industrial caiu 4,5%. O setor automobilístico está entre os mais afetados, com uma queda de 15% na produção de veículos em 2014, o que ameaça milhares de empregos.

Um setor que não pode reclamar da crise são os bancos. A taxa de lucro dos bancos no Brasil é o dobro que nos EUA. O Itaú teve ainda um aumento de seu lucro de 30,2% em 2014, lucrando R$ 20,6 bilhões, o maior lucro da história dos bancos brasileiros privados.

Diante desse cenário, a política do governo é claramente impor um “ajuste” que coloque o peso da crise nas costas dos trabalhadores. Logo após as eleições, começou uma nova rodada de aumento de juros. As medidas provisórias 664 e 665, que atacam o seguro desemprego, auxílio doença, pensão por morte, abono salarial, etc., vieram no dia 30 de dezembro, no finalzinho do mandato, ainda com a assinatura de Guido Mantega como Ministro da Fazenda. Vimos também o tarifaço, com aumentos da gasolina e diesel, transporte e energia, etc.

Luta contra os ajustes

Os cortes implementados no final do ano passado e no começo do ano têm tido um efeito forte nos programas sociais, universidades federais e também nos estados e municípios. O MTST já se mobilizou contra a paralização do Minha Casa Minha Vida. No dia 26/03 houve um dia nacional de luta contra os cortes nas universidades.

Houve greves importantes também, como a greve no setor público no Paraná. Dezenas de milhares de funcionários públicos, liderados pelos professores, conseguiram barrar o pacote de maldades do governador Beto Richa.

Os professores estaduais de São Paulo também entraram em greve contra o governo Alckmin, que oferece 0% em reajuste, com dezenas de milhares nas manifestações.

Os garis do Rio de Janeiro, que conquistaram uma grande vitória com aumento de 37% no ano passado, conseguiram 8% de aumento, depois do governo primeiro não oferecer aumento nenhum. Os garis em várias cidades no estado de São Paulo também saíram em greve.

A luta dos trabalhadores terceirizados do Comperj teve uma vitória parcial após muita luta, depois de ficarem por meses sem salário. Muitos terceirizados das universidades federais sofreram com os cortes na educação e também se mobilizaram.

Nos dias 07 a 09 de abril houve uma jornada de lutas dos servidores federais, com o dia 07 sendo um dia importante de luta contra a PL4330 das terceirizações.

Disputa trabalho-capital

Mas a disputa não se trata somente sobre as finanças públicas. Tão ou mais importante no ponto de vista das grandes empresas é salvar seus lucros, jogando o peso da crise nas costas dos trabalhadores. Nos anos de crescimento econômico e desemprego baixo, os salários em geral têm aumentado mais do que a inflação.

Segundo o Dieese, 91,5% das disputas salariais no ano passado terminaram com ganhos reais para os trabalhadores, em média com ganhos de 1,39% acima da inflação. Mas agora o desemprego está subindo. A taxa de desemprego nas seis maiores metrópoles subiu de 4,3% em dezembro para 5,9% em fevereiro, segundo o IBGE, e o rendimento real dos trabalhadores em fevereiro foi 0,5% menor que o do mesmo mês de 2014, o pior resultado desde maio de 2005.

Os patrões querem usar a crise para atacar os salários e direitos dos trabalhadores. Por isso, querem tanto a PL4330, que libera as terceirizações, uma ferramenta importante para os patrões diminuírem os direitos dos trabalhadores.

Já houve lutas importantes contra as demissões, como as greves na Volkswagen em São Bernardo do Campo e na GM em São José dos Campos, ambas conseguindo barrar as demissões imediatas. No dia 1 de abril, os trabalhadores da Ford em Taubaté saíram em greve contra as demissões de 137 trabalhadores.

Os sindicatos combativos têm que traçar uma estratégia para essa luta, que vai ficar mais complicada com o aumento das demissões. É necessário começar a questionar o direito dos patrões destruírem o meio de sustento de milhões para salvar os lucros de um punhado de ricos. A produção tem que ser voltada para a necessidade social e em sintonia com o meio-ambiente, não para gerar lucros.

Reprovação de Dilma

Diante do descontentamento generalizado e da crise política, a reprovação da Dilma nas pesquisas do Datafolha assumiu o nível mais alto de um presidente desde a crise do governo Collor em 1992. A queda é muito rápida. Enquanto 24% avaliavam o desempenho de Dilma ruim ou péssimo em dezembro, 62% reprovavam a presidenta na medição de março. Somente 13% achavam que o desempenho de Dilma era bom ou ótimo em março, comparado com 42% em dezembro e 65% em março de 2013.

Essa queda não é só um produto da crise econômica em si, mas também da sensação de traição que muitos sentiram após as eleições. O discurso da Dilma, com ataques a Aécio pela esquerda, levou milhares de pessoas a fazerem campanha pela Dilma no segundo turno, só para ver a Dilma fazer o oposto do que pregava na campanha após as eleições.

Atos da direita 15 de março

O esgotamento do lulismo abriu um grande vazio na política. Os atos do dia 15 de março foram uma expressão do descontentamento da classe média, que foi quem menos se beneficiou dos governos do PT.

A grande maioria dos presentes nos atos era da classe média branca. Segundo a pesquisa do Datafolha, entre os participantes em São Paulo, 47% indicaram “protestar contra a corrupção” como motivo de estar nas ruas, 27% “pelo impeachment de Dilma”, 20% “contra o PT” e 14% “contra os políticos”. Havia um sentimento contra todos os partidos. O Paulinho da Força (Solidariedade) foi vaiado e não conseguiu discursar em São Paulo. Jair Bolsonaro também foi vaiado no Rio de Janeiro.

Dentro da classe média encontramos uma camada com visão bastante reacionária, aqueles que xingam os nordestinos pela vitória da Dilma, pedem a intervenção militar e chamam Dilma de “comunista”. Esses não são a maioria (por exemplo, somente 10% na pesquisa do Datafolha dizia que “em certas circunstâncias, é melhor uma ditadura”), mas se sentiam a vontade a colocar suas ideias abertamente, incluindo por uma intervenção militar, nos atos. Se a esquerda não conseguir apontar uma saída alternativa coerente à crise, o apoio a essas ideais podem crescer na classe média, especialmente se a crise começa a afetar mais duramente essa camada da sociedade.

A direita quer sangrar o PT

Nenhuma ala da direita hoje está seriamente planejando um golpe contra o governo. O alarmismo sobre o “golpe” serve mais como justificativa para justificar apoio ao governo federal, apesar dos ataques contra os trabalhadores. Não é a toa que o PT foi o partido que mais recebeu doações das grandes empresas nas eleições, coroado pelos 350 milhões recebidos pela Dilma para sua campanha presidencial. As grandes empresas apostaram nas eleições em que o PT ainda é o partido mais capaz de garantir os ajustes necessários para manter seus lucros, além do fato que muitas dessas empresas esperam receber de volta o dinheiro em forma de contratos lucrativos ou mesmo pelos esquemas de corrupção.

Ao mesmo tempo, sabem que o esgotamento do lulismo limita sua capacidade de segurar as lutas dos movimentos sociais. Isso ficou evidente nas jornadas de junho, o primeiro grande movimento de massas no país desde os anos 1980 em que o PT não era uma força protagonista. Por isso, esse apoio não é eterno ou incondicional.

Os partidos da oposição de direita, encabeçados pelo PSDB e apoiados pela mídia e os grandes capitalistas, querem sangrar o governo e ao mesmo tempo garantir que os ajustes fiscais sejam implementados.

Quem está colocando em xeque a “governabilidade” de Dilma hoje é a direita governista: o PMDB, “principal aliado” do PT, segundo decisão do último congresso do PT. A linha do PMDB é de chantagear o governo para ampliar o seu poder.

Uma queda imediata do governo não interessa ao PSDB. Ela geraria uma crise profunda que atingiria a economia como um todo e os interesses do capital. Os tucanos também teriam que se responsabilizar pela crise e teriam poucas chances de ganhar as eleições em 2018. Além disso, a queda do governo significaria também uma crise institucional, que afetaria também o PSDB, que é um partido de governo nos estados e herdariam essa crise se tivessem que assumir o governo.

Por outro lado, o PSDB não pode se distanciar demais das camadas que foram às ruas no dia 15 de março. Se o tema do impeachment pegar, eles têm que estar juntos, se não o apoio eleitoral pode ir para alguma figura ocasional, como um Joaquim Barbosa da vida. Por isso, Aécio Neves e figuras do PDSB ficaram tateando qual postura ter diante dos protestos. Hoje, FHC, Aécio ou Alckmin não apoiam o impeachment, mas deixam aberta a questão se houverem novas acusações diretas à Dilma. Em entrevista, FHC deixou claro que uma condenação judicial não é necessária para haver um impeachment, basta à perda de governabilidade. Deu o exemplo do Collor, que foi absolvido no Supremo, mas cujo impeachment foi um “julgamento político”.

Reforma política

Está cada vez mais evidente a bancarrota do sistema político do país. A tendência de gerar novos partidos para cada um dos grupos ou figuras do poder, as campanhas eleitorais cada vez mais caras, a corrupção endêmica. Defendemos qualquer medida que restrinja os interesses das grandes empresas e seu representantes políticos, ou que implemente elementos de poder popular.

Porém, a tendência é que qualquer medida que saia do congresso atual será para o pior. Como vimos, bastou o risco das doações de empresas diminuírem por causa da Operação Lava Jato, o congresso votou a triplicação do fundo partidário no orçamento.

Nesse sentido, é mais coerente defender uma assembleia constituinte para discutir a reforma política. Porém, uma eleição chamada hoje com as regras atuais, que favorecem aos grandes interesses econômicos e grupos de poder, dificilmente levaria à eleição de uma assembleia constituinte menos corrupta e conservadora. Uma verdadeira reforma política só poderá ser conquistada com uma correlação de forças mais favorável na rua, que consiga ameaçar o sistema atual.

Por isso, o foco deve ser o de construir as lutas contra os ataques dos governos e, assim, fortalecer uma alternativa de esquerda. Hoje a luta contra a retirada de direitos tem mais potencial de mobilizar do que uma luta para mudar o sistema político, algo bastante abstrato pra a maioria, principalmente uma nova geração com postura ainda bastante cética e antipartidária.

Hoje vivemos um desgaste profundo do petismo/lulismo, sem que ainda haja uma alternativa política clara para as massas. Já havia camadas importantes que romperam com o PT e seus movimentos auxiliares desde a chegada ao poder de Lula em 2003, o que resultou na formação do PSOL, CSP-Conlutas, Intersindical, etc.

Essa esquerda é ainda minoritária. Vimos na Europa que esse período de forte desgaste das antigas organizações, sem que uma alternativa clara surja, pode ser relativamente longo. Nesse período, o PT ainda pode obter votos de grande parte dos trabalhadores, como um “mal menor”, mas com uma base cada vez mais frágil nos movimentos.

Esse processo se reflete nas jornadas de junho de 2013, onde a esquerda não teve capacidade de canalizar a vontade de protestar. De certo modo, os atos de 15 de março também refletem isso. Em uma situação em que a classe trabalhadora tivesse uma direção mais clara, uma boa parte da revolta da classe média, exceto as camadas mais reacionárias, poderia ter sido canalizada pela esquerda.

Há uma nova camada de jovens trabalhadores que deram passos pra frente nas lutas sindicais desde junho de 2013. Em alguns momentos, esses novos ativistas conseguiram atropelar direções burocráticas e impor uma nova radicalidade na luta, como na greve dos garis no Rio de Janeiro no ano passado. Isso ainda não se reflete em uma forte renovação sindical. Muitas vezes, a velha direção ainda consegue se manter, com manobras burocráticas, controle do aparato, mas também fragilidade e fragmentação da esquerda.

Construir uma Frente de Esquerda e dos Trabalhadores

Por isso, é fundamental hoje a construção da unidade da luta, construindo espaços amplos e democráticos da esquerda para elaborar lutas concretas. Devemos utilizar os atos do dia 15 de abril para levantar a necessidade de unificar a luta e lançar uma Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, unindo PSOL, PSTU, PCB, MTST, CSP-Conlutas, Intersindical e demais movimentos dos trabalhadores, da juventude e do povo dispostos a enfrentar os governos e construir uma alternativa política socialista no país. Assim teremos uma base mais forte para atrair essa nova geração de lutadores e camadas críticas dos movimentos governistas, como CUT, MST, UNE, etc., que hoje se opõem às medidas do governo, mas não enxergam uma alternativa viável para barrar a direita.

Defendemos:

  • Derrotar nas greves e nas ruas o ajuste de Dilma e dos governos estaduais e municipais!
  • Barrar as demissões e o arrocho no setor privado – que os patrões paguem pela crise!
  • Nenhum direito a menos – barrar as MPs 664 e 665, o PL 4330 que amplia as terceirizações e todos os ataques aos trabalhadores!
  • Pelo direito à agua, transporte, moradia, saúde e educação – não ao “tarifaço”, sucateamento e privatização dos serviços públicos!
  • Barrar os ataques da direita reacionária – não a redução da maioridade penal; em defesa dos direitos de mulheres, negros e negras e população LGBT! Por 1% do PIB investidos no combate à violência contra a mulher.
  • No lugar dos cortes e ajuste defendemos a taxação das grandes fortunas e a auditoria e suspensão do pagamento da dívida pública aos grandes especuladores!
  • Barrar as privatizações do governo Dilma no setor de infraestrutura, Caixa, etc. Pela reestatização das empresas e bancos que foram privatizados e dos setores chaves da economia com controle dos trabalhadores!
  • Defender a Petrobras conquistando petróleo 100% estatal e com controle dos trabalhadores.
  • Punição de corruptos e corruptores, incluindo expropriação dos recursos desviados – por uma comissão popular de inquérito que faça o que o Congresso reacionário é incapaz de fazer!
  • Por uma reforma política radical que comece com a proibição do financiamento empresarial de campanhas eleitorais, o direito de revogabilidade de mandatos e eliminação do Senado.
  • Unir as greves e lutas em curso (professores, garis, sem-teto, sem-terra, etc) e construir as bases para uma greve geral de 24 horas contra o ajuste e pelos direitos dos trabalhadores. Unidade de ação com todos os setores dispostos a construir essa luta!
  • Por uma Frente de Esquerda e dos Trabalhadores unindo PSOL, PSTU, PCB, MTST, CSP-Conlutas, Intersindical e demais movimentos dos trabalhadores, da juventude e do povo dispostos a enfrentar os governos e construir uma alternativa política socialista no país!

 

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