Vidas pretas importam! A luta por justiça social e econômica nos EUA
Desde a morte de Mike Brown, jovem negro estadunidense, morador da cidade de Ferguson, os EUA vivem um levante popular da população pobre, preta e trabalhadora contra o racismo institucional que persiste. É um dos maiores movimentos desde a década de 1960, quando Martin Luther King, Malcolm X, Angela Davis, Bob Seale e diversos outros ativistas pretos e pretas se insurgiram contra o sistema racista e capitalista, para lutar por direitos civis e igualdade social e econômica.
O assassinato de Mike Brown, que estava desarmado, em 9 de agosto de 2014, levou a população de Ferguson e região a meses de grande revolta e protestos, especialmente depois que seu assassino, o policial branco Darren Wilson, foi inocentado. Outro caso emblemático foi a morte de Eric Garner, um homem preto de 43 anos, que vendia cigarros em Nova York. Em uma abordagem policial violenta, no dia 17 de julho, foi agarrado pelo pescoço com um golpe “mata-leão”, sufocado e teve um ataque cardíaco, mesmo enquanto dizia “não consigo respirar”. Neste caso o júri também inocentou o policial branco Daniel Pantaleo.
Protestos contra racismo e violência policial
Desde que esses casos aconteceram, passaram a ocorrer centenas de marchas nos EUA, com milhares de manifestantes ocupando ruas, rodovias, prédios públicos e delegacias policiais. As pessoas exigem que a polícia – majoritariamente branca – seja responsabilizada pelas mortes de pretos em diversos estados do país. Mesmo com os grandes protestos contra o racismo e violência policial, muitos outros jovens continuaram morrendo nas mãos da polícia!
Assim surgiu o combativo movimento #BlackLivesMatter (#VidasPretasImportam), construído principalmente por jovens pretas e pretos e com grande apoio da comunidade preta dos EUA. A memória de Martin Luther King, Malcolm X, Angela Davis, carregam o espírito dos movimentos dos anos 1950 e 1960 pelos direitos civis da população preta estadunidense.
O choque com a democracia racial de Obama
Com marchas de milhares de pessoas pelas ruas dos EUA, diversas bandeiras contra a violência das forças policiais fizeram com que a consciência de classe dessa nova geração em luta avançasse bastante e que se percebessem os limites dos representantes ditos “progressistas” e em favor da população negra dos “Democratas”.
Em Nova York, o prefeito Bill de Blasio, eleito com um discurso contra a violência da polícia, não impediu que a morte de Eric Garner acontecesse. Pelo contrário: além de não condenar a não-responsabilização do policial que cometeu o assassinato, foi o próprio prefeito que escolheu o comandante de polícia William Bratton, conhecido por conduzir o treinamento de policiais com uma linha bastante dura e repressiva.
No caso do presidente Obama, muitas vezes visto como um representante da comunidade negra, vemos que não basta ser negro para estar em defesa da luta anti-racista. Essa luta é uma luta de classes sociais e é preciso escolher um lado. Obama escolheu o dele.
Mesmo diante dos protestos massivos do movimento #BlackLivesMatter, aprovou sem nenhuma alteração a venda de equipamento militar pesado aos departamentos de polícia dos estados dos EUA. Ou seja, não promoveu nenhuma mudança fundamental na política de militarização da polícia.
Tentando criar uma cortina de gás sobre essa discussão, Obama implementou com prefeitos e governadores a compra de “coletes com câmeras’’, no valor de 160 milhões de dólares, para filmar as ações policiais. Mas essa medida não diminuiu os casos de violência policial racista. O fato de estar sendo filmado não impediu que o policial Daniel Pantaleo assassinasse Eric Garner.
Desde o movimento Occupy Wall Street, o movimento #BlackLivesMatter e a eleição da socialista Kshama Sawant são eventos de extrema importância e que tem o potencial de levar adiante a luta contra o sistema capitalista dos 1% mais ricos que superexplora e discrimina racialmente 99% da população, a fim de enfraquecer suas forças.
O #BlackLivesMatter cada vez mais tira lições sobre o recorte racial das lutas – desmontando o mito da democracia racial, da sociedade “pós-racial” – e também do recorte de classe, aonde não basta ser negro, mas se posicionar e lutar ao lado dos trabalhadores e jovens negros para enfrentar o racismo e o capitalismo.
Socialist Alternative, antirracismo e a luta por US$15 por hora
No início de 2015, o movimento teve grandes manifestações no dia 19 de janeiro, Dia de Martin Luther King, e no aniversário de 50 anos do assassinato de Malcolm X, em 21 de fevereiro, recuperando as lutas e inspirações da população pelos direitos civis nos anos 60 com a determinação de encerrar definitivamente a luta que teve seus momentos mais acirrados nesses anos.
O Socialist Alternative (SA), organização irmã da LSR nos EUA, tem participado ativamente desse movimento. A SA participou, no final de janeiro, da conferência que ativistas do #BlackLivesMatter fizeram para discutir os rumos do movimento. As propostas de discutir os diversos recortes de gênero, sexualidade e econômicos da luta contra a violência racial tiveram uma grande receptividade. No dia 19 de janeiro, uma marcha vitoriosa na Filadélfia unificou a luta dos trabalhadores em educação, dos ativistas do #BlackLivesMatter e do movimento pelo salário mínimo de 15 dólares por hora.
A participação do SA em dezenas de estados do EUA e a bandeira de vincular a luta contra a violência racial à luta por uma salário mínimo de 15 dólares por hora o colocou como importante colaborador e construtor da luta antirracista e anticapitalista nos EUA. O SA faz a discussão histórica com as lições que Martin Luther King Jr tirou nos últimos anos de sua vida, inclusive quando foi assassinado, ao participar da luta dos trabalhadores do saneamento. King foi assassinado por tirar conclusões e por falas suas que diziam que “Há algo de errado com o capitalismo. Deve haver uma melhor distribuição da riqueza, e talvez os Estados Unidos devam avançar no sentido de um socialismo democrático’’. Assim como Malcolm X, que também afirmava prontamente que “não há capitalismo sem racismo”, conclamando ativistas pretos e pretas para a luta antirracista, mas também para a luta unitária com todos(as) os trabalhadores pelo fim do capitalismo.
A luta continua
Hoje o movimento está latente, por conta do inverno rigoroso em diversas regiões do EUA, mas não está morto, enquanto a luta pelo salário mínimo de 15 dólares por hora continua a todo vapor. Dia 15 de abril foi um dia de protestos dos trabalhadores de fast food e outras categorias, onde uma grande parcela dos trabalhadores são pretos e pretas.
Com a unificação das lutas e proposição de pautas concretas, o próximos período promete um salto qualitativo das lutas nessa nova geração do movimento negro, que deve conclamar unidade com a classe trabalhadora estadunidense, dos sindicatos, movimentos sociais em lutas por demandas sociais, econômicas e socialistas.
Nos EUA, África do Sul, Haiti e países da América Latina, é necessário construir um forte movimento antirracista internacionalista para abalar as estruturas do capitalismo e construir um mundo socialista em nome do fim dos massacres de Marikana, Sharpeville, e do genocídio de jovens pretos como Mike Brown, Douglas, Amarildo, Cláudia, Eric Garner e tantos outros.