O “Império Americano” depois de Bush

Qual será a política externa dos EUA depois da eleição?

Os dois mandatos de George W Bush caracterizaram-se pelas guerras em andamento no Afeganistão e Iraque, a brutalidade da Baía de Guantânamo e a desigualdade sempre crescente na sociedade americana. Agora, ele está presidindo uma recessão global intensa. Com presidente eleito democrata, Barack Obama, o que essa nova situação significa para a política externa dos EUA?

A campanha eleitoral presidencial dos EUA abriu um novo capítulo para o imperialismo americano. A esmagadora oposição às políticas do regime Bush e o início de uma profunda e séria recessão viram uma demanda de massas por “mudanças”. Foram despertados massivo entusiasmo e altas expectativas, especialmente entre jovens e afro-americanos no Barack Obama. O entusiasmo e esperanças do que sua presidência significará vai além dos EUA. Pesquisa após pesquisa na Europa, América Latina, Ásia e África, Obama foi de longe o candidato favorito.

Obama chegará ao poder em uma situação mundial inteiramente diferente da que quando Bush e os neo-conservadores chegaram ao poder em 2000. A questão da política externa dos EUA na era pós-Bush está sendo posta agudamente.

Quando Bush e os neo-conservadores tomaram o poder, desencadearam o poder econômico e militar da única super-potência real que restava após o colapso da antiga União Soviética stalinista em 1989-90. O “império”, como o presidente venezuelano Hugo Chávez o apelidou, tentou impor internacionalmente seu massivo poder militar e econômico. A invasão do Iraque, realçada pela intervenção no Afeganistão, Plano Colômbia e outros, era a realidade do mundo “unipolar” dos neo-conservadores. As catástrofes que choveram sobre os povos do mundo através dessas e outras intervenções, embora demonstrassem o poder do imperialismo dos EUA, também demonstraram as limitações desse poder. Embora tenha sido construído um poderoso “império”, ele não é como o império romano na época de sua ascensão. Ele tem mais em comum com o período de declínio de Roma.

Os desastres que se seguiram ao reino neo-conservador revelaram o fato de que o imperialismo dos EUA, embora continue a maior potência econômica e militar, é uma potência historicamente em declínio. A entrada da emergente China capitalista na arena mundial coloca a ela um novo desafio econômico e militar. A Rússia também jogou um papel mais agressivo do que no período imediato após o colapso da antiga União Soviética. Ela procurou estabelecer sua própria esfera de influência, o que a levou a um conflito com os estados da União Européia e com o imperialismo dos EUA.

Esses conflitos entre os principais blocos dos EUA, União Européia, China, Japão e Rússia representa uma mudança nas relações inter-imperialistas internacionais, comparada com o período após o colapso da União Soviética e Leste Europeu. Tais conflitos e choques de interesses estão prontos a aumentar com o desencadear de uma recessão global. É essa tendência, e o poder relativo em declínio do imperialismo dos EUA, junto com o legado da crise deixada pela intervenção neo-conservadora no Iraque, Afeganistão, Oriente Médio e Ásia, a que irá moldar a política externa dos EUA nos anos vindouros.

Apesar de seu reduzido poder, contudo, o imperialismo dos EUA continua de longe a maior potência. Isso é refletido em seu orçamento militar, que estava a US$ 547 bilhões em 2007, comparado com US$ 59 bilhões para a China e US$ 36,7 bilhões para a Rússia. Estima-se que a defesa da China, em tendências atuais, subirá para US$ 360 bilhões em 2020. Mas é improvável que seja capaz de conseguir isso e ultrapassar os EUA, dado o início de uma profunda e prolongada recessão mundial, que terá conseqüências devastadoras para a China, econômicas e sociais.

A Rússia se beneficiou da bonanza do petróleo dos anos recentes, que foi parcialmente usada para reequipar seus militares. A queda nos preços mundiais de petróleo que está ocorrendo inevitavelmente terá devastadoras conseqüências e interromperá sua recente expansão econômica e militar. Ela continua uma sombra do poder da antiga União Soviética. O fato de que os EUA continuam a maior potência imperialista o obrigará a intervir onde necessário, embora de uma posição enfraquecida.

Uma potência em declínio

Contudo, o pano de fundo internacional mudado e as crises que engolfaram os neo-conservadores, junto com o poder em declínio do imperialismo dos EUA, significará que a nova presidência não será um novo “Bush II”. Esses novos traços forçarão o novo ocupante da Casa Branca a adotar uma política mais “multipolar” que seja mais “consensual”. A ideologia da “intervenção imperialista liberal” vai dominar a nova administração. Mesmo no fim da presidência Bush, a velha doutrina unipolar dos neo-conservadores foi largamente abandonada. O fato de que o regime Bush foi obrigado a negociar com a Coréia do Norte, falhou, até agora, em apoiar um ataque ao Irã, e não pôde intervir na crise Rússia/Geórgia reflete isso. O presidente georgiano, Mikhail Saakashvili, foi aconselhado por Condoleezza Rice, Secretária de Estado dos EUA, a não atacar a Ossétia do Sul. Contudo, o governo georgiano se sentiu confiante o suficiente para ir adiante, encorajado por algumas vozes dissidentes em Washington que deram “acenos e piscadelas”. Mas essa intervenção e a resposta da Rússia ilustram a posição enfraquecida em que o imperialismo dos EUA se encontra.

A atual crise econômica também ilustra a mudança que ocorreu desde que Bush chegou ao Salão Oval. O fato que as principais potências imperialistas no G7 fossem obrigadas a se unirem e concordarem com uma estratégia para lidar com a crise refletiu isso. Mas isso não significa que os EUA e outras potências capitalistas não tenderão a romper fileiras e adotem medidas protecionistas ou intervencionistas se decidirem que é de seu próprio interesse fazer isso. Também adotarão uma abordagem similar na política externa em suas próprias esferas de interesse, se forem capazes disso.

O poder em declínio do imperialismo dos EUA foi revelado pelo abandono da ideologia de intervenção neoliberal, não-estatal, que dominou a política mundial pelos últimos 25 anos, à medida que as potências imperialistas reagiram para tentar evitar uma  catástrofe. Geralmente, na era pós-1945, o imperialismo dos EUA tentou impor sua posição e usar sua força econômica na política econômica internacional. Por exemplo, isso levou à pavimentação do caminho do acordo de Bretton Woods após a 2ª Guerra Mundial. Significativamente, seguiu os países da União Européia concordando com a nacionalização parcial do sistema bancário.

Por todo o mundo neocolonial, assim como na Europa, a hostilidade para com os EUA como conseqüência das políticas de Bush aumentou dramaticamente. Bush deixará a Casa Branca com a autoridade e credibilidade internacionais dos EUA nos níveis mais baixos. O fracasso devastador da intervenção americana no Iraque e Afeganistão, e agora o abandono das políticas neoliberais, quando face ao potencial colapso do sistema financeiro mundial, encorajaram as massas na Ásia, África e América Latina. Tendo sofrido as brutais consequências da política econômica e externa neo-conservador, o evidente fracasso delas encorajou o moral das massas nesses continentes, à medida que vêem as potências imperialistas mergulhadas na crise e Bush exposto como um presidente impotente no fim do seu mandato.

Altas esperanças em Obama

Ao mesmo tempo, há sem dúvidas altas expectativas e ilusões sobre o que uma presidência Obama anunciará. Na Europa, Obama foi esmagadoramente o candidato favorito. A esperança de que uma nova presidência democrata, especialmente um presidente negro, adote políticas muito mais radicais, melhores, “humanas”, é a opinião esmagadora na América Latina, África e Ásia.

Embora Obama seja obrigado a adotar uma política externa “multipolar”, “consensual”, a questão crucial é o que isso significará na prática para as massas nesses continentes. Tal mudança na política será feita para tentar defender mais efetivamente os interesses do imperialismo e capitalismo americano em declínio. A mudança está sendo imposta ao imperialismo dos EUA à medida que os limites de suas forças foram revelados nas catástrofes militares e sociais que se desdobraram no Oriente Médio e Ásia. Na América Latina, o fracasso, até agora, de remover Chávez na Venezuela, ou derrotar Evo Morales na Bolívia, representa um retrocesso maior e pode resultar em uma possível mudança de política pela nova administração dos EUA. O claro fracasso dos EUA em Cuba, o que fortaleceu o regime de Castro, combinado com os passos para a restauração capitalista por Raúl Castro, também aumentou a pressão e demanda por uma política alternativa a ser adotada ali.

Não é a primeira vez que existiram esperanças sobre o que significaria uma nova presidência democrata “radical”. De fato, é provável que isso seja mais pronunciado no mundo neocolonial, nesta etapa, após a experiência dos dois mandatos de George W. Bush. Contudo, também houve grandes expectativas depois da eleição de Bill Clinton, após as administrações de Ronald Reagan e George Bush pai. Contudo, não deve ser esquecido que a abordagem mais “consensual” de Clinton não impediu a intervenção militar dos EUA na Sérvia ou Somália. Nem Obama se abstiverá da intervenção militar onde julgar ser do interesse do imperialismo americano e onde tenha a capacidade militar de fazer isso.

Como Obama colocou: “Não podemos nem nos retirar do mundo nem tentar ameaça-lo à submissão. Devemos liderar o mundo, por atos e pelo exemplo…” Mas as massas do mundo não querem ser lideradas pelo imperialismo americano. Se elas não puderem ser convencidas “por atos e pelo exemplo”, Obama continuou, “Devemos também estar melhor preparados para pôr as botas no chão para enfrentar inimigos que lutam campanhas assimétricas e altamente adaptativas a uma escala global”. (Foreign Affairs, julho/agosto de 2007) No mesmo artigo, ele continuou defendendo a expansão das forças terrestres dos EUA acrescentando 65.000 soldados ao exército e 27.000 aos marines. A Guarda Nacional, ele apelou, deveria ter fundos suficientes para “readquirir um estado de prontidão”.

A crise em andamento no Oriente Médio, especialmente Iraque e Irã, junto com a situação piorada no Paquistão e Afeganistão, estará no centro da política externa dos EUA nos próximos meses e anos. Atravancado no pântano do Iraque, Obama apoiou a retirada das tropas de combate dos EUA. Contudo, a perspectiva de uma total retirada não é provável,  dados os conflitos e divisões que abriram-se após a invasão do Iraque e a derrubada da ditadura de Saddam Hussein. Apesar das recentes afirmações de alguns comentaristas de que o “aumento” das tropas permitiu que o imperialismo estabilizasse a situação e reduzisse os níveis de violência, a situação continua extremamente volátil com a perspectiva de um surto de choques étnicos entre povos sunitas e xiitas. Ao mesmo tempo, novos conflitos abriram-se recentemente. O comandante das tropas dos EUA, general David Petraeus, alertou: “Os EUA ainda enfrentam uma longa luta no Iraque e os recentes ganhos na segurança não são irreversíveis”. Isso apesar de uma aparente queda na violência sectária e nos números de baixas americanas. O exército dos EUA atualmente está perdendo mais tropas no Afeganistão do que no Iraque.

Embora o governo xiita, encabeçado pelo primeiro ministro Nouri al-Maliki, tenha fortalecido sua posição, as tensões e conflitos subjacentes continuam, e podem eclodir a qualquer momento. O governo garantiu a integração dos 20.000 combatentes armados sunitas e assumiu os Conselhos do Despertar Sunita, nos quais os EUA pagam lutadores sunitas para se voltarem contra a insurgência. Apesar das garantias de Maliki, já há sinais de que seu regime está orquestrando uma campanha para perseguir e intimidar muitos deles. Além disso, até 100.000 lutadores sunitas foram pagos pelos EUA. As recentes prisões de líderes sunitas levaram a um aumento nas tensões xiitas-sunitas e a uma enxurrada de bombardeios. O medo de um conflito xiita-sunita reiniciado foi o que estava por trás da recente retirada por Bush de 8.000 soldados – um número e uma taxa mais baixos do que muitos comentaristas estavam antecipando.

Junto a essas tensões, a decisão de Maliki de enviar tropas iraquianas à cidade majoritariamente curda de Khanaquin – ostensivamente parte de uma operação militar mais ampla contra as forças da al-Qaida – inflamou os curdos, que a viram como um jogo de poder de Maliki e do governo iraquiano. Essa intervenção torna qualquer perspectiva de um acordo negociado sobre o status de Kirkuk, rica em petróleo, ainda mais improvável.

A possibilidade desses conflitos eclodirem é realçada ainda mais pela recessão econômica mundial e as conseqüências que terá sobre o Iraque e todo o Oriente Médio, especialmente com a queda nos preços de petróleo. Contra esse pano de fundo, a perspectiva de uma ruptura do Iraque, ou pelo menos em sua fragmentação em uma série de divisões dos povos xiitas, sunitas, curdos e outros, é o que provavelmente os EUA e outras potências imperialistas provavelmente enfrentarão no futuro próximo. Embora uma redução dos soldados dos EUA do nível atual de 140.000 seja provável, se o novo ocupante da Casa Branca decidir escalar a ofensiva no Afeganistão, ele deixará uma série de guarnições pesadamente fortificadas no Iraque a proteger os interesses dos EUA, especialmente os campos de petróleo.

Espiral descendente no Afeganistão

O objetivo de Obama de reduzir a intervenção militar no Iraque, enquanto aumenta a do Afeganistão, e Paquistão se necessário, ao invés de fortalecer o imperialismo na região, é certo de se tornar um desastre tão grande quanto o Iraque, provavelmente pior. Mesmo antes de uma grande redução das forças americanas no Iraque, o Pentágono planejou aumentar o número de tropas no Afeganistão de 33.000 para 47.000, por causa do claro fracasso da intervenção. Longe de estabilizar a situação, uma ofensiva renovada encorajará ainda mais a resistência Taliban. Em 2008, os EUA perderam mais tropas no Afeganistão do que em qualquer época desde que a ocupação começou em 2001. Todas as 16 agências de espionagem americanas concordam em um recente relatório da Estimativa de Inteligência Nacional (NIE) do Afeganistão, cuja publicação foi adiada até depois da eleição presidencial, de que as forças dos EUA e OTAN enfrentam uma “espiral descendente”.

A hostilidade esmagadora para com as tropas dos EUA e OTAN deu maior apoio e simpatia aos insurgentes. Isso foi reforçado pelo mar de corrupção e nepotismo em que nada o governo de Hamid Karzai e pelo colapso na segurança. Com relatos de pessoas locais tendo que ir ao Taliban para receber “justiça” contra ladrões e trapaceiros por que não podem recebe-la do aparato estatal oficial, o regime de Karzai está rapidamente perdendo qualquer confiança ou legitimidade que pudesse ter tido entre grandes setores da população. Existe uma situação desesperada, com um surto de violência e falta de segurança em Cabul e outras cidades. Rodric Braithwaite citou jornalistas afegãos, antigos profissionais Mujahideen: “Eles desprezam o presidente Hamid Karzai, a quem comparam com Shah Shujah, o fantoche britânico instalado durante a primeira guerra afegã. A maioria preferia Mohammad Najibullah, o último presidente comunista. As coisas eram melhores sob os soviéticos. Cabul estava segura, as mulheres tinham emprego, os soviéticos construíam fábricas, estradas, escolas e hospitais… Mesmo o Taliban não era tão mau: eram bons muçulmanos, mantinham a ordem…” (Financial Times, 16 de outubro de 2008)

Com senhores da guerra trocando de lados para quem paga mais, e com mais de 50% da renda nacional vindo do boom do comércio do ópio, o escritor britânico Max Hastings comentou que “a mais alta aspiração” deveria ser por um “controle dos senhores da guerra” (Guardian, 13/10/2008) Aumentar a ofensiva militar resultaria apenas em um desastre maior que arrastará as forças dos EUA e OTAN ainda mais fundo no pântano que está desestabilizando ainda mais a já explosiva situação no vizinho Paquistão.

Tensões entre os EUA e Paquistão

O podre Perves Musharraf foi finalmente removido do poder, para irritação do imperialismo dos EUA, que apoiava-se neste regime como seu principal aliado na região na “guerra ao terror”. Por nove anos, o imperialismo dos EUA apoiou seu regime, prodigalizando estimados US$ 11 bilhões em ajuda em troca de seu apoio. Essa política de Musharraf, que era um colaborador do imperialismo dos EUA, serviu para minar seu apoio. O Paquistão, inundado com enorme pobreza, corrupção e opressão nacional, evoluiu para um virtual estado falido. O Paquistão está na beira de uma implosão e mesmo de uma possível ruptura como conseqüência da desintegração econômica e social que está ocorrendo. O preço de muitos alimentos básicos subiu 100% em poucos meses. O fornecimento de energia é interrompido frequentemente, causando devastação para as massas e mutilando negócios, que não podem funcionar. O NIE conclui que o Paquistão está “na beira do abismo”. Um diplomata americano diz que o Paquistão está “sem dinheiro, sem energia e sem governo”. (Guardian, 17/10/2008) O novo governo de coalizão, chefiado por Asif Ali Zadari – famoso pela corrupção e conhecido como “Sr. 10%” por causa dos subornos que foi acusado de aceitar – ameaça ter vida curta.

As regiões fronteiriças com o Afeganistão, Warizistão Norte e Sul, esmagadoramente constituidos por pashtuns, e a Província de Fronteira Noroeste (NWFP) tornaram-se a principal base para o Taliban e outras forças insurgentes que operam no Afeganistão. O Warizistão tornou-se o que um diplomata descreveu como um “supermercado do terrorismo”, onde as forças do Taliban armam, treinam e lançam ataques no Afeganistão. No Warizistão Norte e Sul, a bandeiras brancas do Paquistão Tehrik-i-Taliban, uma força islâmica local, flutuam de prédios governamentais. A capital da NWFP, Peshawar, foi virtualmente cercada por suas milícias armadas. Junto a isso, existe uma situação explosiva no Baluquistão. Quando os bombardeios assassinos que abalam Karachi e as gangues armadas e senhores da guerra que operam no Sind rural são acrescentados a isso, a escala do desastre que os povos do Paquistão enfrentam não pode ser exagerada.

A oposição ao imperialismo dos EUA entre as massas na NWFP e Warizistão Norte e Sul abasteceram o crescimento do Taliban e outras forças insurgentes nestas áreas. Os serviços de segurança paquistaneses, ISI, e setores do exército, estão crivados de simpatizantes dos insurgentes que se opõem a colaborar com os EUA e sua “guerra ao terror”.

É contra esse pano de fundo que Bush autorizou o uso de unidades de operações especiais e incursões do Afeganistão no Paquistão. O Almirante Mike Mullen, falando ao congresso em nome dos chefes do estado maior, junto com o secretário de defesa, Robert Gates, pediu que essas fossem aumentadas. Essa estrarégia foi apoiada por Obama e os democratas: “Me unirei com nossos aliados em insistir – não apenas em pedir – que o Paquistão castigue o Taliban, persiga Osama bin Laden e seus tenentes, e termine sua relação com todos os grupos terroristas”. (Foreign Affairs, Julho/Agosto de 2007)

Isso levantou tensões entre os EUA e o novo primeiro ministro do Paquistão, Zadari. Essas incursões recentemente resultaram no exército paquistanês abrindo fogo sobre as forças dos EUA. Os perigos das operações militares americanas sobre o território paquistanês foram claramente mostrados em um artigo do general-tenente Shahid Aziz, antigo chefe do estado maior sob Musharraf. Ele acusou Musharraf de “Convidar os americanos de lutar sua guerra em território paquistanês, sem consultar o exército… Os militantes serão multiplicados aos milhares. O exército paquistanês não será capaz de apoiar as operações americanas. A crise financeira e a intranquilidade nas ruas criarão caos no país e a guerra se espalhará”. (Guardian, 16/09/2008) Essa política é apoiada por Obama, que levantou a questão de usar tropas americanas no Paquistão antes de Bush autorizar as recentes incursões. Os choques recentes abriram uma profunda brecha no governo Zadari. Um parceiro da coalizão, Jamiat-Ulama-i-Islam, até propôs que o Taliban se dirigisse ao parlamento após um relatório apresentado pelos militares.

Uma combinação da crise afegã e os eventos no Paquistão ameaçam um pesadelo ao imperialismo dos EUA, e terão horríveis conseqüências para os povos de toda a área. A política de Obama de pôr mais “botas no chão” porá mais lenha na fogueira da insurgência e tornará uma situação explosiva ainda mais instável.

Um arco de crise

À crise engolfando o Paquistão, Afeganistão e Iraque deve-se acrescentar o Irã, que, junto, envolverão os EUA e o imperialismo ocidental em um “arco de crise” cobrindo toda a área. Quando se acrescenta a situação difícil dos povos palestinos, junto com as perspectivas da derrubada do regime pró-ocidental de Hosni Mubarak no Egito, assim como uma série de convulsões por todo o Golfo e Oriente Médio, a escala dos problemas que o imperialismo dos EUA enfrenta apenas nesta área é imensa. Agora, ele os enfrenta de uma posição enfraquecida.

Tem havido muita especulação sobre as perspectivas de um ataque às instalações nucleares iranianas. A conseqüência de tal ataque militar seria o de incendiar todo o Oriente Médio. Além disso, o regime iraniano certamente retaliaria bloqueando o Estreito de Hormuz, cortando assim a parte do leão dos fornecimentos de petróleo ao Ocidente. As conseqüências de tal ataque, e o esforço e recursos despejados no Iraque e Afeganistão, até agora impediram o regime Bush de apoiar tal ataque, apesar da intensa pressão de Israel. O regime israelense está determinado a evitar que o Irã desenvolva um programa de armas nucleares e empreendeu uma série de manobras militares para demonstrar sua capacidade de lançar tal ataque, embora ele provavelmente precise da ajuda dos EUA para fazer isso. Além disso, até Bush esteve preparado para modificar sua posição, tomando passos para estabelecer aberturas diplomáticas de baixo nível. Elas, contudo, foram postas na espera até depois das eleições presidenciais.

Embora Bush e seu regime até agora se abstivessem de desencadear um ataque aéreo, embora não seja provável, não se pode excluir que Israel possa agir unilateralmente, em uma certa etapa. A crise social em Israel pode levar sua classe dominante a usar isso como um meio de “reconstruir a unidade nacional” contra um inimigo comum. De outro lado, a ameaça de tal ataque tem sido usado pelo regime iraniano para tentar aumentar seu próprio apoio. Face a tal pressão, é possível que Obama aplique sua política “consensual” e abra negociações, seja abertamente ou por trás das cenas. Mas, como ele alertou, isso será apoiado pela aplicação de sanções mais duras contra o Irã, cujo preço será pago pelo povo iraniano.

Uma nova era

Contudo, na América Latina, é possível que Obama adote uma abordagem diferente da dos neo-conservadores, especialmente em relação à Cuba e, possivelmente, Venezuela e Bolívia. Isso reflete o fracasso da política americana para com Cuba desde a revolução de 1959 e as tentativas de Raúl Castro de se mover para a restauração capitalista junto com uma atitude mais aberta de uma segunda e terceira geração de cubanos e latinos na Floridas e outros estados americanos. Como parte desse processo, é possivel que as sanções comerciais sejam suavizadas. Alguns comentaristas especularam que isso poderia ser feito em troca de “eleições livres” em algum momento no futuro, sem data especificada. Contudo, o início da recessão mundial complicará ainda mais o processo de restauração capitalista plena em Cuba.

Não está excluído que Obama possa fazer algumas aberturas a Morales e Chávez, cujos governos enfrentarão crescente pressão e tumultos como conseqüência da queda nos preços do petróleo e outras commodities. Ao mesmo tempo, a determinação da direita nestes países de remover ambos os governos e a perspectiva de explosões sociais ainda maiores pelas massas exigindo políticas anti-capitalistas mais radicais do que as que foram introduzidas até agora, poderiam facilmente fazer com que a esperança de Obama de “reabrir um diálogo” com esses governos fracassarem. Além disso, a perspectiva de convulsões ainda maiores em outros países latino-americanos, como Brasil, México e Argentina, certamente abrirá novos conflitos com o imperialismo dos EUA à medida surjam que movimentos sociais mais radicais e combativos que possam pressionar novos governos a tomar medidas ainda mais radicais que os levem a conflitos com o imperialismo.

O imperialismo americano é a única grande potência imperialista com uma fronteira direta com um país neocolonial – México. O governo mexicano tem sido preparado para adotar políticas pró-capitalistas e colaborar com o imperialismo dos EUA. Por quanto tempo ele pode continuar a fazer isso é outra questão que confrontará Obama. Com 80% das exportações mexicanas destinadas para os EUA e US$ 25 bilhões enviados de volta todo ano por mexicanos trabalhando nos EUA, a recessão em desenvolvimento já está tendo conseqüências devastadoras. A perspectiva de grandes convulsões sociais e de classe no México terá importantes repercussões dentro dos próprios EUA.

As novas relações inter-imperialistas que se desenvolvem abrirão uma nova era, com crescentes tensões entre os principais blocos e dentro deles, como recentemente mostrado na União Européia durante a crise econômica. A idéia que está sendo propagandeada de um novo acordo de Bretton Woods não corresponde às novas realidades que existem para o capitalismo global. O acordo de Bretton Woods foi feito quando o imperialismo dos EUA era a potência mundial claramente dominante. A existência de um sistema social alternativo, os antigos regimes stalinistas na União Soviética e Leste Europeu, com economias planificadas governadas por ditaduras burocráticas, forneceu uma “cola” que uniu os outros países imperialistas e capitalistas. Com o colapso desses regimes, hoje não existe nenhuma cola e os recursos disponíveis ao capitalismo mundial em um período de profunda recessão são muito diferentes daqueles que existiam após a 2ª Guerra Mundial, quando uma virada econômica do capitalismo estava ocorrendo.

Embora acordos temporários sejam possíveis entre as várias potências imperialistas, esses não oferecerão um retorno à relativa estabilidade que se seguiu ao acordo de Bretton Woods. A sangrenta carnificina no Oriente Médio, Ásia, África e Cáucaso não pode ser resolvida sob o capitalismo e o imperialismo. Apesar de sua posição enfraquecida, os EUA, como a maior potência imperialista, serão obrigados a intervir em algumas dessas crises. A perspectiva de mais conflitos e guerras é o que a nova era de capitalismo e imperialismo significará – até que a classe operária e outros explorados pelo capitalismo substituam-no pelo socialismo, o único caminho para resolver os conflitos e horrores que são produtos da intervenção imperialista e do capitalismo.  

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