As duas caras da globo: Quando a novela é o panfleto dos ricos

É extremamente corriqueiro os meios de comunicação alardearem a sua neutralidade no que tange a veiculação de informa ções. A serviço da “verdade” jornais impressos, revistas, programas de rádio e de TV afirmam ter um compromisso com os fatos e nada mais. Mas afinal, quem escolhe os fatos importantes a serem divulgados? Quem são os responsáveis por definir o que é fato e o que é mentira?

Toda essa equação moral se debate dentro de gabinetes suntuosos das grandes corporações midiáticas que dominam o setor, de acordo com os seus interesses financeiros.

As chamadas novelas “das oito”, desde os primórdios da Globo, tiveram um papel essencial para divulgar o pensamento da classe dominante e naturalizá-lo no imaginário popular. Intimamente ligada aos porões da ditadura, aos altos escalões de poder e às grandes empresas estrangeiras, a Globo utilizava o seu folhetim diário para divulgar, de maneira sorrateira, o modo capitalista de viver.

Desqualificação da mobilização estudantil

A atual novela Duas Caras vem cumprindo esse papel de maneira cada vez mais explícita e caricata. Diante da resistência dos estudantes contra o sucateamento das universidades públicas federais com o REUNI/ Universidade Nova (projeto de expansão e reestruturação das universidades federais do governo Lula/PT), Agnaldo Silva se encarregou de elaborar uma novela que se baseava na contra-informação, buscando desqualificar a todo custo qualquer tipo de mobilização dos estudantes com alusões quase que diretas às ocupações que se deram nas universidades de todo o Brasil.

Já nos seus primeiros capítulos, Duas Caras, mostrou o conflito entre estudantes e a direção da universidade particular Pessoa de Morais. Em função da sucessão ao cargo de reitor da universidade, os estudantes exigiam que após a morte do antigo reitor, deveria abrir-se uma eleição para o cargo. Interinamente, a personagem Branca (Suzana Vieira), viúva e proprietária da universidade passou a ocupar o cargo de reitora.

Revoltados, os alunos protagonizam cenas em que se mostram como baderneiros inconseqüentes e, como que num espetáculo de jovens imbecis, os estudantes são mostrados desafiando a polícia para brigas, queimando pneus e destruindo o prédio da universidade. Algo no mínimo absurdo, afinal, a grande responsável pela violência nas ocupações foi a polícia, que se utilizou da truculência para estabelecer uma forte repressão.

Houve casos em que a reitoria chegou ao absurdo de contratar capangas para bater nos estudantes, como aconteceu na UFPE, em Pernambuco, ou mesmo levando a votação do REUNI para trás dos muros de um quartel, como aconteceu em Rondônia com a Universidade Federal de Rondônia. Essa postura que passou por cima dos regimentos internos das universidades federais, era algo que não se via desde o período da ditadura militar.

Enquanto isso, o líder estudantil na novela Duas Caras se resume a um maquiavélico futriqueiro, que não gosta de estudar e adora criar problemas. A noção global de política do movimento estudantil é passada bem aos moldes burgueses: como uma permanente disputa individualista alimentada pela corrupção.

O rapaz grava conversas para barganhar coisas junto à reitoria, e como um histérico, passa os dias a chamar a personagem Branca de fascista, aliás, o rapaz é tido como bem burro, pois volta e meia o personagem de José Wilker corrige seus supostos equívocos teóricos: “não me ve nha com a sua retórica marxista”.

“A solução é privatizar”

A visão de universidade da Globo fica clara na cena em que se mostra uma reunião do Diretório Acadêmico. Como que por toque de bondade, uma aluna propõe que os alunos sejam estagiários em troca de experiência e não recebam nada por isso. O trabalho universitário é mostrado quase que como um favor para o estudante que deve apenas se dar por satisfeito por conseguir trabalhar.

Durante as aulas, o personagem de José Wilker, apresenta a sua grande teoria para melhorar o Brasil de forma magistral: “a solução é privatizar a educação!”. Num programa repleto de merchandising, por que não acreditar que tal diálogo não faz parte de uma política publicitária das indústrias de diplomas do Brasil para que aumentem seus lucros? Entre cervejas, perfumes e tantos produtos a educação é apresentado como mais um produto digno de ser explorado por empresários, a revelia das implicações sociais que isso possa vir a causar.

Arrombo de bondade A postura da universidade privada Pessoa de Moraes em relação às comunidades pobres é apresentada de maneira, no mínimo, hipócrita. Como que por um arrombo de bondade, a universidade ministra cursos de férias para a comunidade Porte linha, mostrando que as empresas também têm coração. Algo irônico, já que as universidades não fazem cerimônia na hora de embargar as aulas dos estudantes inadimplentes ou de aumentar as mensalidades sem qualquer justificativa.

Tamanho desespero em difamar a luta dos estudantes parece que não garantiu a audiência que a Globo esperava. A estréia da novela foi um grande fracasso para os padrões Globo.

É urgente que os trabalhadores, desempregados, a juventude e todo o povo oprimido aprofundem formas alternativas de expressão artística e informacional, de modo a superar as caricaturas falaciosas da Globo, que criminalizam os movimentos sociais, e a pregação neoconservadora.

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