Capitalismo e constituição psicológica: uma relação de dominação
A atividade na sociedade capitalista tem um sentido muito restrito; ela é reduzida ao lucro e a concentração de renda, o que torna o trabalho assalariado a única alternativa de sobrevivência, ou seja, elemento central na vida da maioria das pessoas.
O trabalho capitalista massacra os próprios trabalhadores, pois se estabelece de maneira hostil e por meio de confrontos entre as classes sociais. Assim, o padrão das relações sociais torna-se, também hostil, violento e individualista – uma grande maioria tem que garantir sua própria sobrevivência enquanto uma minoria, o crescimento dos lucros.
Considerando que a constituição psicológica é um processo desenvolvido socialmente, no bojo das relações sociais, o capitalismo apresenta-se como elemento chave na compreensão do fenômeno psicológico. O homem desenvolve-se na relação com os outros, portanto, suas relações cotidianas são responsáveis por estruturar os pensamentos, a forma de agir e de sentir, e, por fim, a organização global da mente.
Na medida em que as relações sociais refletem a dinâmica de exploração capitalista, barreiras concretas impedem o desenvolvimento de uma consciência crítica, autônoma e saudável. A consciência é condicionada pelas questões objetivas, mas isto não corresponde a total subordinação do psicológico ao social. Ao mesmo tempo em que o sistema capitalista massifica a consciência, leva-se em conta a capacidade do homem de criticar e refletir sobre a própria realidade, o que pode vir a ser um elemento importante nas mobilizações e na construção das lutas diárias da classe trabalhadora e, portanto, um fator que não pode ser ignorado, apesar da potência e da supremacia das condições reais e objetivas sobre as subjetivas.
A compreensão de que a maioria dos problemas, preocupações, angústias, sentimentos e ações das pessoas não estão relacionados, de forma direta, a questões psicológicas e, sim objetivas (principalmente sob o jugo do trabalho capitalista), é essencial para aproximar a psicologia à realidade. Nesta perspectiva, o fenômeno psicológico é compreendido para além indivíduo, pois está alocado no próprio sistema capitalista. Sendo assim, a superação e a transformação deste sistema prima sobre qualquer tipo de ação psicológica.
Desta forma, a compreensão dos problemas psicológicos recoloca as psicopatologias em dimensões sociais e políticas. A sociedade capitalista adoece os homens ao explorá-los no limite de suas possibilidades, ao iludi-los com relações sociais sedutoras e hipócritas, ao ignorar suas capacidades de se emanciparem, ao esgotarem suas possibilidades de se assumirem como sujeitos autônomos e comprometidos com o estabelecimento de condições materiais para sua própria vida, ao contribuir para o desenvolvimento do sentimento de medo e impotência diante de seu cotidiano tornando o outro um potencial inimigo.
Os psicólogos não hegemônicos podem contribuir para a construção de um novo modelo de sociedade, denunciando o impacto das relações capitalistas sobre o homem e colocando o capitalismo como centro das discussões psicológicas – o desenvolvimento psicológico saudável atrelado ao florescer de uma nova sociedade.
Neste sentido a construção de instrumentos que servem a luta da classe trabalhadora – com um partido político de massas – é fundamental para o desenvolvimento psicológico saudável, pois favorece o aparecimento de condições objetivas necessárias a este processo. A conscientização não é um processo abstrato, ela é impulsionada pela luta concreta do dia a dia. Dessa forma, a saída para superar as psicopatologias, prescritas no próprio cotidiano, atravessa a construção de uma sociedade socialista, onde podemos encontrar condições estruturais para a realização do ser humano enquanto tal.