Índia: Greve geral colossal sacode o país

Em 29 de setembro uma greve nacional de um dia ocorreu por toda a Índia atingindo principalmente serviços aéreos, ferroviários e bancários. Aeroportos e escritórios dos setores privados e governamentais, assim como escolas e faculdades, fecharam.

Os sindicatos protestavam contra as reformas econômicas do governo dominado pelo Partido do Congresso na primeira greve ocorrida desde que este chegou ao poder em 2004. O governo liderado pelo Congresso quer liquidar sua parte nas corporações estatais, privatizar aeroportos e permitir investimento estrangeiro em fundos de pensão.

A coalizão governamental é liderada pelo Partido do Congresso e conta com quatro partidos de esquerda para manter a maioria no parlamento. Os dois principais partidos comunistas da Índia são apoiadores importantes da coalizão dominante, mas a pressão dos trabalhadores os forçou a publicamente fazer oposição às “reformas” do governo.

Durante os últimos anos, a Índia foi apresentada, por comentaristas pró-capitalismo de todo o mundo, como uma história de sucesso econômico e como uma prova de como a globalização pode transformar as vidas dos países pobres. É dito que as políticas neoliberais conduziram a um grande crescimento na economia indiana. Sua enorme força de trabalho é uma escolha popular para companhias multinacionais que procuram por trabalho barato em “fontes externas”

Apesar da Índia ser a quarta maior economia na Ásia, isto ocorre, largamente, ao custo das condições e dos direitos dos trabalhadores e devido a um aumento da exploração no local de trabalho. Enquanto uma seção das classes médias ganhou com o “boom”, muitos trabalhadores não ganharam e as desigualdades cresceram. A vasta maioria da população rural continua analfabeta e empobrecida. A renda per capita é de meros US$ 620 (Banco Mundial, 2005). Mas, é claro que os ricos tornaram-se muito mais ricos.

Os trabalhadores já estão esgotados. Isto foi demonstrado pela magnífica greve geral da última semana – a qual envolveu mais de 50 milhões de trabalhadores por todo o país. Esta é uma indicação poderosa do humor real entre a maioria dos trabalhadores. Isto mostra onde está o poder real na sociedade – nas fábricas, nos escritórios e nas comunidades da classe trabalhadora. Para construir seu poder sindical, os trabalhadores da Índia necessitam de um novo partido socialista de massas que lutará por mudanças fundamentais.

Jagadish Chandra, do CIO na Índia, relata a greve e o cenário de fundo desta demonstração brilhante do poder dos trabalhadores.

do site Socialistworld.net

Índia: Greve geral colossal sacode o país

Cinqüenta milhões de trabalhadores se mobilizam contra a privatização

Uma fonte de notícias online, “rediff.com”, chamou a greve geral da Índia de 29 de setembro de “a mãe de todas as greves”. A greve foi impulsinada por trabalhadores em muitas partes do país. Esta foi a primeira greve geral desde que o governo da Aliança Progressiva Unida (United Progressive Alliance – UPA), encabeçada pelo Congresso de Manmohan Singh, chegou ao poder. M. K. Pandhe, líder do Centro de Sindicatos Indianos (Centre of Indian Trade Unions – CITU), o qual é controlado pelo Partido Comunista (Marxista) da Índia – CPI(M) – se referiu à greve como “a maior desde a globalização”. De acordo com as principais fontes de notícias a participação total foi por volta de 40 milhões, apesar da liderança dos sindicatos afirmar que ultrapassou os 50 milhões.

O chamado para a greve veio principalmente do CITU e do AITUC (Congresso de Todos os Sindicatos da Índia) que estão sob controle do velho Partido Comunista da Índia (CPI). Os sindicatos de bancos, serviços de seguro, serviços de associações de estados e empregados do governo central de várias cidades participaram na greve. Apesar dos trabalhadores dos serviços ferroviários não participarem, os trabalhadores de aeroporto participaram.

A ação de 29 de setembro mostrou um claro contraste com a última greve geral de 21 de maio de 2003, quando os trabalhadores de todo o país participaram espontaneamente. Durante esta ação de massas anterior, mesmo as seções não-organizadas da classe trabalhadora, tal como os trabalhadores de baixos salários em pequenas e médias indústrias ou aqueles que ganham salário diário na Índia rural, participaram.

Desta vez não houve campanha para construir o 29 de setembro. As lideranças dos partidos comunistas aperfeiçoaram o ato de fazer oposição pública contra o governo, o qual eles apóiam. Ao mesmo tempo, os militantes de base e mesmo a liderança regional dos sindicatos liderados por comunistas acreditavam que o “sagrado” Programa Mínimo Comum, que os partidos comunistas barganharam com o pró-capitalista Partido do Congresso, cuidaria das demandas da classe trabalhadora.

Porém, a enorme participação dos trabalhadores em 29 de setembro mostra a natureza combativa da classe trabalhadora indiana. Esta foi a décima greve geral em nível nacional desde os ataques das políticas de liberalização econômica feitas pelo FMI e pelo Banco Mundial que começaram em 1991.

Apesar do papel de colaboração de classes desempenhado pela liderança dos partidos comunistas, foi clara, durante a greve, a crescente raiva contra as políticas neoliberais do governo da Aliança Progressiva Unida liderada pelo Partido do Congresso (CP). Foi esta raiva de classe que derrubou o governo do aparentemente, todo-poderoso, comunalista Partido Bharatiya Janata nas eleições gerais de maio de 2004.

Este percurso do setor comunal raivoso da classe capitalista mostrou que os trabalhadores da Índia falaram numa voz só e rejeitaram qualquer sinal da classe capitalista. Mas os partidos comunistas, dada a sua falência ideológica, deram uma interpretação totalmente diferente para os resultados das eleições de maio de 2004.

À serviço do capitalismo

Pintando como “secular” o Partido do Congresso, os líderes dos partidos comunistas indicaram que era preciso algum tipo de aliança que não fosse com o BJP e que pelo fato do Congresso ser um partido secular ele levaria a uma nova coalizão. Enquanto o CPI estava preparado para participar de tal formação governamental, o CPI(M) era cauteloso tendo em vista sua base em Bengala Ocidental e Kerala.

Servindo como cobertura para esta política, o Programa Mínimo Comum foi criado e a UPA apoiada pela esquerda chegou ao poder. O Partido do Congresso estava mais do que feliz em assinar este documento prolixo e de centro-esquerda que os colocaria de volta no poder. Ele também ajudaria o Partido do Congresso a reconquistar sua aura de supostamente ser o campeão dos trabalhadores e outras classes exploradas.

O Programa Mínimo Comum pode ser associado ao mais sujo capacho da Índia. Suas cláusulas foram maculadas e violadas por vezes e vezes pelo Partido do Congresso no poder. O CP não tem intenção de cumprir o chamado do Programa de parar as privatizações imprudentes ou de seguir a prescrição do Programa para que o governo assuma uma política externa não-alinhada e independente.

Dos 16 pontos de demanda do Programa Mínimo Comum, as principais discordâncias da esquerda (CPI, CPI(M), RSP e o Bloco Avante) que apoiou a greve geral de 29 de setembro eram de que o governo estava permitindo o investimento estrangeiro direto nas vendas e pensões, retirando investimentos (privatizando) de indústrias do setor público lucrativo e estava mudando o Ato de Disputas Industriais para permitir uma política livre de “contratação e demissão”.

Nos meses recentes diversos pequenos conflitos desenvolveram-se entre a esquerda que apóia a UPA e o principal partido do governo – o CP. Uma luta foi sobre a retirada de investimentos da BHEL (empresa de eletricidade), a qual é uma das “Navaratnas” (“nove jóias”) do país. Quando o governo da UPA, liderado pelo CP, noticiou sua intenção de retirar mais 10% de investimentos, os partidos de esquerda se opuseram boicotando sua participação nas reuniões da UPA argumentando que o governo estava violando o Programa Mínimo Comum.

Apesar de ser um evento colossal, a greve geral de 29 de setembro foi usada pelos partidos de esquerda para salvarem a própria pele diante da raiva de membros de sindicatos ao invés de ser uma forma de desenvolver uma esquerda forte e independente.

As futuras eleições para as assembléias estaduais de Bengala Ocidental e Kerala, onde o Partido do Congresso é a principal força de oposição, pressionaram as lideranças do partido comunista a distanciarem-se do Congresso nas questões de economia e de política externa.

O discurso ambíguo stalinista

Mas uma dicotomia medíocre desenvolveu-se dentro da esquerda stalinista, principalmente em relação ao CPI (M). Enquanto possui uma atitude de denúncia da ofensiva neoliberal do Congresso e do BJP, quando chega em Bengala Ocidental, onde o CPI(M) está no poder, o partido tem a política de oferecer um carpete vermelho de boas vindas para o neoliberalismo.

O CPI(M) dá argumentos ridículos para justificar sua posição. Buddhadev Bhattacharya, o Primeiro Ministro de Bengala Ocidental, é descrito pela mídia pró-capitalista como o “garoto de recado” do capitalismo indiano. Algumas de suas declarações e ações colocaram os líderes partidários do CPI(M) em uma situação muito embaraçosa. Sua recente declaração intitulada “Reformar ou perecer” é também a expressão favorita do Primeiro Ministro indiano, Manmohan Singh, que disse ao parlamento: “Eu gostaria que todos os primeiros ministros fossem iguais a ele [Buddhadev Bhattacharya]”.

Apesar das posturas dos chamados “linha-duras” do CPI(M) em relação ao investimento estrangeiro direto e às companhias multinacionais, Buddha infelizmente quer que o magnata indonésio, Anthony Salim (que é ligado ao antigo ditador indonésio Suharto), vá em frente com seu “projeto de centro industrial” de US$ 10 bilhões em Bengala Ocidental. O investimento prometido pelo homem de negócios da Indonésia é quase três vezes maior que o valor de tudo o que a Índia recebeu no último ano fiscal de novos investimentos estrangeiros direto.

Iludido?

Mesmo entre apoiadores dos principais partidos de esquerda o discurso político ambíguo do CPI(M) em relação ao investimento estrangeiro direto é ridicularizado. A posição na resolução política do CPI(M) – de que o investimento estrangeiro direto deve aumentar a capacidade produtiva ao invés de somente acumular bens; deve levar a um avanço tecnológico da economia e que isto gerará emprego – é um mero argumento “reformista” para iludir a militância do partido. Combinado com isto, a liderança do CPI(M) faz declarações tais como: “na era da globalização o país não pode ficar isolado” e “Vejam, comunistas, nós não podemos mais falar de velhos dogmas. O mundo está mudando. Nós também estamos mudando. Vejam a China. A situação é completamente diferente, se vocês a compararem com antes de 1978”. Este tipo de comentários explicita o papel traiçoeiro dos partidos comunistas stalinistas da Índia.

O espírito combativo da classe trabalhadora indiana, por um lado, e a crise que a liderança sofre, por outro, nos lembra das famosas palavras do marxista russo, Leon Trotsky: “a crise histórica da humanidade é, antes de mais nada, a crise de sua direção”.

Os partidos comunistas da Índica completaram seu ciclo. Hoje eles defendem a “democracia” capitalista, isto é, o sistema capitalista enquanto no passado estes partidos, ao menos em palavras, tinham como estratégia “quebrar a burguesia desde dentro”.

A tarefa de construir um partido de massas dos trabalhadores genuíno, sobre bases socialistas, é a necessidade urgente de nossos tempos. Isto demanda juntar os melhores militantes dos partidos comunistas, os sindicalistas mais politicamente avançados e os mais combativos da nova geração de trabalhadores e jovens que mostraram sua força em 29 de setembro. Isto significa forjar um novo partido socialista revolucionário e de massas da classe trabalhadora que se opõe a impulsionar governos capitalistas, rivais da classe trabalhadora e, ao invés disso, avançam em políticas de classe independentes para conquistar as massas de trabalhadores e pobres para a luta por uma nova sociedade socialista.