Eleições mostram: cresce o espaço para a esquerda e aumentam as contradições na base governista

É hora de construir o terceiro turno das lutas contra governos e patrões

O governismo venceu as eleições, mas saiu mais dividido desse processo. Num ano de importantes lutas sindicais e populares, a esquerda socialista, especialmente o PSOL, ocupou um espaço importante e deixou claro o potencial para um crescimento ainda maior. Usar essa base para fomentar e apoiar as lutas é nossa tarefa central.

Os partidos da base de Dilma Rousseff elegeram a maioria dos prefeitos e vereadores nas eleições municipais desse ano. Porém, se PT, PMDB e PSB estão entre os vitoriosos nas urnas, não foram poucas as situações em que disputaram duramente entre si acirrando os conflitos na base governista com vistas a 2014.

O governista PSB foi o algoz do PT em quatro capitais: em Recife (PE), Fortaleza (CE), Cuiabá (MT), e Belo Horizonte (MG).

O PSB passa a ser em 2013 o partido que governa o maior número de capitais, ultrapassando o PMDB e o PT que antes estavam empatados nessa posição. O PMDB despencou de seis capitais sob sua administração para apenas uma a partir do próximo ano, a cidade do Rio de Janeiro. O PT caiu de seis para quatro. A vitória de Haddad em São Paulo serviu para evitar um desempenho pior nas capitais e representou um passo importante do “lulo-petismo” no confronto com o combalido PSDB.

O PSDB se mantém na segunda colocação em termos de número de prefeitos eleitos, mas perdeu 89 prefeituras. O DEM rolou ladeira abaixo perdendo 218 prefeituras e ocupa a nona posição. O primeiro colocado ainda é o PMDB, mas que também caiu bastante, perdendo 177 prefeituras. O PT continua na terceira posição com um leve crescimento ganhando 77 prefeituras. O PSB, por sua vez, aumentou em 132 o número de prefeituras sob seu controle e ocupa a sexta posição.

No campo da oposição de direita ao governo Dilma, o que vemos é um enfraquecimento evidente. Essa situação aponta para uma reformulação da linha adotada pela direita tradicional. O PSD, novo partido formado por Kassab que reúne ex-tucanos e “demos”, é fruto desse processo. O partido, que ocupa a quarta posição em número de prefeitos eleitos, se prepara para aderir formalmente ao governo Dilma, depois de ter apoiado o Serra em São Paulo.

As contradições e conflitos entre os partidos da base de Dilma, em particular entre o PT e o PSB, podem apontar para o surgimento de candidaturas alternativas à de Dilma em 2014, dependendo da evolução do cenário político e econômico. Não se pode também descartar a possibilidade de algum acordo entre o PSB e setores da direita tradicional com uma maquiagem oposicionista menos carregada.

Espaço para a esquerda

Outra marca importante do processo eleitoral desse ano foi o crescimento do espaço para a esquerda socialista e para o PSOL em particular. O simples fato de que o partido disputou o segundo turno com chances reais de vitória em duas capitais (Belém e Macapá) já dá uma dimensão desse crescimento da importância do PSOL.

Como a vitória obtida pelo PSOL em Macapá foi marcada por uma política não coerente com a história do partido e que deve ser rejeitada pela militância, é no Rio de Janeiro que o fortalecimento do partido fica mais evidente, apesar do partido não ter vencido as eleições.

O candidato do PSOL a prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo, obteve incríveis 28% dos votos válidos. Não conseguiu impedir que o atual prefeito, Eduardo Paes do PMDB, vencesse já no primeiro turno. Afinal Paes foi o candidato de uma coligação de 20 partidos, incluindo o PT que indicou o candidato a vice-prefeito, numa campanha milionária que contou com todo o apoio do governado do estado do Rio, de Sérgio Cabral (também do PMDB) e do governo federal.

Campanha militante

A campanha de Freixo mobilizou milhares de ativistas voluntários, como há muito tempo não se via, pelo menos desde quando o PT virou um partido da ordem. O PSOL elegeu ainda quatro vereadores na cidade do Rio, dobrando sua bancada na Câmara Municipal.

Em outras capitais de estados, mesmo sem vencer, o PSOL obteve importantes votações, como no caso dos 14,4% em Florianópolis (estado de Santa Catarina), os 11,8% em Fortaleza (Ceará), os 4,2% em Belo Horizonte (Minas Gerais) e os 3,6% em Natal (Rio Grande do Norte, com Robério Paulino da LSR).

Entre as votações expressivas em cidades com mais de 200 mil eleitores, destaca-se o caso de Niterói, a segunda cidade do estado do Rio de Janeiro, onde o PSOL obteve 18,4% dos votos para prefeito e elegeu três vereadores (os três, assim como o candidato a prefeito, das alas mais à esquerda do partido e dois deles com envolvimento prioritário da LSR na campanha).

O partido saltou de 25 para 49 vereadores, com 22 deles eleitos em capitais. O primeiro prefeito eleito na história do PSOL é Gelsimar Gonzaga no município de Itaocara, estado do Rio de Janeiro, que já mostrou a que veio ao eleger em Assembleia popular os secretários de saúde e educação, reduzir o próprio salário e defender a formação de Conselhos Populares.

No campo da esquerda socialista, o PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado), em aliança com o PSOL, também elegeu, depois de muitos anos, um vereador Belém e uma vereadora em Natal.

O crescimento do PSOL nas eleições também reflete um novo momento de lutas e mobilizações no país.

Impacto do julgamento do “mensalão”

As eleições aconteceram sobre o pano de fundo de um dos julgamentos mais espetaculares já realizados pelo poder judiciário brasileiro. Durante semanas, os ministros do Supremo Tribunal Federal, com transmissão ao vivo pela TV, julgaram os envolvidos no mega-escândalo de corrupção do “mensalão” que, há sete anos, provocou a queda do homem-forte do governo Lula, ministro chefe da Casa Civil José Dirceu e atingiu duramente o primeiro mandato de Lula.

Porém, apesar da dimensão grandiosa do episódio, com condenações espetaculares de alguns dos principais dirigentes históricos do PT, o impacto político do julgamento do mensalão não foi suficiente para derrotar o PT. Para a maioria dos eleitores o voto nos candidatos da base do governo Dilma reflete a relativa estabilidade econômica e a esperança de que as possibilidades de acesso ao consumo irão permanecer indefinidamente. Esses fatores, por hora, pesaram mais.

Um setor importante da classe média apenas reafirmou sua posição anti-petista. Outro setor tirou conclusões corretas e buscou alternativas de esquerda e o relativo crescimento do PSOL não deixa de ter alguma relação com a rejeição à corrupção. Outra parcela simplesmente deixou de votar ou votou nulo ou branco.

Um total de 26% do eleitorado brasileiro absteve-se de votar ou votou nulo ou branco no segundo turno das eleições municipais. Desse total, as abstenções representaram 19% e os votos brancos e nulos somaram 7,44%. A campeã dos votos brancos e nulos foi São Paulo com o índice de 9,27% dos votos. Além disso, 20% do eleitorado paulistano não compareceram às urnas, o maior percentual desde 1992.

A importância da disputa em São Paulo

A vitória do PT no segundo em São Paulo, com Fernando Haddad, foi o principal triunfo do governismo. De um lado ela alimenta o projeto prioritário do “lulo-petismo” que é tirar o governo do estado de São Paulo das mãos do PSDB. De outro, joga a última pá de cal sobre José Serra, até então a principal figura pública da direita neoliberal tradicional, e impõe uma reorganização da oposição de direita.

Mas, a vitória de Haddad não escondeu as fragilidades do “lulismo”. Da mesma forma que fez com Dilma Rousseff, Lula empenhou-se ao máximo na tentativa de transferir seu prestígio ao novo candidato paulista. Quase fracassou.

Durante a maior parte da campanha, a base social do “lulismo”, baseada nas populações mais pobres da periferia seduzidas pelas possibilidades de consumo a crédito, foi capturada por Celso Russomanno, um populista de direita que apoia Dilma e cuja imagem é fortemente vinculada à defesa dos consumidores.

Ao contrário das ilusões geradas em uma parcela em meio ao confronto com o PSDB de Serra, Haddad não representa uma alternativa real para os trabalhadores de São Paulo. O anúncio do aumento das tarifas de transporte no início do próximo ano já feito pelo prefeito eleito, assim como  a manutenção da política privatista na saúde municipal, mostram claramente a que interesses o governo do PT servirá na prefeitura.

A verdadeira esquerda deve comprometer-se a construir uma oposição baseada nas lutas sociais e nos movimentos organizados da classe trabalhadora. Esse é o único caminho capaz de arrancar conquistas e fazer avançar a luta.

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