Uma visão diferente: Uma introdução ao materialismo dialético
Por que ter uma filosofia?
“Os filósofos não fizeram mais que interpretar o mundo de diferentes formas; trata-se, porém, de transformá-lo” (Marx: Teses sobre Feuerbach).
No início do século XXI, um quinto da população mundial vive na absoluta pobreza com um dólar por dia ou menos, enquanto os bens das 200 pessoas mais ricas são maiores do que os ganhos conjuntos dos 2,4 bilhões mais pobres do planeta.
Apesar disso, a prosperidade material cresceu mais nos últimos 100 anos, do que no resto da história humana. Portanto, já existem, potencialmente, as bases para um progresso jamais imaginado da sociedade humana, de tal forma que as contradições criadas pelo capitalismo possam ser varridas pela classe trabalhadora no mundo.
Os capitalistas por meio de seu controle do judiciário, do militar, da educação e da mídia estão sempre procurando evitar que trabalhadores e jovens tirem a conclusão de que o capitalismo pode ser transformado.
Na imprensa, comentadores ocasionalmente abordam este ou aquele sintoma da doença do sistema, enquanto repetem o mantra de que a economia de mercado representa o único evento na vizinhança.
Ao mesmo tempo, justificativas mais sérias do capitalismo são produzidas. O colapso da União Soviética em 1989-1992 deu um impulso massivo para um setor das mentiras literárias, permitindo que filósofos burgueses afirmassem que o capitalismo saiu vitorioso em sua luta histórica com o socialismo.
Cada classe dominante ao longo da história procurou dar ao seu regime o selo de permanência. Sem contar que existiram várias formas de dominação de classe como o escravismo e o feudalismo, os apologistas do capitalismo de hoje acreditam que a sua forma de comandar a sociedade é a melhor e representa a maior das conquistas.
Tony Blair denunciou veementemente o Marxismo como “um dogma sectário fora de moda”. Sua única contribuição para a filosofia foi dar crédito à teoria da Terceira Via de Anthony Gidden’s – a idéia muito velha e desacreditada de que pode existir uma via alternativa entre o mercado e a economia planificada.
A maior parte dos líderes capitalistas acredita que eles não precisam de uma filosofia. Ganhar dinheiro é tudo o que importa e eles abraçam a idéia de que se algo funciona, então é bom. Eles são extremamente empíricos em sua abordagem, respondendo pragmaticamente aos novos desafios e raramente buscam compreender as relações e conexões entre políticas e eventos, causas e efeitos. Nas esferas da política e da economia, está o pensamento filosófico complacente de que o que ocorreu no passado continuará sem grandes mudanças no futuro.
Nos anos 90 eles estavam certos de que o “boom” simplesmente continuaria crescendo. Quando ele colapsou, estavam atônitos, mas não aprenderam nada, apenas coçaram suas cabeças, afirmaram que eles sempre previam isto e retornaram à confortável posição de acreditar que o capitalismo voltaria a ficar bem de novo.
Este texto demonstrará que possuir uma filosofia que interprete corretamente o mundo e que ofereça um compasso para mudá-lo é algo indispensável.
O materialismo dialético, base da filosofia marxista, ainda é o método mais moderno de pensamento que existe. Tal como Leon Trotsky destacou em Marxismo na nossa época: “… se a teoria aborda corretamente o curso de desenvolvimento e antecipa o futuro melhor que outras teorias, ela continua sendo a teoria mais avançada para a nossa época, mesmo que tenha vários anos de idade”.
O marxismo é a ciência das perspectivas – buscando antecipar como a sociedade se desenvolverá – usando o seu método do materialismo dialético para desvelar os processos complexos do desenvolvimento histórico.
Ele busca ensinar a classe trabalhadora a conhecer a si mesma e ter consciência de si como uma classe. O materialismo dialético – a ciência das leis gerais do movimento e desenvolvimento da natureza, da sociedade humana e do pensamento – foi e continua sendo uma filosofia revolucionária, desafiando o capitalismo em cada esfera e substituindo os sonhos e preconceitos da ciência.
Materialismo versus Idealismo
“Não é a consciência que determina a existência, mas a existência social que determina a consciência” (Marx & Engels: A ideologia alemã).
As pessoas sempre procuraram compreender o mundo em que elas vivem por meio da observação da natureza e generalizando suas experiências cotidianas. A história da filosofia mostra uma divisão entre dois campos – o idealismo e o materialismo. Os idealistas argumentam que o pensamento (consciência) é o centro e que as ações das pessoas vem do pensamento abstrato, independentemente da história e das condições materiais.
Foram Marx e Engels os primeiros a desafiar esta concepção, explicando que uma compreensão do mundo deve começar não das idéias que existem nas cabeças das pessoas em um período histórico particular, mas do real, das condições materiais em que estas idéias surgem.
A natureza é histórica em todos os seus níveis. Nenhum aspecto da natureza simplesmente existe; ela possui uma história, torna-se existente, modifica-se e desenvolve-se, transforma-se e finalmente deixa de existir. Aspectos da natureza podem parecer fixos, estáveis, em um estado de equilíbrio, por períodos curtos ou longos, mas nenhum deles é permanente. Para Trotsky: “A consciência cresceu da inconsciência, a psicologia da filosofia, o mundo orgânico do inorgânico, o sistema solar da nébula”.
Marx e Engels fundamentaram seu materialismo sobre as idéias e práticas dos grandes filósofos materialistas do século XVIII. O “renascimento” no século XVI ampliou as incursões culturais e científicas que eram tanto causa e efeito do início do crescimento do capitalismo. Nas palavras de Engels: “A ciência se rebelou contra a igreja; a burguesia não poderia ficar sem a ciência e, portanto, teve que participar da rebelião”.
Astronomia, mecânica, física, anatomia e fisiologia desenvolveram-se enormemente como disciplinas separadas e, como conseqüência, atingiram nas antigas crenças de um deus inviolável. Galileu, por exemplo, começou a descobrir algumas das propriedades físicas do universo e revelou que os planetas giravam em torno do sol. Mais tarde, a teoria da gravidade e as leis do movimento físico de Newton revelaram os mistérios do movimento e da mecânica. O filósofo Hobbes declarou que era impossível separar pensamento da matéria que pensa. Marx observou que este “esclarecimento” fez com que “as mentes dos homens se abrissem” para a grande revolução francesa e para a época da razão.
Mas Engels acrescentou que: “A limitação específica deste materialismo está em sua incapacidade de compreender o universo como um processo, como matéria que está em desenvolvimento ininterrupto”. Ele e Marx fundiram os brilhantes avanços científicos do materialismo com o pensamento dialético, criando a mais revolucionária e ampla teoria para explicar e transformar o nosso mundo. O filósofo alemão Hegel, resgatou a dialética dos gregos e aprendeu com o início do século XIX, era um proponente da abordagem idealista. Para ele, os pensamentos dentro do cérebro não eram imagens abstratas das coisas e dos processos, mas, ao contrário, as coisas e o seus desenvolvimentos eram apenas as imagens realizadas pela Idéia ou por Deus existindo em algum lugar da eternidade antes do mundo existir.
Desta forma, o marxismo baseia-se em uma visão materialista da história. O mundo material é real e se desenvolve por meio de suas próprias leis naturais. O pensamento é um produto da matéria, sem a qual não existem idéias separadas.
A partir disto, fica claro que o marxismo rejeita verdades universais, religiões e espíritos. Todas as teorias são relativas, abarcando algum aspecto da realidade. Inicialmente elas assumem ter validade e aplicabilidade universal. Mas em um certo momento, deficiências na teoria são encontradas. Elas devem ser explicadas e em outro momento novas teorias são desenvolvidas para dar conta das exceções. Mas as novas teorias não apenas superam as anteriores, mas também as incorporam em uma nova forma.
Por exemplo, no campo da evolução biológica os marxistas não são nem deterministas biológicos ou culturais. Há uma interação dialética entre nossos genes e nosso ambiente.
Recentemente, o “projeto genoma” permitiu o mapeamento complete da estrutura dos genes que são transmitidas de uma geração humana para outra. Alguns biólogos afirmaram que isto revelaria os genes individuais que constituem os padrões de comportamento, desde a preferência sexual até a criminalidade e preferência política!
Uma conseqüência seria a de que a posição de uma pessoa na sociedade seria enormemente pré-determinada e inalterável. Porém, qualquer tentativa de “delimitar” os genes individuais para a “inteligência” foi falha e as tentativas de definir a posição social como geneticamente determinada foram apresentadas como pura conseqüência da ideologia dos biólogos envolvidos.
Uma descoberta que revolucionou nossa compreensão do pensamento humano se deu recentemente, quando cientistas descobriram que temos menos genes do que se pensava, revelando que as influências ambientais devem ser muito mais poderosas na constituição dos atos humanos.
O que é pensamento dialético?
“Os homens pensavam dialéticamente muito antes de eles saberem o que era dialética, tal como eles falavam em prosa muito antes do termo prosa existir” (Engels: Anti-Dühring).
A dialética é a filosofia do movimento. O método dialético de análise nos permite estudar os fenômenos naturais, a evolução da sociedade e do pensamento, enquanto processos de desenvolvimento baseados sobre o movimento e a contradição. Tudo está em um constante estado de fluxo e mudança; toda realidade é matéria em movimento.
As raízes do pensamento dialético podem ser traçadas até os gregos antigos, que justamente por sua civilização ainda não ser avançada o suficiente para separar e analisar a natureza em diferentes partes, via a natureza como um todo, em suas conexões, dialeticamente. Nada na vida é estático. Nas palavras do filósofo grego Heráclito: “Tudo flui, tudo muda”.
À nossa volta, no mundo natural estão exemplos do desenvolvimento dialético da Terra e do espaço. Astrônomos ficam espantados como os supertelescópios nos permitem testemunhar o nascimento e a morte de estrelas distantes, enquanto nenhum geólogo ou especialista em vulcões pode trabalhar sem ter uma compreensão das básicas e inter-relacionadas leis da dialética – a lei da transformação da quantidade em qualidade, a interpenetração dos opostos e a negação da negação.
Na matemática uma abordagem dialética é indispensável. Na vida cotidiana nós precisamos, muitas vezes, distinguir entre linhas curvas e retas. Mas matematicamente uma linha reta é simplesmente uma forma especial de curva. Ambas podem ser tratadas usando uma única equação matemática geral.
Nós também aprendemos como em uma específica temperatura, o gelo sólido transforma-se em água líquida e em uma temperatura mais alta ainda, ela evapora – um gás – e que as três substâncias, aparentemente, diferentes são na realidade diferentes manifestações do movimento das mesmas moléculas da água.
Apesar da sociedade capitalista ou burguesa usar o método dialético em busca de avanço científico nos campos da filosofia e da economia ela teimosamente busca refutar a dialética, escondendo-se sob a metafísica (lógica formal). A metafísica traduzida na política torna-se uma justificativa do status quo, a idéia de que a evolução procede na velocidade de um caramujo.
Não é difícil de ver a razão. Explicando de uma forma marxista, o desenvolvimento de todas as formas passadas e presentes de sociedade mostram que em certos períodos na história, quando o modo de produção está em agudo conflito com o modo de troca, guerras e movimentos revolucionários ocorreram. As formas de luta de classes mudaram ao longo de diferentes períodos históricos, mas, a luta fundamental pela divisão da mais-valia entre exploradores e explorados é uma linha contínua desde as antigas sociedades escravistas até o presente.
A classe capitalista ou burguesa (tal como Marx a descrevia) precisa, portanto, esconder a concepção materialista da história de nós e, ao invés disso, exalta os atos dos grandes homens (e vez ou outra, de mulheres!) que seriam os responsáveis por mudar a história. As grandes revoluções sociais são atribuídas não às lutas entre as classes, mas aos erros de reis ou czares tiranos e as ambições sanguinárias de homens duros como Cromwell, Robespierre e Lênin, para citar o nome de três de seus alvos principais.
O pensamento metafísico usualmente é descrito como a ciência das coisas, não do movimento. Baseando-se sobre técnicas de classificação rígidas e enxergando as coisas como entidades estáticas, é uma ferramenta útil para a nossa vida cotidiana, mas não nos permite enxergar as coisas em suas relações.
A lógica formal enxerga causa e efeito como opostos, mas para os marxistas as duas categorias fundem-se e misturam-se umas nas outras a todo o momento. Trotsky comparou a lógica formal com a dialética usando a analogia de uma fotografia e de um filme. A anterior tem os seus usos, mas, na medida em que vamos para questões complexas, a lógica formal mostra-se inadequada. Por exemplo, podemos dizer que a nossa sociedade é capitalista e todos concordarão. Mas para enxergar ela dialeticamente como uma sociedade burguesa em um estágio avançado de desenvolvimento, nós teremos que acrescentar que ela possui resquícios de feudalismo, enquanto, ao mesmo tempo, possui potencial tecnológico e sementes para uma economia planificada socialista. Este exemplo não é abstrato. Os marxistas usam o método dialético para clarificar as perspectivas. Todas as realidades têm mais do que um lado. Que estágio o capitalismo alcançou? Que caráter terá a recessão? O quão poderosa é a classe trabalhadora? Qual é o papel do Partido dos Trabalhadores? Onde e quando esperamos que as lutas operárias vão surgir? Todas estas questões e muitas outras só podem ser respondidas analisando a sociedade dialeticamente.
As leis da dialética
“A dialética não é nada mais do que a ciência das leis gerais do movimento e do desenvolvimento da natureza, da sociedade humana e do pensamento” (Engels: Anti-Dühring).
Baseando-se nas leis do movimento, a dialética nos permite enxergar as coisas em suas relações. Nossos corpos e nossos pensamentos estão em permanente mudança. Do nascimento à morte, não há um único momento em que nosso desenvolvimento físico para. Assim como ocorre com os nossos pensamentos e crescimento mental. Nós estamos sempre desenvolvendo nossas idéias.
Mas como a dialética é especificamente aplicada no estudo da sociedade? Quais são as leis gerais do materialismo dialético para além da idéia primária de que tudo muda? Se a dialética é o instrumento teórico dos marxistas, como é este instrumento e como ele nos ajuda a desafiar o capitalismo e a mudar a sociedade?
Marx e Engels elaboraram três leis gerais e inter-relacionadas da dialética, cada uma das quais está em permanente funcionamento e nos dá uma visão sobre como a sociedade se desenvolve e quais são as tarefas teóricas e práticas que nos confrontam como revolucionários buscando construir as forças para derrotar o capitalismo.
1-A lei da quantidade e da qualidade
Tal como um cientista está familiarizado com o conceito das coisas alterando sua qualidade em certos pontos quantitativos (água em vapor no ponto de ebulição), há também na observação da evolução das sociedades de classe a mesma lei.
A sociedade não se desenvolve de uma forma vagarosa e evolucionária. O atrito entre as classes pode e criará períodos específicos de luta aguda levando a crises sociais e políticas, guerras e revoluções. Por todo um período a luta de classes pode, aparentemente, estar reduzida, com níveis baixos de ação operária, aparente desinteresse em luta política, etc. Porém, os marxistas enxergam os eventos em sua totalidade. Na superfície pode existir estabilidade aparente, mas um acúmulo quantitativo de frustração e antagonismo diante do capitalismo pode surgir subitamente, criando condições totalmente novas para a luta e tomando os patrões e seus aliados de surpresa. Esta lei é vulgarmente reconhecida quando alguns filósofos burgueses, usualmente depois do ocorrido, referem-se tristemente à “gota de água que fez o copo transbordar”. Isto tem enormes conseqüências para os marxistas.
Nós analisamos o processo de conflito entre as classes e todas as vezes participamos do movimento dos trabalhadores para construir as idéias do socialismo e tomar vantagem destas mudanças súbitas e viradas agudas.
A lei, é claro, nem sempre significa uma progressão de um curso. Por muitos anos nós caracterizamos a burocracia stalinista na antiga União Soviética como uma limitação relativa para o crescimento da economia planificada. Com isto queríamos dizer que apesar do desperdício e da corrupção dos burocratas, sempre existiu um potencial para a economia planificada crescer, ainda que de forma menos eficiente do que seria se a classe trabalhadora estivesse no comando. Nos anos 60 a dominação de comando que emanava do Kremlin estava lutando para enfrentar os desafios de uma forma de economia mais avançada no nível técnico. A máxima de Trotsky de que a economia planificada exige o controle dos trabalhadores, tal como um corpo exige oxigênio tornou-se mais relevante do que nunca. Nós observamos esta mudança e concluímos que a burocracia passou de uma limitação relativa para uma limitação absoluta.
A quantidade se transformou em qualidade. De um estudo de toda a queda nas estatísticas econômicas da URSS, nós começamos a tirar conclusões teóricas.
Uma sociedade com crises econômicas, política e social, onde a casta burocrática tornou-se absolutamente incapaz de desempenhar um papel progressivo não poderia ficar em um congelamento absoluto. Um ponto estava sendo rapidamente alcançado, no qual a classe trabalhadora teria que derrubar a burocracia e realizar uma revolução política ou ocorreria uma contra-revolução social que levaria à restauração do capitalismo; esta possibilidade foi prevista por Trotsky 50 anos antes disso ocorrer. O triunfo de Yeltsin acabando com todos os ganhos remanescentes da revolução de 1917, marcou uma derrota qualitativa para a classe trabalhadora na Rússia e em outros lugares.
2- A interpenetração dos opostos
A dialética aplicada na luta de classes não tem o mesmo grau de precisão que existe na ciência de laboratório. O papel dos indivíduos, dos partidos políticos e dos movimentos sociais não é cientificamente pré-ordenado. Um líder sindical pode ser uma pessoa de esquerda respeitada, mas pode capitular quando está diante de um determinado ataque dos patrões. Um líder sindical moderado pode surpreender-ser e se tornar muito mais “militante” do que queria quando é pressionado pelos de baixo.
Não há absolutos na luta de classes! Nós usualmente enfatizamos que o boom e a depressão econômicos não são categorias antitéticas, tal como os manuais proclamam. Dentro de cada crescimento econômico do capitalismo estão as sementes da recessão futura e vice-versa. E não é somente a depressão que faz com que os trabalhadores se rebelem contra o sistema de classes. O oposto também pode ser verdadeiro, com os trabalhadores se sentido intimidados pela ameaça do desemprego.
Em um “boom”, os trabalhadores podem ir para a ofensiva, não somente para resgatar conquistas que foram perdidas, mas para ganhar novas vitórias. Trotsky exemplificou esta lei em sua análise das forças que fizeram a Revolução Russa em 1917: “Para realizar o Estado Soviético, foi necessário juntar e a penetração mútua de dois fatores que pertencem a duas espécies econômicas completamente diferentes: uma guerra camponesa – isto é, um movimento característico do início do desenvolvimento burguês – e uma insurreição proletária, o movimento que sinaliza a sua queda. Esta é a essência de 1917” (História da Revolução Russa).
Este “desenvolvimento desigual e combinado” ilustra a forma complexa em que as sociedades se desenvolvem. A aplicação da lei da interpenetração dos opostos é crucial na clarificação do estágio que o capitalismo alcançou, a sua direção futura e as nossas respostas.
3- A negação da negação
Descrita por Engels como “uma lei extremamente geral e, justamente por isto, de enorme alcance e importância, lei do desenvolvimento da natureza, da história e do pensamento”. A negação da negação lida com o desenvolvimento através das contradições que parecem anular ou negar um fato, teoria ou forma de existência anterior, apenas para, mais tarde ser, por sua vez, negado.
O ciclo econômico do capitalismo ilustra esta lei. É criada uma grande riqueza durante o boom, apenas para ser parcialmente destruída em crises episódicas de sobre-produção. Estas, por sua vez, criam as condições para novos “booms” que assimilam e utilizam métodos de produção adquiridos para, mais uma vez, entrarem em contato e serem parcialmente negado pelos limites da economia de mercado.
Tudo o que existe, assim o faz por necessidade. Mas tudo perece apenas para ser transformado em alguma outra coisa. Portanto o que é “necessário” em um tempo e espaço torna-se “desnecessário” em outro. Tudo cria o seu oposto, que está destinado a superar e negar.
As primeiras sociedades humanas eram sociedades sem classes baseadas na cooperação da tribo. Elas foram negadas pelo surgimento das sociedades de classes baseando-se no desenvolvimento material dos níveis de riqueza. A propriedade privada moderna dos meios de produção e do Estado-nação, que são as características básicas da sociedade de classes, foram originalmente um grande avanço, mas hoje servem apenas para limitar e prejudicar as forças produtivas e ameaçar todas conquistas anteriores do desenvolvimento humano.
Hoje existem as bases materiais para substituir o sistema dos patrões pelo socialismo, o embrião disto já existe na sociedade de classes, mas não pode jamais ser percebido até que a classe trabalhadora negue o capitalismo.
Materialismo dialético como teoria revolucionária
“Dialética, chamada de dialética objetiva, prevalece por toda a natureza…” (Engels: Dialética da natureza)
No reino da ciência, explicita ou implicitamente, o método dialético continua a aparecer como uma ferramenta vital para o progresso. Disciplinas científicas, aparentemente sem relações entre si, passaram a compartilhar visões e metodologias refletindo sobre a interligação real de nosso universo.
Mesmo o filósofo idealista Kant, que escreveu em uma época anterior a Marx e Engels e que acreditava em um ser supremo, foi forçado pela experiência a chegar inconscientemente em uma posição dialética. Ele afirmava que se a Terra era algo que se tornou existente, então seus estados geológicos, geográficos e climáticos, suas plantas e animais, eram coisas que também deveriam ter se tornado existente. Se realmente foi assim, então a Terra deveria ter tido uma história não somente de co-existência no espaço mas também de sucessão no espaço.
Especialmente a teoria da evolução de Darwin, cujo significado revolucionário foi imediatamente compreendido por Marx e Engels, foi enriquecida e foi uma confirmação mais profunda da dialética da natureza.
Darwin demonstrou como a evolução se desenvolve por meio da seleção natural e, consequentemente, criou reações contrárias daqueles que viam em “Deus” uma determinação de tudo. Mas enquanto ele argumentava que “a natureza não dá saltos”, os debates que se dão entre os neo-darwinistas são sobre quando os saltos ocorrem e a natureza dos mesmos.
Incorporando a ciência genética, novos conceitos como MUTAÇÃO (a formação espontânea de novas variações genéticas), FLUXO GÊNICO (a introdução de novos genes em uma população por meio da imigração de procriações individuais) e DERIVA GENÉTICA (mudanças genéticas aleatórias em uma população graças ao seu tamanho limitado), assim como seleção natural, começaram a ser estudados.
Trata-se de uma brilhante confirmação da dialética como a ciência das viradas agudas e mudanças súbitas oposta ao desenvolvimento gradualista e hoje é amplamente aceito que a velocidade da mudança evolucionária pode variar enormemente. A teoria do EQUILÍBRIO PONTUADO aprofunda ainda mais esta idéia ao afirmar que o desenvolvimento ou o aparecimento de novas espécies pode ser, em termos de tempo geológico, quebrar instantaneamente um estado de aparente equilíbrio.
Esta teoria lida com o súbito e acelerado desenvolvimento evolucionário de uma nova espécie e com a extinção massiva de espécies, tal como Darwin falou da luta pela existência das variações individuais dentro de espécies singulares.
Teorias científicas modernas baseiam-se na visão dialética da natureza. Mecânica quântica, a teoria sobre qual toda a tecnologia moderna se baseia, fundamenta-se na unificação de dois conceitos clássicos (aparentemente contraditórios) de movimento da onda e de movimento da partícula para produzir uma nova compreensão aprofundada sobre a natureza da realidade. Teorias da partícula elementar estão desenvolvendo conceitos que ligam a contradição entre matéria e espaço-tempo no qual a matéria move-se.
Rumo a um mundo socialista
“… as causas finais de todas as mudanças sociais e revoluções políticas não devem ser procuradas nas cabeças dos homens nem na idéia que eles fazem da verdade ou da justiça eternas, mas nas mudanças nos modos de produção e troca; devem ser procuradas não na filosofia, mas na economia de cada época particular” (Engels: Do socialismo utópico ao socialismo científico)
O MATERIALISMO DIALÉTICO não é uma teoria maçante para ser pensada por acadêmicos eruditos em seus estudos. É um guia para a ação. É uma ferramenta indispensável para jovens trabalhadores e estudantes, buscando compreender o capitalismo e mais importante transformá-lo.
A chamada Nova Ordem Mundial é cada vez menos harmônica do que a velha. Dos seis bilhões de pessoas na Terra, quase 3,6 bilhões não possui dinheiro ou crédito para comprar algo. A maior parte da população do planeta continua, no máximo, meros observadores de vitrines. Apesar do desenvolvimento de corporações gigantescas por todos os continentes e a existência de informática permitirem potencialmente um planejamento mundial da produção e da troca, o capitalismo continuará um sistema baseado na competição dispendiosa entre os Estados-nações em que multinacionais rivais lutam para aumentar sua quota no mercado, sua produtividade e seus lucros – ao nosso preço.
Grandes revoluções sociais no passado foram realizadas por minorias emergentes que melhor articularam as novas necessidades econômicas e políticas da classe em desenvolvimento. A história é feita por homens e mulheres conscientes, impulsionados por motivos e desejos definidos. A luta pelo Socialismo é qualitativamente diferente, pois envolve a participação consciente da maioria – a classe trabalhadora e as massas oprimidas por todo o mundo. Em nosso caminho está o capitalismo em agonia. A nossa tarefa é armar a enorme energia dos trabalhadores de todo o mundo para acabar com a exploração por meio da construção de uma poderosa força socialista. O método dialético aplicado em cada momento da luta de classes ilumina o nosso caminho e nos ajuda a transformar nossas idéias em força material – deixando mais perto o dia em que homens e mulheres poderão passar do reino da necessidade para o reino da liberdade humana.