Cônsul geral da Rússia no Brasil é questionado pelo papel do governo Putin na repressão aos trabalhadores no Cazaquistão
Na noite de 11 de abril, no Anfiteatro do curso de História da Universidade de São Paulo, o Cônsul geral da Rússia no Brasil, Mikhail Troyanski, foi pego de surpresa ao ser abordado por apoiadores brasileiros da Campanha internacional de solidariedade aos trabalhadores do Cazaquistão.
O Cazaquistão vive sob um Estado policial encabeçado por Nursultan Nazarbayev que reprime os mais básicos direitos democráticos da população. O exemplo mais dramático do caráter desse regime foi a terrível repressão às manifestações pacíficas organizadas entre 16 e 18 de dezembro do ano passado em Zhanaozen e na estação Shetpe, na região de Mangistau. A repressão armada a essa movimento resultou na morte de um número grande, embora ainda não totalmente calculado, de trabalhadores e seus familiares. A manifestação foi organizada em solidariedade aos trabalhadores petroleiros em greve desde maio de 2011, que tem sofrido uma dura perseguição e repressão por parte do regime.
O Cônsul participava de uma palestra organizada pelo Laboratório de Estudos da Ásia, vinculado à Universidade de São Paulo, sobre a Rússia pós-eleição de Putin. Após uma fala bastante superficial, demagógica e cínica sobre as virtudes do governo Putin diante de seus antecessores, um bando de bêbados e desqualificados, o Cônsul pediu para que os presentes fizessem apenas perguntas e não intervenções.
Apesar das restrições impostas pelo Cônsul, um panfleto explicando os objetivos da Campanha internacional pelos direitos democráticos, sociais e políticos no Cazaquistão foi distribuído entre os presentes, estudantes e professores da universidade. Um representante da Campanha explicou aos presentes a situação no Cazaquistão e o papel reacionário do governo Putin, além de explicar os objetivos da Campanha. Antes da palestra, uma Plenária dos estudantes de História da USP recebeu informes sobre a situação no Cazaquistão e manifestou apoio à Campanha.
Durante a palestra o Cônsul foi questionado sobre o papel do governo Putin/Medvedev em relação à ditadura no Cazaquistão. Além disso, foram levantados os riscos e ameaças que pairam sobre os ativistas e dirigentes cazaques que foram obrigados a sair do país e hoje vivem na Rússia. Em particular foram enfatizadas as ameaças sobre Esenbak Ukteshbayev, presidente do sindicato “Zhanartu” (“Renascença”) e o vice-presidente da mesma entidade, Ainur Kurmanov.
Há suficientes razões para se acreditar que os governos da Rússia e do Cazaquistão e os respectivos serviços secretos estariam planejando a prisão ilegal e a transferência sigilosa de ambos de Moscou para o Cazaquistão, onde seriam presos e acusados de incitamento à desordem social e à derrubada do regime constitucional do Cazaquistão.
Uma Carta levantando esses questionamentos foi entregue ao Cônsul que reagiu tentando fugir do tema ao argumentar que a Rússia não pode se relacionar com as demais Repúblicas da ex-URSS como uma metrópole e que, portanto, não responde pela situação no Cazaquistão que seria um país independente. Porém, disse que assumia o compromisso de remeter os questionamentos da Carta às autoridades de seu governo.
Os apoiadores brasileiros da Campanha do Cazaquistão, incluindo os militantes da corrente LSR, seção brasileira do CIT, estão planejando novas ações de pressão e solidariedade.
Ao Cônsul-geral da Rússia no Brasil, Sr. Mikhail Troyanski
Por meio desta carta queremos chamar sua atenção para os sérios riscos que ameaçam dois dirigentes do movimento sindical do Cazaquistão que hoje estão em seu país. Trata-se de Esenbak Ukteshbayev, presidente do sindicato “Zhanartu” (“Renascença”) e o vice-presidente da mesma entidade, Ainur Kurmanov.
Ambos foram forçados a se retirar do território da república do Cazaquistão por seu papel de defensores dos direitos democráticos do povo daquele país diante do regime político ditatorial de Nursultan Nazarbayev. Eles têm suficientes motivos para avaliar que podem ser detidos a qualquer momento de forma arbitrária e serem conduzidos de volta para os braços da ditadura Cazaque.
Estas alegações tem por base a visita a Moscou do chefe do Ministério para os Assuntos Internos da região de Mangistau (Cazaquistão), Coronel Amanzhol Kabylov, acompanhado por um grupo de oficiais dos serviços secretos, de forma a conduzirem negociações com os oficiais da Federação Russa. O tema destas negociações incluiu certamente o procedimento a adotar em relação aos dirigentes sindicais cazaques em solo russo.
A referida autoridade governamental cazaque está procedendo “investigações” sobre os eventos sangrentos dos dias 16 a18 de dezembro de 2011 em Zhanaozen e na estação Shetpe, na região de Mangistau, que, de acordo com nossas informações, resultaram na morte de um grande número de trabalhadores grevistas, bem como de seus familiares, envolvidos num protesto pacífico.
Como resultado da colaboração entre o Ministério dos Assuntos Internos e o Serviço de Segurança do Cazaquistão, muitos processos criminais foram apresentados e dezenas de pessoas já foram presas, tais como ativistas sindicais que participam na enorme greve do sector petrolífero que dura desde o dia 7 de Maio de 2011, e também os líderes do partido de oposição “Alga” (Avante) – Vladmir Kosovo, Ayzhangul Amirov, Ruslan Simbinov, SerikSapargali, bem como o editor-chefe do jornal independente, “Vzglyad” (Ponto de Vista), Igor Vinyavski. Todos eles, mas também dezenas de pessoas que estão proibidas de viajar, foram acusadas sob diversos artigos do Código Penal: 164º “Incitamento à desordem social”; 241º “Organização de desordem em massa” e 170º “Incitação ao derrube do sistema constitucional existente”.
Uma nova queixa-crime deverá ser apresentada contra esses dois dirigentes sindicais cazaques numa tentativa de culpabilizá-los pelos eventos trágicos dos dias 16 a18 de dezembro em Mangistau. Esta é a razão pela qual o comandante de Zhanaozen visita Moscou, de modo a organizar a detenção e subsequente entrega às autoridades cazaques.
Existe o justo temor de que essa detenção possa ser feita de forma secreta e levada a cabo na forma de sequestro, sem qualquer mandato de captura em nível internacional, e sem qualquer observância de todos os requerimentos para a extradição legal. Este tipo de operação já foi anteriormente realizado pelos serviços especiais de Uzbequistão e Tajiquistão em relação aos seus opositores políticos e dissidentes que se encontravam em solo da Federação Russa.
Os dirigentes sindicais Esenbak Ukteshbayev e Ainur Kurmanov estão em solo russo de forma legal e não violaram qualquer lei do país. Apenas estão determinados a defender os direitos de seus concidadãos, que foram violados pelas autoridades do Cazaquistão.
Solicitamos ao Sr. Cônsul-geral da Rússia que informe às autoridades de seu país sobre nossa preocupação e que estaremos acompanhando de perto essa situação e divulgando seus desdobramentos junto à opinião pública brasileira.
Qualquer tentativa de rapto de Esenbek e Ainur, ou da sua detenção – quer no território da Federação Russa ou no Cazaquistão – terá a condenação brasileira e mundial. Se alguma coisa acontecer e estes dois dirigentes operários será da total responsabilidade dos regimes de Nazarbayev e de Putin.
Reivindicamos garantias de que eles não sejam sujeitos à perseguição e contínuas ameaças de rapto e prisão.
André Ferrari, do Diretório Nacional do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL)
Miguel Leme, da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas – Central Sindical e Popular
Campanha Cazaquistão – Pelos direitos democráticos, sociais e políticos no Cazaquistão