Egito: eleições sob a sombra de novos confrontos

Nas vésperas das eleições novos protestos eclodiram no Egito contra os militares que se agarram no poder. “Defender a revolução! Pela luta de massas para derrubar o governo do exército!”

Milhares de ativistas travaram imensas batalhas com as forças de segurança pelo controle da Praça Tahrir, no Cairo, no fim de semana de 19 e 20 de novembro e no começo da semana seguinte. Pelo menos 42 pessoas foram mortas e mais de três mil feridas.

Indicando algumas divisões na cúpula sobre como responder a esses protestos de rua, o governo renunciou e os militares indicaram um ex-premiê de Mubarak, Kamal Ganzouri, para o cargo de primeiro-ministro.

Ao invés de retirar as odiadas leis de emergência do Egito, os generais as estenderam, enquanto protegem seus próprios privilégios. Estima-se que 12 mil pessoas foram levadas a tribunais militares nos últimos dez meses, um número mais alto do que nos 30 anos de Mubarak.

O exército se agarra ao poder

Os eventos eclodiram com a crescente raiva com o papel do Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF), que está tentando manter o controle. O conselho, liderado pelo marechal de campo Mohamed Tantawi, supostamente está encarregado de supervisionar a transição para a democracia depois de três décadas do regime ditatorial de Mubarak.

As profundas tensões entre o regime do SCAF e as massas em busca de direitos democráticos e uma vida melhor, junto com um novo ascenso de lutas e greves nos últimos meses, acabou por detonar o que muitos ativistas estão chamando de “segunda revolução”.

As massas lutaram duramente, com o custo de muitas vidas, para derrubar Mubarak. Depois que ele foi derrubado, explodiram greves em muitos setores e os protestos continuaram. Boa parte da população, esgotada pelas lutas e ansiando pela “estabilidade”, botou esperanças no novo regime para supervisionar eleições democráticas e uma vida melhor. Mas agora grandes setores da população concluíram corretamente que o SCAF está tentando continuar o regime de Mubarak sob novas roupagens.

Eleições sob controle militar

As primeiras eleições serão para a Assembleia do Povo (a câmara baixa), que redigirá uma nova constituição. O processo eleitoral irá fortalecer os apoiadores do velho regime, muitos dos quais estão concorrendo como “independentes” ou membros da “oposição leal” que era permitida por Mubarak para dar um verniz democrático a seu regime.

Os militares organizaram o processo eleitoral para ser o mais complicado possível, e por isso mais fácil de fraudar. As eleições, que se iniciaram no dia 28 de novembro, vão ocorrer em diferentes ocasiões num espaço de quatro meses. Toda a apuração vai ocorrer de forma centralizada e os resultados só serão proclamados após várias semanas. Os militares proibiram a participação de observadores internacionais para fiscalizar as eleições.

Os militares se manterão no poder no mínimo até as eleições presidenciais no meio do ano que vem e o governo declarou que o novo parlamento não terá controle sobre as forças armadas, que continuariam a controlar seu próprio orçamento e política. Depois dos protestos, o SCAF disse que prestaria contas a um Conselho Nacional, metade do qual seria eleito pelo parlamento e metade pelo SCAF, e presidido pelo presidente da nação. Isso deixaria as forças armadas com o efetivo controle de si mesmas.

Embora espera-se que os islâmicos se tornem o maior bloco no novo parlamento, seus apoiadores estão divididos em vários partidos. O maior é o “Partido da Liberdade e Justiça” da Irmandade Muçulmana.

O apoio eleitoral aos partidos islâmicos se baseia em seu histórico de obras de caridade, que preenchia algumas lacunas das políticas sociais sob Mubarak, assim como seu histórico de oposição ao regime e o aparente não envolvimento com a corrupção. Houve relatos desses partidos distribuindo carne e remédios pela metade do preço em alguns comícios eleitorais.

Revolução sequestrada

As manifestações por todo o Egito em novembro mostram que um crescente número de jovens e trabalhadores entendem que o SCAF pretende sequestrar sua revolução. O movimento precisa urgentemente criar comitês de luta de massas e autodefesa contra a repressão estatal e que sejam eleitos e dirigidos democraticamente. Os soldados rasos do exército podem ser ganhos, com um firme e decisivo apelo para que se unam ao levante, lutando contra baixos salários, más condições e o tratamento de seus altos oficiais, ao lado da demanda pelo direito dos soldados de organizar um sindicato livre e independente, comitês de soldados e a eleição de oficiais.

Uma ação de massas dos trabalhadores, incluindo a greve geral, para derrubar o marechal de campo Mohamed Tantawi, o Supremo Conselho das Forças Armadas e todo o regime podre e brutal, precisa ser organizada ao lado de uma ofensiva para mobilizar e organizar as massas como base para um governo formado por representantes dos trabalhadores, jovens, pequenos agricultores e população pobres, que possa tomar uma ação imediata para deter a contrarrevolução e por direitos democráticos, passos imediatos para melhorar os padrões de vida e romper com o capitalismo.

As massas se opõem instintivamente a uma constituição aprovada ou redigida pelos militares. Um verdadeiro parlamento democrático, uma assembleia constituinte revolucionária, para realmente representar a maioria da população, tem que ser convocado sob o controle democrático de comitês por local de trabalho.

Um governo dos trabalhadores e do povo pobre introduziria genuínas reformas democráticas, incluindo eleições regulares para representantes com o salário médio de um trabalhador e sujeitos à revogação se agirem contra os interesses dos trabalhadores e pobres. Ele também garantiria o direito de organizar sindicatos independentes, o direito de greve e o direito de organizar partidos políticos.

Tal governo nacionalizaria todas as grandes companhias e bancos sob controle democrático dos trabalhadores, para que a economia possa ser planejada no interesse da grande maioria da população, ao invés de ser dirigida em beneficio dos ricos. Os recém-formados sindicatos independentes precisam construir seu próprio partido independente dos trabalhadores para lutar por essas ideias. 

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