20 de novembro e a luta pela Consciência Negra

Abolição inacabada

O ano de 2010 marca 122 anos da Abolição da Escravatura e 100 anos da Revolta da Chibata comandada pelo Almirante negro João Candido em 22 de novembro de 1910.

João Cândido organizou uma revolta em vários navios, reivindicando melhores salários, fim dos castigos físicos com a chibata e anistia aos rebeldes. Ele ameaçou bombardear o Rio de Janeiro e depois de cinco dias de revolta o Congresso pôs fim ao uso da chibata e aprovou um projeto de anistia para os amotinados, porém a anistia fora uma “farsa” para desarmá-los. João Cândido e os seus companheiros foram presos, 97 marujos foram abandonados na Floresta Amazônica, outros sumariamente assassinados e jogados ao mar. A Revolta da Chibata representa hoje a luta dos trabalhadores brasileiros em busca de seus direitos.

Da senzala à favela

Os negros e negras ainda não garantiram sua integração à sociedade brasileira, pois após a abolição os negros e negras não receberam terras ou nenhum outro tipo de indenização pelos séculos de trabalho escravo. Sem dinheiro e local para morar, os negros e as negras em grande escala saíram das senzalas e foram morar nas encostas livres e perigosas por poderem desabar a qualquer momento, isso foi um dos fatores para a formação das favelas no Rio de Janeiro. Todo esse processo de fim da escravidão no Brasil é entendido pelo conjunto do movimento negro como uma abolição inacabada.

Os negros e negras continuam sofrendo com as profundas desigualdades sociais. Vivemos na maior nação negra fora da África, que assistiu mais de 5 milhões de africanos serem escravizados (cerca de 40% do total de negros arrancados da África pelo tráfico escravista). Conforme nos mostra o Índice de Desenvolvimento Humano, as condições de vida dos negros no Brasil hoje são péssimas: ganhamos os piores salários, somos os primeiros a serem demitidos e os livros escolares ainda não contam nossa história.

Estudo do Dieese apresentado em novembro de 2007 aponta que, na região metropolitana de São Paulo, 60,3% dos negros não conseguem terminar o Ensino Médio e apenas 3,9% conseguem acessar e terminar uma faculdade. O mesmo estudo mostra que a população negra trabalha mais, porém ganha menos, a cada R$ 4 reais gerado no país R$ 3 ficam nas mãos dos brancos.

Lucram encima do racismo

A lógica do lucro e da exploração do sistema capitalista faz os capitalistas se aproveitarem do racismo para pagar menores salários aos negros e as negras, pois estes estão desempregados em maior número no mercado de trabalho por causa do racismo e por isso acabam aceitando salários mais baixos para não morrerem de fome. A luta do povo negro só se encerrará quando acabarmos com a exploração do homem pelo homem, e isso só é possível em uma sociedade socialista, onde todas as etnias (brancos, indígenas, negros e asiáticos) poderão construir a sociedade da igualdade.

A juventude negra é o principal alvo da violência urbana, principalmente dos excessos cometidos pela polícia. Os jovens negros são os que mais morrem nas favelas e periferias por ações policiais. Por outro lado, as jovens negras são as que mais morrem por consequência de abortos mal feitos por utilizar clínicas baratas clandestinas onde faltam recursos para uma operação deste tipo. Além disso, as mulheres negras são as mais oprimidas (opressão de raça, de classe e de gênero-machismo).

Boa intenção não é suficiente

No dia 20 de outubro entrou em vigor a Lei que instaura o Estatuto da Igualdade Racial. Como quase todas as medidas aprovadas pelo governo Lula, à primeira vista parece ser um avanço para os trabalhadores negros. Porém, o Estatuto não representa qualquer garantia de combate ao racismo. Por exemplo, como garantir o fim das discriminações e as punições a quem discrimina? Como garantir a proteção da juventude negra que esta sendo exterminada? O Estatuto não caracteriza o racismo como crime de lesa-humanidade. A questão da titulação das terras quilombolas, da representação dos negros nos meios de comunicação, das políticas de ação afirmativa e do atendimento especial à saúde da população negra, nada disso esta contemplado no Estatuto. Por isso percebemos que na verdade o Estatuto é mais do mesmo, propaganda enganosa do governo Lula, não passa de uma carta de boas intenções com sugestões ao Estado.
 

O dia da consciência negra

O dia 20 de Novembro de 1695 é o dia da morte de Zumbi dos Palmares, Zumbi foi o mais importante líder negro do Quilombo de Palmares. O Quilombo dos Palmares (localizado na atual região de União dos Palmares, Alagoas) era uma comunidade auto-sustentável, um território formado por escravos negros que haviam escapado das fazendas, prisões e senzalas brasileiras. Ele ocupava uma área próxima ao tamanho de Portugal e sua população alcançou o marco de 50 mil pessoas em 1670.

Aos 40 anos de idade Zumbí dos Palmares morreu e tornou-se o herói ou mártir da abolição da escravatura brasileira. Em 1995 após anos de reinvidicação do movimento negro (desde a década de 1970 o movimento negro comemora o 20 de novembro), a data da morte de Zumbi foi adotada como o dia da Consciência Negra. O dia da consciência negra deve ser uma data que represente a luta do povo negro e ninguém melhor que Zumbi para expressar essa luta.

Zumbi é o símbolo maior dessa luta porque nunca aceitou fazer acordos com os brancos, sempre defendeu a libertação de todos os escravos, diferente de Ganga Zumba outro importante líder negro do Quilombo de Palmares que tentou fazer um acordo com os escravocratas brancos.

Por volta de 1678, o governador da Capitania de Pernambuco cansado do longo conflito com o Quilombo de Palmares, se aproximou do líder de Palmares, Ganga Zumba, com uma oferta de paz. Foi oferecida a liberdade para todos os escravos fugidos se o quilombo se submetesse à autoridade da Coroa Portuguesa; a proposta foi aceita por Ganga Zumba, mas Zumbi, na época general do exercito do quilombo de Palmares, rejeitou a proposta do governador e desafiou a liderança de Ganga Zumba. Prometendo continuar a resistência contra a opressão portuguesa, Zumbi tornou-se o novo líder do quilombo de Palmares.

O feriado de Zumbi dos Palmares é o único feriado que homenageia uma liderança popular do Brasil, pois a Proclamação da Republica, a Independência do Brasil e a Conjuração Mineira são exemplos de feriados feitos por movimentos das elites, sem participação popular, para não alterar as estruturas fundiárias do Brasil.

Apesar da importância histórica de Zumbi, percebemos nas leis brasileiras novamente o preconceito racial, pois o dia 20 de novembro ainda não é considerado um feriado nacional oficial, atualmente o feriado municipal ou estadual esta reconhecido em 225 cidades de 11 estados. O movimento negro não aceita o dia 13 maio de 1888 (dia oficial da abolição) como seu dia, pois esse dia foi somente a assinatura da lei Áurea pela branca opressora princesa Isabel. A libertação dos negros não deve ser comemorada neste evento feito pela elite, pois a luta do povo negro se fez durante os 350 anos de resistência à escravidão através das guerras de libertação promovidas pelos diversos quilombos formados nas diferentes regiões do Brasil.

Cultura negra é desprezada

A religião afro-brasileira, a capoeira e a música são elementos identitários do povo negro que foram mantidos de geração em geração até os dias atuais através da cultura negra de resistência. Percebemos que essa cultura é desprezada pelos grandes meios de comunicação. Recentemente a morte de uma das mais brilhantes cantoras sambistas da história, Jovelina Pérola Negra, não recebeu sequer uma nota de solenidade na grande mídia, demonstrando um completo descaso e desprezo pelo samba de raiz. Por que será que símbolos de uma cultura negra popular como Jovelina Pérola Negra não merecem destaque na televisão, será porque ela era negra, ou pobre ou mulher? Ou pelos três motivos.

Reivindicações das Negras e Negros:
  • Pela aprovação do Projeto de Lei 1336/2007 que institui como feriado civil no Brasil o dia 20 de novembro (Dia Nacional da Consciência Negra)
  • Exigimos medidas concretas para evitar o extermínio da juventude negra
  • Exigimos medidas concretas contra a intolerância às religiões de matriz africana (Candomblé e Umbanda)
  • Não à discriminação no local de trabalho – salário igual para trabalho igual
  • Pela aprovação da Lei de Cotas
  • Pela Implementação da Lei 11.645/2008 que obriga o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira em todas as escolas
  • Pelo reconhecimento de terras para remanescentes de quilombo, fazendo a Reforma Agrária
  • Mais verbas para as políticas de combate ao racismo e promoção da população negra

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