Segundo turno das eleições municipais em Natal: Voto crítico em Natália Bonavides e apostar na mobilização e luta da classe trabalhadora contra a austeridade fiscal e a extrema direita!

O primeiro turno das eleições municipais no Brasil demonstrou um processo de ascensão da direita fisiológica e da extrema-direita. Mesmo com derrotas relevantes de alguns candidatos bolsonaristas, a estratégia hegemônica das frentes cada vez mais amplas mostrou um campo de esquerda cada vez menos capaz de pautar os debates em temas fundamentais. Esse campo defendeu programas extremamente rebaixados, que poderiam ser apresentados, como de fato foram, por candidatos de direita e até de extrema-direita. Tentando agradar e conciliar com setores do capital, essa lógica hegemônica tem fortalecido cada vez mais o sentimento de descrédito com a política e têm empurrado a população para os discursos falsos, porém radicalizados, da extrema direita. Mesmo como estratégia eleitoral, as frentes amplíssimas (onde cabem partidos de direita e até extrema direita) não foram capazes de garantir vitórias, especialmente nas grandes capitais do país. Em Natal, o número de votos brancos, nulos e abstenções somados ultrapassaram todas as candidaturas, revelando um sentimento de desesperança.

Em nossa nota do primeiro turno, apontamos que a candidatura de extrema direita de Paulinho Freire, o representante das oligarquias locais, Carlos Eduardo e o projeto de conciliação de classes do PT, representado por Natália Bonavides, em que pesem as diferenças importantes, não traziam um programa de enfrentamento aos problemas centrais da cidade de Natal. Entendemos que o campo eleitoral é um território controlado pela burguesia, tanto em termos econômicos quanto políticos, mas que não devemos abdicar de disputá-lo. A participação daqueles(as) que defendem a transformação radical da sociedade deve fazer das eleições um momento de enfrentamento com a burguesia e um espaço pedagógico, apresentando programas que expressem as necessidades mais imediatas das massas, mas que denunciem os interesses antagônicos entre as classes dominantes e a maioria da população, além de denunciar os próprios limites das eleições e apontar para a necessidade de organização de lutas, buscando atrair o debate eleitoral para refletir as necessidades de mudanças mais profundas na sociedade. É isso que a LSR procura fazer com a suas candidaturas e, na medida em que não apresentamos nomes da nossa organização para o pleito, foi nesse sentido que apoiamos Nando Poeta e Tiago Silva (PSTU), para prefeito e vice, e Camila Barbosa (PSOL), para vereadora, ainda que tenhamos diferenças com eles em alguns pontos. 

Mobilizar não só para as eleições

Mesmo com uma mobilização aguerrida, de caráter orgânico e militante em torno da candidatura de Natália Bonavides, avaliamos que na campanha predominou o caráter agitativo e pouco crítico, em que o apoio se deu sem debate politizante sobre os problemas da cidade e seu enfrentamento, ou mesmo sobre os limites da tática eleitoral das candidaturas majoritárias do PT. A falta de uma candidatura para a Prefeitura pelo PSOL com caráter combativo, com um programa de demandas necessárias e com um chamado para a construção diária da luta contribuiu para esse rebaixamento. Da mesma forma, é importante ressaltar que a capacidade de mobilização colocada pelo PT para a disputa eleitoral não é utilizada para enfrentamentos fundamentais por mudanças estruturais. 

Vale ressaltar que, mesmo que tenha havido uma tentativa de se colocar como uma candidatura contra as oligarquias locais, o PT apoiou Carlos Eduardo para o Senado em 2022 (apoio costurado por Lula) e repete essa tática em outros lugares do país, mostrando que a oposição às oligarquias só existe quando é conveniente. Por sua vez, o fato do MDB não ter indicado o vice de Natália pode ter sido um motivo de tensionamento entre as forças, mas foi sobretudo um cálculo oportunista, pois a resolução do MDB que autorizou os seus candidatos a vereador a escolherem qualquer candidatura majoritária para apoiar data de 18 de setembro, quando as pesquisas indicavam que Carlos Eduardo iria para o segundo turno com Paulinho Freire. Em outras palavras, o fim da aliança entre o PT e o MDB foi iniciativa desse último, não do primeiro. Por essa razão, não está excluída a possibilidade de um retorno do partido de Walter Alves e Júlio Protásio para construir uma “governabilidade” nos moldes conservadores já conhecidos.

Combater a extrema direita

Nesse cenário, chegamos à disputa de segundo turno entre Natália Bonavides e Paulinho Freire, com a derrocada de Carlos Eduardo, que chegou a aparecer como favorito indiscutível nas primeiras pesquisas eleitorais. Paulinho Freire é a continuação da gestão tenebrosa de Álvaro Dias, atual prefeito de Natal e o candidato do bolsonarismo. Não consideramos qualquer possibilidade de diálogo dos movimentos sociais e da classe trabalhadora com o setor que esse candidato representa. A gestão de Álvaro Dias coleciona ataques a trabalhadores(as), como o projeto de lei que destrói a carreira de professores municipais e não abriu qualquer diálogo com as categorias quando houve mobilização. Além disso, foi um prefeito bolsonarista “raiz”, que durante a pandemia de Covid-19 defendeu e fez profissionais da saúde indicarem ivermectina como tratamento e não adotou qualquer medida efetiva para prevenir a propagação do vírus, bem como as condições de renda e trabalho da população. Álvaro Dias também mobilizou constantemente os aparatos de violência do Estado contra as parcelas mais pobres da classe trabalhadora, como aconteceu com estudantes que protestaram contra o aumento do valor das passagens, com os movimentos sociais que lutaram durante a revisão do Plano Diretor e no caso dos despejos truculentos feitos contra a população em situação de rua, sem construção efetiva de políticas para garantia de direitos a essa população . Como bolsonarista, vem atropelando a legislação ambiental para acelerar obras a qualquer custo, gerando riscos e transtornos para os moradores e moradoras da cidade. O ápice foi quando mobilizou seus secretários, apoiadores e até servidores para pressionar pela liberação das obras de engorda da praia de Ponta Negra mesmo sem o cumprimento das exigências para avaliação de impacto. Como resultado, houve até a derrubada do portão e invasão violenta à sede do IDEMA. 

O atual prefeito, grande aliado do capital imobiliário e do empresariado da construção civil, aprovou uma revisão do Plano Diretor da cidade que aumenta a vulnerabilidade das áreas de proteção ambiental e de interesse social, entregando o desenvolvimento urbano nas mãos dos que buscam o lucro. Nessa mesma direção, vem impulsionando as obras do Novo Complexo Turístico da Redinha, expulsando e violando direitos de trabalhadores(as) que dependiam do Mercado e da atividade comercial em seu entorno, visando entregar a área para o capital privado. A privatização do Mercado da Redinha e do Teatro Sandoval Wanderley são ataques graves que uma candidatura como a de Natália Bonavides deve indicar a reversão caso eleita!

Paulinho Freire é a continuidade desse projeto de Álvaro Dias, inclusive nos métodos sujos da extrema direita bolsonarista. Sua campanha vem utilizando mentiras e mobilizando discurso de ódio que, além de enganar a população, ajudam a promover ataques misóginos contra Natália. Sua biografia conta com feitos negativos notáveis, como ter sido vice-prefeito de Micarla de Souza, uma gestão trágica para a cidade e, mais recentemente, ter votado contra a cassação do mandato de deputado de Chiquinho Brazão, acusado de ser mandante do assassinato de Marielle Franco.

Derrotar a austeridade fiscal

Por outro lado, mesmo compreendendo a trajetória de atuação pessoal, como vereadora e como deputada, junto às lutas da classe trabalhadora, não é realista considerar Natália como um oásis no deserto. O Governo Federal, comandado pelo PT, adota uma política de austeridade fiscal e, para cumprir seu compromisso com o Novo Arcabouço Fiscal, que só favorece o 1% mais rico da população, vem adotando uma política de cortes e congelamentos nos orçamentos de políticas como saúde e educação, ameaçando inclusive acabar com os pisos constitucionais de investimentos nessas políticas. O governo também ameaça não cumprir vários acordos da greve da educação federal que aconteceu em 2024 e cortou o ponto de grevistas do INSS. Nesse sentido ainda, o funcionalismo público está ameaçado por uma contrarreforma administrativa, que na prática vem sendo feita por meio de normativas. Setores centrais para lidar com problemas urgentes, como a crise climática e ambiental, como é o caso de servidores do IBAMA, ICMBio e FUNAI, sofrem com a precarização do trabalho, além de orçamentos irrisórios para suas atividades. Também em nome da austeridade fiscal, uma série de benefícios sociais estão passando por um “pente fino” do governo que, com o discurso de “combate a fraudes”, visa cortar mais gastos, agora ameaçando milhares de pessoas que dependem, por exemplo, do BPC (Benefício de Prestação continuada). Entraram na mira do teto de gastos de Haddad e companhia também o abono salarial, seguro desemprego, entre outros direitos conquistados com muito sangue e suor da classe trabalhadora.

Todos esses elementos estão ligados ao Arcabouço Fiscal, que é o principal instrumento da austeridade do governo,  que contou com o voto de Natália Bonavides a favor e só serve ao pagamento de juros de dívida pública e enriquecimento do capital financeiro. Também não se deve ignorar que a política hegemônica do PT é de se articular com setores da burguesia para garantir eleições e uma governabilidade sem enfrentamentos. Assim, mesmo que ao longo do primeiro turno a imagem de Lula tenha sido amplamente mobilizada sem se apontar quaisquer dessas críticas, não é possível adotar uma visão personalista da política e considerar que Natália atuaria, por sua história, de forma independente da lógica que rege majoritariamente o partido. É emblemático que no mesmo dia em que Lula veio a Natal para atividade de apoio à candidatura de Natália, ele tenha se reunido com os representantes dos grandes bancos para discutir a política econômica e, durante toda a semana seus ministros tenham dado declarações sobre uma ampla agenda de arrocho fiscal e ataque aos direitos da classe trabalhadora que virá após as eleições. 

Nossas exigências programáticas

Nós, da LSR, entendemos que nenhuma das candidaturas postas para o segundo turno representa o enfrentamento dos problemas fundamentais da cidade. O Programa de Natália Bonavides possui propostas tecnicistas na maioria dos temas tratados, que focam em elementos de gestão e eficiência de forma pouco politizada e não consegue se mostrar como oposição programática com diferenças visíveis em relação a outros programas. O exemplo das propostas para o transporte público é elucidativo. A proposta de licitação para as empresas de ônibus repete algo que já foi feito em outras oportunidades, contudo mantém o controle do transporte nas mãos do empresariado e a necessidade da população é ignorada em nome da necessidade do lucro. Por isso defendemos que a licitação é insuficiente, sendo necessário municipalizar o transporte, tornando um direito da população trabalhadora e não fonte de riqueza de poucos. Também consideramos que os problemas urbanos de Natal estão associados à entrega do desenvolvimento da cidade nas mãos do capital, o que vai ser piorado com a atualização do Plano Diretor feita por Álvaro Dias, sendo necessária sua revogação. 

Natália tem se apresentado a partir de agendas com inserção nas pautas da juventude e das mulheres. Defendemos que são aspectos cruciais para construir políticas sociais e que têm feito parte da construção do seu histórico político. No entanto, esperamos que essas ações ultrapassem limites institucionais e ataquem a raiz de um sistema de exploração que violenta, oprime e mata mulheres e meninas da classe trabalhadora cotidianamente. Os diálogos eleitorais travados, em acordo com as táticas políticas do PT, não aprofundam nas perspectivas de mobilização popular real e organizada que ultrapasse as urnas. Como objetivos do Plano de Governo, o Eixo que trata da promoção de igualdade de gênero e combate à violência contra a mulher é, de fato, genérico, e, além disso, se cala sobre um tema fundamental para as mulheres e meninas em situação de violência, qual seja, a defesa do direito ao aborto legal, seguro e gratuito, como pauta central em termos de direito das mulheres e de sua saúde. 

Esse ano, contamos com mobilizações nacionais e regionais muito importantes sobre o tema do aborto e contra o PL 1904. Natália, que esteve presente em vários dos atos que aconteceram, fazendo falas públicas em defesa das mobilizações, não cita o tema como pauta do programa de governo ou como prioridade durante suas aparições públicas. Entendemos esse silêncio como um dos acenos que forças ligadas ao PT fazem sistematicamente aos grupos conservadores para evitar desgastes eleitorais e defendemos que essa não é uma pauta que pode ser rifada. Não podemos esquecer, ainda, que as medidas de austeridade fiscal terão impacto negativo direto nesse tema, em articulação com toda a política de garantia de acesso à saúde reprodutiva das mulheres, e das políticas de saúde de maneira geral. Não custa lembrar que políticas de austeridade e a ausência de garantia dos direitos reprodutivos de meninas e mulheres afeta principalmente a parcela feminina negra da classe trabalhadora. 

Apesar da necessidade de uma avaliação realista do cenário, que tem como objetivo colaborar para o fortalecimento da classe trabalhadora em defender suas agendas sem confiança irrestrita em propostas eleitorais, avaliamos que o programa da candidata apresenta avanços, tais como acabar com o sorteio de vagas nas creches, questão primordial para garantia mínima de dignidade às mães trabalhadoras, ações para universalizar o acesso e os planos setoriais de cultura, a criação de Política Municipal de atenção à população apátrida, refugiada e migrante, e o diálogo com as especificidades da garantia de proteção aos Direitos Humanos e de grupos em situação de vulnerabilidade econômica. Além disso, consideramos que no segundo turno devemos nos unir para derrotar a representação eleitoral da extrema direita e do bolsonarismo em Natal. Por esse motivo, defendemos o voto crítico em Natália Bonavides.

É fundamental colocar que a extrema direita não será derrotada na esfera eleitoral e é necessária a construção de lutas com independência de classe. Estamos em um momento de crise do capital em suas diversas esferas e a própria vida humana está ameaçada por questões como a crise climática. Uma situação radical exige saídas radicais, que rompam com o cenário de crises generalizadas e que tenham a mobilização e as lutas da classe trabalhadora como o seu fundamento, para além das eleições.

Assim, nossa posição é:

  • Voto crítico em Natália Bonavides (PT) para Prefeitura do Natal;
  • Revogação da revisão do Plano Diretor, do ataque ao Plano de Carreira das Professoras e da privatização do Mercado da Redinha e do Teatro Sandoval Wanderley! 
  • Municipalização do sistema público de transporte! Fora Seturn!
  • Direito ao aborto legal, seguro e gratuito e mais investimentos para a saúde pública!
  • Apostar na mobilização e luta da classe trabalhadora para derrotar a austeridade fiscal, a extrema direita e conquistar direitos!

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