Greve do funcionalismo federal: da ebulição à fervura

Nove anos se passaram desde a última greve que unificou estudantes, técnicos-administrativos e docentes nas universidades federais. Desde então, vimos cortes orçamentários, arrocho salarial e precarização de condições de trabalho. Por tudo isso, o ano de 2024 começou com o crescimento das mobilizações por salários, orçamento, revogaço e condições de trabalho que culminaram na aprovação de greve de diversas entidades dos serviços públicos federais. No processo de mobilização se destacam as entidades da educação: a recém aprovada greve do Sinasefe Nacional (servidores dos Institutos Federais, IFs, e Cefet), a forte greve da Fasubra (técnicos de Universidades e Institutos Federais) e o indicativo do Andes-SN (docentes de UFs, IFs e CEFET). O cenário de ebulição nas universidades que já debatíamos ao final do ano passado parece chegar à fervura.

É importante começar afirmando que trabalhadoras e trabalhadores da educação federal foram empurrados para essa greve, devido ao descumprimento das promessas do governo Lula, que tem se negado a avançar tanto em pautas políticas – como a revogação das medidas aprovadas nos governos anteriores (Reforma da Previdência, Teto de Gastos, Reforma do Ensino Médio, intervenção bolsonarista nas reitorias, etc.) – quanto em pautas econômicas. Em relação a essas, o governo se nega a fazer uma reposição condizente com as perdas salariais, que para algumas categorias chega a 52,5%. É inadmissível que uma gestão que discursa sobre a reconstrução da educação pública se negue a reajustar o salário de seus servidores que são engolidos pela inflação! Na mesa de negociação, o governo propõe ZERO reajuste para o ano de 2024, com 4,5% para 2025 e mais 4,5% para 2026, insuficientes para repor sequer as perdas deste período.

Se, por um lado, a militância governista pede às bases calma e paciência com a negociação, o mesmo governo que alega ausência de orçamento apressou-se a conceder reajustes às carreiras policiais, demonstrando que não se trata tão somente de recursos, mas sim uma ausência de prioridade com os servidores da educação. Além disso, concede créditos e isenções fiscais ao agronegócio e às indústrias em valores que, somados, ultrapassam os 600 bilhões de reais e segue pagando a dívida pública, para onde vai quase metade dos recursos públicos e que nunca foi auditada. Tem dinheiro para banqueiros, mas não tem para educação?!

FASUBRA

Dentre essas categorias, a mais afetada é a dos Técnicos-Administrativos em Educação, que hoje tem o pior salário de todas as carreiras do executivo federal e por isso uma taxa de evasão de mais de 70%. Além disso, os cortes orçamentários nas universidades têm servido à precarização das condições de trabalho, convertendo-se em dificuldades para adquirir e consertar equipamentos utilizados no cotidiano, tais como computadores, aparelhos de ar condicionado e materiais de laboratório, corte de bolsas e na assistência estudantil, dentre outros.

Decorrente dessas condições, a Fasubra foi o primeiro sindicato a entrar em greve, no início de março, e a categoria está atropelando qualquer pedido de calma por parte das direções governistas. A federação está próximo de atingir 100% de sua base paralisada, mas sofre diversas pressões das gestões, que tentam manter as universidades funcionando através da precarização do trabalho de bolsistas e terceirizados. Isso tem sido combatido pelos comandos locais de greve.

A paralisação da Fasubra foi iniciada após arrastados processos de negociação em que o governo não melhorava a proposta inicial e não se dispunha a destinar orçamento para reestruturar a carreira dos técnicos. Esse cenário, aliás, foi o mesmo para outras categorias do serviço público federal que agora se articulam para elevar o patamar das lutas.

Após anunciada a consulta às bases a respeito da greve, o governo foi forçado a se movimentar e criou um grupo de trabalho com a Fasubra, Sinafese, Andifes, Conif, MEC e MGI. Esse grupo avançou no debate de carreira, com alguns indicativos positivos, como a diminuição dos prazos de progressão de 18 para 12 meses, aceitação do Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC), dentre outros. Apesar disso, as pautas que têm impacto orçamentário ainda não foram deliberadas. É preciso, portanto, elevar a temperatura da greve para que respostas positivas sejam dadas sobre isso.

SINASEFE

Em meio a essas questões, o Governo Federal anunciou uma ampliação da Rede Federal em mais de 100 Institutos, todavia sem destinar aumento de orçamento para os mesmos que já tem sofrido diariamente com a precarização do seu funcionamento. Esse cenário leva aos trabalhadores dos Institutos Federais uma duplicação das questões econômicas que têm motivado a greve geral nas federais, para além da corrosão salarial. As condições de trabalho não só pioraram como tal ampliação sem a garantia dos recursos aponta para uma agudização desse quadro.

Impulsionados pela greve da Fasubra e compreendendo que uma greve nos Institutos Federais poderia acelerar o processo de debate e adesão dos professores das Universidades, o Sinasefe aprovou, em sua 187ª Plenária Nacional, greve nacional a partir do dia 03 de abril.

Durante a Plenária Nacional, a quase totalidade das Seções Sindicais que estavam presentes já haviam aprovado construção de greve e indicativo de greve, sendo que algumas dessas em seus informes já apresentavam um processo de ampla mobilização. Em menos de uma semana (21/03), 7 seções sindicais, responsáveis por 41 campi de Institutos Federais, já aderiram ao movimento paredista, sendo que a maioria das seções ainda tem assembleias para realizar até a primeira semana de abril.

A aprovação da greve no Sinasefe parece ter ecoado também nas Universidades, pois, tão logo sua decisão de adesão à greve, diversas seções sindicais do Andes-SN apontaram indicativos de greve.

ANDES-SN

No seu 42o Congresso, em fevereiro, o Andes-SN aprovou a construção de uma greve da categoria com vistas à greve unificada da educação e dos servidores federais. Após rodada de assembleias nas universidades, em que metade delas votou favorável à greve, a reunião das entidades federais indicou o início da greve no dia 15 de abril. Nesta semana, nova rodada de assembleias estão acontecendo para votar o início da greve. A categoria docente sente a perda salarial e vive com condições de trabalho muito precárias (as perdas salariais acumuladas entre 2016 e 2023, totalizam quase 25%). Além disso, as universidades federais estão sucateadas e necessitam de maior comprometimento orçamentário para o seu funcionamento. Em sentido contrário ao necessário, o governo reduziu o orçamento de 2023 para 2024 em 300 milhões de reais, piorando um quadro que já estava ruim (os cortes começaram a ocorrer desde 2014).

Na pauta também aparecem temas como reposicionamento de aposentados (que sofreram um duro golpe salarial em um acordo que foi assinado entre governo e Proifes em 2012), reestruturação de carreiras e a pauta do “revogaço” (exoneração de interventores, medidas antigreve criadas no bolsonarismo e mantidos pelo governo Lula, etc.). 

A forte e crescente greve dos técnicos-administrativos tem grande impacto nas universidades e, junto com o anúncio de ajuste de 0% para 2024, influenciou a mobilização docente, pois somos parte de uma mesma categoria de trabalhadores. 

Além da óbvia e gritante emergência de nossa pauta de reivindicações, outra discussão é forte nas assembleias e no diálogo com os servidores: a de que uma greve agora serviria para enfraquecer o governo Lula e, por isso, fortalecer o bolsonarismo. Nessa argumentação, os servidores teriam ficado imóveis nos governos da direita e agora querem greve. Entendemos que muitos servidores coloquem essa dúvida e ela é legítima. Por outro lado, a propaganda do PT e de diversos dirigentes de sindicatos desses servidores constroem uma peça publicitária falsa e superficial.

Primeiro, porque os servidores fizeram muitas lutas nos governos Temer e Bolsonaro e houve indicativos de greve que acabaram não se desenrolando por causa da pandemia e da repressão nas universidades. Cabe dizer que os mesmos setores petistas que agora argumentam contra a greve porque é o governo de Lula, na época argumentavam contra pois desviavam a luta para as eleições, pois Lula (ou Haddad em 2018) ganharia e resolveria tudo…

Em segundo lugar, e o que a LSR tem apresentado: para derrotar o bolsonarismo, precisamos de luta, de greves, da classe trabalhadora de forma independente nas ruas, defendendo as suas pautas e o seu programa baseado nas suas necessidades. O bolsonarismo defende a destruição das universidades públicas e o fim das mobilizações da classe trabalhadora. O atual quadro em que o governo cede muito mais à direita dentro do executivo e do Congresso do que para a classe trabalhadora e ainda pede para esperarmos, enquanto o bolsonarismo continua nas ruas, é uma tragédia para o nosso futuro! 

Divisões do movimento e a necessidade de unidade

Entre os servidores federais, essa linha de atuação de completa submissão ao governo está representada por dois sindicatos paralelos: o PROIFES, de docentes, e o ATENS, de técnicos-administrativos. Além de plantarem essa propaganda falsa entre os servidores e causarem a sua divisão, durante as negociações, vão facilitar para o governo e conspirar contra os servidores, como aconteceu nas greves de 2012 e 2015. 

Estamos apenas no início da mobilização e o governo já mostra sinais de preocupação. Desde 02 de janeiro de 2023, as entidades da educação pediam a instalação de uma mesa com o MEC para negociar pontos específicos da pauta de negociação. Esta solicitação só foi respondida agora, como uma reação ao movimento paredista. Da mesma forma, o governo federal ignorou por semanas a solicitação de nova mesa de negociação sobre os reajustes e, também como resposta à mobilização, marcou na última sexta-feira 05 de abril, uma nova reunião para o dia 10. 

É de grande importância que a greve unificada cresça e envolva outras categorias dos servidores federais, algumas que inclusive já estiveram em greve, como os servidores do IBAMA e ICMBio. Nas universidades e IFs, a unidade com os estudantes também é fundamental! Os estudantes também estão sofrendo com o sucateamento das universidades e têm a sua própria pauta, principalmente ligada à permanência estudantil (alimentação, moradia, bolsas, etc), reivindicação puxada pelo setor mais vulnerável nas universidades e afetados pelas opressões de gênero e raça. Até agora a UNE não se manifestou sobre a atual greve… Uma luta unificada entre servidores e estudantes é necessária!

Agora é greve! Que a luta dos servidores federais possa inspirar e puxar uma nova onda de lutas da classe trabalhadora e da juventude por mais direitos, para derrotar o bolsonarismo e a direita dentro e fora do governo!

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