Milhares de pessoas morrem no terremoto que atinge a Turquia, Síria e Curdistão enquanto as empresas de construção lucram

A extensão total da destruição causada pelos terremotos na Turquia, Síria e Curdistão ainda não é conhecida, mas as grandes empresas já estão procurando uma forma de como lucrar com isso.

As cenas das vidas destroçadas pelos terremotos na Turquia, na Síria e no Curdistão são dolorosas de se ver. Eu estava na Turquia no verão de 1999, à apenas 40 km do epicentro do último terremoto de proporções semelhantes que atingiu aquele país. Eu tinha 16 anos na época e as lembranças perturbadoras das longas filas de cadáveres no chão, de cidades e vilarejos inteiros arrasados até o chão, e do cheiro avassalador da morte humana em todos os lugares, nunca mais me deixaram desde então.

Tornou-se óbvio que as normas e práticas de construção do país (como misturar areia do mar no concreto), adequadas para maximizar os lucros dos gangsters que comandam a indústria da construção civil, e a corrupção desenfreada que tinha proliferado no setor como resultado, tinham sido fatores centrais para a realização deste desastre. A resposta terrivelmente inadequada do então governo turco foi um fator importante na subsequente ascensão do AKP e da variante política de Erdoğan, que prometeu mudança e prosperidade para o povo da Turquia, e também prometeu implementar mudanças nos padrões de construção do país.

Após duas décadas do governo AKP, fica evidente que muito pouco mudou. Os terremotos de anteontem expuseram tudo o que está podre na corrida pela construção e infraestrutura, que durante anos foi um motor tão alardeado do crescimento turco. Apesar de anos de repetidas advertências de cientistas e especialistas, qualquer movimento sério em direção a uma melhor preparação para terremotos foi sacrificado no altar do lucro privado por alguns dos principais aliados comerciais do partido governante. Apoiados por generosos incentivos fiscais, e pela manipulação de licitações e corrupção em escala institucionalizada, os poucos magnatas da construção próximos ao regime de Erdoğan fizeram bilhões e bilhões cortando sistematicamente gastos, tanto com a segurança das pessoas, quanto com as condições dos trabalhadores. E agora milhões de pessoas pobres têm que reviver as mesmas cenas totalmente evitáveis de desolação e morte em larga escala. As ações das empresas de cimento, por sua vez, subiram acentuadamente na bolsa de Istambul, com os abutres já circulando para lucrar com o desastre.

Este último desastre não é mais “natural” do que a que ocorreu há 24 anos, e do que todos os menores que ocorreram neste intervalo. Os meios, técnica e ciência necessários para construir cidades e edifícios resistentes a terremotos existem, mas a lógica do capitalismo impede a sua utilização efetiva, pois apostar em cima de vidas humanas é muito mais lucrativo.

Os apelos atuais para “não politizar” os terremotos refletem tanto o cinismo, quanto o medo da elite governante de que a raiva profundamente enraizada das massas comece a explodir em cena a poucos meses das importantes eleições. De fato, a solidariedade da classe trabalhadora que está sendo forjada neste momento crítico de desespero poderia precisamente lançar as bases para a construção de um movimento que possa levar todos os criminosos de alto nível responsáveis por esta catástrofe a prestar contas, acabar com o regime do AKP que comandou tudo isso, colocar os grandes conglomerados de construção sob propriedade pública e, consequentemente, lutar por um sistema socialista no qual a vida das pessoas, o direito à segurança, à moradia, etc., sejam firmemente colocados em primeiro plano.

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