Escola de Quadros Mundial da ASI de 2022
Grande passo por um internacionalismo revolucionário
Mais de 90 camaradas fizeram introduções ou fechamentos em mais de 40 comissões. As delegações de 22 países, em grande parte de jovens que deixaram Leuven, Bélgica, energizados e preparados para turbulentas batalhas da luta de classes nos próximos meses e anos.
Guerra, turbulência econômica e eventos climáticos extremos – 2022 é um ano em que a crise do capitalismo global se aprofundou ainda mais. Nós entramos em uma nova era da desordem, que apresenta enormes oportunidades para o crescimento do socialismo revolucionário, mas que está marcada por complexidades e complicações. Neste contexto, é fundamental uma análise precisa e ágil. Como Leon Trotsky observou na década de 1930, outra era de revolução e contrarrevolução, “a grande importância de uma orientação teórica correta se manifesta de maneira mais evidente em um período de conflito social agudo, de rápidas mudanças políticas, de mudanças abruptas na situação”.
Assim, a necessidade de 250 marxistas se reunirem por uma semana de intensa discussão, dificilmente poderia ser subestimada. Após três bem-sucedidas Universidades Marxistas Virtuais (UMV), essa foi a primeira Escola de Quadros Mundial presencial em mais de quatro anos. Camaradas de 22 países se reuniram em Leuven, Bélgica, com mais 230 se juntando online para um evento que marcou um passo a frente na construção de uma genuína internacional revolucionária.
Infelizmente, muitos dos sintomas mórbidos de um sistema em decadência tiveram seu impacto na escola: a guerra, a Covid-19, o caos nas viagens e as fronteiras mais rígidas prejudicaram a participação de diferentes maneiras, principalmente de membros da ASI na Rússia, Nigéria e Costa do Marfim. No entanto, isso não diminuiu o entusiasmo, a determinação e a avidez por política que percorria toda a escola. Mais de 90 camaradas fizeram introduções ou fechamentos nas mais de 40 comissões e delegações, compostas por jovens principalmente, que deixaram Leuven energizada e preparada para turbulentas batalhas da luta de classes para os próximos meses e anos.
Nova Guerra Fria
A semana começou com uma sessão fenomenal sobre perspectivas mundiais, onde uma análise das principais tendencias econômicas e políticas foram desenvolvidas ao longo de um dia inteiro. O essencial para compreensão do novo período é uma análise correta da Nova Guerra Fria, o conflito interimperialista entre EUA e China, que continua a esquentar à medida que cada potência disputa o domínio global. Embora com destaque na discussão da plenária de abertura, uma plenária separada intitulada “Nova Guerra Fria ficando quente?”, se dedicou a discutir com mais detalhes esse conflito histórico que domina uma nova era de geopolítica. A ASI é única entre a esquerda por ter uma análise multifacetada desses processos e uma posição internacionalista da classe trabalhadora que se opõe a todos os campos imperialistas. A ASI luta por mudanças revolucionárias tanto no Oriente como no Ocidente, e luta para construir as forças do marxismo em ambos os lados da divisão da Guerra Fria. No entanto, como eixo central sobre a qual as relações mundiais se voltam, camaradas de todos os continentes contribuíram para a discussão sobre como esse choque de imperialismos está impactando a política, a economia e a luta de classes em todo o canto do globo.
Guerra na Ucrânia
De fato, apesar do conflito independente de Putin e do imperialismo russo com o imperialismo ocidental, a invasão brutal da Ucrânia e a guerra em curso devem ser vistas através do prisma do conflito EUA-China, e está acelerando os processos de desacoplamento entre as duas grandes superpotências. Diversas comissões abordaram esse contexto, que direta ou indiretamente definiu o evento. A comissão “A guerra na Ucrânia: seu impacto e o nosso programa”analisou as raízes da guerra, seu efeito nas relações mundiais e a consciência da classe trabalhadora na Ucrânia, na Rússia e além, e o nosso programa internacionalista de independência de classe. A comissão “Marxismo e guerra: Segunda Guerra Mundial, Vietnã, Iraque” se baseou na história do movimento socialista e os enormes desafios e pressões que enfrentaram durante guerras passadas, mas também o potencial por movimentos de massa da juventude e dos trabalhadores se desenvolverem contra o militarismo e o imperialismo. Quanto os protestos antiguerra eclodiram na Rússia após a invasão, camaradas da Sotsialisticheskaya Alternativa estavam na linha de frente, enfrentando a repressão estatal e prisões.
Economia
A guerra também teve grandes repercussões econômicas globalmente. Várias comissões ofereceram uma análise marxista dessas tendências, tanto passadas quanto presentes. “A próxima recessão: guerra e estagflação” examinou a tempestade perfeita de crise econômica que está se formando atualmente. A guerra na Ucrânia e o impacto econômico do conflito imperialista, se juntando aos efeitos de uma era de política monetária de “dinheiro fácil”, interrupções na cadeia de suprimentos, lockdowns draconianos na China e mudanças climáticas estão contribuindo para o aumento da inflação.
Acrescente a esse contexto uma crescente crise da dívida e nós temos grandes problemas no horizonte para a classe dominante e seu sistema. Em sua introdução, Claire Laker Mansfield, da seção da Inglaterra, País de Gales e Escócia, observou como “em geral, esta continua sendo uma era em que os tipos de concessões necessárias para fazer melhorias fundamentais na situação dos trabalhadores tenderá a ser possível apenas sob as bases de lutas revolucionárias que colocarem o próprio sistema em perigo”. Uma comissão que juntou muita gente, “Estagflação, década de 1970 e luta de classes” traçou paralelos com um período semelhante de mal-estar econômico e como ele deu lugar às batalhas de classes titânicas que definiram a década de 1970.
Revolução e contrarrevolução
Na verdade, nós já estamos vendo escassez crônica e inflação descontrolada colocarem as necessidades mais básicas fora do alcance da classe trabalhadora e dos pobres. Isso é mais marcante no mundo neocolonial e na comissão sobre “Revoltas em massa contra aumento do preço dos alimentos e de outras necessidades” nós discutimos o caráter do recente levante no Sri Lanka, bem como os movimentos de protesto no Panamá, Equador e Peru.
Em “Perspectivas para lutas na América Latina”, camaradas analisaram o aumento na luta e a profunda polarização política que tem sido uma característica em toda a região. Particularmente notável na escola foi a impressionante delegação de camaradas latino-americanos, 13 no total. A urgência e o potencial de construir as nossas forças no México, Brasil, Chile e Argentina foi enfatizada em várias sessões. Em particular durante “Brasil: combatendo Bolsonaro e a direita – uma abordagem marxista”, onde camaradas da Liberdade, Socialismo e Revolução explicaram os diferentes debates que ocorrem no PSOL sobre como derrotar a extrema-direita nas próximas eleições, com muitos optando pelo apoio acrítico pela candidatura de Lula a presidente.
Como na comissão “Reação em marcha? Autoritarismo, populismo de direita e extrema-direita”, os camaradas explicaram como Bolsonaro e outras forças de extrema-direita podem continuar crescendo, alimentando-se do descontentamento e frustração com o reformismo. Embora tenhamos empatia com as pessoas da classe trabalhadora que querem derrotar a extrema-direita nas urnas, nós precisamos destacar que Bolsonaros e Trumps desse mundo só podem ser derrotados sob as bases da mobilização independente da classe trabalhadora e povo oprimido, não pela conciliação com as forças pró-capitalistas.
Movimento da classe trabalhadora
Um destaque na Escola de Quadros Mundial foi a detalhada discussão sobre o movimento dos trabalhadores e as grandes aberturas para os revolucionários nos sindicatos. Em “Tendências no movimento sindical” camaradas analisaram os esforços de sindicalização na Amazon e Starbucks nos EUA e como desde a África do Sul (onde a ASI tem sido ativa na luta dos trabalhadores da Clover) à Grã Bretanha, trabalhadores estão entrando cada vez mais em oposição a lideranças sindicais burocráticas.
Uma manhã inteira de grupos de trabalho foram dedicadas a discussões detalhadas em setores específicos desde a saúde e assistência até logísticas, educação e indústria. Embora existam diferenças inevitáveis de país para país, também há uma sobreposição impressionante, pois os trabalhadores em todos os lugares enfrentam uma crise de custo de vida. Os marxistas ativos nos sindicatos de todo o mundo puderam compartilhar experiências inestimáveis em suas próprias lutas e tirar lições enriquecedoras da batalha contra os patrões em todos os lugares.
Feminismo socialista
Uma pedra angular da política e histórico da ASI é nosso trabalho feminista socialista internacional e isto se refletiu em uma série de comissões em toda a escola. As lutas explosivas contra a opressão têm sido uma característica no último período e um fator chave na radicalização de trabalhadores e dos jovens. Em “A luta pelo direito ao aborto – lições dos EUA e de outros países” camaradas discutiram a recente derrocada do Roe vs. Wade e o espectro de novos ataques da direita contra as mulheres e pessoas LGBT+, o que significa que grandes confrontos são inerentes à nossa situação. Nos EUA, a Socialist Alternative desempenhou um papel central na organização de protestos e assembleias de ação para apontar um caminho para o combate, tudo em contraste com a ausência criminosa de uma oposição real dos Democratas e das ONGs. De fato, enquanto a escola estava acontecendo, o projeto de lei de Kshama Sawant para tornarSeattle a primeira “cidade-santuário” do aborto nos EUA foi aprovado pelo conselho da cidade de Seattle (equivalente à câmara municipal), um exemplo do que os socialistas revolucionários podem alcançar em cargos eleitos com base em uma estratégia de luta de classes.
A ASI entra nessa luta com um histórico orgulhoso e camaradas se inspiraram e aprenderam com o trabalho do ROSA e do Partido Socialista na Irlanda e a vitória do referendo em 2018. Nós também nos baseamos nas ricas, mas muitas vezes esquecidas, tradições do marxismo e uma comissão que também reuniu muitas pessoas, “Zetkin, Kollontai – a primeira onda do feminismo e a abordagem das marxistas revolucionárias” analisou a história das socialistas intervindo no movimento de mulheres.
Trabalho de juventude
Na Bélgica, nossa campanha ROSA tem sido fundamental para atrair jovens radicais para nossa bandeira, juntamente com outras iniciativas dinâmicas em muitos países. Como explicou Lenin, “quem tem a juventude tem o futuro” e desde sua fundação a ASI enfatizou a importância do trabalho de juventude na regeneração de um movimento socialista revolucionário.
A escola refletiu o progresso em várias de nossas seções neste campo e ficou evidente que uma nova geração de quadros está avançando e intervindo nos movimentos de juventude e na luta de classes. Em “Construindo com o trabalho de juventude” e “Giro para a juventude: mobilizando secundaristas” jovens camaradas compartilharam experiências sobre consciência hoje, enfatizando que, embora haja uma abertura real às ideias socialistas, também existe uma compreensão limitada da classe trabalhadora e de suas organizações, em particular organizações e partidos políticos. No entanto, esses obstáculos podem ser superados por meio da explicação paciente e pelo impacto dos acontecimentos e da experiência. Uma comissão sobre os setores de combustíveis fósseis foi uma sessão conjunta de trabalhadores/jovens em que abordamos como os jovens ativos no movimento climático podem fazer unidade com os trabalhadores da indústria e mobilizar a classe na luta contra a catástrofe climática.
Construindo uma internacional revolucionária
Na tarde de quarta-feira, nós realizamos um ato público com mais de 250 pessoas presentes pessoalmente e com transmissão no tiktok, facebook e youtube, com mais de 2000 visualizações. Os diversos setores de intervenção da ASI foram apresentados e militantes do Brasil, Hong-Kong, Alemanha, Bélgica, Estados Unidos, Inglaterra e Escócia deram um panorama das lutas atuais e futuras da classe trabalhadora e oprimida, delineando o tipo de programa, estratégia e organização necessários para traçar uma saída dos horrores do capitalismo.
A construção de tamanha força revolucionária não é pouca coisa e nós tivemos dois dias de sessões sobre como nós podemos construir melhor as forças do marxismo em todo o mundo, refletindo sobre experiências recentes, oportunidades e desafios. Comissões sobre “Lutando pelo Socialismo na África”, discutiram o trabalho de nossas seções na Nigéria, África do Sul e Costa do Marfim, enquanto em “Recentes avanços nos EUA”, camaradas da Socialist Alternative realizaram um balanço das diferentes intervenções e como eles se apoderaram das oportunidades em uma situação volátil para crescer ultrapassando mil membros.
Diversas comissões discutiram os fundamentos da construção do partido revolucionário. Em “Ano do jornal” vimos camaradas compartilhando os melhores métodos de produção e distribuição de jornal marxista, nossa mais importante ferramenta em organizar as nossas forças e trazer as nossas ideias para a classe trabalhadora, além de abrir diálogo com os trabalhadores e jovens mais conscientes politicamente. Em “Finanças revolucionárias”, discutimos a importância de independência financeira e como a captação de recursos entre a classe trabalhadora é uma questão profundamente política, uma concretização de apoio às nossas ideias.
A plenária de encerramento sobre construção deixou evidenciado de que a ASI é uma internacional revolucionária se preparando para aproveitar as grandes aberturas para construir as forças do marxismo nos próximos anos. O senso de urgência dessa tarefa correu como um fio vermelho através de todas as contribuições e refletiu no impressionante apelo financeiro, até agora atingindo 66,133 da nossa meta de 75 mil euros, com milhares ainda chegando.
Ao mesmo tempo, nós temos uma compreensão sóbria das complicações e de como as coisas nem sempre se desenvolvem de forma linear e direta. Discussões coletivas e democráticas são necessárias para alcançar compreensão política e, como foi enfatizado ao longo da sessão, uma nova geração de lutadores da classe trabalhadora deve ser encorajada a tomar iniciativa, cometer erros e corrigi-los e coletivamente traçar lições das experiências.
Aqueles que compareceram presencialmente e virtualmente na Escola de Quadros Mundial da ASI de 2022 retornarão para as suas sessões enriquecidos de uma semana de debates e experiências compartilhadas na luta de classes global. E a ASI entrará no próximo período politicamente mais afiada e dinâmica do que nunca.