A esquerda socialista em 2010 – que fazer?
O ano de 2010 será decisivo para a esquerda socialista brasileira. Em meio a um cenário complexo, marcado pelas ilusões que persistem em relação ao governo Lula, recai sobre a esquerda que não se vendeu e não se rendeu a difícil tarefa de romper a falsa polarização entre PT e PSDB no processo eleitoral que se aproxima.
Depois de uma enorme ofensiva propagandística de que o crescimento praticamente zero no ano de 2009 foi um bom resultado, o clima do “Brasil grande”, do pré-sal, da Copa e da Olimpíadas em solo nacional, será estimulado ao máximo bloqueando qualquer debate sério sobre o futuro de milhões brasileiros que ainda vivem e viverão o pão que o diabo amassou.
A situação é complicada para a esquerda. Mas, existem condições para um acúmulo de forças que será vital quando o cenário mudar. O próximo governo burguês não será como o de Lula, seja quem for o novo presidente e a composição do Congresso Nacional. A persistência da crise internacional terá consequências sobre o Brasil. A fatura das medidas imediatas do governo para minimizar a crise será cobrada na conta dos trabalhadores. Um cenário de resistência e de avanço na consciência de masas pode se abrir.
Mas, para que a esquerda estimule e intervenha nesse cenário, precisa passar pelo difícil teste de 2010. Algumas condições são básicas para isso. Em primeiro lugar a esquerda precisa ter cara própria, apresentar-se como alternativa e lutar para ocupar um espaço na consciência da massa dos trabalhadores, jovens e do povo pobre desse país. Mesmo que seja um espaço minoritário, a esquerda precisa mostrar que existe, que não sucumbiu com a degeneração do PT.
Tão importante quanto isso, porém, é a necessidade da unidade da esquerda socialista em 2010. A apresentação de pequenas candidaturas fragmentadas disputando o mesmo espaço é uma política suicida e que prejudica a todos. A construção da Frente de Esquerda envolvendo PSOL, PSTU, PCB e setores combativos dos movimentos sociais é vital para o conjunto da esquerda.
Uma candidatura unitária da esquerda em 2010 tem que romper com o discurso hegemônico, quase consensual, imposto pelos neoliberais de dentro e de fora do governo Lula. Não se trata de um debate técnico comparando FHC e Lula utilizando-se critérios comuns a ambos. Trata-se de apresentar uma alternativa programática que, partindo das necessidades mais concretas dos trabalhadores e do povo, possa construir saídas com base em mudanças estruturais em relação ao modelo econômico comum de FHC e Lula e, a partir daí, à propria lógica do capitalismo brasileiro e internacional.
Mas, uma candidatura unitária da esquerda com um programa anti-capitalista e socialista, como estamos defendendo, não cumprirá seu papel se não tiver como objetivo claro o fomento à organização de base dos trabalhadores, à luta direta através dos movimentos sociais combativos, à organização operária, camponesa, estudantil e popular.
Nesse marco, a formação da nova Central sindical e popular unificada no Congresso da Classe Trabalhadora (CONCLAT) em junho deve ser encarada como uma prioridade fundamental. A esquerda nas eleições deve estar à serviço da organização dos trabalhadores e suas lutas. Eleger parlamentares e disputar o Executivo deve servir para fortaleceler a luta dos trabalhadores e não transformar-se num fim em si.
Essa é a estratégia que defendemos para o PSOL, o PSTU, o PCB e outros setores da esquerda socialista e dos movimentos sociais combativos em 2010. Partindo dessas condições será possível ocupar um espaço, acumular forças e nos prepararmos para o próximo período apesar da complexidade da conjuntura.
Uma saída pela esquerda para a crise do PSOL
O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) entra em 2010 em meio a uma grave crise. É verdade que o contexto político no país dificulta a atuação de um partido que se coloca abertamente como oposição de esquerda ao governo Lula e à direita tradicional.
Porém, os setores majoritários da direção do PSOL não poderiam ter sido mais eficientes em fomentar a confusão e agravar as dificuldades. Um balanço crítico da nova direção eleita no II Congresso do partido precisa ser feito.
Diante da decisão equivocada de Heloísa Helena de não disputar as eleições presidenciais, a maior parte dos integrantes e das correntes na Executiva Nacional (da chapa hoje majoritária, mas também da chapa que reflete a maioria anterior) decidiu abrir formalmente negociações com vistas a uma coligação com o PV de Marina Silva. Não são ingênuos, sabiam com quem lidavam, conheciam o caráter oportunista do PV e a dinâmica conservadora da própria pré-candidatura de Marina.
Junto com isso, pouco tempo depois, a quase totalidade da Executiva decidiu adiar a Conferência Eleitoral que o Congresso do partido havia decidido realizar no prazo de dois meses. A Conferência fora adiada para março e agora novamente adiada para abril.
Adiar a decisão e negociar com Marina, ao mesmo tempo em que figuras públicas do PSOL, como Heloísa, não se cansavam de dar declarações de apoio à pré-candidata do PV, causou um estrago considerável.
Hoje, depois de tanto tempo perdido, o projeto de coligação com o PV fracassou de forma acachapante. O PV de Marina se coligará com o PSDB e Democratas no Rio, Marina não se declara de oposição a FHC e muito menos a Lula e, pra piorar, sua candidatura mostra grandes dificuldades para decolar. Junto com isso, houve um grande rechaço da base do partido à política de diluir o PSOL numa coligação com fins meramente eleitoreiros.
Diante dos terríveis danos da política implementada, a maioria da Executiva tenta se justificar com argumentos do tipo: “tínhamos que dialogar com a base de Marina, mostrar que não somos sectários”. Mas, a que preço? Possivelmente, o preço de uma candidatura para valer do PSOL e da Frente de Esquerda em 2010. Um preço alto demais que terá que ser cobrado da direção majoritária do PSOL.
O tempo perdido tornou mais difícil a composição da Frente de Esquerda com PSTU e PCB. Tornou mais difícil até mesmo a apresentação de uma candidatura para valer por parte do PSOL e não um mero ‘tapa buraco’ improvisado na última hora.
A melhor forma do PSOL e a Frente de Esquerda abrirem um diálogo franco e honesto com a base social que hoje se ilude com Marina Silva seria tendo cara própria, se apresentando para o debate, apresentando suas alternativas e não se escondendo com medo de que os dirigentes do PSOL fossem fotografados ao lado de Zequinha Sarney quando este foi enviado a participar das negociações com os dirigentes do PSOL.
Diante do estrago já feito, o partido tem duas possibilidades: remendar os danos improvisadamente e seguir no mesmo caminho ou tomar uma decisão firme e ousada, mudando radicalmente os rumos adotados até agora.
O nome de Martiniano Cavalcanti, dirigente do partido em Goiás e membro do Diretório Nacional, apresentado como pré-candidato por Heloísa Helena e muitos daqueles que promoveram o desastre da tentativa de coligação com o PV, representa em nossa opinião, uma opção por insistir nos mesmos erros.
Independentemente dos qualificativos do nome de Martiniano, a quem respeitamos, trata-se essencialmente de uma alternativa apresentada para a luta interna pelo controle do partido. A lógica não é a do nome com melhores condições de fazer avançar o PSOL e a Frente de Esquerda.
A possibilidade concreta de uma saída pela esquerda, voltada para fora, firme e ao mesmo tempo viável, diante da crise do PSOL, se materializa nesse momento na pré-candidatura de Plínio de Arruda Sampaio.
Plínio é uma figura pública inquestionável da esquerda socialista do ponto de vista de sua coerência militante e socialista. Como referência sólida da esquerda para milhares de ativistas, seu nome é capaz de ampliar a base social do PSOL dialogando abertamente com os movimentos sociais.
A pré-candidatura de Plínio é a única que poderia lutar, com chances reais de êxito, contra a fragmentação da esquerda em 2010 e pela constituição da Frente de Esquerda com PSTU e PCB. Não existe hoje qualquer outro nome disponível que abra concretamente essa possibilidade.
Plínio é também uma alternativa capaz de combater as ilusões no PT ou em Marina Silva presentes até mesmo nos movimentos sociais. Mais ainda, o nome de Plínio e o tipo de campanha militante e socialista que propõe podem desafiar até mesmo o ceticismo despolitizado que cresce em meio à falta de alternativas.
O nome do ex-deputado e dirigente do PSOL Babá, também recém apresentado como pré-candidato, merece da nossa parte todo o respeito e consideração. Babá compôs conosco uma chapa de esquerda no II Congresso do PSOL e suas credenciais como lutador social são inquestionáveis. Infelizmente, porém, a lógica por trás da apresentação de seu nome também é a de marcar posição apenas.
Num momento em que a pré-candidatura de Plínio se fortalece em razão de seus méritos próprios e da crise do campo majoritário e quando até mesmo setores da maioria da direção decidem apoiar Plínio sem que concessões tenham sido feitas, a apresentação do nome de Babá não ajuda a fortalecer a esquerda do partido. Também não ajuda na luta pela constituição da Frente de Esquerda com PSTU e PCB.
A batalha pelo futuro do PSOL é também parte fundamental da luta para reconstruir uma esquerda socialista de massas no Brasil.
É preciso constituir um pólo de esquerda no PSOL que manterá o fio de continuidade do processo de recomposição da esquerda socialista brasileira, uma continuidade com o projeto original do PSOL que hoje se esgarça e enfraquece diante das vacilações e erros da direção majoritária do partido. A candidatura de Plínio deve ser uma ferramenta para isso.