Combater o racismo ambiental e a devastação capitalista

No momento em que este artigo está sendo escrito, o número de mortes em Petrópolis confirmadas chegou a 204, com mais de 50 desaparecidos. Isso ocorre apesar de inúmeros estudos e alertas avisando sobre a necessidade de medidas preventivas, mostrando mais uma vez o descaso e o sistema de lucros por trás dos desastres ambientais, onde quem paga o preço é a população preta, pobre e trabalhadora.

No sistema capitalista a natureza é tratada como fonte de recursos inesgotáveis. A sociedade tem emitido mais poluentes do que o ecossistema consegue absorver, mas a vasta maioria da população do mundo não tem qualquer controle ou responsabilidade sobre isso. Um relatório recente da ONU revela que, globalmente, os 1% mais ricos são responsáveis anualmente por uma taxa de 74 toneladas de CO2 per capita, enquanto a dos 50% mais pobres é de 0,7 toneladas.

Legado de destruição

Não temos controle sobre as grandes corporações, mas somos constantemente atingidos por crimes ambientais que tem acontecido com mais frequência nas últimas décadas. Os rompimentos das barragens da Vale em 2015 e da Samarco em Brumadinho em 2019, ceifou centenas de vidas e deixou um legado de destruição ambiental, social e econômica. 

Ao menos seis etnias de povos indígenas e duas comunidades remanescentes de quilombolas foram diretamente atingidas, além da perda das bacias do Rio Doce e do Rio Paraopeba, fonte de alimentação e consumo para milhares de outras famílias em comunidades ribeirinhas e também das cidades do entorno.

Recentemente, as grandes chuvas provocadas pelo descontrole climático, consequência da exploração capitalista, deixou 654 barragens em Minas Gerais sob alerta, com 31 delas colocadas em nível de emergência. Uma das barragens da Vallourec transbordou em Nova Lima, cidade limítrofe da capital Belo Horizonte, interditando a BR-040, uma importante via de acesso da região. 

As barragens são a forma mais barata para armazenar os rejeitos de minério da atividade desenvolvida pelas mineradoras, logo, mostra que a preocupação das grandes empresas não é com o meio ambiente ou a população, mas sim garantir seus lucros.

Para além de contribuir com a contaminação do solo, a atividade das mineradoras também contribui para o desequilíbrio ambiental, que junto com o agronegócio desenfreado, é causa de inúmeros conflitos e mortes no campo. 

O Brasil de Bolsonaro tornou-se uma terra sem lei e altamente perigosa para comunidades indígenas e quilombolas, onde se expressa de maneira mais evidente o racismo ambiental contra essas pessoas. Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública informou que houve uma queda de mortes violentas em praticamente todas as regiões do país no ano de 2021, exceto na região norte, que teve um aumento de 10%, sobretudo na Amazônia, cujo aumento foi de 54%. Esse aumento se deve às mortes violentas relacionadas com crimes ambientais.

Garimpeiros, posseiros, latifundiários passaram a invadir e expulsar famílias de imensas quantidades de terras no Norte e Centro-Oeste. As famílias e comunidades sofrem atentados constantes, que vão desde voos rasantes de agrotóxicos sobre as comunidades até a execução de famílias inteiras, incluindo crianças.

Não ao marco temporal!

O “cinturão-verde”, os “guardiões das florestas” são respostas auto-organizadas de comunidades quilombolas e indígenas na tentativa de preservação ambiental ante a inércia reiterada dos governos. São comunidades que resistem ao ecocídio e mantêm relação não comercial com a natureza.

Desde 2018, a bancada ruralista e do agronegócio vem pressionando para o governo federal aprovar o marco temporal que é mais um exemplo de racismo ambiental e, em certa medida, regulamenta o etnocídio. Ele propõe que o governo só demarque e reconheça terras comprovadamente ocupadas por indígenas na promulgação da constituição de 1988. 

Essa aberração jurídica tem de cessar por duas simples razões lógicas: 1) antes de 1988, durante a ditadura militar, houve perseguição sistemática a comunidades inteiras de indígenas, que foram obrigadas a deixarem suas terras, portanto, com a reabertura democrática há o retorno e reagrupamento dessas comunidades para o seu local de origem de forma gradual, 2) o marco temporal deveria considerar o ano de 1500, ano da invasão do Brasil. Os indígenas são os legítimos “donos” dessas terras. Dos cinco milhões de indígenas à época da invasão portuguesa, em 2014 restavam apenas 460 mil, segundo dados da FUNAI.

No contexto da pandemia da Covid, a pretexto de levar assistência aos indígenas, o governo Bolsonaro promoveu o vírus, a fome, a violência, o abandono. O último ancião do povo Juma, morreu de Covid e levou com ele os saberes ancestrais de um povo, antes que tivesse tempo de deixar o seu legado. O movimento indígena está correto: o governo Bolsonaro é genocida sim!

Eventos climáticos cada vez mais extremos

O desmatamento que povos indígenas e quilombolas enfrentam bravamente, principalmente na Amazônia, tem contribuído para o descontrole climático que resulta em grande volume de chuva precipitada em curto espaço de tempo em algumas regiões do país, intercalado com grandes períodos de secas extremas. 

Na virada do ano, os estados da Bahia e Minas Gerais registraram cerca de 700 milímetros de chuva em poucos dias, algo esperado para a estação toda. Enquanto o presidente curtia suas férias passeando de lancha, cidades inteiras ficaram debaixo d ‘ água e dezenas de famílias, além de ficarem desabrigadas e desalojadas, choravam a morte de seus entes queridos. 

Em fevereiro, São Paulo, Espírito Santo e Rio de Janeiro receberam grandes volumes de chuva, insuficientes para recuperar o nível dos reservatórios, mas suficientes para mostrar o déficit da política pública habitacional no Brasil, sobretudo nas grandes cidades. 

Muitos prefeitos têm feito uso oportunista de supostas situações de risco geológico para remoções forçadas para interesse da especulação imobiliária, é o que acontece com o Beco do Fagundes em Betim, cidade da região metropolitana de Belo Horizonte. Há laudos técnicos que comprovam que as casas estão seguras, mas o prefeito empresário quer forçar a desapropriação de famílias que vivem no local há 40 anos para ceder a área para a construção de um shopping. Por outro lado, as “casinhas” oferecidas pela prefeitura como alternativa de moradia, ficaram debaixo de água com as chuvas que caíram no final de janeiro em Minas Gerais.

Os extremos climáticos revelam uma política escancarada de violências socioambientais praticadas contra comunidades inteiras, desde a ausência de políticas públicas habitacionais até o armamento de jagunços e fazendeiros.

A cúpula do clima revelou que os países mais desenvolvidos, maiores poluidores e utilizadores de matérias primas do planeta, não têm plano A, nem B nem C para conter o uso irresponsável dos nossos recursos naturais. É impossível mudarmos a rota da exploração humana e ambiental dentro do sistema que se baseia na acumulação de capital. Se medidas urgentes não forem tomadas para um equilíbrio saudável de uso e recuperação dos recursos naturais, todos sofrerão as consequências, mas por enquanto somente os pobres, os indígenas e quilombolas estão pagando a conta.

Tirar das mãos dos grandes capitalistas

Precisamos de um planejamento verde, tirar das mãos dos grandes capitalistas o controle sobre a produção de insumos e alimentos. Temos condições de aplicar o mais alto padrão de eficiência energética tanto para novas quanto para antigas construções, além de satisfazer as necessidades humanas de maneira sustentável. Isto significa tirar os setores fundamentais da economia das mãos das grandes empresas e colocá-los sob propriedade pública e controle democrático. Isto possibilitaria reorganizar, a partir da planificação democrática, a indústria energética, transporte, agricultura e a produção em geral para satisfazer os interesses do povo e do planeta.

Temos que denunciar o racismo ambiental, como parte da agenda de mobilização da juventude pelo meio ambiente e por uma alternativa socialista.

  • Não ao marco temporal! Não à exploração em terras indígenas, quilombolas e populações tradicionais.
  • Por uma política pública que garanta moradia em locais seguros. Combate à especulação imobiliária. Medidas de prevenção contra enchentes e deslizamentos bancadas pela taxação dos ricos e grandes empresas. 
  • Combate às mudanças climáticas enfrentando os interesses do agronegócio, madeireiras, mineradoras, indústria de combustíveis fósseis, grandes empresas e todo esse sistema capitalista que coloca o lucro acima da vida e do meio ambiente.
  • Colocar a exploração e o uso de recursos naturais sob gestão e controle democrático de trabalhadores para garantir a preservação do meio ambiente.
  • Combate ao racismo ambiental e estrutural, luta por uma sociedade socialista sem opressão e exploração.

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