Brumadinho: o desastre do capitalismo

“Somos o país que mais preserva o meio ambiente”, disse presidente Jair Bolsonaro em seu discurso no dia 22 de janeiro. Ele já vinha dizendo que há uma “indústria de multas” no setor ambiental, que as licenças ambientais atrapalham obras, e que é “horrível” ser patrão no Brasil. Três dias depois do discurso em Davos, veio a catástrofe em Brumadinho, e o novo dilúvio de lama, apenas três anos após Mariana, mostrou a realidade do capitalismo predatório que Bolsonaro defende.

Novamente, a gigante mineradora Vale está envolvida. Em Mariana, como dona da metade da Samarco; agora, com um mina 100% da empresa. Apesar da quantidade de lama liberada ser somente um quarto (12,7 milhões de metros cúbicos) do que foi em Mariana, o preço em forma de vidas humanas foi muito mais alto. Em Mariana foram 19 mortes. Até o dia de hoje (08/02), foram 157 mortes confirmadas, mas com 182 pessoas ainda desaparecidas, sem perspectiva de serem encontradas com vida.

Uma grande parte dos mortos trabalhavam para a Vale, diretamente ou como terceirizados. O prédio administrativo e o refeitório estavam no caminho da lama, e o estudo da própria empresa tinha mostrado que em caso de rompimento, só levaria 1 minuto para a lama chegar até lá. Não há dúvida sobre a responsabilidade da empresa. “Foi um massacre”, como constata o editorial da Folha de São Paulo.

Os efeitos sobre o meio-ambiente serão graves. A lama, que já matou o Rio Paraopeba, pode se alastrar por 300 quilômetros, atingindo o Rio São Francisco.

A comoção nacional, reforçada pela memória de Mariana, forçou as autoridades a agir rapidamente. A justiça bloqueou 11 bilhões de reais em bens da Vale. Representantes dos poderes públicos foram visitar a área atingida. O novo ministro do meio ambiente teve que ajustar o discurso anterior, explicando que as regras de licenciamento só vão ser afrouxadas para projetos de baixo impacto ambiental, não em casos como esses.

Mas o balanço da catástrofe de Mariana, – onde a lama matou o rio Doce, percorrendo 650 quilômetros, levando a extinção de dezenas de espécies e afetando a distribuição de água e pesca de mais de 200 cidades – é que pouco mudou.

As pessoas atingidas ainda esperam por indenização e novas moradias. Os casos de depressão entres elas são comuns. As regras mais rígidas propostas foram, na maioria dos casos, bloqueadas, com a ação direta de políticos de direita que tiveram suas campanhas eleitorais financiadas por mineradores. 

A Folha de São Paulo mapeou essa “bancada da lama”. Em 2014, 23 dos 52 deputados que iriam discutir o novo Código de Mineração, se elegeram com recursos de mineradores. O principal representante, Leonardo Quintão (MDB-MG) recebeu R$ 2,1 milhões de mineradoras (42% do que arrecadou). Ele não se reelegeu em 2019, mas manteve sua influência, tornando-se assessor do governo Jair Bolsonaro (PSL).

A Agência Nacional de Mineração, criada em 2017, não tem poder nenhum. A maior multa que pode dar é de R$ 3,2 mil. Um projeto que elevaria isso a R$ 30 milhões foi barrado no congresso.

A cidade de Mariana ainda vive uma profunda crise e grande desemprego, com a mineração paralisada faz três anos. A Vale prometeu manter a “Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM)”, taxa que as mineradoras devem pagar aos municípios, que representa 60% da verba da cidade. Mas isso só será garantido se houver muita pressão e luta. O balanço de Mariana até agora é que a Samarco só pagou 5,7% das multas (R$ 41 milhões de R$ 716 milhões no total). A cidade Brumadinho vai encarar uma profunda crise. Dos 9 mil empregados na cidade, 2 mil trabalhavam para a Vale (sendo metade terceirizados). 

O problema das barragens é gigantesco. Segundo relatório divulgado pela ANA (Agência Nacional de Águas), em 2017 havia 45 estruturas de barragens com risco de rompimento no Brasil, 80% a mais que 2016. A barragem de Brumadinho não estava na lista das consideradas de alto risco. 

A Vale tem 175 barragens no país. No ano passado só foram feitos simulados de emergência em 9 delas. Brumadinho estava entre elas. A população receberam brochuras informativas, explicando o que fazer se o alarme soar. Mas as sirenes não funcionaram, apesar de estarem intactas, ao contrário do que foi dito pela empresa logo após a catástrofe.

 A empresa perdeu 24% do seu valor no primeiro dia em que a bolsa de valores abriu. Apesar de se recuperar um pouco, ainda se trata de mais de R$ 50 bilhões que evaporaram. A empresa suspendeu pagamento de bônus e dividendos também. Mas não há dúvida que, sob o sistema atual, quem vai sofrer e pagar o preço não são os acionistas ricos ou diretores, e sim as famílias dos trabalhadores e a população local.

A Vale foi privatizada a preço de banana em 1997. O valor pago equivale a três meses de lucro da empresa, que cresceu ao ponto de ser, hoje, uma das maiores do mundo. Novamente, evidencia-se como se dá esse crescimento, colocando a busca por lucro à frente da vida e do meio ambiente.

A LSR exige que os diretores responsáveis sejam responsabilizados criminalmente, que sejam pagas indenizações plenas aos atingidos, e que o meio ambiente seja recuperado o mais rápido possível. A Vale tem que ser reestatizada, sob o controle e gestão democrática dos trabalhadores. A população local tem que ter direito de vetar projetos como esses, que potencialmente pode devastar a terra onde vivem. Recursos naturais não podem ser deixados nas mãos do capitalismo predatório, e um sistema de reciclagem efetivo tem que ser implementado para minimizar a necessidade de nova extração. Tudo isso requer que a produção seja submetida a um planejamento democrático, onde a produção seja para cumprir necessidades sociais do povo trabalhador e sem degradar o meio ambiente – não a serviço da busca de lucros de uma pequena elite.

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