Debate de gênero no Movimento dos Atingidos por Barragens
Entrevista com Alexandra Borba (Barragem de Machadinho (RS), que em 2000 foi deslocada e reassentada) dirigente do MAB, no final da 3ª etapa do curso de extensão e especialização do MAB/IPPUR/UFRJ, 23/07/2009.
LB: Como surgiu o debate de gênero no MAB?
AB: No início 1980 havia discriminação das mulheres que participavam da luta do movimento, o MAB começou a fazer discussão de gênero através do contato com a Via Campesina, que já tinha mulheres organizadas. Mas desde o início já existia a questão do cuidado da família que produzia alimentos em volta de casa, por isso já percebíamos que as mulheres eram mais afetadas.
Hoje no MAB algumas mulheres são organizadas para fazer este debate específico, mas as mulheres vão as atividades de mulheres de outros movimentos também. Nos cursos de formação do MAB tem uma discussão de gênero (como o capital oprime as mulheres), e um novo debate no MAB é se a questão de gênero esta articulada diretamente a questão da energia.
LB: Como acontece o debate de gênero hoje?
AB: Os cursos tem um eixo que discute a questão das mulheres nos movimentos, onde os homens discutem juntos, o movimento discute que lavar as roupas e cuidar das crianças deve ser tarefa dividida entre homens e mulheres, nos encontros nacionais ou cursos as tarefas hoje em dia já estão sendo divididas.
LB: O MAB incorporou o discurso de mulheres para aumentar se número de militantes, como uma tática de sobrevivência?
AB: A questão das mulheres não é só trazer para o movimento mais mulheres e crescer o MAB, também é para deixar claro que tem uma carga maior de opressão sobre as mulheres, essa discussão é essencial para transformar a sociedade no sentido da emancipação. A luta por uma nova sociedade esta casada com a luta contra o machismo.
LB: Qual a principal luta das mulheres do MAB hoje?
AB: Fortalecer a construção do MAB e especificamente devemos nos preocupar como fazer o debate de gênero ser incorporado de fato no dia-dia e na prática, como organizar o debate na nossa base em geral, devemos fazer com que as tarefas das mulheres no MAB não sejam machistas e por gênero, tentando evitar reproduzir o machismo da sociedade na divisão de tarefas rotineiras.
LB: Qual o maior marco na luta das mulheres do MAB?
AB: A ocupação da Aracruz no dia 8 de março de 2006 no Rio Grande do Sul, feita só por mulheres, éramos cerca de 1.500 do MAB, MST e Via Campesina, que tinha como objetivo evitar os problemas causados pelo eucalipto e desertificação.
Relato de conversa com Andréia da Silva Neiva (Correntina, BA) professora de series iniciais e militante do MAB, no final da 3ª etapa do curso de extensão e especialização do MAB/IPPUR/UFRJ, 23/07/2009.
“Eu comecei a participar do MAB em 2003, sempre percebi a opressão de gênero na sociedade, mas tive um contato com o debate teórico de gênero na escola de militantes de 2005 e 2006.
O MAB na discussão de divisão de tarefas tem sempre a preocupação em ter um homem e uma mulher na coordenação dos grupos e de dar nomes de mulheres e homens lutadores para os grupos de base. Porém o mais difícil é colocar em prática, no dia-dia, a questão de gênero, os companheiros se esforçam, mas é um debate difícil, discutir entre as mulheres é fácil, o difícil é concretizar as discussões, pois o preconceito com as mulheres esta presente na sociedade.
Nosso desafio é provocar a reflexão nos homens, nesta etapa do curso de formação conseguimos fazer esse debate. Nesta etapa teve uma discussão de quem cuidaria das crianças e alguns homens colocaram a dificuldade em entender a idéia de que a tarefa de cuidar será dos dois.
Nesta tarefa da ciranda, a resistência dos homens não era em cuidar das crianças, isso eles aceitavam, a resistência era lavar a roupa das crianças, eles atribuíam isso a mulher por ser mãe (alguns homens não queriam lavar a roupa dos filhos de mães que estavam presentes no espaço, argumentando que não eram seus filhos e por isso não era uma tarefa dos grupos de base). Não aceitavam que no movimento não tem mãe, tem companheiros e companheiras dividindo tarefas e aqui a tarefa de lavar roupa das crianças nesses 20 dias de curso era de todo mundo. Porém um outro companheiro, aceitou bem a discussão e disse que foi o melhor momento do curso para ele, por isso as opiniões entre os homens ficaram divididas.
Um verdadeiro avanço que conseguimos é colocar no plano nacional de formação política do MAB o debate de gênero. As novas cartilhas de formação política do MAB tem o debate de gênero e isso garantira que os novos militantes terão maior facilidade de incorporar o debate de gênero. Neste sentido de 2004 para cá teve um grande avanço no debate de gênero no MAB.”