Mexico: Centenas de milhares juntam-se para ato de posse do presidente legítimo López Obrador
“Se ve, se siente, tenemos presidente”
Cento e quarenta e um dias depois que os partidos de direita fraudaram as eleições presidenciais do México, o movimento de protesto popular encabeçado pelo ex-candidato presidencial, Andrés Manuel López Obrador (AMLO), saiu com força total em 20 de novembro para a sua própria cerimônia de posse em Zócalo, a principal praça da Cidade do México.
Multidões juntaram-se das 15hs em diante e no início da cerimônia, às 17hs, uma das maiores praças do mundo estava totalmente lotada. Pessoas que chegaram tarde tentaram acompanhar os eventos nas ruas mais próximas. A multidão era composta por membros do PRD (Partido de la Revolución Democrática, partido de AMLO), do PT (Partido dos Trabalhadores) um aliado do PR na aliança Por el Bien de Todos e membros de organizações comunitárias. Eles enfrentaram o frio e esperaram calmamente a chegada de AMLO, no mesmo dia do aniversário oficial da histórica Revolução Mexicana.
A multidão de mais de 300 mil pessoas ocupando a praça foi um desafio aos partidos de direita e o presidente oficialmente eleito, Calderon. Por meses, a mídia previu a morte do movimento de protesto e a falência política de AMLO e do PRD. Logo depois das eleições fraudadas, AMLO chamou seus apoiadores a ocupar a Zócalo e montar um acampamento. Por 48 dias, os manifestantes acamparam na praça, protestaram por todo o país e fizeram tudo a seu alcance para reivindicar a eleição que foi claramente roubada deles. Agora eles voltaram para Zócalo em grandes números e as celebrações oficiais de aniversário organizadas pelo governo Fox desapareceram na insignificância. A maior parte dos atos oficiais de lembrança foi cancelada. As poucas representações dos heróis da Revolução Mexicana, Pancho Villa e Zapata, que se apresentaram a cavalo em outras partes da cidade (jogando papéis subservientes nas cerimônias oficiais de lembrança que são desprovidas de qualquer significado revolucionário) eram uma ilustração da impotência da classe dominante ao invés da usual celebração bajuladora em que os ladrões multimilionários que comandam o México tentam mostrar algum antecedente revolucionário.
O governo legítimo é o povo organizado
Quando López Obrador apareceu no palco em Zócalo o público começou a gritar palavras de ordem: “Es um honor de estar con Obrador” e “Si se pudo”. A cerimônia de posse começou com uma proposta do líder da Convenção Democrática Nacional, uma organização composta por diferentes partidos na aliança de Obrador e organizações sindicais e comunitárias. A proposta alcançada, por meio de uma consulta a mais de um milhão de delegados, era a de se mobilizar em 1º de dezembro para protestar contra a posse fraudulenta de Filipe Calderon. O orador perguntou para a multidão na praça se eles concordavam e estavam preparados para ocupar Zócalo, às 7hs da manhã, em 1 de dezembro. Imediatamente todas as mãos foram levantadas, como se fosse a ação de uma só pessoa.
Então o governo alternativo de 12 pessoas (6 mulheres e 6 homens), foi proposto para o público. Depois disto, López Obrador apareceu com uma insígnia representando uma águia, com asas abertas e uma cobra em seu bico. Em seu discurso, Obrador referiu-se a este símbolo como a águia republicana, o símbolo da presidência Juarez durante a primeira Revolução Mexicana. Obrador diferenciou este símbolo do símbolo oficial na bandeira mexicana nacional, gritando: “Abaixo a águia ameaçadora! Abaixo a águia dos conservadores e dos reacionários do México!”.
Obrador continuou e afirmou: “É uma satisfação ver vocês aqui. Ver a Zócalo cheia de novo e vibrando com entusiasmo que reafirma o que eu sempre pensei: de que com pessoas como vocês nada é impossível. Aqui está a prova do que nós somos e do que nós seremos capazes de construir”.
O discurso apresentou 20 pontos programáticos do governo alternativo, pontos que giravam em torno de “um governo do povo” que será organizado, “a organização do mais importante movimento civil que já existiu em nossa história, nós construiremos debaixo – a transformação política, econômica, social e cultural que o México necessita”.
As maiores aclamações surgiram quando López Obrador atacou a classe dominante e o governo “oficial” do México, presente e futuro. “Um governo separado do povo não é nada mais que uma fachada, uma casca de ovo, um aparato burocrático; o governo legítimo é o povo organizado”. Ele chamou o estabelecimento de uma “verdadeira comissão” para investigar o enriquecimento ilegal e a corrupção desenfreada que acompanhou a privatização das antigas indústrias estatais e investigar, também, a “rede dos velhos rapazes”, os partidos políticos e as práticas corruptas em torno das quais os contratos de governo são concedidos.
A primeira medida deste governo popular, afirmou Obrador, seria “enfrentar os monopólios econômicos” e propor uma “lei sobre os preços competitivos” que darão fim aos “preços exagerados que os mexicanos pagam por serviços e bens”.
Ele listou preços que o povo mexicano paga e os comparou com os preços que um cidadão dos EUA pagaria pelos mesmos bens e serviços. “Não é aceitável que os mexicanos paguem 223% mais por cimento, 260% mais por internet em banda larga, 65% mais por telefone, 116% mais por eletricidade residencial, 116% mais por televisão a cabo e 26000% mais taxas pelo uso de cartão de crédito”.
Outros dos 20 pontos programáticos incluíam educação gratuita, um salário mínimo nacional garantido na constituição, proteção da indústria mexicana da competição internacional, direitos para os povos indígenas e todas as outras minorias, não para as privatizações e sim para a proteção dos recursos nacionais do país.
Obrador recebeu a maior aclamação da noite quando disse que não se pode esperar que um povo oprimido aceite a opressão pacificamente. “Quando não existe justiça, não pode existir paz!”. Ele anunciou apoio para a rebelião na região de Oaxaca, exigindo a renúncia do governador do estado Ulises Ruiz e a retirada da polícia militarizada de Oaxaca (ver relatos anteriores em www.socialistworld.net).
Acabar com o poder dos barões industriais e combater o crime de colarinho branco
Obrador fez referências aos “barões” da economia mexicana que enriqueceram durante as políticas neoliberais dos governos de la Madrid, Salinas, Zedillo e Fox. De fato, tal como em outros países da América Latina massacrados pelo neoliberalismo, enquanto a população sofria a “liberalização” do mercado, estas políticas criaram poucos ricos monopolistas.
Os 10 barões mais importantes até 2005 acumularam uma fortuna de 30 bilhões de dólares ou 5% do Produto Interno Bruto – um quarto disto está nas mãos do mais rico mexicano, Carlos Slim Helú, que também é um ex-líder de campanha do candidato a presidente da direita, Salinas.
O sr. Slim controla 94% da comunicação telefônica fixa e 75% da rede de telefone móvel. Lorenzo Zambrano, o rei do cimento, controla 90% do mercado mexicano e seu grupo industrial é o terceiro na produção mundial de cimento. No início do processo de privatização sua fortuna acumulava 55 bilhões de pesos e 5 anos depois ele triplicou sua fortuna. Germán Larrea, o líder do grupo industrial Grupo México, possui 95% da exploração e do comércio da indústria de cobre. No começo da presidência de Fox, a riqueza da rede de Germán Larrea era de 700 milhões de pesos. Em 2005 ela cresceu para 7,2 bilhões de pesos. Estes monopolistas tiveram lucros gigantescos enquanto as taxas de pobreza continuaram as mesmas ou cresceram durante a última década. Entre 43% e 51% dos mexicanos vivem na linha de pobreza e aproximadamente 80% de todas as famílias rurais vivem na pobreza. O auxílio governamental é virtualmente inexistente ou não ajuda. Um jornal relatou recentemente que as famílias pobres em Oaxaca, Puebla, Hidalgo e Veracruz dão a comida para bebês distribuída pelo governo para seus animais, pois suas crianças não comem.
O gênio está fora da garrafa
Este programa populista de esquerda apresentado por Obrador tem todas as chances de servir como um catalisador e impulsionador para as lutas das massas mexicanas. O PRD, não sendo um partido dos trabalhadores no sentido de defender os interesses de classe da classe trabalhadora, pode ser por enquanto uma força em volta da qual juntam-se grupos de trabalhadores em luta. Apesar de Obrador incluir nos 20 pontos a necessidade de democratizar o movimento sindical e apoiar a votação secreta – uma tarefa fundamental para os ativistas-trabalhadores, socialistas e revolucionários – ele não fez qualquer referência à democratização do PRD, à necessidade de um governo dos trabalhadores e dos camponeses pobres ou a necessidade de romper com o capitalismo.
As demandas radicais apresentadas por Obrador serão apoiadas por socialistas e revolucionários por todo o mundo. Porém, para garantir a implementação e a sustentabilidade destas reformas, o domínio dos barões e reacionários capitalistas sobre o povo mexicano, apoiados pelo imperialismo, deve ser derrotado e junto com ele o sistema capitalista. As comportas serão abertas no México e nesta luta milhões estarão lado a lado buscando uma vida melhor, uma sociedade mais justa e igual e um fim para a espoliação carnívora realizada pela pequena elite. Ao longo deste movimento, socialistas revolucionários explicarão e apontarão as tarefas fundamentais que o movimento de massas deve realizar, incluindo a criação de um partido de massas dos trabalhadores, com representantes democraticamente eleitos recebendo o salário de trabalhadores e sujeitos a revogação. Os sindicatos devem ser reivindicados e reconstruídos. Um programa de socialismo democrático genuíno clama pelo controle e gestão dos trabalhadores e pela imediata implementação de um plano emergencial para reconstruir a sociedade.
Um povo pode ser sujeitado, explorado e abusado por um longo tempo. O povo trabalhador pode deixar que golpeie suas cabeças, e suportar um terrível sofrimento. Porém, que fiquem avisados os exploradores, assim que as massas buscarem mudanças, levantarem-se e lutarem por seus direitos, nenhum exército multimilionário poderá pará-los e nenhuma quantidade de repressão derrubará as massas. Hoje, no México, nós estamos assistindo os primeiros passos neste processo.