Morte de Pinochet: Só assassinos homenageiam assassinos
Hoje, domingo, 10 de dezembro, às 14:15 horas, morreu o maior assassino e ladrão que teve o Chile, o ex-ditador Augusto Pinochet.
Milhares de chilenos saíram às ruas para comemorar. Rapidamente se organizaram manifestações de alegria nas ruas do país. Em todos os bairros populares as pessoas saíram às ruas para expressar sua alegria. Em comunidades como La Bandera e La Victoria os moradores organizaram rapidamente carnavais de alegria.
No centro de Santiago, mais especificamente na Praça Itália que é um lugar tradicional de comemorações, juntaram-se centenas de pessoas para comemorar e em menos de duas horas já haviam milhares e se organizou uma enorme marcha pela Alameda até La Moneda (o palácio do Governo). Champanha, tambores, danças, tudo servia para comemorar. Lamentavelmente quando se chegou em frente do Palácio do Governo, os “carabineros” (equivalente a Polícia Militar) deu início a uma repressão violenta aos que estavam se manifestando na rua, o que não é raro, pois muitos dos torturadores e assassinos da ditadura saíram das tropas de “Carabineros”. A mentalidade e os métodos criminosos seguem vigentes entre os membros dessa polícia que não podem entender por que a maioria da população estava tão contente.
Por outro lado é especialmente lamentável que seja a Consertacão (coalização de governo) e a presidenta Michelle Bachelet os que deram a ordem de reprimir aos que legitimamente estavam se manifestando. Conforme divulgou a imprensa: “o governo quer evitar que se instale um ambiente de carnaval diante da morte do assassino”.
As pesquisas mostravam isso. Nesse mesmo dia a imprensa divulgou que 70% da população não concordava que se rendesse homenagem ao ex-ditador, ou seja, sete de cada dez chilenos se opunha a que se decretara luto oficial em decorrência da morte de Augusto Pinochet.
Esta foi a razão fundamental para que o governo não se atrevesse a decretar luto nacional, mais ainda quando viram que eram milhares os chilenos que estavam comemorando nas ruas minutos depois da divulgação da notícia nas rádios e canais de televisão.
Só assassinos homenageiam assassinos
A presidenta Michelle Bachelet autorizou o exército a render homenagem ao criminoso. Todos os quartéis do Exército estão autorizados a colocar a bandeira a meio pau em sinal de luto.
Por sua vez o governo igualmente prestará homenagem a Pinochet enviando aos funerais do ditador a Ministra da Defesa representando o Executivo. É lamentável e vergonhoso que depois de quase 17 anos de suposta democracia esse assassino não tenha sido punido por seus crimes. Todas as honras para o ex-ditador ficarão a cargo do Exército, o que não é de se estranhar, já que os integrantes do Exército são tão responsáveis como Pinochet por todos os horrores e violência vividos nos 17 anos de ditadura. O único que podemos dizer é: só assassinos homenageiam assassinos.
O Papel dos Tribunais de Justiça
O papel dos tribunais de justiça chilenos tem sido vergonhoso. Os processos abertos contra Pinochet foram uma farsa completa. Supondo que Pinochet fosse viver duzentos anos jamais seria condenado. Isso apesar de existirem numerosas e contundentes provas dos crimes e roubos que ele cometeu em nosso país. Os juízes chilenos fizeram parte da ditadura e nunca tiveram a menor intenção de fazer justiça. Todos sabem dessa postura e apesar disso a Concertação fez parte da farsa que se montou quando Pinochet estava preso em Londres. Nessa ocasião disseram que os tribunais chilenos fariam justiça. Por isso é absolutamente correto o que expressou o vice-presidente da Venezuela, José Vicente Rangel: “a morte sela a impunidade de Pinochet”. Essa morte era esperada pelo governo e pela oposição como forma de selar a impunidade do ditador e lavando as mãos como Pilatos. Foi nossa intenção, mas morreu antes de ser condenado, típico da atitude moral dos governos da Concertação que sempre garantiram a impunidade de Pinochet.
O cinismo dos Estados Unidos
A frase para o bronze veio dos Estados Unidos: “A ditadura de Augusto Pinochet representou um dos períodos mais difíceis na história do país. Nossos pensamentos estão hoje com as vítimas de seu regime e suas famílias…” (Tony Fratto, porta-voz da Casabranca). A única coisa que se pode dizer é que o cinismo não conhece limite, dado que os Estados Unidos foi o principal financiador e impulsor da ditadura e Pinochet sempre atuou sob suas ordens, como ficou demonstrado em centenas de documentos, já revelados, da própria CIA. A CIA financiou os principais jornais do país, como “El Mercúrio”. Também financiou grupos terroristas de direita e partidos políticos como a Democracia Cristã. Os antecedentes existentes sobre essa intervenção seriam matéria prima para vários livros.
Pinochet e o suposto bem estar econômico do Chile
A direita, os empresários e setores da Concertação tentam compensar as atrocidades da ditadura com um suposto bem estar econômico e chegam a dizer coisas do tipo: Pinochet é o pai do Chile moderno. De que país estarão falando?
Esta é a pior de todas as farsas e a mentira melhor vendida. Não só no Chile como a nível internacional. A realidade é outra. A maioria dos chilenos vivem em condição de pobreza. Um de cada cinco chilenos vive em condição de extrema pobreza (20% da população). Outros 40% da população pertencem a classe baixa (grupo D) que também vive em condição de pobreza, ou seja, a maioria da população vive em condições bastante miseráveis.
Oitenta por cento dos trabalhadores chilenos estão empregados em pequenas e médias empresas (Pymes). Estes trabalhadores são submetidos a uma constante instabilidade no emprego, baixos salários e péssimas condições de vida. 60% dos trabalhadores ganha em torno de 300 dólares por mês. Por outro lado dizem que a renda per cápita é de 8 mil dólares. Esta última cifra é a que se vende no exterior, essa de que nós chilenos recebemos em média 8 mil dólares mensais.
A crise social e a pobreza provocada pela ditadura pode ser vista em todos os âmbitos importantes para o desenvolvimento da sociedade. Hoje temos um sistema educacional imposto pela ditadura que está imerso em uma grave crise contra a qual estão se mobilizando os estudantes secundários. É uma luta que será retomada com mais força no próximo ano. Algo similar ocorre com a catástrofe que temos no atendimento à saúde e a crise aberta com o sistema de previdência (AFP’s) que condenará milhares de trabalhadores em idade de aposentadoria a pensões miseráveis, que fatalmente será bancado pelo Estado já que o sistema privado é incapaz de financiar-se por conta própria.
Sendo otimista, o bem estar econômico de que tanto falam chega aos 20% mais ricos da população por que o resto dos chilenos vive em condições econômicas bastante difíceis. Então, de que país falam? Obviamente não estão falando do país dos trabalhadores, dos que moram na periferia e sim dos ricos, dos empresários, das Forças Armadas, dos burocratas que estão no governo e no parlamento. Eles são os únicos que se beneficiaram com o sistema econômico instaurado a sangue e fogo pela ditadura.
Esta é a razão fundamental de que milhares de trabalhadores, mulheres, jovens e moradores da periferia estão hoje celebrando a morte do tirano. Esta celebração não foi impedida nem pelo enorme respeito que se tem pelos mortos em nosso país. Apesar disso, um setor majoritário da população sai as ruas para comemorar.
A consigna – “Nem esquecimento e nem perdão” – hoje é mais vigente do que nunca.
Tradução William Martani