Bélgica: 50º aniversário da catástrofe mineira de Marcinelle

Um acidente… Bem pouco acidental

No dia 8 de agosto de 1956, aconteceu a maior catástrofe mineira da Bélgica na mina do bosque de Cazier, em Marcinelle (próxima a Charleroi). Esta catástrofe causou 262 vítimas, de doze nacionalidades diferentes, a maioria de italianos.

A imprensa falou muito desta catástrofe devido ao seu qüinquagésimo aniversário, mas a grande maioria dos artigos e reportagens só relatou os fatos ou apresentou entrevistas “emocionantes” de testemunhas do drama sem propor a análise das causas deste acontecimento fatídico e sem designar os verdadeiros responsáveis: os patrões da indústria mineira.

Ainda que a catástrofe do bosque de Cazier tenha ficado marcada nas memórias pela sua amplitude e sua divulgação na mídia, ela está longe de ser somente um acidente mineiro ocorrido na Bélgica. Segundo os “Anais das Minas da Bélgica” a extração de carvão (na Bélgica) causou a morte por acidente de 20.895 trabalhadores entre 1850 e 1973. No bosque de Cazier, o acidente de 1956 não foi o primeiro: Guiseppe Di Biase, um mineiro que trabalhou lá durante sete anos, declarou no momento do processo que em 1952 já havia acontecido um outro acidente, em diversos pontos parecidos com o da catástrofe. Segundo Alain Forti e Christian Joosten autores de Cazier judiciaire, Marcinelle, chronique d’une catastrophe annoncée (Cazier judiciário, Marcinelle, crônica de uma catástrofe anunciada), “A verdadeira questão não consistia em saber se uma catástrofe poderia acontecer no bosque de Cazier, mas sim, quando ela ocorreria.” Efetivamente, todos os presságios do drama estavam reunidos: vagonetes mal conservados e sujeitos a freqüentes avarias, falta de comunicação entre o fundo e a superfície, negligência dos engenheiros – os quais toleravam a proximidade imediata de eletricidade, óleo e ar comprimido – como a falta de preparo dos trabalhadores, em particular daqueles que trabalhavam em postos-chave.

O drama de Marcinelle não aparece somente como um tipo de catástrofe natural, mas também como um fato que pertence de agora em diante ao passado e que não tem nenhuma ligação com o mundo atual.

Ora, segundo a FGTB, houve, somente no ano de 2004, 198.861 vitimas de acidentes de trabalho na Bélgica e a quantidade de acidentes mortais se elevou para 195, em que 24 vêm da catástrofe em Ghislenghien.

Esses números provam que, apesar da melhora nas condições de vida e de segurança nos locais de trabalho nos últimos 50 anos, os acidentes de trabalho continuam uma calamidade pública que ameaça um grande número de trabalhadores. E essa situação não tem previsão de melhorar com a acentuação da flexibilização (jornadas de 10 horas multiplicam os riscos ligados à fadiga e falta de concentração), a pressão da concorrência (a qual leva os patrões a diminuir suas despesas ligadas a seguridade) e a privatização dos serviços públicos (como o mostram os diversos acidentes mortais nas estradas de ferro da Grã-Bretanha desde a sua privatização). A luta por condições de trabalho dignas continua tão atual no século XXI como o era no XIX e no XX.

Traduzido por Angelina Corrêa

Artigo originalmente publicado no jornal “Alternative Socialiste” da seção belga do CIO de setembro de 2006, nº114. Uma versão maior e mais detalhada deste artigo está disponível no nosso site www.socialisme.be