Sri Lanka: “Vitória na Guerra” celebrada

A questão nacional continua sem solução

A guerra entre os Tigres de Libertação de Tâmil Eelam (LTTE) e as forças armadas do governo do Sri Lanka chegou a um fim. Ela se estendeu por 30 anos e se originou da questão nacional não resolvida em relação à minoria tâmil. As forças do governo foram capazes de derrotar os “Tigres”, matar seus principais líderes, incluindo Velupillai Prabhakaran, e capturar todo o território mantido pelo LTTE.

Houve celebrações organizadas no sul do país para marcar a vitória da guerra e também ocorre uma campanha para mostrar que não há mais problema nacional. Contudo, ela agora irá se tornar mais complexa no futuro próximo do que era há 60 anos. No discurso cerimonial feito pelo presidente no parlamento, declarando a vitória em 19 de maio, ele disse: “Não há mais nenhuma comunidade minoritária neste país. Há apenas duas comunidades: Uma que ama esse país e outra que não ama”. Mas o conflito nacional no Sri Lanka tem uma longa história: ele de modo algum será resolvido pela suposta vitória militar de Rajapaksa.
 

História da questão nacional no Sri Lanka

Após a independência do imperialismo britânico em 1948, o novo governo do Sri Lanka queria substituir a língua inglesa, que era a mais usada até então, pela língua cingalesa, que era a língua da maioria cingalesa. Ele prometeu dar um status comparável à língua tâmil, mas isso nunca se tornou uma realidade. Ao invés disso, ele atacou os direitos dos trabalhadores tâmeis das plantações e depois assinou um acordo com a Índia e repatriou dezenas de milhares de trabalhadores e suas famílias. Os líderes tâmeis no primeiro período tentaram agir em cooperação com a burguesia cingalesa. De fato, esses líderes tâmeis acreditavam que poderia resolver os problemas da comunidade tâmil através do diálogo com os líderes cingaleses. Mas essa crença gradualmente se desvaneceu. O papel decisivo para isso foi jogado por Soloman (SWRD) Bandaranaike em 1956.

Em 1952 Bandaranaike renunciou ao Partido Nacional Unido (UNP, todas siglas em inglês) que estava no poder naquela época e se moveu para uma posição nacionalista cingalesa para ganhar poder político. Para esse propósito ele construiu uma força nacionalista composta de monges budistas, médicos, professores, camponeses e trabalhadores– o Partido da Liberdade do Sri Lanka (SLFP). Ele garantia que a língua cingalesa se tornaria a língua oficial 24 horas depois que ele se tornasse primeiro-ministro. Apenas os líderes do Partido Lanka Sama Samaja (LSSP) e do Partido Comunista (PC) fizeram campanha e votaram contra a Lei Única Cingalesa no parlamento.

No debate parlamentar em 1956, Colvin R de Silva, um líder do Sama Samaja (socialista/ trotskista) da época, proferiu a famosa frase: “uma língua dois países, duas línguas um país”. Alguns no movimento de esquerda que anteriormente lutaram pelos direitos dos tâmeis depois se tornaram identificados com o comunalismo (que promove conflito baseado em etnia/religião) cingalês ao abraçar políticas de coalizão entre as classes. Quando o governo do UNP de Dudley Senanayaka aprovou a Lei da Cláusula Especial da Lingua Tâmil, supostamente para dar algumas concessões ao povo tâmil através do acordo Dudley-Chelva de 1965, os líderes de esquerda dos Partidos Sama Samaja e Comunista vergonhosamente realizaram manifestações junto com Sirima Bandaranaike do SLFP contra o governo, tomando uma posição comunalista.

Um monge budista, Dhambarawe Rathnasara, foi morto a tiros pela polícia em 8 de janeiro de 1968, em uma dessas manifestações anti-tâmeis. A coalizão do SLFP com o Partido Lanka Sama Samaja (LSSP) e o Partido Comunista chegaram ao poder em 1970 e uma das razões para essa vitória foi que se baseavam neste sentimento cingalês budista. Antes o LSSP tinha um apoio de massas entre uma ampla camada de trabalhadores cingaleses, tâmeis e muçulmanos e entre os trabalhadores das plantações das montanhas do interior. Tal era o apoio para as genuínas ideias socialistas que o LSSP e o PC freqüentemente vinham em segundo lugar nas eleições. Contudo, à medida que os líderes do LSSP começaram a buscar a via parlamentar, buscando concessões e negociando reformas, seu comprometimento coma luta revolucionária de massas declinava.

O final dos anos 1960 e começo dos 1970 marcou um ponto de inflexão na política do Sri Lanka por causa das traições dos líderes dos tradicionais partidos de esquerda ao se unirem no governo de coalizão capitalista e abandonarem a luta de classes. Isso pavimentou o caminho para movimentos pequeno-burgueses que começavam no sul e no norte na mesma época. Foi lançada uma rebelião no sul sob a direção da Frente de Libertação do Povo (JVP) e o movimento guerrilheiro liderado pelos Tigres de Libertação de Tâmil Eelam (LTTE) apareceu quase simultaneamente.

Os representantes do UNP e do SLFP da classe capitalista-latifundiária cingalesa governavam o país até então, mas agora mesmo os líderes de “esquerda” degeneraram no processo da política parlamentar burguesa. O governo de coalizão de 1970 com os chamados líderes de esquerda iniciou um processo de redação de uma nova constituição e os líderes tâmeis mais uma vez tentaram incorporar as aspirações nacionais do povo tâmil nesta nova constituição. O Conselho Constitucional rejeitou todas as demandas apresentadas pelos líderes tâmeis. O budismo, que é a religião da maioria cingalesa, foi tornada a religião oficial do estado sob essa constituição. Ela foi proclamada sob o mesmo Colvin R. de Silva, o proeminente líder do LSSP, então no governo. O povo tâmil, que foi primeiro marginalizado pela Lei Única Cingalesa do governo Bandaranaike em 1956, foi assim rejeitado completamente até mesmo pelos chamados lideres de esquerda no governo de Frente Popular de 1970. Na ausência de uma alternativa da classe trabalhadora que uniria todos os trabalhadores na luta por direitos iguais, os tâmeis oprimidos procuraram por outros meios para levar sua luta adiante. Os líderes tâmeis então se apressaram em preencher o vácuo.

Assim foi criado o pano de fundo para a formação da Frente Única Tâmil, abarcando todos os partidos políticos tâmeis. Com a Lei Única Cingalesa, após 1956 um número considerável de servidores públicos tâmeis foram expulsos do serviço público com base na afirmação de que eles não eram proficientes na língua cingalesa. A nova geração de jovens tâmeis foi assim impedida de entrar no serviço público. Todas as expectativas do povo tâmil de subir na escala social foram atropeladas por esse processo.

Exceto por uma fábrica de cimento em Kankasunthrai e uma fábrica química em Paranthen, nenhuma grande indústria foi estabelecida no norte pelos sucessivos governos cingaleses depois da independência. Mesmo essas duas indústrias só apareceram por causa da pressão dos tâmeis. O líder do Congresso Tâmil, GG Ponnambalam, foi forçado a tomar uma iniciativa. Ele foi o ministro das indústrias no governo do UNP de 1947 e representava Jaffna, a principal cidade no norte. Neste contexto, a única esperança do povo tâmil de ter uma vida decente era através da educação. Isso deu a eles um incentivo maior do que os cingaleses de conseguir uma educação inglesa.
 

A Juventude tomando a direção da luta tâmil

Os líderes tâmeis que eram parte da classe dominante manteve o controle do povo tâmil até os anos 1980. Ponnambalam Ramanathan nos anos 1920 e GG Ponnambalam (que iniciou a campanha ’50:50′ na época do domínio britânico nos anos 1940) representavam uma linha da classe capitalista aspirante. SJV Chelvanayagam, que fundou o Partido Federal em 1949, e A. Amirthalingam nos anos 1970 e começo dos 1980s, foram outra tendência entre os líderes tâmeis. O movimento da juventude tâmil que estava desafiando a liderança estabelecida apareceu contra esse pano de fundo. Os líderes burgueses tâmeis, que afirmavam seguir os métodos não-violentos de Mahatma Gandhi (líder da luta de libertação indiana), procuravam ter uma política de negociação para resolver as queixas do povo tâmil. Eles foram desafiados pelos emergentes líderes jovens tâmeis, entre eles um grupo chamado “Tigres Tâmeis”, no começo de 1972. Isso mudou o padrão político no norte.

Houve vários grupos jovens armados no norte até o final dos anos 1980. A Organização de Libertação de Tâmil Eelam (TELO), A Organização de Libertação do Povo de Tâmil Eelam (PLOTE), a Organização Revolucionária dos Estudantes de Eelam (EROS), a Frente de Libertação Revolucionária do Povo de Eelam (EPRLF) e os Tigres de Libertação de Tâmil Eelam (LTTE). A Índia ajudou a treinar todos esses grupos no período inicial à medida que defendiam um estado Eelam separado e nada mais. Isso mostra a intensidade que as aspirações nacionais do povo tâmil tinha alcançado naquele período. O LTTE alcançou a proeminência parcialmente por seus ataques a alvos militares e parcialmente pela aniquilação física dos outros grupos. Apesar disso, o LTTE conseguiu ganhar o apoio dos jovens e estudantes tâmeis à medida que seu descontentamento com o governo do Sri Lanka continuava a aumentar.

JR Jayawardana, líder do UNP quando ele chegou ao poder em 1977, tomou medidas para abolir a ‘estandardização’ como parte da implementação das políticas neoliberais. A estandardização foi introduzida pelo governo anterior de Sirima Bandaranaike (Sob essa política, os estudantes tâmeis do nível médio eram discriminados a favor dos estudantes cingaleses de nível médio quando entravam na universidade).

Nessa época os líderes cingaleses começaram a reconhecer o direito dos tâmeis a usar sua própria língua e a agir para aliviar as injustiças infligidas a eles, quando a luta nacional do povo tâmil se elevou para uma etapa onde exigiam justiça igual. Eles não se contentariam em aceitar tais pequenos gestos. Está muito claro que o povo tâmil tinha mais do que suficientes razões para perder toda a confiança nos líderes capitalistas cingaleses quando se olha essa curta história.

O “julho negro” em 1983 – a carnificina feita contra os tâmeis pelos piores elementos do regime Jayawardena – foi o ponto de inflexão na luta nacional tâmil. Centenas de inocentes tâmeis que viviam em Colombo e outras cidades do sul foram mortos nas ruas e queimados vivos em suas casas. Todas as suas propriedades foram saqueadas e destruídas pelos gângsteres chauvinistas cingaleses. A polícia e o exército do Sri Lanka não interferiram para deter qualquer uma dessas atividades. Mas houve alguns cingaleses que heroicamente esconderam tâmeis em suas casas para protegê-los do pogrom.

Até então alguns jovens tâmeis embarcavam na luta armada baseada no método do terrorismo individual e argumentaram pela guerra nacional e internacionalmente. Desde então se seguiu uma sangrenta guerra, que tomou mais de 100.000 vidas.
 

Solução militar da Questão Nacional

A guerra com o LTTE se arrastou por quase 30 anos. Embora incapaz de conseguir uma vitória decisiva contra o estado do Sri Lanka e criar o Eelam, não obstante, até o fim do milênio, o LTTE estabelece um controle quase completo no norte e em partes do leste. Ele não tinha apenas seu próprio exército, marinha e até uma força aérea de pequena escala, tinha seus próprios tribunais, sistema de impostos, postos de fronteira e agia como um estado dentro do estado. Contudo, o fracasso do LTTE de envolver as massas de uma maneira democrática significava que divisões inevitavelmente apareciam nesta organização.

A defecção para o lado do governo, em 2004, do comandante Tigre do leste, Karuna, com milhares de quadros, desferiu um golpe mortal no LTTE. Isso, combinado com o apoio massivo de potências regionais como China, Índia e Paquistão, fez com que Rajapaksa fosse capaz de conduzir uma grande ofensiva de 2006 em diante. Finalmente, o exército do Sri Lanka foi capaz de capturar todo o território anteriormente controlado pelos Tigres Tâmeis e matar todos os seus líderes, incluindo Prabhakaran.

Mas ninguém pode dizer que a luta, que surgiu das injustiças infligidas a uma comunidade por décadas, agora acabou por causa da derrota militar dos Tigres Tâmeis.

Os líderes do governo do Sri Lanka têm se vangloriado repetidamente que eles foram capazes de trazer o país, até aqui dividido, sob uma única bandeira nacional. Na realidade, é absurdo dizer isso, pois centenas de milhares de tâmeis estão aprisionados em campos ao ar aberto no norte e as áreas capturadas estão desertas, sem qualquer população.

Nenhuma solução real ode ser conquistada sem o apoio dos cingaleses, tâmeis, muçulmanos e outras minorias do país. Mas Rajapaksa quer criar um país unitário, apenas em seus próprios termos, sem organizar quaisquer medidas democráticas de consulta aos trabalhadores e pobres comuns. Os motivos sinistros do governo Rajapaksa podem ser entendidos a partir do destino do Comitê Representativo de Todos os Partidos (APRC), que foi nomeado por Rajapaksa logo depois de sua eleição, com o propósito de achar uma solução política. Rajapaksa dizia repetidamente que ele apresentaria uma solução/proposta em poucas semanas.

O presidente do APRC, Tissa Witharana, que é ministro do gabinete e líder do LSSP, declarou há mais de um ano que o APRC finalizou mais de 90% de suas propostas. O governo, enquanto alardeia o final da guerra, mantém silêncio sobre qualquer solução a ser apresentada pelo APRC. Parece uma farsa que o APRC tenha agora sido enterrado sem se dar nenhuma notícia.

Não há maneira deste governo lidar com a questão nacional sem apresentar pelo menos um esboço de propostas para o povo tâmil, especialmente contra o pano de fundo de sua declarada afirmação de ter destruído os Tigres rebeldes. Através disso, o governo pode ter ganho alguns tâmeis para seu lado. Mas a realidade é que a administração Rajapaksa é totalmente dependente dos comunalistas cingaleses extremistas para sua sobrevivência. Portanto, seria uma tarefa hercúlea conseguir um consenso entre as partes constituintes do partido dominante para qualquer tipo de proposta que desse conta dos desejos das minorias.

O presidente Rajapaksa declarou em janeiro de 2007 que ele está preparado para implementar totalmente a 13ª Emenda à constituição (Essa emenda foi introduzida pelo Pacto Rajiv-J.R., também conhecido como o Acordo Indo-Lanka, de 1987, assinado entre os líderes da Índia e do Sri Lanka. Ela propunha o estabelecimento de conselhos provinciais e a eleição de ministros-chefes em cada província. Sob essa constituição as províncias do Norte e Leste seriam fundidas em uma só província. Mesmo que o ministro-chefe fosse eleito, na realidade ele não teria qualquer poder. As províncias ficariam sob o controle da presidência executiva em Colombo que aponta os governadores). Rajapaksa agora colocou um fim completo neste tipo de coisa. Mesmo os aliados mais próximos de Rajapaksa estão em uma campanha para não se implementar a 13ª Emenda.

Deve ser notado que o LSSP e o PC saudaram esse Pacto Indo-Lanka com braços abertos. Mesmo o suposto Partido revolucionário Nava Sama Samaja, que rompeu com a política de coalizão do LSSP, apoiou esse pacto entre os dois partidos capitalistas e saudaram a Força de Manutenção de Paz indiana que entrou no norte e leste para implementá-lo. Isso, como a minoria no NSSP (que ficou com o CIT) alertou, terminou indo contra as aspirações tâmeis e preparou o caminho para as forças armadas indianas serem usadas contra a população tâmil no norte. O agrupamento do CIT, com uma clara compreensão marxista das questões e forças envolvidas, foi o único a se opor à entrada dessas forças no país.

Muçulmanos e a guerra

Líderes muçulmanos pró-governo esforçam-se em mostrar que não há ligação direta entre os muçulmanos de língua tâmil e a guerra no norte. Eles estão tentando mostrar que houve uma retomada da vida normal no leste depois que o território foi recapturado dos Tigres Tâmeis. Uma das principais demandas do LTTE era a aceitação do Norte e Leste como uma pátria tâmil. Não obstante, a experiência da formação do conselho provincial oriental em 2008 mostra a atitude do governo Rajapaksa de minar os sentimentos nacionais e religiosos dos muçulmanos no leste. Ele violou abertamente a promessa dado a Hisbullah (o líder muçulmano da Aliança do Povo, governante, que disputou no leste) de que ele seria nomeado como ministro-chefe no caso de seu partido governante ganhar as eleições na província oriental.

Os líderes burgueses cingaleses sempre usam o povo tâmil e muçulmano como peões em seus jogos políticos e isso fica evidente em sua experiência no leste e na situação do norte. O papel oportunista dos “líderes” Thondeman dos Hill Country Tamils, de Douglas Devananda e de Karuna (antigo líder LTTE no leste) é uma clara indicação disso. No início da luta armada tâmil, a maioria dos muçulmanos no leste era receptiva a ela e isso era visto como um desafio dos oprimidos para com o opressor. Mas a expulsão dos muçulmanos das províncias do norte e leste pelo LTTE em 1990 alienou a população muçulmana. Já no fim da guerra, a vasta maioria dos muçulmanos se opunha ao LTTE e sua luta e toleraram o chauvinista governo de Rajapaksa no sul principalmente por causa dos erros e equívocos do LTTE.

Agora, os líderes e o povo muçulmano estão alegando que o Rajapaksa está no processo de estabelecer colônias cingalesas em áreas muçulmanas tradicionais. Ao mesmo tempo os muçulmanos também estão sofrendo já que o governo falhou em impedir a deterioração da lei e da ordem. Igualmente importante é a acusação de que tem sido emitidos regulamentos para limitar a liberdade dos mulçumanos de observar e praticar sua religião. Desta maneira, as tradições e sentimentos do povo muçulmano está sendo desafiado pela hegemonia cingalesa-budista. Embora o ministro da educação tenha permitido às mulheres estudantes muçulmanas usar o véu junto com suas roupas tradicionais na escola, há relatos de que em algumas delas em Colombo as autoridades escolares tentam impedir, ou pelo menos desencorajar, esse direito. Quando os diretores não são sensíveis às suas demandas, os pais começaram organizar campanhas agitativas. Os comunalistas cingaleses começaram uma violenta campanha contra essa justa demanda dos pais muçulmanos.

Isso mostra o desejo de hegemonia desses elementos comunalistas-nacionalistas, que não permitem a qualquer grupo étnico ir além dos limites impostos por eles. Seu ódio chauvinista, que vai além até mesmo das leis básicas do país, devem ser derrotado na primeira oportunidade. De outro modo não podemos descartar a possibilidade do povo muçulmano ser levado a tomar uma posição religiosa reacionária contra esses chauvinistas comunalistas.

Marxismo e o LTTE

Com a derrota militar dos Tigres Tâmeis, a discussão sobre a questão nacional tâmil irá alcançar novas dimensões. Nós como marxistas repetidamente questionamos os métodos do LTTE. Nossa crítica era que a luta armada, sem engajar as massas, nunca iria trazer qualquer libertação do povo tâmil. Contudo, os marxistas apoiaram e defenderam o direito dos tâmeis de lutar contra a opressão desencadeada sobre o povo tâmil pelo estado cingalês.

Apesar de uma inclinação anterior pelas ideias do socialismo, os Tigres não tinham qualquer confiança em um despertar ou numa luta das massas oprimidas. Eles empreenderam uma campanha para eliminar fisicamente todas as pessoas e organizações que não subscreviam sua ideologia. Por isso nada restou ao povo tâmil a não ser apoiar o LTTE como a única organização que lhe traria a libertação. O LTTE, embora levasse a luta nacional tâmil a um nível que atrairia atenção internacional, não permitiam que qualquer outra liderança emergisse da comunidade tâmil no norte e no leste.

Eles conseguiram reunir um apoio financeiro e político considerável do estrangeiro, especialmente da enorme diáspora tâmil. Por causa da abordagem autoritária da direção dos Tigres sob Prabhakaran, eles não aproveitaram diversas importantes oportunidades que atravessaram seu caminho para implementar suas demandas.

Durante o período de vigência do acordo de cessar-fogo, de 2002 a 2004, o LTTE teve amplas oportunidades de permitir uma discussão e debates democráticos dentro da comunidade tâmil e se tornar seus líderes com sua aprovação. Mas os Tigres se opuseram totalmente a tal curso de ação e não permitiram qualquer prática democrática dentro de seu território. Ao mesmo tempo houve amplas oportunidades para eles começarem um diálogo com líderes da classe trabalhadora do sul que eram defensores dos direitos do povo tâmil. Os Tigres nem tentaram organizar tal coisa nem pareciam estar preocupados se organizações ou trabalhadores marxistas no sul estavam apoiando o direito à autodeterminação. Eles até mesmo atacaram e mataram socialistas tâmeis.

Ao mesmo tempo, a resposta do LTTE às atrocidades das forças do governo no norte foi realizar ataques militares e algumas vezes matar e aterrorizar cingaleses inocentes no sul. Eles efetivamente fecharam qualquer oportunidade de o povo cingalês levantar sua voz em apoio a luta tâmil. O LTTE criou essa atmosfera por causa de sua rejeição da luta das massas oprimidas no sul para derrubar o capitalismo e construir uma sociedade socialista.

Tornou-se uma tarefa muito difícil lutar pelo direito do povo tâmil à autodeterminação na sociedade cingalesa do sul por causa dessa situação. Mesmo sob condições muito difíceis, o movimento marxista no sul lutou pelo direito de autodeterminação do povo tâmil. O que o LTTE queria mostrar ao mundo era que não havia um único cingalês que apoiasse a luta nacional tâmil.

A luta do povo tâmil por sua liberdade e libertação se desenvolveria, em um país de terceiro mundo como o nosso, unindo-se com a luta da classe trabalhadora e das massas pobres oprimidas – cingalesas, tâmeis e muçulmanas – para derrubar essa sistema capitalista parasita.
 

Verdade impalatável para a maioria

O período pós-independência mostra perfeitamente a natureza sinistra, fraudulenta e enganadora da classe capitalista cingalesa sobre a questão nacional tâmil. É devido principalmente à natureza fraca e parasitária do capitalismo no Sri Lanka, assim como em muitos outros países subdesenvolvidos. Tanto o UNP quanto o SLFP (no momento juntos na Aliança da Liberdade do Povo) sempre tiveram seus olhos sobre os votos da maioria cingalesa budista para chegar ao poder e não tinham qualquer outro objetivo. Portanto estava muito claro que eles não iriam e não poderiam fornecer qualquer solução para os problemas dos tâmeis e muçulmanos.

Há várias pessoas “liberais” dando conselhos gratuitos ao governo sobre uma solução numa era pós-LTTE. Essas camadas expressam suas opiniões supondo que o governo Rajapaksa seja capaz de resolver esses problemas. A verdadeira natureza daqueles supostos radicais que usam uma roupagem de liberalismo ou não-violência apareceu apenas depois da chamada vitoria militar de Rajapaksa.

Aqui temos que entender que o que se desenvolveu ao nível de uma guerra horrenda foi a luta nacional do povo tâmil que foi embebida em seu próprio sangue. Ela não pode ser rejeitada levianamente como mero terrorismo. É difícil dizer neste momento como a luta de libertação tâmil se desenvolverá ou que forma tomará no próximo período.

Contudo, a realidade é muito clara para os trabalhadores e jovens. Um número sem precedentes de tâmeis por todo o mundo congregaram-se em torno da luta de libertação nacional do povo tâmil no Sri Lanka. Isso aponta para uma internacionalização desta luta, incluindo em Tâmil Nadu na India, ao invés de um fim da guerra, como afirma o governo. Ironicamente, até Jayalalitha Jeyaram, o líder de oposição em Tâmil Nadu, que é ferrenhamente anti-LTTE, declarou que não há outra solução para os problemas dos tâmeis Sri Lanka do que o Eelam – um país separado.

Finalmente, está muito claro que a questão nacional tâmil no Sri Lanka não pode ser resolvida dentro dos limites do capitalismo. O controle democrático dos recursos para benefício de todos, independentemente da etnia, religião, sexo e casta, é a única saída para os pobres e trabalhadores do Sri Lanka. Para conseguir isso, uma luta contra o capitalismo é crucial. O capitalismo sempre joga um papel divisionista para intensificar a exploração das massas trabalhadoras.

Foi confirmado, tal como defendido pelos marxistas, que a libertação nacional não pode ser ganha através do método do terrorismo individual isolado. A libertação do povo tâmil só poderá ser conquistada através da fusão da luta dos trabalhadores e as massas oprimidas no sul para derrubar o sistema capitalista e resolver os problemas dos tâmeis e muçulmanos.

O conflito armado no norte e no leste, que durou quase 30 anos, tirando incontáveis e preciosas vidas, finalmente nos ensinou uma amarga lição. É uma importante lição não apenas para os tâmeis no norte, mas também para os cingaleses no sul.

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