Socialistas e o Estado: como acabar com o racismo policial

O papel da polícia e como mudanças reais podem ser conquistadas

A natureza do policiamento nos Estados Unidos é inseparável da história violenta e racista do capitalismo neste país. De patrulhas para controlar escravos; aos cães soltos de Bull Connor e jatos de água contra manifestantes negros em Montgomery durante o movimento dos Direitos Civis; aos linchamentos da polícia nas comunidades negras hoje; existe um fio de continuidade.

A repressão policial e estatal também foi desencadeada historicamente contra trabalhadores que tentavam se sindicalizar, organizadores radicais e qualquer luta séria que ameaçasse os interesses da classe dominante. Em 1932, o presidente Hoover enviou a infantaria e tanques para esmagar o acampamento de veteranos brancos e negros em Washington, exigindo seus prometidos abonos da Primeira Guerra Mundial. Em 30 de maio de 1937 (o link inclui imagens de vídeo), a polícia de Chicago atirou em 40 trabalhadores siderúrgicos desarmados do lado de fora dos portões da Republic Steel, matando dez. Em 2006, a ICE (autoridade de Imigração e Alfandega dos EUA) realizou batidas em massa no estilo Gestapo à fábricas de carne no Centro-Oeste, seguidos por deportações em massa de trabalhadores imigrantes, com o objetivo de esmagar o movimento em massa dos direitos dos imigrantes que os trabalhadores estavam organizando.

O papel da polícia

Como Friedrich Engels explicou há mais de cem anos, o surgimento do aparato repressivo do Estado, incluindo exércitos, polícias, prisões e etc., reflete-se historicamente na divisão da sociedade em classes sociais com interesses antagônicos. O estado consiste, nas palavras de Engels, em “corpos de homens armados”, que mantém o antagonismo de classe “dentro dos limites da ordem”, mas no final das contas defende os interesses da classe dominante – que, em nossa sociedade, são os capitalistas bilionários. Uma parte inevitável para manter a riqueza e o domínio da classe dominante em uma sociedade tão desigual quanto a nossa é a repressão e a ameaça de violência.

Da escravidão a Jim Crow ao racismo e segregação institucionalizados de hoje, a manutenção da divisão racial tem sido à base do domínio capitalista nos EUA. Para formar sindicatos poderosos como os United Auto Workers nos anos 30 e 40, os organizadores radicais dos sindicatos tiveram que recuar contra o racismo venenoso, promovido por chefes como Ford para manter seu controle. Sem assumir uma posição clara antirracista, eles não teriam conseguido convencer os trabalhadores brancos e negros a lutarem juntos e obterem vitórias históricas que beneficiaram toda a classe trabalhadora. Esse movimento foi tão poderoso que poderia ter sido o começo do desafio do próprio regime capitalista.

O policiamento agressivo nos bairros pobres de negros e latinos de hoje visa manter as pessoas literalmente confinadas em casas e escolas segregadas e precárias. Mas os políticos racistas também procuraram apresentar as pessoas pobres de cor como uma ameaça para as comunidades brancas da classe trabalhadora e da classe média para obter apoio mais amplo a essas políticas repressivas.

Não é possível criar um policiamento completamente “não-racista”, enquanto o racismo e a segregação institucional permanecerem intactos. A polícia também não pode ser “abolida” dentro da estrutura de uma sociedade capitalista. Enquanto os capitalistas governarem, eles precisarão e encontrarão uma maneira de proteger seus interesses e sua propriedade. Mas isso não significa que não podemos fazer nada além antes de nos livrarmos do próprio capitalismo.

Mudança real

As mudanças conquistadas na primeira fase do movimento Black LivesMatter, incluindo mais treinamento e câmeras corporais, provaram ser completamente insuficientes. No entanto, o policiamento pode ser alterado significativamente e o encarceramento em massa pode ser interrompido. Contudo, esses ganhos só́ podem ser conquistados por um movimento de massa do tipo que explodiu após o terrível assassinato de George Floyd. Para obter ganhos reais e duradouros, o movimento precisa ser sustentado, recusar-se a ser cooptado, centrar-se na mobilização do poder social dos trabalhadores e articular um programa social mais amplo.

O movimento atual demonstrou que a maioria da população rejeita o racismo odioso e reacionário que é galopante na força policial. Essa rejeição ao racismo é extremamente positiva. O que também foi exposto é a enorme rede de proteção em torno da polícia. Eles receberam virtualmente uma imunidade legal para quase qualquer crime. Eles são uma casta que não está sob nenhum controle democrático. Enviados pela classe dominante em uma missão para manter a população, especialmente a comunidade negra “alinhadas”, agora é difícil até para o establishment os controlar.

O movimento de massas expôs divisões reais no establishment político sobre como lidar com o policiamento. A posição de Trump e os elementos mais reacionários para aumentar massivamente a repressão foi isolada. Outra ala do establishment, representada pelos prefeitos Durkan em Seattle e de Blasio em Nova York, procura manter o status quo, mas bate em retirada no momento sob a pressão do movimento. Uma terceira ala procura cooptar o movimento adotando seu apelo para cortar o financiamento da polícia para depois enfraquecê-la. Em Minneapolis, a maioria da câmara municipal chegou ao ponto de comprometer-se a “dissolver” o departamento policial. Mas quase imediatamente eles começaram a se afastar dessa posição, dizendo que estão abrindo um período de um ano para procurar acordos alternativos de policiamento. Este é um exercício de perda de tempo. Precisamos de mudança agora!

Precisamos tornar a demanda por cortes de financiamento mais concreta. A vereadora socialista de Seattle, Kshama Sawant, lançou a demanda de um corte de 50% do orçamento da polícia e está liderando a luta pelo Imposto à Amazon em Seattle para financiar moradia social barata, serviços sociais e empregos. Devemos exigir uma vez por toda que a política policial, incluindo a contratação e demissão de policiais, fique sob o controle de conselhos civis eleitos democraticamente. Deve haver um expurgo imediato de todos os policiais com registros de racismo e uso de força excessiva na comunidade. Como em muitos outros países, a polícia não deve estar armada quando em patrulha. Uma força policial que é colocada sob controle democrático, até certo ponto, diminuiria especialmente a opressão da classe trabalhadora negra, mas, na verdade, beneficiaria a classe trabalhadora como um todo.

Divisões entre a polícia

Também devemos reconhecer que a polícia não é uma massa homogênea. A ala reacionária é muito forte e domina a maioria das forças policiais locais em todo o país. Mas, embora tenha havido atos performáticos de policiais que, depois de se “ajoelhar”, depois atacaram violentamente manifestantes, também houve sinais de genuína simpatia de alguns policiais comuns. Uma carta recente de 14 policiais em Minneapolis alega falar em nome de centenas de outros policiais ao denunciar Derek Chauvin e apoiar uma reforma. Este é um passo limitado e positivo, mas teria sido completamente inconcebível sem a pressão do movimento de massas.

Se existem policiais comuns que realmente querem reforma e um relacionamento diferente com as comunidades em que trabalham, agora é a hora de se levantarem e trabalharem para afastar figuras como Bob Kroll – o chefe de extrema-direita do sindicato de policiais em Minneapolis que adora Trump. Acreditamos no direito da polícia de formar sindicatos para que eles tenham uma maneira de resistir sem serem usados pela classe dominante contra os trabalhadores. Mas esse claramente não é o papel que esses sindicatos estão desempenhando hoje.

A verdade é que as forças policiais de muitas cidades usaram sua participação no movimento de trabalhadores mais amplo para se proteger. O movimento dos trabalhadores não pode ficar em silêncio. Deve defender a classe trabalhadora negra e as comunidades de imigrantes abusadas pela polícia. Ele deve exigir que os sindicatos rejeitem as políticas racistas de policiamento e concordar em apoiar um expurgo da polícia para remover aqueles com histórico de violência e racismo, como precondição para permanecer ou ingressar nas coordenações e federações sindicais.

Uma sociedade segura e justa

Para viver em uma sociedade onde as pessoas não precisem temer a repressão estatal e a subjugação racista, temos que nos livrar do capitalismo. Como apontamos em um artigo recente sobre a rebelião em Minneapolis:

“Uma tarefa central de um governo dos trabalhadores, onde empresas-chave são tornadas em propriedade pública e as pessoas da classe trabalhadora têm controle democrático da economia, é combater o legado racista da escravidão, o imperialismo e a desigualdade de todas as formas, e criar as condições para uma sociedade verdadeiramente livre de policiamento racista, exploração e opressão. Isso incluirá́ comunidades da classe trabalhadora organizando sua própria segurança e proteção.”

“O processo de desmantelamento da polícia, das prisões e da repressão estatal, geralmente estão entrelaçados com o processo de acabar com o e ir além do capitalismo e estabelecer uma sociedade socialista verdadeiramente igualitária e sem classes. Isso nãos erá́ feito pela câmara municipal de Minneapolis, mas através da organização consciente do povo da classe trabalhadora em um movimento revolucionário.”

Alternativa Socialista defende

  • Demissão e processo imediato a todos os policiais que cometeram ataques violentos ou racistas.
  • Remoção da guarda nacional de Minneapolis e de outros lugares e o fim do toque de recolher nas cidades. Eles não conseguiram nada pela justiça racial e, em vez disso, foram usadospara atacar protestos, aterrorizar comunidades da classe trabalhadora, ferir jornalistas que cobriam protestos não violentos e proteger bancos e delegacias de polícia.
  • Desmilitarização da polícia. Proibir o uso policial de gás lacrimogêneo, balas de borracha, estrangulamentos e equipamento militar. Desarmar policiais em patrulha.
  • Policiamento sob o controle de conselhos civis eleitos democraticamente. Eles devem ter poderes reais, incluindo poder sobre as políticas de contratação e demissão, revisão das prioridades orçamentárias e poder de intimação. Tudo isso deve ser feito de forma aberta e pública.
  • Corte massivo do financiamento da polícia e uso desses fundos em escolas e moradias populares. Taxação massiva dos ricos para investir em empregos sustentáveis, programas sociais, educação pública e moradia social de baixo custo.
  • Os sindicatos policiais que são dominados por reacionários que defendem a polícia abusiva não devem receber cobertura do movimento sindical. O movimento de trabalhadores precisa estar decisivamente do lado dos manifestantes e contra o racismo e a violência policial. Ele deve exigir que os sindicatos rejeitem as políticas racistas de policiamento e concordem em apoiar um expurgo da polícia para permanecer ou ingressar nas coordenações e federações sindicais.
  • Representação política: Ambos os principais partidos políticos demonstraram sua lealdade ao sistema racista e opressivo do capitalismo. Prefeitos e vereadores democratas fizeram pouco para deter os policiais assassinos. Não devemos confiar que um dos grandes partidos possa nos representar. Precisamos construir um novo partido político multirracial da classe trabalhadora, independente dos grandes negócios, a partir de nossas lutas.

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