O dezembro grego – levante da juventude

Nikos Anastasiadis é da direção nacional do SYRISA (Coali­zão da Esquerda Radical), novo partido que reúne boa parte da esquerda socialista grega e que esteve presente participando e apoiando os levantes da juventude em dezembro de 2008. Nikos faz parte do Xekinima, seção grega do CIO, e esteve no Brasil para a II Escola Latino-Americana do CIO e também participou de debates em várias universidades, esteve presente no Ato dos demitidos da EMBRAER,na ocupação do Jardim Pantanal, etc.

Como se iniciaram as mobilizações que assistimos em dezembro de 2008?

O movimento, a revolta da juventude grega, se iniciou em 6 de dezembro quando um policial atirou e matou um garoto de 15 anos sem razão alguma. Isso provocou uma enorme raiva na sociedade contra a polícia e contra o governo que a educou durante os últimos anos. No entanto, isso foi o estopim para que as pessoas saíssem às ruas para protestar contra a corrupção, a situação econômica, o nível de vida e o desemprego. Cerca de 22% da população vive abaixo da linha da pobreza na Grécia.

Esse grande movimento envolvia manifestações diárias, ocupações de universidades, escolas e prédios públicos. E envolveu milhares de pessoas que exigiam a queda do governo da Nova Democracia.

Esse governo de direita nos últimos 5 anos propôs políticas que atacavam diretamente os trabalhadores. Tentaram implementar uma reforma educacional que gerou um movimento de massas em oposição. Tentaram também fazer uma reforma da previdência, aumentando a idade de aposentadoria e rebaixando seu valor. Deixaram que grande parte das nossas florestas fossem queimadas pois não deram dinheiro para as brigadas de incêndio. E também se viram envolvidos em vários escândalos de corrupção.

A imagem que recebemos pela mídia aqui foi de um movimento basicamente de juventude, foi isso?

A grande parte do movimento era de jovens, de estudantes secundaristas e universitários. Mas eles não estavam sozinhos, eles tiveram o apoio e a participação de professores, e tiveram o apoio de trabalhadores que lutaram contra o governo no período anterior. No início era comum ver a população agir para impedir as prisões dos estudantes, ou fazendo cercos para proteger os estudantes dos policiais.

A população em geral compreendia a raiva dos jovens contra a polícia. Garotos de 14 anos jogando pedras em delegacias e viaturas policiais. O problema foi quando alguns provocadores orientados pela polícia a praticar atos contra pequenas lojas e carros particulares, assim como anarquistas com uma violência generalizada, entraram em cena. Isso gerou receio nas pessoas de participar das manifestações. Essa violência indiscriminada mostrou que nesse sentido não há como o movimento avançar, a direção anarquista só levou ao fortalecimento do argumento do governo para reprimir o movimento.

Que o protesto contra o governo e a polícia repressora inevitavelmente inclui certa violência, essa não é a questão. A questão é que nossa força está nas manifestações de massas, e para isso, devemos evitar ações que afastem os trabalhadores das manifestações.

A principal reivindicação era de derrubada do governo, por que o governo não caiu?

Como disse, as ações anarquistas atrapalharam a massificação das manifestações. Também houve outro fator. Se a direção do movimento sindical tivesse aproveitado o momento para se juntar às manifestações, seria possível derrubar o governo. Havia uma greve geral marcada 14 de dezembro, mas os sindicatos não organizaram essa greve e cancelaram as manifestações alegando receio de que houvesse levantes. A direção do movimento sindical é do PASOK, partido social-democrata, que se diz oposição ao governo. Porém o PASOK se aliou ao governo ao não exigir sua queda, pois não queria chegar ao poder num momento de grande instabilidade política, e ter que responder às exigências da juventude e dos trabalhadores. Por isso, eles esvaziaram a participação dos sindicatos nas manifestações.

Era necessária uma alternativa política para o movimento, a unidade com os trabalhadores, e a generalização das ocupações nas escolas e universidades.

De fato, o SYRIZA foi o único partido de expressão que apoiou as manifestações e chamou pela queda do governo. No entanto, é um partido frágil ainda, em processo de construção e definição de uma linha política mais clara. Por isso, nós, do Xekinima estamos construindo o SYRIZA e buscando que o partido tenha uma linha clara, conseqüente e revolucionária.

No período recente, várias mobilizações estão ocorrendo na Europa. Os levantes nos subúrbios franceses de 2005, greves e mobilizações na Irlanda, Islândia neste ano. Existe relação entre esses movimentos?

Todos os levantes e movimentos no último período na Europa vêm da mesma causa, que é a incapacidade do capitalismo em resolver os problemas cotidianos das pessoas. Nós vimos isso, por exemplo, com os imigrantes franceses, vimos na Grécia e nos lugares que você citou. Com a crise, esses movimentos devem se intensificar. Pois, até agora, passamos por duas décadas de ataques da classe dominante, e após o fracasso do modelo econômico, eles querem que paguemos pela crise. Sem dúvida, as pessoas protestarão com mais força do que nos últimos anos.

Quais as perspectivas para o movimento na Grécia?

Após o Natal, o movimento parou. Houve protestos em janeiro, como o bloqueio de estradas pelos fazendeiros. O fato do governo não ter caído, e o movimento ter se dispersado, não quer dizer que acabou a raiva da população. Creio que isso deve vir à tona novamente no próximo período, combinado com o impacto da crise, a deterioração rápida do nível de vida.

Discute-se que a Grécia é o elo fraco da Europa e há risco de uma moratória da dívida. As pessoas estão apenas esperando a próxima mobilização, pois as causas ainda estão aí.  

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