PSOL: um passo atrás na Conferência Eleitoral
Organizar a resistência classista e socialista na base do partido e nas lutas
A II Conferência eleitoral do PSOL, realizada em Brasília nos dias 29 e 30 de março e convocada para definir as políticas diante das eleições municipais de 2008, representou um grave passo atrás para o partido.
O veredicto pode parecer excessivamente rigoroso, mas não é. Além de legitimar coligações eleitorais do PSOL com partidos burgueses, como no caso do PV de Porto Alegre e outros casos em negociação, a Conferência votou uma resolução sobre eixos programáticos que nega as bases do programa anti-capitalista e socialista aprovado na fundação do partido.
O PSOL nasceu em 2004 sob a bandeira do socialismo e da independência de classe dos trabalhadores. O partido já sofreu um retrocesso político importante quando a principal resolução política de seu I Congresso, realizado em junho de 2007, assume um viés mais eleitoralista, colocando o processo de lutas sociais num segundo plano e rebaixando o programa do partido.
Mas, naquele momento o campo majoritário do partido (principalmente as correntes MES, PP-MTL e APS) ainda não tinha condições de aprovar uma política que permitisse alianças eleitorais com partidos burgueses. Junto com a corrente Enlace, que apresentou a proposta ao Plenário, preferiram adiar a decisão para uma Conferência eleitoral, muito mais restrita e controlada.
Um Congresso com quase 800 delegados acabou sendo substituído por uma Conferência com apenas 103 delegados e quase nenhuma discussão prévia na base do partido.
Entre o Congresso e a Conferência trataram de criar fatos consumados, como no caso da coligação com o PV de Porto Alegre, legitimada pelo campo majoritário no Diretório Nacional do partido. Dessa forma, uma Conferência eleitoral esvaziada física e politicamente, onde vários estados sequer enviaram um único delegado, acabou sendo o cenário de um perigoso retrocesso para o PSOL.
Política de alianças
A resolução sobre política de alianças para 2008, aprovada na Conferência, aponta que o PSOL não fará alianças com DEM, PSDB, PMDB, PT e partidos ‘mensaleiros’. Apesar disso, o PSOL deverá, segundo a resolução, “envidar esforços para atrair setores sociais e partidários que estejam em contradição com o governo e a velha direita, inclusive com as forças majoritárias nos partidos de que fazem parte”. Traduzindo, a porteira está aberta para a negociação de alianças com todos os demais partidos burgueses.
O caso de Porto Alegre é emblemático dessa política. Como se pode dizer que o PV de Porto Alegre esteja em conflito com a velha direita se tem como presidente e provável candidato a vice-prefeito na chapa com Luciana Genro um cidadão que nas eleições municipais anteriores foi candidato a vice do direitista Jair Soares do PP.
O dano que essa política pode causar na imagem combativa do PSOL e de Luciana Genro, uma das ‘radicais’ expulsas do PT por sua coerência, pode ser gravíssimo. O PSOL de Porto Alegre irá aliar-se com o mesmo partido que está coligado com o PSDB no Rio de Janeiro, em torno de Fernando Gabeira, e que apóia o governo Serra no estado de São Paulo!
Apesar da reivindicação feita por nós do SR e do Bloco político que apresentou a Tese “Por uma campanha eleitoral a serviço das lutas”, a direção majoritária recusou-se a abrir o jogo e informar sobre todas as negociações de coligações parecidas que estão sendo feitas em todo o país. Teoricamente, segundo a resolução, os diretórios regionais e o Diretório Nacional podem vetar alianças nos municípios. A militância combativa do PSOL deve se posicionar para barrar esses acordos políticos que lembram o início do processo de degeneração do PT.
A resolução ainda fala em “dialogar com o PSTU e PCB, partidos que compuseram a Frente de Esquerda em 2006”. Ao contrário de uma política de construir uma Frente de Esquerda, classista e socialista, nas eleições e nas lutas, como nós defendemos na Conferência, a resolução apenas admite, sem nenhuma ênfase ou prioridade, a possibilidade de envolver esses partidos em coligações locais.
Eixos programáticos
A discussão sobre a política de alianças está diretamente relacionada à questão do programa do partido para as eleições municipais. Mesmo floreada com uma retórica que fala até em revolução socialista (voltada para o público interno), a resolução votada falhou em levantar as questões chave para uma alternativa anti-capitalista e de transição ao socialismo nas eleições de 2008.
O texto fala em denúncia da dívida pública, mas não fala que o PSOL deve romper com a lógica da Lei de Responsabilidade Fiscal e parar de pagar a dívida aos grandes capitalistas. Fala em planejamento e gestão participativos, mas não fala de onde virá o dinheiro para que as decisões tomadas pelos trabalhadores sejam efetivamente implementadas.
Não é possível falar em poder popular sem falar também na suspensão do pagamento das dívidas e também na estatização (ou municipalização) dos serviços públicos com controle direto dos trabalhadores.
O PSOL deveria assumir como suas as reivindicações de todos os movimentos sociais que atuam nas cidades, as bandeiras dos sem-teto por moradia e reforma urbana, dos estudantes pelo passe-livre nos transportes, dos sindicatos de trabalhadores do município na educação, saúde, transporte, etc.
Ligar as reivindicações imediatas dos trabalhadores nos municípios às bandeiras mais gerais contra a política nacional do governo Lula e dos governos estaduais e apontar uma saída anti-capitalista e socialista, deveria ser o eixo geral do programa do PSOL para as eleições de 2008.
Ao contrário disso, o discurso do ‘viável’, do que é ‘possível’, da relação de forças desfavorável, foi o que prevaleceu na linha das correntes do campo majoritário do partido.
O papel da esquerda revolucionária no PSOL
A luta por um partido revolucionário com influência de massas no Brasil será um longo processo. Parte dessa luta passa por construir uma forte ala esquerda socialista coerente no PSOL. Essa resistência organizada no partido permite que os socialistas revolucionários acumulem forças, forjem quadros políticos e evitem o isolamento num momento complexo da luta de classes.
Além disso, é preciso identificar quando o PSOL joga um papel progressivo do ponto de vista dos trabalhadores. A candidatura presidencial de 2006 foi um passo adiante, mesmo com o programa e a linha de campanha rebaixados. Apresentar candidatos em 2008 contra os partidos tradicionais da direita e os governistas, joga um papel progressivo.
Apesar dos retrocessos, o PSOL é e ainda será uma referência importante de muitos daqueles que buscam uma alternativa de esquerda. Nas eleições municipais, mesmo com os limites políticos do PSOL, refletidos em sua Conferência Eleitoral, não haverá outras candidaturas que expressem a oposição de esquerda a Lula e aos governos estaduais e municipais.
Nossa tarefa é de participar das campanhas de forma crítica em relação à linha majoritária, apresentando claramente nossas posições, e buscando fortalecer uma ala socialista e revolucionária do partido. Porém, mais do que nunca, é preciso fomentar e intervir de forma contundente no processo de reorganização dos movimentos sociais da classe trabalhadora, nas suas lutas e mobilizações.
Da intensificação das lutas, junto com a defesa organizada de um programa e estratégia socialistas, é que virão as bases para uma alternativa revolucionária de massas no Brasil.