PSOL com Boulos e Guajajara – radicalizar a democracia interna e construir um programa socialista

Crédito: Nunah Alle

Desde 2004, o Partido Socialismo e Liberdade mantém acesa a chama da reorganização e reconstrução da esquerda no Brasil.

Nascemos da luta dos trabalhadores, da juventude e dos oprimidos, da resistência contra os ataques da classe dominante implementados tanto pela direita tradicional quanto pelos governos do PT.

Durante a difícil “travessia do deserto”, quando as ilusões no Lulismo estavam no auge, mantivemos de pé a bandeira da oposição de esquerda diante da adaptação completa do PT à ordem política e econômica.

Ao entrarmos em um ciclo político marcado por uma profunda crise e pela redobrada ofensiva do grande capital, enfrentamos os golpistas em unidade de ação ampla, nas ruas e no parlamento, mas sem abrir mão de nossa independência política e programática.

O ocaso do Lulismo e a gravidade dos retrocessos atuais torna dramaticamente urgente a construção de uma nova esquerda, ao mesmo tempo em que cria condições novas para isso.

Nossa história nos credencia como protagonistas dessa construção. Mais uma vez, nosso partido é colocado à prova diante desse novo desafio.

A aliança política do PSOL com o MTST e outros movimentos representa um grande passo adiante. É um avanço para nosso partido e para o conjunto da esquerda.

Essa aliança vincula o PSOL ao que há de mais combativo nos movimentos sociais, com seu método de luta direta, trabalho de base, mobilizações massivas, ocupações de terra, etc.

Ela tem o potencial para fazer do PSOL um partido mais enraizado socialmente entre os setores mais explorados e oprimidos de nossa classe. Também ajuda a tornar o PSOL um partido capaz de disputar a base social que se desgarra de suas velhas direções.

Para cumprir esse papel, além de resgatar sua trajetória, o PSOL terá que superar a si mesmo em muitos aspectos. Terá que se fortalecer política e programaticamente. Mas, antes de tudo, terá que corrigir graves erros e deformações no que se refere à sua democracia interna, seu funcionamento e organização.

Saldar o déficit democrático no partido

Nossa campanha presidencial em 2018 se dará nos marcos de uma frente, uma aliança política de esquerda. Isso não tira protagonismo do PSOL, mas exige do partido uma postura de abertura em relação a outros setores da esquerda e do movimento social combativo.

Ao contrário de alguns, nós não vemos um obstáculo no fato de que o encabeçador de nossa chapa presidencial não seja um militante orgânico do PSOL, ainda que filiado ao partido. Isso é parte do espírito de frente e pode ter um efeito simbólico positivo diante da prática hegemonista, sectária e nefasta, na esquerda tradicional.

Há muito tempo, a LSR e grande parte dos setores mais à esquerda do PSOL defendem a necessidade de uma frente de esquerda socialista que incluísse, além dos partidos de esquerda (PCB e PSTU), organizações e movimentos combativos da classe trabalhadora. A aliança entre PSOL e MTST deve representar um passo nessa direção. Devemos valorizar essa iniciativa.

Mas, esse processo precisa se dar da forma mais transparente e aberta possível, com participação da militância e legitimidade na tomada de decisões. A tarefa de construir essa aliança política é uma tarefa do conjunto do partido e não pode ser um arranjo de cúpula.

O MTST, um componente vital dessa aliança, viveu seu processo interno de debate e deliberação, no seu tempo e com sua dinâmica própria. Para tomar sua decisão, realizaram discussões em sua coordenação, nas ocupações, fizeram assembleias massivas na base e realizaram um grande Encontro com muitos milhares de participantes no dia 25 de fevereiro em São Paulo.

Depois, em conjunto com outros movimentos, como indígenas da APIB, artistas, organizações de juventude, etc., realizaram a chamada Conferência Cidadã no dia 03 de março, aglutinando um campo popular em torno da proposta de pré-candidatura de Guilherme Boulos e Sônia Guajajara.

Uma vez referendada nesse âmbito, a candidatura Boulos/Guajajara precisa ser aprovada pelo PSOL em suas instâncias. Em nosso entendimento, a falta de um espaço suficientemente democrático de debate e deliberação no PSOL acirrou o debate interno, gerou desconfianças e ameaçou seriamente o processo de construção da aliança política de esquerda que precisamos. Não podemos culpar o MTST por isso. A responsabilidade é do PSOL e sua direção.

O PSOL padece de problemas estruturais do ponto de vista da democracia interna. A cada ano, a cada Congresso, desde a fundação do partido, os retrocessos se acumulam. De partido militante, com núcleos de base com poder real e envolvimento permanente da militância com suas atividades e deliberações, o PSOL mais e mais se aproximou do modelo falido do partido meramente eleitoral, onde uma cúpula decide e o resto faz .

O fato de que essa Conferência Eleitoral esteja realizando-se com uma proporção pré-estabelecida de delegados por correntes internas, baseada numa votação de delegados feita em setembro do ano passado, seis meses atrás, já demonstra o déficit democrático desse processo.

No 6º Congresso do partido, em dezembro de 2017, defendemos junto com muitas outras correntes do partido, que a Conferência de 10 de março refletisse um debate real na base do partido, com eleição de delegados e assim refletisse a evolução do debate interno. Essa proposta não foi aprovada.

Mesmo questionando muitos aspectos do 6º Congresso, incluindo as graves irregularidades na eleição de delegados no Amapá, por exemplo, o que se refletiu em uma distorção grave na proporção das forças internas ao partido, acatamos a decisão do Congresso e estamos participando da Conferência Eleitoral.

Reabrir um período de disputa interna, seja com a realização de uma outra  Conferência mais democrática ou prévias, não ajudaria na construção do projeto para a disputa presidencial. Nesse momento, é preciso colocar nossa campanha na rua e democratizar o debate sobre programa internamente e junto à população.

Não podemos aceitar que a construção do programa seja resultado da elaboração feita por um pequeno grupo de “especialistas” sobre cada tema, como recentemente foi anunciado pelo presidente do partido. O processo deve ser amplo e aberto e envolver toda a militância.

O debate sobre o programa deve aproveitar o acúmulo dos debates da iniciativa “Vamos – sem medo de mudar o Brasil”, mas deve agora ter uma delimitação nítida em relação à participação de setores dirigentes do campo Lulista, do PT, PCdoB, etc.

Se o partido não conseguir superar a prática interna cupulista e antidemocrática, dificilmente poderá constituir-se como referência alternativa aos milhões de jovens e trabalhadores que repudiam os partidos tradicionais e buscam uma prática democrática real.

Somente com um debate democrático, para dentro e para fora do PSOL, poderemos construir um programa anticapitalista e socialista como alternativa dos trabalhadores para o país.

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