A ascensão do Militant: Trinta anos do Militant 1964 – 1994

O Poll Tax – Primeiros dias

“Pela primeira vez um governo declarou que alguém que pudesse razoavelmente fornecer algo o fizesse para pelo menos pagar para a manutenção das facilidades e a provisão dos serviços de que eles se beneficiavam. Toda uma classe de pessoas – uma ‘subclasse’ se preferir – tinha sido arrastada para as fileiras da sociedade responsável e pedia para não serem apenas dependentes, mas cidadãos. Os distúrbios violentos de 31 de março em torno da Trafalgar Square foram a resposta deles e da esquerda. Um eventual abandono da taxa representava uma das maiores vitórias para essas pessoas já concedidas por um governo Conservador.”

(Margaret Thatcher: The Downing Street Years: pg 661)

Apenas um mês após a vitória conservadora, em 17 de julho, o Militant publicou a manchete de primeira página “O roubo Conservador do Poll Tax”. Um resultado da eleição geral foi a redução da representação Conservadora escocesa no Westminster de tal forma que eles não encheriam dois táxis. Thatcher planejava se vingar primeiramente introduzindo o poll tax na Escócia. Nós pontuamos: “a família Thatcher em Dulwich irá poupar £2.300 por ano… uma família média em Suffolk irá pagar um extra de £640.” Se dirigindo aos líderes Trabalhistas, Militant declarou:

Não podemos querer apenas concessões ou emendas, queremos esta legislação jogada fora. O movimento trabalhista de toda Grã-Bretanha precisa se mobilizar em torno desta questão. É o tipo de campanha extraparlamentar que pode construir o Partido Trabalhista e os sindicatos… O movimento precisa lutar, tirando planos de não-cooperação e não-implementação desta legislação. (1)

Nos preparamos muito cedo para lutar contra a medida, acima de tudo na Escócia, onde o poll tax foi introduzido primeiro. Os escoceses votaram massivamente contra os Conservadores, mas por causa dos votos da Inglaterra estes estavam uma vez mais no poder em Westminster. Isso abasteceu uma indignação nacional na perspectiva de mais um período da arrogância Conservadora em relação à Escócia.

Começou a crescer o apoio por uma assembléia escocesa: “Pesquisas de opinião mostram que quatro em cada cinco escoceses estão a favor de algum tipo de devolução.” (2)

Como mostrado antes, há muito éramos favoráveis à criação de uma assembléia escocesa. Mas agora, dado o enorme apoio entre o povo escocês para uma assembléia, o Trabalhismo começou, pela primeira vez desde os anos 70, a levar a sério a questão nacional na Escócia. Contudo, isto foi acompanhado pela capitulação aos Conservadores em outras questões. Depois de inicialmente adotar a política de “não-submissão”, i.e. não-cooperação ou não-implementação do poll tax, a Convenção das Autoridades Locais Escocesas (COSLA), em Setembro de 1987, decidiu retomar conversações com o Escritório Escocês. Além disso, algumas autoridades Trabalhistas, como nas regiões de Strathclyde e Lothian, concordavam com massivos cortes totalizando £10 milhões, sob a pressão do governo.

Militant pontuou que um dos medos do governo sobre uma Assembléia era precisamente como poderia ser usada, especialmente pela esquerda e pelos marxistas:

Uma administração de esquerda em Edimburgo entrando em conflito com o governo Conservador em Londres causaria uma situação potencialmente mais explosiva do que a de Liverpool em 1984/85… a possibilidade de uma Assembléia Escocesa de Esquerda, talvez influenciada pelas idéias do marxismo, enviaria ondas de choque para todas as fileiras do establishment britânico. (3)

Lições de Liverpool

Enquanto as lições da luta de Liverpool ainda estavam frescas, o Militant decidiu produzir um livro, Liverpool, uma cidade que se atreveu a lutar, escrito por mim e Tony Mulhearn, relatando os principais eventos entre 1983 e 1987.

Uma das resenhas mais bem vindas apareceu no próprio Militant, de Eric Heffer, MP Trabalhista por Liverpool Walton. O fato de que Eric escreveu isso depois das expulsões dos principais Militants de Liverpool era tanto uma indicação de sua posição principista e também de que não era possível, mesmo então, para a direita esmagar a esquerda. Eric corretamente viu a luta de Liverpool como uma inspiração para as futuras gerações de socialistas, que

irá ser estudada e seguida como a luta popular do começo dos anos 20 quando George Lansbury, uma vez líder Trabalhista, foi o líder da Câmara de Poplar… Embora não concorde com tudo que é dito, sinto que é um livro importante. Peter Taaffe e Tony Mulhearn produziram um documento que todos os futuros escritores sobre a luta irão precisar ao investigar fontes materiais básicas… A luta de Liverpool, como a dos mineiros de 1984-85, foi uma parte importante da luta de classe que teve lugar contra o governo Thatcher. Foi uma ‘política posta em teste’ e ao contrário do que alguns possam dizer, foi um teste em que a maioria dos vereadores de Liverpool e membros do partido passaram. Sim, eles cometeram erros, mas apenas os que não fazem nada e sentam em suas poltronas pontificando sobre aqueles que fazem, nunca cometeram erros. (4)

Combatendo o poll tax

Assim que se fechou um capítulo sobre a épica luta em que os apoiadores do Militant jogaram um papel chave, outro se abriu. O poll tax era uma questão chave, num sentido mais decisivo, que o movimento trabalhista enfrentava no terceiro mandato de Thatcher. Muitos setores do movimento se opunham ao poll tax, na maior parte verbalmente, mas o Militant ganhou proeminência num primeiro estágio pontuando as consequências para o governo e para a própria Thatcher se o poll tax fosse introduzido. No lançamento londrino do livro de Liverpool, atendido pelos principais jornais, rádio e TV, eu comentei:

A grande maioria está contra este imposto, mas os líderes Trabalhistas deixaram claro que a luta deve se restringir ao Parlamento. Mas a história deste governo mostra que eles não escutam as falas parlamentares. Apenas quando uma luta de massas é mobilizada, como foi em Liverpool, o movimento trabalhista pode forçar a ‘Dama de Ferro’ a se retirar. As câmaras escocesas têm a mesma escolha de Liverpool. Elas podem ou obter o ódio pela implementação do poll tax ou, como Liverpool, dizer não, se recusar a coletar e chamar um dia de greve geral. Do contrário eles podem também renunciar às suas posições. Há uma explosiva situação se desenvolvendo nos conjuntos habitacionais. O governo fez um grande erro. O poll tax envolve inquilinos e donos de imóveis, velhos e jovens. A posição do governo pode se tornar insustentável se o Trabalhismo tomar uma posição sobre a questão. (5)

No final do ano tiramos algumas conclusões gerais, que usamos para delinear a abordagem do Militant nos próximos 5 anos de intensa luta nesta questão. O jornal comentou:

Na ofuscação com sua reeleição em 1987, Thatcher confiantemente declarou que o poll tax seria o ‘carro-chefe’ de seu governo. O Titanic era o carro-chefe da Marinha Mercante Britânica e considerado inafundável até bater num iceberg atlântico! Os Conservadores agora estão em rota de colisão com um obstáculo muito mais formidável – a classe trabalhadora escocesa amargurada e mobilizada, e atrás dela apenas seus irmãos ingleses e galeses! Com uma liderança clara o movimento trabalhista pode afundar o carro-chefe Conservador sem vestígios. Quando o carro-chefe afundar, a Almirante pode ir junto com ele ou ser demitida. (6)

Através do poll tax Thatcher conseguiu o que os líderes Trabalhistas e sindicais falharam em fazer nos nove anos anteriores – ela uniu e generalizou as lutas da classe trabalhadora contra seu governo. Antes, ela era muito cuidadosa em não desafiar toda a classe trabalhadora ou abrir uma ofensiva em duas frentes. Mas o poll tax afetou velhos e jovens, empregados e desempregados, doentes e deficientes, inquilinos e os com casa própria, assim como as populações negras e asiáticas. Portanto todos, exceto a alta classe média e os ricos, seriam golpeados pelo poll tax.

O erro fatal que ela e seus ministros cometeram foi confundir a posição dos líderes Trabalhistas como um reflexo preciso do sentimento das bases.

Escócia

Uma campanha do movimento trabalhista contra o poll tax foi lançada em Edimburgo em dezembro de 1987, iniciada pelos apoiadores do Militant. Logo depois disso, passos foram tomados no Oeste da Escócia, especialmente em áreas como Pollok, para organizar uniões anti-poll tax. Isso levou a uma idéia, promovida pelo Militant, de uma Federação Anti-Poll do Oeste da Escócia. Mas antes deste passo ser tomado houve uma discussão séria tanto na Escócia quanto no resto do país entre as fileiras do Militant, sobre o programa e os passos organizacionais a serem dados para maximizar a enorme possibilidade de resistência de massas a esta medida.

Em abril de 1988 eu visitei Glasgow para uma conferência de um dia com delegados de cada área da Escócia onde o Militant tinha apoio e influência. Esta reunião clarificou importantes medidas táticas e deu luz verde para os apoiadores do Militant na Escócia para se concentrar no poll tax como uma questão chave e ligar a luta com a batalha que iria se desenvolver provavelmente numa escala de toda Grã-Bretanha depois. A atitude do Militant foi resumida num artigo de página central do jornal:

Este é o maior ataque único às condições de vida da classe trabalhadora não apenas deste governo Conservador, mas provavelmente deste século… O rolo-compressor de Thatcher está nos portões de Glasgow e Edimburgo. Ele pretende passar pelo ‘esqueleto’ do movimento trabalhista escocês e então passar por cima da classe trabalhadora inglesa e galesa. (7)

A conferência de abril do Militant tomou a decisão de organizar uniões anti-poll tax através da Escócia e sistematicamente pressionar pela adoção de um programa cuja demanda central seria o “não-pagamento” do imposto. Em cada estágio, a abordagem combativa do Militant contrastou claramente com a dos líderes do movimento trabalhista escocês.

No Congresso do Partido Trabalhista Escocês em março de 1988 os delegados responderam entusiasticamente a um desfile de oradores, incluindo apoiadores do Militant, que argumentaram apaixonadamente pelo desafio ao poll tax. Dick Douglas, então um MP trabalhista que estava na direita do partido, declarou: “Há um exército esperando para ser conduzido pela rota do não-pagamento.” Ele comparou Neil Kinnock a “um general levando suas tropas para uma batalha carregando uma bandeira branca.” (8)

No dia em que a conferência se abriu, uma pesquisa mostrou que 42% na Escócia eram a favor de uma campanha de não-pagamento ilegal contra o poll tax. Entre os eleitores Trabalhistas isto aumentava para 57%. E a fala no congresso de Neil Kinnock foi tão pobre que o fiel Trabalhista de Glasgow Herald escreveu que foi “universalmente avaliado como um desastre”. (9)

A conferência votou por dois votos a um pela resolução se opondo à “ilegalidade”. Era um contraste total com o sentimento da vasta maioria dos delegados, especialmente dos diretórios zonais. Mas a cúpula sindical usou seu voto em bloco a favor da liderança do Partido Trabalhista Escocês. Não obstante, foi decidido re-convocar a conferência no outono para reconsiderar a opção de não-pagamento. Isso deu uma oportunidade aos advogados do não-pagamento para mobilizar a classe trabalhadora numa ação a favor desta demanda. Reportamos em abril que as reuniões massivas nos conjuntos habitacionais mostravam que os trabalhadores esperavam que os líderes trabalhistas agissem. Em Pollok, Glasgow,

400 pessoas se uniram numa reunião pública para criar uma união anti-poll tax na área. “O que iremos fazer? Como combater isso?” eles perguntam. Um delegado sindical dos estaleiros de Govan perguntou ao vereador Trabalhista regional, “Se a Câmara regional é contra esta taxa então porque ela persegue inquilinos e intimida pensionistas idosos com cartões postais e formas de registro?”

Tommy Sheridan, então um apoiador do Militant pouco conhecido, declarou em meio a aplausos estrondosos:

Precisamos de vereadores preparados para lutar, a se posicionar agora contra este imposto e nos liderar na batalha. 75% dos escoceses se opõem ao imposto. Um milhão e meio estão dispostos a desafiar a lei. Precisamos de representantes trabalhistas que também estejam dispostos a desafiar a lei.

Ele foi eleito secretário da união anti-poll em Pollok e

lembrou a reunião de 47 vereadores de Liverpool que estavam preparados a permanecer firmes e desafiar a lei Conservadora. “Precisamos deles aqui em Pollok”, foi a resposta da audiência. (10)

Em julho 350 delegados representando milhares de trabalhadores em 105 grupos anti-poll tax, a maioria de conselhos comunitários e associações de inquilinos, concordaram em criar uma Federação Anti-Poll Tax de Strathclyde. Esta conferência chamou unanimemente por uma campanha massiva de não-pagamento e para os vereadores trabalhistas se recusassem a perseguir os não-pagadores. Também chamou o TUC escocês a aumentar a campanha e organizar uma greve geral de 24 horas. Tommy Sheridan foi eleito sem oposição secretário da Federação e prometeu vigorosa liderança do recém-eleito comitê.

Como combater o poll tax

Pouco antes desta conferência o Militant produziu um panfleto Como Combater o Poll Tax, escrito por Alan McCombes. Pontuava que:

já um ano inteiro antes do poll tax estar pronto para ser coletado, uma enorme onda de resistência está se desenvolvendo nas cidades por toda a Escócia.

Mas era “ainda fragmentada e carente de coordenação”. Alan chamou pela mobilização de amplos setores da classe trabalhadora e por

reuniões públicas em cada cidade, grande e pequena, e nas pensões; acima de tudo, por uma campanha de massas de porta em porta em cada localidade com o objetivo de conseguir pelo menos um milhão se empenhando em recusar pagar o poll tax.(11)

Também reportamos que

Numa reunião de 180 em Cowglen, um camarada da antiga Red Clydesider, Harry McShane, resumiu a etapa que nós agora alcançamos; “estes vereadores trabalhistas parecem não saber nada sobre nossa história. Sempre tivemos que lutar… O único meio de quebrar o poll tax é quebrar a lei.” (12)

Falas como essa e material escrito disseminado através de centenas e milhares de canais da classe trabalhadora, familiarizando o povo trabalhador com a realidade e os detalhes do poll tax, criaram a base para o maior movimento massivo de desobediência civil visto neste século. Até mesmo no congresso nacional do Partido Trabalhista em outubro, para o horror da liderança, os apoiadores do Militant chamaram pelo desafio ao poll tax. O vereador de Glasgow Jim McVicar foi ovacionado quando chamou o partido a apoiar o não-pagamento:

Não podemos apenas esperar por um governo Trabalhista. Uma campanha massiva é o único meio de garantir uma vitória Trabalhista. A escolha é entre a bandeira vermelha do socialismo e a bandeira branca da rendição. (13)

Alec Thraves, um delegado de Swansea, relembrando o ataque de Neil Kinnock aos vereadores de Liverpool no congresso de 1985, disse que se o Trabalhismo não organizasse uma campanha vitoriosa de não-pagamento “iremos ver o caos grotesco de vereadores trabalhistas, sim, vereadores trabalhistas, saindo disparados em táxis distribuindo notícias de despejo a pessoas que não podem pagar o poll tax.” Donald Dewar, secretário-ajudante escocês, condenou o não-pagamento como “taticamente ingênuo e errado em princípio”.

O consolo de um Trabalhista de direita para uma mulher que não podia pagar a taxa foi: “Se você não pode pagar estou certo que o tribunal irá ser indulgente com você!” (14) Os lideres Trabalhistas neste estágio estavam defendendo como uma alternativa ao poll tax a idéia de “duas taxas”. A recusa covarde em apoiar o não-pagamento foi um presente ao Partido Nacional Escocês (SNP), que, sob o impacto da radicalização da população escocesa se desenvolveu de “Conservadores Light” a um partido nacionalista cada vez mais radical. No congresso Trabalhista especial, o Militant alertou:

O SNP está rezando que a política de Neil Kinnock de subserviência cega à lei de Thatcher irá prevalecer no congresso. Isso pode dar aos nacionalistas o maior apoio desde a descoberta de petróleo no Mar do Norte. (15)

Previsivelmente, o congresso rejeitou a “opção de não-pagamento”.E o revide não demorou a vir: em 10 de novembro o Trabalhismo perdeu a pré-eleição de Govan. Na eleição geral havia uma maioria Trabalhista de 19.500 no seu 15° assento mais seguro na Grã-Bretanha. Jim Sillars, o candidato SNP, ganhou a pré-eleição com 33% saídos do Trabalhismo.Sillars, que era um antigo MP Trabalhista de esquerda, superou o trabalhismo em radicalismo:

“Eu me concentro no fato de que Donald Dewar está dizendo ao povo para pagar o poll tax enquanto o SNP está organizando a campanha contra.” (16)

Algumas das áreas com os mais oprimidos trabalhadores, foram infestadas com cartazes do SNP durante a eleição. Havia uma notória falta de entusiasmo para o Trabalhismo. O comentário desanimado de um trabalhador parecia resumir o sentimento das fileiras trabalhistas: “O SNP tem os Proclaimers; nós temos o Wet Wet Wet.” (17)

Nós comentamos:

Govan foi um teste para a agenda Kinnoista do Partido Trabalhista. As sedes têm mais computadores do que a nave estelar Enterprise! Um exército de organizadores em tempo integral foi recrutado para operá-los, fazer campanha e assegurar a vitória A nova imagem moderada assegurou as bênçãos do Daily Record e Evening Times. Tudo parecia ir bem. Exceto que nenhum computador ou editor de jornal bateu nas portas. (18)

Após este fracasso a direção Trabalhista tentou culpar Bob Gillespie, o derrotado candidato trabalhista. Ele foi aprisionado numa camisa de força política, com os MPs Donald Dewar e Brian Wilson escrevendo suas falas e assistindo cada palavra. A direita preferiu Anne McGuire, uma anti-devolucionista de longa data e advogada do pagamento do poll tax, como sua candidata. (19)

Não havia dúvida que uma campanha socialista combativa teria cortado a ascensão do SNP. E a direita e a imprensa ainda insinuaram que o Militant era o culpado pela derrota de Bob Gillespie. Nós respondemos:

Pelo contrário, se as políticas socialistas do Militant fossem adotadas e defendidas pelo Partido Trabalhista da Escócia, teria havido uma vitória espetacular em Govan como em Liverpool na eleição geral de 1987. (20)

Dois meses antes, o congresso especial do Partido Trabalhista, um delegado alertou:

Se formos à Govan e dizer ao povo que devem ficar sem o essencial de comida e roupas para pagar o poll tax, não receberemos boas vindas. (21)

O resultado de Govan enviou ondas de choque a todo movimento trabalhista na Escócia. Indicou o perigo posto ao Trabalhismo pelo SNP e mais importante, num sentido, a raiva que existia da negativa das aspirações nacionais do povo escocês.

NHS

Já em 1988 estava claro que o poll tax era a questão chave enfrentada pelos trabalhadores escoceses. Mas no resto da Grã-Bretanha isto não parecia tão importante nesta etapa. O ataque ao Sistema Nacional de Saúde (NHS) estava mais em evidência. A vulnerabilidade do governo nesta questão foi mostrada pela declaração de Thatcher durante a eleição geral de 1987 de que “o Sistema Nacional de Saúde está seguro nas mãos dos Conservadores”. Isso era pura hipocrisia, como demonstrado logo depois da eleição. Os recursos devidos ao NHS e especialmente às condições de saúde dos trabalhadores foram solapados. Nos primeiros meses de 1988 a raiva dos trabalhadores da saúde explodiu. O gatilho para o que se tornou um poderoso movimento nacional não veio das cúpulas dos sindicatos de saúde. A greve de 38 enfermeiras do Hospital Geral de Manchester Norte e a ameaçadora ação dos trabalhadores da transfusão de sangue trouxe para a luz toda a raiva e ressentimentos acumulados do pessoal do NHS. Não foi o conselho geral do TUC, com 9 milhões de trabalhadores atrás dele, nem a liderança do NUPE ou COHSE, os sindicatos da saúde, que forçaram o governo Thatcher a uma humilhante derrota, mas 38 enfermeiras. Duas vezes em 2 dias o “indomável” governo Conservador foi forçado a ceder aos trabalhadores da saúde em greve. Primeiro capitulou quando as enfermeiras de Manchester pararam devido às horas de pagamento. Isso deu aos trabalhadores da transfusão de sangue um estímulo.

Uma das líderes das enfermeiras de Manchester, Joan Foster, revelou porque não contaram ao NUPE e outros líderes sindicais da saúde, ou do Partido Trabalhista, de que entrariam em greve: “Não queríamos ouvir de que não deveríamos sair em greve.” (22)

Havia muita suspeita sobre os líderes de ‘esquerda’ do NUPE, assim como os da direita. Até mesmo o The Independent saiu com uma manchete: “Greves dos trabalhadores da saúde botam o gabinete para correr” (23): O movimento confundiu completamente os advogados do ‘Novo Realismo’, que levou tal influência sobre a liderança sindical. Na esteira da eleição geral de 1987 eles se tornaram obcecados com a idéia de que as greves e os sindicatos eram “impopulares”. Nós declaramos:

Os trabalhadores da saúde têm todo o direito a greve, mas eles precisam do apoio total e completo de outros sindicalistas… No momento a ação das enfermeiras se limitou a uma greve de 24 horas, e de forma correta e cuidadosa organizaram uma cobertura de emergência. (24)

Éramos a favor de greves de 24 horas nas áreas onde as enfermeiras se moviam à ação, para greves regionais como um passo para a ação nacional. Mas os líderes sindicais cantavam uma canção diferente. Nós reportamos:

No comitê coordenador de Londres do COHSE, o secretário geral, Hector McKenzie, disse a delegados reunidos dos hospitais em greve que eles não tinham o apoio aberto do sindicato nacional. (25)

Compare isso com a posição de John Macreadie, em 27 de janeiro de 1988, na reunião do conselho geral do TUC. Ele chamou por um dia de greve geral em defesa do NHS. Isso foi encaminhado ao Comitê de Serviços de Saúde do TUC, porque os “sindicatos de saúde ainda não se encontraram para formular qualquer plano de ação.” (26) Não havia dúvida que John Macreadie refletia a atmosfera da base. Tal era a pressão que o comitê de saúde do TUC foi obrigado a chamar uma demonstração nacional em 5 de março. Imediatamente depois disto foi anunciado uma corrida a favor da ação começou a ser construído. Trabalhadores em diferentes regiões tomaram parte em demonstrações e chamaram os líderes sindicais a entrarem em ação. Em meio a este movimento Arthur Scargill foi reeleito presidente do Sindicato Nacional dos Mineiros com 54% dos votos, claros oito pontos a frente do candidato direitista, John Walsh.

À medida que as linhas de batalha foram delineadas no serviço de saúde, nossos apoiadores se jogaram diretamente em apoio aos trabalhadores de saúde. John Macreadie pontuou que:

Na recente reunião do conselho geral [do TUC], apenas 5 minutos foram gastos discutindo a luta da saúde. Alertei que sem uma direção coordenada, grupos individuais de trabalhadores fazendo ações de solidariedade poderiam ser escolhidos para a vitimização. Agora servidores civis também estão ameaçados. Se qualquer trabalhador fizer um piquete de greve pelo NHS, os sindicatos precisam organizar uma ação total para defendê-los. (27)

Em resposta à marcação de passo dos líderes nacionais, devotamos 2 páginas para defender um dia de greve. Rodney Bickerstaffe, líder do NUPE foi abordado numa demonstração para assinar uma petição organizada pelo BLOC chamando por um dia de greve geral Sua resposta foi “nunca”! Seu assistente, Tom Sawyer, que com Kinnock foi muito mais responsável do que ninguém pelo fracasso da eleição geral de 1987, também deu o tom:

Nos sindicatos do NHS nós temos o poder do cuidado paciente, o poder do amor e o poder da compaixão. Este poder é maior que o poder da força. As pessoas vendendo jornais na demonstração chamando por um dia de greve geral estão errados. Há muitos meios de ganhar. O poder da moderação é melhor que o poder da força. Com o poder da moderação iremos ganhar… Um dia de greve geral poderia perder apoio. Esta é uma batalha entre as forças do bem – os trabalhadores da saúde e o público – e as forças do mal – Moore (então Secretário da Saúde), Currie e Thatcher. (28)

Militant respondeu que era preciso muito mais do que “amor” para derrotar Thatcher, seu governo e sua implacável hostilidade às enfermeiras a ao sistema de saúde.

Havia um apoio esmagador às enfermeiras, como mostrado nas greves dos trabalhadores de Vauxhall, Merseyside e os mineiros de Frickley, que saíram em solidariedade. Mas o governo Thatcher estava preparado para derrotar qualquer movimento a menos que todo o poder do movimento trabalhista fosse mobilizado. Até o Daily Telegraph, fiel apoiador de Thatcher, pontuou que 80% da população apoiava as enfermeiras e, mais significativo, 66% dos Conservadores as apoiavam. Em sua posição contra Thatcher a câmara municipal de Liverpool colheu enormes dividendos políticos na eleição geral de 1987: 57% apoiavam o Trabalhismo. No fim da greve dos mineiros o apoio ao Trabalhismo tinha subido para mais de 10% comparado com a eleição geral anterior de 1983. Kinnock dissipou este apoio com a caça-às-bruxas e seu rumo à direita.

Para a cúpula do movimento sindical ação limitada e manifestações eram meramente um meio de aliviar a pressão. Contudo, para os trabalhadores na Grã-Bretanha um dia de greve geral poderia ser visto de forma inteiramente diferente. Poderia unir o povo trabalhador e desencadear um terremoto político.

Demandas, slogans para a luta, precisam levar em conta o nível real do movimento dos trabalhadores, incluindo o de sua liderança. Reconhecendo as mudanças ocorridas nos altos escalões dos sindicatos, Militant declarou:

apenas quando o movimento alcança um ponto febril o conselho geral do TUC irá ratificar uma greve geral de 24 horas. O movimento dos trabalhadores, não apenas na Grã-Bretanha mais internacionalmente, precisa se desenvolver de baixo antes que os líderes sindicais e trabalhistas dêem apoio. E mesmo então eles serão indiferentes, com o propósito de desencaminhar o movimento na primeira oportunidade. (29)

Muitos trabalhadores perguntavam aos apoiadores do Militant se uma greve geral de 24 horas seria suficiente para forçar uma retirada do governo. Além do que, na Itália, Espanha e França greves gerais de 24 horas eram muito comuns. Mas na Grã-Bretanha a situação era diferente. Se devidamente preparada poderia minar completamente o governo Conservador. “Deve ser uma ocasião não apenas para paradas, mas para reuniões de massas para alcançar cada canto da sociedade britânica.” (30)

Uma vez tendo sentido seu poder, a classe trabalhadora estaria ávida para mostrá-lo de novo. Várias greves gerais de um dia poderiam se desdobrar. Isso poderia mobilizar e levantar novas camadas da classe trabalhadora, especialmente aquelas fora dos sindicatos que não fossem afetadas por uma ação anterior. Contudo:

os marxistas devem se opor à greves gerais nos moldes da Itália nos últimos 15 anos. Lá a greve geral de um dia tem sido usada como uma válvula de escape para dissipar a raiva e oposição da classe trabalhadora às várias coalizões capitalistas… Num certo estágio, mesmo uma greve geral total será posta na Grã-Bretanha. Contudo, não estamos neste estágio. Uma greve geral é uma situação ‘ou/ou’. Duas forças, dois estados criados que visam a supremacia, como a greve geral de 1926 indicou. (31)

O chamado para uma ação decisiva foi reivindicado na marcha massiva do TUC da saúde em Londres em 5 de março, que foi uma “maravilhosa confirmação da força não diminuída do trabalhismo organizado”. (32)

Até o secretário geral do TUC, Norman Willis, disse que a marcha de 100 mil ao Hyde Park foi: “uma das maiores marchas da história deste país”. Um chamado para um dia de greve geral em 14 de março, dia do orçamento, foi levantado pelos manifestantes.

Contudo, o grande entusiasmo da marcha foi dissipada no que foi provavelmente o mais desanimador comício já feito ao fim de uma demonstração de massas dos trabalhadores britânicos. Houve apenas quatro oradores: Norman Willis, o líder pensionista Jack Jones, “Tia Agonia” Clare Rayner, e o arcebispo Trevor Huddlestone. Willis foi o único orador sindical – na verdade um cantor, já que ele fez um Karaoke! – e incrivelmente não houve oradores dos sindicatos dos trabalhadores da saúde.

Contudo, após esta mostra massiva do poder da classe trabalhadora, havia uma determinação em apoiar a ação planejada para a véspera do orçamento. Mineiros, doqueiros, motoristas de ônibus, estivadores e trabalhadores aéreos se uniram aos milhares aos trabalhadores da saúde naquele dia. Em Londres, num chuvisco contínuo, 3 mil trabalhadores da saúde e de outros lugares marchara do South Bank à um comício no Friends’ Meeting House. Este foi tudo o que o comício e a marcha do dia 5 não foi, com cantos, ovações e refrões de “Estamos entrando em greve pelo NHS”.

Os apoiadores do Militant jogaram um papel chave, especialmente em áreas como Sheffield em organizar um movimento que resultou em 5 mil marchando numa demonstração viva e entusiástica para defender o sistema de saúde. O movimento dos trabalhadores da saúde nos meses de janeiro, fevereiro e março de 1988 – se bem construído – poderia ter parado o governo Thatcher. Contudo o contraste entre a atitude dos trabalhadores da saúde comuns e os líderes sindicais foi evidente em cada estágio. O fato de que a Thatcher assim como a Major foi dada a oportunidade de desmantelar sistematicamente o sistema de saúde não é uma indicação pequena da inatividade dos líderes sindicais nacionais.

P&O

Ao mesmo tempo outro amargo conflito com todos os mesmos ingredientes da disputa da saúde, estourou entre os marinheiros e a linha marítima P&O. Esta companhia tentou demitir todos os seus trabalhadores de travessia de Dover devido a sua recusa em aceitar um corte na quantidade de pessoal que, fora qualquer outra coisa, era uma ameaça à segurança de passagem. A demissão de 2.300 marinheiros em Dover era um ataque a todos os marinheiros e um sentimento para uma ação nacional se desenvolveu.

Indicações prévias mostraram que era provável ter uma decisão de dois a um a favor da ação. Mas estão os donos de balsas apelaram ao tribunal e os juízes os favoreceram declarando que a disputa afetava apenas os trabalhadores da P&O de Dover. Ainda que estivesse muito claro que se a P&O pudesse ir adiante com significativas reduções na força de trabalho outros poderiam segui-la. Portanto, todos os marinheiros tinham interesse em sair em ajuda aos trabalhadores do Dover. Mas outra vez os líderes sindicais tremera ante as cortes Conservadoras. Uma votação pela ação nacional foi cancelada no meio dos procedimentos, o que enraiveceu a massa dos marinheiros, especialmente os da P&O, que foram deixados isolados.

Os apoiadores do Militant fizeram uma intervenção impressionante na greve, com Tony Mulhearn falando em Dover para uma reunião lotada de trabalhadores da P&O. Os apoiadores do Militant divergiram até mesmo com aqueles “à esquerda” da executiva do NUS. Este tinha decidido que a melhor estratégia era restringir a disputa de Dover a um nível local. Alguns deles argumentaram que se outros trabalhadores de passagem, tais como os da Sealink, saíssem em greve, “esta greve poderia ser perdida”. Contudo, o apoio às nossas idéias de como conduzir a greve cresceu com a própria greve. Todas as iniciativas de fato vieram de baixo, com as fileiras dos marinheiros levantando fundos, organizando grupos de apoio e montando uma campanha por uma ação sindical nacional.

O que aumentava a amargura dos marinheiros era que seus patrões da P&O doaram £100.000 aos Conservadores. A pressão de baixo obrigou a liderança do NUS a sancionar uma ação nacional, o que resultou no seqüestro dos bens sindicais. Após este seqüestro os líderes sindicais deram para trás.

Em fevereiro eles terminaram a greve nacional, que estava ganhando ímpeto em solidariedade com os trabalhadores da Isle of Man Steam Packet. A liderança então deu um golpe a todos os membros do NUS. Depois de semanas lutando sozinho, uma minoria dos marinheiros começou a desanimar. Pequenas brechas na greve foram então utilizadas pela P&O e algumas linhas de navegação foram restauradas. McCluskie, lider do NUS e tão efetivo em expulsar os Militants de Liverpool do Partido Trabalhista, era totalmente incapaz de dar uma direção decisiva aos marinheiros na hora crítica. A conseqüência foi que os trabalhadores da P&O em Dover foram isolados e por fim derrotados.

Fora desta disputa foram ganhos alguns trabalhadores chaves para o Militant que jogaram um importante papel tanto sindical quanto nas amplas lutas do movimento trabalhista em Dover e outras áreas.

1 Militant 857 17.7.87
2 Militant 864 11.9.87
3 ibid
4 Militant 884 19.2.88
5 Militant 883 12.2.88
6 Militant 907 29.7.88
7 ibid
8 Militant 888 18.3.88
9 Quoted ibid
10 Militant 893 22.4.88
11 “How To Fight The Poll Tax”, 1988, resenha no Militant 898 27.5.88
12 Militant 898 27.5.88
13 Militant 916 7.10.88
14 ibid
15 Militant 913 16.9.88
16 Sunday Times, citado no Militant 922 18.11.88
17 Militant 922 18.11.88
18 ibid
19 ibid
20 Militant 914 23.9.88
21 Militant 886 4.3.88
22 Citado no Militant 880 22.1.88
23 Militant 880 22.1.88
24 Militant 882 5.2.88
25 ibid
26 Militant 886 4.3.88
27 ibid
28 ibid
29 ibid
30 ibid
31 Militant 887 11.3.88